Turismo | Proposta de Kou Hoi In junto da APN gera críticas

 

Pouco impacto nas receitas do jogo, falta de infra-estruturas e pior qualidade de vida para quem cá vive. Eis as críticas apontadas por dois analistas à proposta feita pelo deputado Kou Hoi In de criar vistos chineses com duas entradas a cada três meses

 

[dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] deputado Kou Hoi In quer mais turistas a visitar Macau. Segundo o Jornal Tribuna de Macau, o também representante da RAEM na Assembleia Popular Nacional (APN) fez uma proposta junto do órgão legislativo da China quanto à possibilidade de estabelecer vistos que permitam duas entradas a um turista por cada ciclo de três meses.

Em declarações ao HM, o economista Albano Martins prefere recorrer à ironia para mostrar que está contra a proposta. “Deviam chegar turistas todos os dias, 365 dias por ano, e o deputado devia andar nas ruas de Macau. A qualidade de vida da população é muito mais importante do que ter gente a meter dinheiro ao bolso”, apontou apenas.

Já Anthony Wong, docente na área do Turismo da Universidade Cidade de Macau (UCM), alerta para a falta de infra-estruturas que persiste no território. “Esta medida pode de facto trazer algum desenvolvimento ao turismo mas, no território, deve haver também um desenvolvimento em termos de infra-estruturas, com mais entretenimento. Não falo de mais hotéis, mas em termos de espaços e eventos, para garantir o conforto de quem nos visita. Acho que ainda temos uma deficiência a esse nível. Se queremos atrair mais turistas, ainda há muito a melhorar.”

Impacto assim-assim

Em termos económicos, Anthony Wong considera que os vistos de duas entradas a cada três meses, sistema que já vigora em Hong Kong, não trarão grandes consequências.

“Poderia melhorar um pouco mais em termos de número de turistas, especialmente para os que vêm de Guangdong. Mas não traria um grande impacto na economia. Poderia existir algum aumento em termos de chegada de turistas em trânsito, dos que circulam entre Guangdong e Hong Kong com frequência”, diz.

Para Anthony Wong, uma mudança nos vistos nem sequer iria contribuir para um aumento significativo das receitas do jogo. “Poderia haver algum impacto, porque haveria mais turistas. Mas o problema é que esta medida não iria levar mais turistas para o jogo, não é esse o foco, especialmente se falarmos de jogadores VIP.”

As mudanças iriam verificar-se, sobretudo, na percepção do território enquanto destino de turismo em trânsito. “Poderia ser uma oportunidade para promover Macau para um turismo em trânsito. Aí haveria uma promoção do turismo no Delta do Rio das Pérolas e Macau seria apenas uma das paragens, com turistas com múltiplas entradas”, concluiu o docente da UCM.

9 Mar 2017

House of Beijo, loja de vinhos e conservas | Douro, um amor tardio

Natural de Hong Kong, Gordon Yue já importava vinhos de vários países, mas o sabor do néctar português não o fascinava. Um convite à região do Douro mudou tudo. Há dois anos abriu a House of Beijo, loja de vinhos, conservas e produtos de cosmética, por ser uma palavra que apela ao amor e à felicidade, juntamente com um copo na mão

[dropcap style≠’circle’]N[/dropcap]ão foi amor à primeira vista. Até há quatro anos, Gordon Yuen não conseguia encontrar um único vinho português de que gostasse. “Sempre achei que o sabor era uma porcaria. De verdade. Naquela altura, quando vinha a Macau e tentava provar algum vinho, todos tinham um mau sabor”, contou ao HM.

Um convite para ir à região do Douro acabou por mudar a sua percepção sobre os produtos e, hoje, a loja que Gordon Yuen possui na Calçada do Amparo, em Macau, obteve o nome graças a uma das zonas com mais história em termos de produção de vinhos. House of Beijo, ou Casa do Beijo, roubou o nome ao vinho “Quinta do Beijo”.

“Recebi um convite para ir ao Douro, então pensei ‘nunca estive em Portugal e tenho aqui uma viagem grátis, com tudo pago’. Foi a primeira vez que fui ao Douro. Havia uma prova de vinhos e achei o vinho incrível. Não conhecia nada sobre aquela região, e comecei a partir daí a adorar esse vinho e a promovê-lo”, contou ao HM.

As viagens a Portugal começaram a ser uma constante. “Vou ao Douro, a Lisboa, a várias zonas produtoras de vinho. Mas continuo a achar que o vinho do Douro é o melhor.”

O português é que vende

Durante a entrevista, Gordon Yuen foi à estante buscar uma garrafa de “Quinta do Beijo”, enquanto degustava um copo de vinho de outra nacionalidade. A razão? As fracas vendas dos vinhos franceses, americanos ou espanhóis na loja, e o sucesso do vinho português junto dos turistas.

“Se abrisse a loja de novo não escolheria esta localização e levava a maioria dos vinhos para Hong Kong, à excepção dos portugueses e do vinho do Porto. São os melhores. Todos os clientes que chegam aqui, sejam da China, de Taiwan ou da Coreia, só procuram vinhos portugueses. Não sabem que há vinhos franceses ou italianos. Compram três e quatro garrafas. Os outros fazem-me perder tempo, acabo por ser eu a bebê-los”, apontou.

O sabor das conservas

Além das estantes cheias de garrafas de vinho, a House of Beijo tem também várias conservas, um sucesso junto de quase todos os turistas que por ali passam. Gostam da qualidade do produto, do sabor do peixe com os vários temperos. Há também produtos de cosmética para a pele e cabelo, vindos de França e feitos com ingredientes naturais.

Voltando ao vinho, Gordon Yuen assegura que, na hora de vender para casinos e hotéis, é o vinho francês que acaba por ser sinónimo de qualidade e elegância dentro de um copo. “Quando os clientes vão jogar procuram mais esses vinhos”, aponta, referindo que a culpa é da falta de estratégia de marketing por parte dos portugueses. “O vinho francês é mais conhecido. O vinho português é muitas vezes considerado um vinho barato e nem todos os clientes VIP gostam. Um vinho francês é quase sempre considerado muito bom.”

Os entraves

Com as portas abertas há dois anos, e com o negócio de importação a correr sobre rodas em Hong Kong, Gordon Yuen explica que o volume de vendas na House of Beijo poderia ser maior.

“Tenho de dizer que a localização desta loja não é a ideal, porque não há muita gente a passar por aqui. Está um pouco aquém das minhas expectativas. Se abrisse de novo não escolhia esta localização”, referiu.

Gordon Yuen falou ainda dos entraves que podem existir na relação empresarial com os produtores portugueses. “Em Portugal, o estilo de vida é considerado mais importante do que o negócio. Se eu disser que quero este e aquele produto, dizem-me: ‘ok, está acordado’, mas três meses mais tarde continuo a não ter a minha encomenda. Não é fácil fazer negócio, sobretudo na área dos vinhos. Precisam de ter grandes encomendas para enviar aos importadores, para não ser tão caro, e precisamos de esperar.” Tudo isto é dito com o sorriso de quem ultrapassa as diferenças culturais na hora de negociar.

8 Mar 2017

Tabaco | Comissão volta a analisar o diploma na Assembleia

Há mais de seis meses que os deputados não se debruçam sobre a revisão do regime de prevenção e controlo do tabagismo, que prevê o fim das salas de fumo nos casinos. O regresso à análise na especialidade de um diploma polémico está marcado para a próxima terça-feira

 

[dropcap style≠’circle’]É[/dropcap] uma lei cujo processo de revisão tem sido feito de avanços e recuos, mas parece que, desta vez, vão ser dados passos em frente. Há mais de seis meses que a 2.ª Comissão Permanente da Assembleia Legislativa (AL) não se encontra para analisar na especialidade o regime de prevenção e controlo do tabagismo, mas está agendada uma nova reunião para a próxima terça-feira.

Esta sessão de trabalho decorre depois de o Governo ter mostrado abertura para a permanência de salas de fumo nos casinos, desde que com padrões mais rígidos.

No período em que a análise na especialidade ficou em banho-maria, as operadoras de jogo tornaram públicos dois relatórios que comprovam que, afinal, as salas de fumo desempenham bem o seu papel. Do outro lado, as associações de trabalhadores do jogo têm refutado essas conclusões.

A última vez que a comissão presidida pelo deputado Chan Chak Mo reuniu foi em Junho do ano passado. Nessa altura, foi referido que a elaboração de uma nova proposta iria atrasar os trabalhos, uma vez que sete deputados da comissão se mostravam a favor das salas de fumo e apenas dois estavam a favor da proibição total do tabaco nos casinos.

Muitos consideravam então o documento de trabalho de revisão da lei “parcial”, pelo que se impunha a necessidade de prolongar a análise. “É para ser mais democrático. Há deputados que entendem que o memorando não está bem redigido porque não reflecte bem as suas opiniões”, referiu Chan Chak Mo na altura.

Em Agosto, o deputado Au Kam San mostrou-se preocupado com a possibilidade de o diploma ficar esquecido nas gavetas do hemiciclo. Na altura, o HM questionou a Assembleia sobre o facto da discussão em torno do diploma estar parada, sendo que muitos deputados defenderam que a revisão não era prioritária. Ng Kuok Cheong, o seu colega de bancada, chegou mesmo a dizer que poucos gostariam de ver a revisão da lei avançar.

As contradições

Pelo meio falou-se de uma contradição: se na generalidade a revisão da proposta de lei passou com a aprovação da maioria dos deputados, no seio da comissão as opiniões revelaram ser diferentes.

Numa ocasião pública, o deputado Leong Veng Chai frisou isso mesmo. “Na altura, a maioria dos deputados votou a favor mas depois, quando chegou à comissão, só dois deputados mantiveram essa opinião. Percebem a contradição?”, questionou.

Em Fevereiro deste ano chegaram as declarações que, segundo o Governo, não representam uma reacção a pressões. “Se as salas de fumo forem bem instaladas e não afectarem os outros, então não há problema”, disse Alexis Tam, secretário para os Assuntos Sociais e Cultura. Resta saber quais as conclusões da próxima reunião da 2.ª comissão permanente da AL.

8 Mar 2017

Instituto do Desporto em silêncio sobre processo de adesão ao Comité Olímpico

Depois de o Chefe do Executivo ter dito que Macau aceita o facto de não ser um Estado soberano para pertencer ao Comité Olímpico Internacional, o Instituto do Desporto nada diz sobre o que tem sido feito nesse sentido desde 2007. Resta a promessa de participação em eventos do Conselho Olímpico da Ásia

 

[dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] Instituto do Desporto (ID) não adianta qualquer informação sobre as etapas que têm sido levadas a cabo na tentativa de adesão de Macau ao Comité Olímpico Internacional (COI). O HM quis saber o que tem sido feito nos últimos dez anos, bem como se Macau iria mesmo “desistir” do processo de adesão ao COI, após as declarações do Chefe do Executivo, Chui Sai On.

Contudo, o ID apenas afirmou que os atletas locais e as instituições desportivas vão continuar a participar em eventos sob alçada do Conselho Olímpico da Ásia (COA).

“O ID vai continuar o seu esforço no apoio ao desenvolvimento do desporto em Macau e, enquanto membro do COA, Macau vai participar de forma activa nos eventos por si organizados e em outras competições internacionais. [Tal irá] providenciar o desenvolvimento do desporto local, o qual irá realizar-se com condições favoráveis por forma a atingir novas metas de desenvolvimento”, explicou o organismo ao HM através de resposta escrita.

Esta segunda-feira, no âmbito de um encontro com Gou Zhongwen, director da Administração Geral do Desporto e presidente do Comité Olímpico da China, Chui Sai On disse que a RAEM “compreende que, por não ser um país soberano, não poderá integrar o Comité Internacional, apesar das alterações introduzidas nas regras do COI”. Hong Kong que, tal como Macau, não é um país, faz parte do COI desde 1951.

Mais do mesmo

Da parte do ID, nada mais há a acrescentar à história oficial que já se conhece. “No seguimento da criação do Comité Olímpico de Macau, em 1987, foi submetida a candidatura de adesão ao COI e ao COA. Enquanto que a candidatura ao COA foi aprovada em 1989, a revisão dos estatutos do COI feita em 1996 significou que apenas ‘Estados independentes’ seriam reconhecidos, e Macau não poderia ser aceite como membro do COI.”

Em declarações ao HM, Manuel Silvério, antigo presidente do ID, considerou que as palavras do Chefe do Executivo não representam a total desistência da RAEM, tendo dito ainda que, em 2007, o território estava prestes a fazer parte do COI.

“Como pessoa ligada ao desporto e residente digo que, se Macau desistir, e se as pessoas pensarem em não levar para a frente essa luta, não estamos a fazer as coisas de acordo com a Lei Básica, não estamos a fazer as coisas como Hong Kong fez e somos nós próprios que estamos a recusar um direito que é nosso”, acrescentou Manuel Silvério.

8 Mar 2017

Raquel Ochoa, autora da biografia de Manuel Vicente: “O seu génio era, por natureza, caótico”

No meio dos esquissos pragmáticos fazia poesia e filosofia, buscava eternamente um desconhecido para o conhecer e criar uma outra coisa. A paixão pela arquitectura durou até ao fim, tal como o lado pop que marcou um génio “irrepetível”. O livro “Manuel Vicente: A Desmontagem do Desconhecido” é hoje apresentado no edifício do antigo tribunal, no âmbito do festival Rota das Letras

[dropcap]C[/dropcap]omo é que chegou a Manuel Vicente e à possibilidade de escrever a sua biografia?
É uma aventura com muitos anos, porque escrever sobre Manuel Vicente é tudo menos fácil. Não é uma pessoa com um carácter e um percurso linear. Nenhum ser humano é, mas o Manuel Vicente destaca-se. O seu génio era, por natureza, caótico. Ele costumava dizer que a maneira de se ordenar era utilizando aquelas grelhas que ele usava muito na sua arquitectura. Quanto ao resto não seguia um padrão, não tinha uma forma de querer agradar a um qualquer parâmetro. Começámos este trabalho com o apoio do Centro Cultural e Científico de Macau. Um amigo que foi aluno dele, o Sérgio Xavier, disse-me: ‘Tu que escreves biografias vais adorar o meu professor, que é um homem que eu adoraria que alguém que não tem nada que ver com a arquitectura tentasse capturar a sua personalidade’. Fui um pouco sem saber ao que ia, mas fiquei imediatamente convencida. Comecei então a entrevistar Manuel Vicente, a conhecer alguns dos seus amigos. Isto durou dois anos e nunca pensámos que iria demorar tanto tempo a ser publicado o livro.

O que levou a isso?
Ele adoeceu e, antes disso, estava com trabalho e menos tempo. Por causa da doença afastámo-nos, ele afastou-se de toda a gente. Após a morte dele demorei a encontrar a finalização do projecto. 

Porquê?
Este trabalho não é uma biografia, chamo-lhe ensaio biográfico. Se estava pensado para ser uma biografia, não pôde ser no final devido à sua partida.

Houve histórias que ficaram por contar.
O meu trabalho não ficou completo e tinha de assumir um risco. Ou finalizava a biografia com um método que não é o meu ou tinha de chamar-lhe outra coisa, e torná-lo num documento interessante e importante para entender a vida de Manuel Vicente. Aí foi essencial a aproximação e interesse de Rui Leão, que foi seu colega e que o conheceu muito bem. Deu-me algum apoio e a sua equipa direccionou-me onde estava perdida. Depois fiz várias entrevistas e pude completar esta biografia. Tive acesso a um trabalho do Bruno Alves, que fez uma tese de mestrado sobre o arquitecto.

Que Manuel Vicente podemos ter no livro? Vamos ter o homem caótico ou o arquitecto que gosta de pop art?
É uma pergunta à qual é difícil responder. Sempre quis mostrar o Manuel Vicente íntimo, que não era nada fácil. O meu foco não é, de todo, a arquitectura. Esta aparece porque é a linguagem dele, é a maneira como ele se projecta na sua construção como pessoa. Percebo pouco ou nada de arquitectura e, aliás, a feitura deste livro muda-me completamente a visão que tenho sobre ela, sobre as cidades. As conversas com ele alteraram também a minha maneira de olhar o mundo. Há uma alteração entre a Raquel que não conhece o Manuel Vicente e a Raquel que passa a conhecê-lo. Fascina-me o carácter, o pensamento filosófico. O que me interessou partilhar foi: porque é que este homem consegue pensar desta maneira.

Ele próprio era uma pessoa do mundo. Muitos consideram-no um arquitecto de Macau, mas ele não gostava muito dessa designação.
Não posso com toda a certeza dizer que não gostava, mas posso dizer que ele se via como um arquitecto do mundo. E com muito mundo. Essa é uma das facetas que tento ao máximo apresentar de uma forma muito simples, contando episódios passados em várias partes do mundo e as pessoas que o influenciaram. Uma das coisas que mais gosto de fazer na vida é viajar e identifiquei-me muito com o Manuel Vicente viajante. Há episódios incríveis na vida dele. Há um episódio em que ele tem a oportunidade de dar quase a volta ao mundo durante seis ou sete meses. A primeira mulher está grávida e, por um acidente de percurso ele perde um transporte, e quando chega à maternidade a mulher já tinha tido o filho. Obviamente ela não gostou, ele conta isto com imensa pena, mas este episódio revela bem o viajante que Manuel Vicente era e também o que é viajar: faz-nos também perder muitas coisas. Até ao fim da vida, lidou com as consequências de ser um viajante e de não ser um homem que assentou só num sítio. Falo nomeadamente da dificuldade que é estudar a obra arquitectónica dele, que é uma obra dispersa.

Que pessoa foi o Manuel Vicente que não está espelhada nos edifícios que desenhou? Há outro lado?
Sem dúvida. Qualquer pessoa que tenha tido a oportunidade de privar com ele entende essa espontaneidade com que ele falava e se incorporava nas coisas. Ele tinha uma forma de ver esta planta que aqui está numa rua, numa cidade, num projecto. Tinha uma maneira de emergir nas coisas. Incorporava-se nas coisas com um mergulho completamente louco, de uma maneira incansável. São épicas as histórias dos seus ateliers, em que todos viviam praticamente neles. Ele impunha esse ritmo, mas aquilo era uma festa, não era nada imposto. Esta é talvez a faceta mais conhecida dele, a maneira fogosa com que ele vivia as coisas. Para mim, o mais interessante foi captar tudo isso em discurso directo. É ouvir a maneira como ele sussurrava as coisas. Em pormenores tentei ao máximo trazer essa voz dele, dos tempos que precisava para começar a falar das coisas. Não o vejo ou nunca o vi como arquitecto, como os outros olham para ele e têm um enorme respeito pela sua arquitectura. Entendo esse respeito, mas o que me fascinou foi o pensador Manuel Vicente. A maneira como ele pensa sobre a construção de uma identidade, de um povo.

Quando pensamos na arquitectura pensamos em algo estático, com números, linhas, e ele ia além disso. Ia além desse pensamento pragmático.
Sim. Ele tinha uma objectividade que é clara nas suas obras, mas era dentro dessas linhas que ele criava poesia. Eu também o via como poeta. Estava sempre a fazer grandes anotações de frases que ele dizia e que eram autêntica poesia. Confesso que vi o meu trabalho inacabado, mas chegámos a um produto final que vale a pena. Não é por acaso que não existem milhares de biografias sobre ele. É muito difícil encontrar um fio condutor para a história da vida dele. Era um homem de uma errância em relação ao pensamento e espaço físico onde viveu, e à própria arte que praticava. Ele recebeu influências de arquitectos também eles completamente erráticos e fora do sistema, e tudo isso é difícil de compilar e colocar numa obra biográfica.

Nessas conversas como surgia Macau? Surgia de forma espontânea, era um território que lhe dizia muito?
Macau surgiu nas nossas conversas constantemente. Não houve uma conversa em que Macau não surgisse. Era muito giro, porque ele tinha várias Macau na sua vida. Tinha a Macau que guardava de forma cinematográfica na sua cabeça, do período em que chegou [ao território], daquilo que foi a primeira grande paragem em termos profissionais. Depois tem a fase de Macau de grande trabalho e intervenção na cidade. Depois há uma terceira Macau, de fazer o seu trabalho olhando para as condições políticas que aqui existiam. [Desse período] também tem bastantes histórias para contar, mas sempre reservado. Muitas das informações nem surgem em discurso directo, mas sim com base em jornais. Há depois uma última Macau, quando ele tem cá o atelier, mas está baseado em Lisboa. É a Macau em que tudo o que ele é e sente vem daqui mas, ao mesmo tempo, com algumas amarguras, nomeadamente a história do Fai Chi Kei. 

Quando demoliram o complexo de habitação pública.
Ele tem um episódio que acho curial. Quando lhe perguntei o que achava desta demolição, conta que, durante os primeiros anos de Macau, houve alguém que tentou alterar a fachada de um edifício que ele tinha feito e que aquilo o transtornou por completo. Aí era o Manuel Vicente ainda jovem. Ele disse-me isso de uma maneira muito gira: ‘A minha tensão arterial foi para um nível que nunca mais saiu de lá. Percebi nesse momento que as minhas obras são as minhas obras, e eu sou eu’. Então, em relação ao Fai Chi Kei, ele dizia que era uma pena, mas que as cidades evoluem. Que lhe custava, mas que não ia pensar muito nisso.

Que outras mágoas levou de Macau?
Ele não era um homem de muitas mágoas. Esta é a resposta politicamente correcta, mas é verdadeira. Ele era um homem que respirava a projectar e dizia que a vida dele era fazer arquitectura. A única mágoa dele foi talvez não lhe terem dado mais trabalho. Acredito que o projecto da Expo 98 que foi demolido também tenha sido uma mágoa para ele, por ser a obra lindíssima que era. Teria outras, mas estas eram as mais evidentes. Ele era uma pessoa que explodia quando tinha de explodir, eu ainda tive uma quota-parte disso, mas não se compara a outras situações que aconteceram. O Manuel Vicente que conheci, nos últimos anos, é alguém completamente resolvido, à excepção de não se conformar com o facto de ter menos trabalho.

A arquitectura esteve à frente da vida pessoal?
Não sei se tenho estatuto para responder a isso. Sei que pôs a arquitectura à frente de tudo e mais alguma coisa, muitas vezes. Não sei se fazia isso de forma sistemática. A arquitectura era a sua grande paixão, mas adorava os filhos. Sempre que podia falava da segunda mulher, Teresa, falava com imenso respeito da primeira mulher, e a legião de amigos era muito referida. Era um homem de afectos, terá tido muitas loucuras e, nessa busca pela arquitectura, terá feito alguns atropelos.

O livro chama-se “A Desmontagem do Desconhecido”. É o desconhecido para além do que foi edificado?
É enigmático, foi difícil pensar um título à altura. A desmontagem vem da maneira que ele tinha de ver as coisas, de as desmontar. O desconhecido surgiu porque tudo o que era novo, o que ele não conhecia, era o que o animava. Percebi isso nele: ele queria ir em busca do desconhecido para depois desmontar e montar de novo à maneira dele. Há muitas histórias da infância neste livro, sobre a deficiência que ele tinha numa anca. Teve uma infância demolidora, passou 12 anos numa cama.

Talvez venha daí a vontade de ir à aventura.
Sim. Quando entendemos a infância que ele teve e de como a família o apoiou, que ele talvez não contasse no escritório, é interessante percebermos isso. É como a aventura na Índia, que o marca enquanto jovem. Ele tem também uma aventura em Karachi, no Paquistão, e o regresso da Índia é uma viagem que dá um livro. São coisas que se narram de forma breve e consistente neste livro, e que nos fazem aproximar de novo desta pessoa, que é muito saudosa para Macau e Portugal, para o mundo da arquitectura e dos pensantes que gostam de falar com alegria, a sorrir. Ele era essa pessoa.

Que legado deixa ele?
Há muita gente que, a partir do momento em que entra em contacto com ele e com a sua obra, percebe que Manuel Vicente é irrepetível. Tem este lado pop, uma linguagem apelativa para um jovem que goste do lado disruptivo da arquitectura. Acho que as pessoas que se interessam por este mundo não consensual da arquitectura o vão procurar e estudar.

7 Mar 2017

Comité Olímpico | Manuel Silvério entende que Macau ainda não desistiu

O Chefe do Executivo disse ontem que Macau “compreende que, por não ser um país soberano, não poderá integrar” o Comité Olímpico Internacional. Manuel Silvério, antigo presidente do Instituto do Desporto, afirma que não se trata de uma desistência. E diz que o processo não deve ser suspenso

[dropcap style≠’circle’]C[/dropcap]orria o ano de 1989 quando Macau escreveu uma carta de intenções a pedir para integrar o Comité Olímpico Internacional (COI), processo que continua pendente por não ser um país, apesar da mudança de estatutos da organização em 1997. Hong Kong faz parte do COI desde 1951.

Ontem, no âmbito de um encontro com Gou Zhongwen, director da Administração Geral do Desporto e presidente do Comité Olímpico da China, o Chefe do Executivo, Chui Sai On, disse que Macau “compreende que, por não ser um país soberano, não poderá integrar o Comité Internacional, apesar das alterações introduzidas nas regras do COI”.

Ao HM, Manuel Silvério, ex-presidente do Instituto do Desporto (ID) que acompanhou o processo de tentativa de adesão ao COI até 2008, ano em que se reformou, não está em causa uma desistência por parte da RAEM.

“Analiso esta declaração não como uma desistência, mas como uma grande esperança de ser a República Popular da China a apoiar, a levantar e a forçar o processo. Se não tiver vontade política, de certeza que o Chefe do Executivo sabe que não pode forçar, nem trabalhar nesse sentido.”

Manuel Silvério considera que, segundo a Lei Básica, Macau tem direito a pertencer ao COI, se colocar a designação “Macau, China”, “tal como o que aconteceu com Hong Kong”, apontou.

Apesar disso, o impasse persiste. “Todos os dirigentes do COI admitem que o pedido de Macau é diferente dos outros. Não devem castigar Macau por uma decisão tardia e adiada pelo próprio COI [sobre a mudança dos estatutos].”

Manuel Silvério diz não conseguir explicar porque é que este processo ainda não ficou concluído. “Não devo ser eu a responder a isso, e julgo que os actuais dirigentes do Comité Olímpico de Macau também não saberão responder ou nem têm coragem para responder.”

“Como pessoa ligada ao desporto e residente digo que, se Macau desistir, e se as pessoas pensarem em não levar para a frente essa luta, não estamos a fazer as coisas de acordo com a Lei Básica, não estamos a fazer as coisas como Hong Kong fez e somos nós próprios que estamos a recusar um direito que é nosso”, acrescentou.

As tais declarações

Manuel Silvério recorda o passado para ir buscar palavras de Chui Sai On, na Assembleia Legislativa, acerca da adesão da RAEM ao COI. “A única pessoa que disse, publicamente, e na Assembleia, foi o actual Chefe do Executivo, de que Macau não estaria interessado. Para mim ele está a tentar rectificar o que afirmou há uns anos.”

O ex-presidente do ID garante que a China sempre apoiou uma adesão de Macau ao COI. “Pelo que sei, a RPC e o Comité Olímpico da China sempre apoiaram esse desiderato de Macau. Nunca, nem formalmente nem informalmente, a China falou dos inconvenientes dessa afiliação. Nenhum dirigente, nem o actual nem os anteriores, mostraram que a China não quer que Macau participe.”

A adesão esteve prestes a ser uma realidade há dez anos, mas Manuel Silvério não adianta quais foram os entraves que evitaram que isso acontecesse. “Há uns anos, em 2007, faltava apenas um passo para Macau entrar no COI. Nessa altura, o presidente do COI visitou Macau e assistiu à abertura dos Jogos Asiáticos em Recinto Coberto.”

No encontro com Gou Zhongwen, Chui Sai On referiu ainda que o facto de Macau ser membro da direcção do Conselho Olímpico da Ásia (COA) permitiu “desenvolver as modalidades desportivas em alta competição, sendo também um enorme incentivo para os atletas locais”.

7 Mar 2017

Comissão mista | Escolas de Portugal e Macau juntas em rede

Da segunda reunião da subcomissão da língua portuguesa e educação, integrada na Comissão Mista Macau – Portugal, saiu a ideia de criar uma rede de escolas dos dois territórios, em colaboração com o Instituto Confúcio. Há ainda a hipótese de um protocolo entre o Instituto Camões e o IPM

[dropcap style≠’circle’]A[/dropcap] ideia deixada em Macau por Tiago Brandão Rodrigues, ministro português da Educação, parece estar prestes a nascer. Aquando da sua visita ao território, o ano passado, o ministro afirmou que gostaria de ver as escolas locais criarem laços com instituições portuguesas, sobretudo as que já ensinam mandarim.

Essa foi precisamente uma das conclusões saídas da segunda reunião da Subcomissão mista da língua portuguesa e educação, criada no âmbito da Comissão Mista Macau-Portugal. Segundo um comunicado oficial, “as partes acordaram na criação de uma rede de escolas associadas que unirá, por via de protocolos de geminação, escolas secundárias de Portugal, preferencialmente aquelas onde decorre o projecto piloto da oferta de mandarim […] a escolas da RAEM, onde é ministrada a língua portuguesa”.

A rede será operacionalizada com o apoio do Instituto Confúcio e constituirá uma plataforma privilegiada para o desenvolvimento de outras áreas de cooperação bilateral que as partes consideraram relevantes”, tais como a “capacitação institucional no domínio da produção de estatísticas em educação, do desenvolvimento da educação inclusiva, do desporto escolar e adaptado, da educação estética e artística do ensino e formação profissionais”.

O plano poderá ainda contemplar apoios ao nível “da coordenação e liderança escolares, bem como da promoção da leitura em língua portuguesa para crianças e jovens”.

O encontro, que decorreu em Lisboa entre os dias 20 e 21 de Fevereiro, contou com Sou Chio Fai, do Gabinete de Apoio ao Ensino Superior, enquanto coordenador da delegação da RAEM, enquanto que Ana Paula Laborinho, presidente do Instituto Camões, chefiou a delegação portuguesa.

Segundo o mesmo comunicado, a delegação portuguesa “expressou o seu reconhecimento pelo apoio institucional e financeiro que tem sido dado pelo Executivo da RAEM à Escola Portuguesa de Macau, que constitui uma escola de referência no quadro das escolas portuguesas no estrangeiro”.

Ligação ao IPM

Da reunião saíram também novas intenções para reforçar a formação de professores, tal como a “assinatura, num futuro próximo, de um protocolo de cooperação entre o IC e o Instituto Politécnico de Macau (IPM)”. Os membros da Subcomissão falaram do “grande progresso que se tem verificado na RAEM e o trabalho desenvolvido nesse domínio pelas autoridades da Região e pelas várias instituições académicas”.

Uma vez que as universidades portuguesas estão à procura da internacionalização, o GAES considera que “a nova Lei do Ensino Superior, em vias de aprovação pela Assembleia Legislativa, abre espaço ao incremento e alargamento da cooperação neste sector”. Dessa forma a aposta será feita através do portal study & research in Portugal, “uma ferramenta de apoio que o GAES passará a veicular junto dos estudantes e investigadores da RAEM”.

Foi adiantada ainda a possibilidade de um “aumento do número de bolsas de estudo”, um “elemento importante de uma estratégia definida por parte do Governo da RAEM”. A ideia é “acelerar a formação de quadros bilingues em áreas que não se restringem, apenas, às da tradução e formação jurídica”.

Mais tecnologia

As entidades assinaram um memorando de entendimento entre a Fundação para a Ciência e a Tecnologia de Portugal (FCT) e o Fundo para o Desenvolvimento das Ciências e Tecnologias de Macau (FDCT).

O acordo insere-se nas “áreas estratégicas prioritárias” assumidas neste encontro, que visam, ao nível do ensino superior e investigação, “o desenvolvimento de projectos conjuntos nos domínios da investigação, ciência e tecnologia, e ainda formações pós-graduadas”.

Foram ainda assinalados “os avanços registados na resolução dos constrangimentos referentes à tramitação dos processos de estudantes da RAEM que vêm estudar para Portugal”. A “disponibilidade” por parte do Conselho Coordenador dos Institutos Superiores Politécnicos (CISP) para que as instituições académicas ligadas a esta entidade possam aceitar o exame unificado para efeitos de acesso ao ensino superior em Portugal, “no âmbito do Estatuto do Estudante Internacional”, ficou ainda demonstrada.

Quanto ao reconhecimento de graus académicos, “as partes têm já em análise o texto do memorando de entendimento no qual será alicerçada a cooperação neste domínio”.

6 Mar 2017

Saúde | Tratamentos médicos no exterior vão manter-se sem alterações

Os Serviços de Saúde esclarecem que não há redução de tratamentos fora de Macau para doentes oncológicos devido a cortes orçamentais ou à entrada em vigor da Lei do Erro Médico

[dropcap style≠’circle’]O[/dropcap]s tratamentos feitos por doentes de Macau em hospitais estrangeiros não irão sofrer quaisquer alterações ou eventuais reduções. É o que afirma um comunicado ontem emitido pelos Serviços de Saúde (SS).

O esclarecimento surge após terem sido “expressas algumas opiniões públicas aludindo ao facto de que, devido a eventuais cortes orçamentais e à entrada em vigor da Lei do Erro Médico, os pacientes oncológicos, que se encontram em reabilitação no exterior, tinham visto os seus tratamentos cancelados”.

Os SS esclarecem assim que cabe à avaliação dos médicos de Macau a decisão do doente continuar ou não a ter consultas fora do território, pelo que “a questão não está relacionada com o orçamento”. “Quer as despesas, quer os locais de tratamento, não irão sofrer a influência das mudanças sócio-económicas”, aponta o mesmo comunicado.

Os Serviços de Saúde explicaram ainda que casos antigos de erro médico ocorridos antes da entrada em vigor da lei podem ser analisados no Centro de Mediação de Litígios Médicos, criado recentemente. Este centro tem como responsabilidade a mediação ao nível dos valores de indemnização, sendo que “a apresentação de litígios ao centro tem carácter voluntário e o procedimento de mediação é gratuito para as partes”.

Tal pedido não “suspende qualquer prazo de recurso” aos tribunais, e também não impede os intervenientes de recorrerem para as instâncias judiciais para verem o caso resolvido.

Expectativas e rigor

Para os SS, o facto da Lei do Erro Médico já estar em vigor “não impede que situações já passadas e relacionadas com eventuais erros médicos voltem a ser discutidas em público”. Isto apesar de “em algumas situações, já existirem decisões judiciais e que são respeitadas pelos SS”.

Segundo os Serviços, “é compreensível que os pacientes tenham expectativas de que os tratamentos possam ‘curar’ as situações clínicas, mas os médicos apenas prestam o apoio e diagnosticam o tratamento mais adequado ao paciente”. “Estes diagnósticos podem não corresponder à expectativa criada pelos doentes originando, eventualmente, insatisfação nos utentes provocando, por vezes inevitavelmente litígios médicos”, afirma ainda a entidade dirigida por Lei Chin Ion.

Ainda sobre a Comissão de Perícia do Erro Médico, os SS dizem que a nomeação dos seus membros “foi efectuada de forma rigorosa, de acordo com as suas qualificações”, por forma a “garantir o funcionamento independente da Comissão”. Esta “não se encontra sujeita a qualquer ordem, instrução ou interferência, de forma a garantir a justiça e a imparcialidade”.

6 Mar 2017

AL | Pedido debate sobre aumento das taxas de veículos

 

Leong Veng Chai entregou um pedido de debate na Assembleia Legislativa sobre o aumento das taxas de veículos, questionando se este é “razoável”. O deputado teme que mais aumentos venham a acontecer

[dropcap style≠’circle’]N[/dropcap]ão basta uma reunião com o secretário para os Transportes e Obras Públicas, um protesto e uma marcha lenta para encerrar o assunto. A questão do aumento das taxas de veículos continua a gerar reacções negativas, o que levou o deputado Leong Veng Chai a apresentar na Assembleia Legislativa (AL) uma proposta de debate sobre a matéria.

Questionando se o aumento das taxas “é razoável”, o número dois de José Pereira Coutinho pretende esclarecer uma situação onde afirma existirem interesses por detrás.

“Espero que, através de um debate, todos os deputados possam apresentar as suas opiniões, de modo a ir ao encontro da opinião pública e evitar suspeitas sobre a existência da transferência de interesses entre o Governo e entidades privadas”, pode ler-se na proposta. Leong Veng Chai espera ainda que o Chefe do Executivo, Chui Sai On, “possa reunir amplamente os conhecimentos, a fim de tomar uma decisão resoluta”.

As actualizações das taxas para a remoção de veículos dos lugares de estacionamento ocupados de forma ilegal passaram das 120 para as 750 patacas para as motas. No caso dos veículos, estes começaram a pagar 1500 patacas, bastante mais do que as anteriores 300. O maior aumento regista-se no caso dos veículos pesados e especiais, já que os valores subiram de 450 para seis mil patacas.

“Em 2017 também aumentaram substancialmente as despesas para o desbloqueamento e a remoção de veículos por parte das empresas de parquímetro. Além disso, em várias taxas, registou-se um aumento para o dobro ou mais. Há, por isso, suspeitas de transferência de interesses”, acusa Leong Veng Chai.

Novos aumentos?

O deputado recorda declarações de Lam Heong Sang, director dos Serviços para os Assuntos de Tráfego (DSAT), quanto à possibilidade de aumento progressivo das referidas taxas.

“O director da DSAT revelou, ao ser entrevistado por jornalistas, que era possível que as referidas taxas continuassem a aumentar. Se os cidadãos ignorarem este caso, que nunca antes tinha acontecido, será que o Governo vai continuar a aumentar outras taxas da mesma forma, ou seja, através de um despacho do Chefe do Executivo e sem realização de uma consulta pública?”, questionou Leong Veng Chai.

Um argumento que tem sido utilizado nos protestos é o de que muitas famílias não têm capacidade financeira para suportar estes aumentos, pois já convivem com uma elevada inflação. Algo que Leong Veng Chai também expõe na sua proposta de debate.

“Nos últimos 17 anos, os rendimentos dos residentes só aumentaram ligeiramente. Com o desenvolvimento em flecha da economia, a inflação faz com que os preços dos produtos do dia-a-dia estejam em constante aumento. Contudo, os salários dos residentes não só não conseguem suportar a subida em flecha, como estes também vão ter de suportar a subida do valor das taxas, aumentando, cada vez mais, o custo de vida das famílias.”

O deputado recorda que, na maioria das vezes, não existem mais alternativas a não ser andar de mota ou de carro. “Os residentes que são utentes dos transportes públicos não conseguem prever com segurança o período necessário para chegar ao trabalho e às escolas, por isso, são obrigados a utilizar motas ou automóveis para se deslocarem.”

Vida difícil

Leong Veng Chai considera também que ainda não existem lugares de estacionamento suficientes, apesar das promessas já feitas pelo Executivo nesse sentido.

“Nestes 17 anos o número de veículos registados em Macau teve um aumento constante. De acordo com os dados publicados pela Direcção dos Serviços de Estatística e Censos de 2016, esse número atingiu os 250 mil. Nas Linhas de Acção Governativa para o presente ano, apenas se refere que vão entrar em funcionamento quatro novos auto-silos públicos, onde só se vão disponibilizar 3600 lugares de estacionamento”, refere.

Para Leong Veng Chai, “a actual rede de trânsito é desequilibrada”, sendo que, sem vagas de estacionamento suficientes para todos os veículos, “torna-se mais difícil a vida dos cidadãos”.

“Para melhorar a qualidade de vida, de que ponto devemos partir? Porque é que o Chefe do Executivo não compreende as dificuldades dos cidadãos? Isto é que é ‘melhor servir a população’?”, remata o membro do hemiciclo.

A proposta já foi admitida na AL, mas ainda não há uma data para a sua votação. Caso seja aprovado pelos deputados, o debate será posteriormente agendado.

5 Mar 2017

Tam Kam Chun, construtor de barcos | O fazedor de pequenas memórias

[dropcap style≠’circle’]N[/dropcap]as mãos de Tam Kam Chun a história não morre, não pode morrer. Onde outrora havia barcos grandes, feitos no seio de uma indústria bem-sucedida, há hoje barcos pequenos, que já não servem para transportar pessoas e mercadorias, mas sim para transportar memórias de um tempo que foi e já não volta.

Este artesão dedica-se a fazer barcos em miniatura, mas foi durante décadas construtor de juncos de madeira. Primeiro na península, junto ao Mercado Vermelho, e depois em Lai Chi Vun. Quis o destino que continuasse a trabalhar no ofício de uma vida, mas hoje as suas mãos trabalham pequenos pedaços de madeira que não são para vender, mas para contar histórias.

“Como já estou reformado e continuo a ter interesse por isto, então faço estas miniaturas, para que as pessoas possam conhecer um pouco desta indústria”, contou ao HM.

É na imensidão do vazio do estaleiro Son Weng, já sem actividade, que diariamente vai trabalhando nas suas peças. “Este estaleiro não é meu, mas de uma pessoa que conheço. Como os estaleiros ficam sem funcionamento, então um amigo emprestou-me este local.”

O trabalho com as miniaturas começou “há pouco tempo”, mas os barcos de grande dimensão começaram a sair das suas mãos quando ainda nem tinha 20 anos. Recorda de então tempos áureos, de quando havia trabalho e cada um aprendia as antigas técnicas como podia.

“Não trabalhava num lugar fixo, estava em qualquer estaleiro, onde fosse preciso. Não tive um mestre fixo e os que faziam os barcos comigo também não tinham. Aprendíamos uns com os outros. Perguntávamos sempre onde era precisa mão-de-obra e íamos aprendendo.”

O rigor acabaria por vir com o tempo. “Precisava de observar a técnica dos profissionais e com a passagem do tempo ia descobrindo a maneira correcta para fazer barcos. Só aí me tornei profissional.”

Na época, construir barcos era uma opção natural. “Antes não havia muitos trabalhos que pudéssemos escolher e tínhamos de ganhar dinheiro para a família. O meu pai também fazia barcos e tinha contacto com esta indústria. Então decidi começar.”

Igual ao original

Muitos dos que se deparam com Tam Kam Chun a trabalhar no estaleiro perguntam se ele pretende vender os pequenos barcos que faz. Mas para este antigo construtor naval o objectivo é mesmo contar um pedaço da história.

“Muitos perguntam-me se vendo as miniaturas, mas levo muito tempo, dez dias ou até meio ano. O objectivo é mostrar como era a indústria antes. A estrutura das minhas miniaturas é diferente dos barcos reais, mas tento esforçar-me e imitar a forma original. São as mesmas técnicas que usava para os barcos.”

Se as suas mãos enrugadas ainda são capazes de construir barcos, as mãos dos mais novos demorariam a aprender o ofício. Os tempos são outros e os interesses também, assegura.

“Não há muitos jovens que queiram aprender a fazer barcos, porque esta indústria já não garante o rendimento. Além disso são precisos vários anos para dominar esta técnica. Os jovens têm de estar mesmo interessados na indústria naval. Levei três anos a aprender as técnicas mais básicas, mesmo quem está interessado não tem hoje as condições suficientes para trabalhar”, aponta.

Ouvir primeiro

Anunciada a demolição dos estaleiros onde trabalhou uma vida inteira, Tam Kam Chun não aceita que o fim chegue de forma súbita. “Os estaleiros são a última amostra que existe sobre esta indústria, vou ter pena se o Governo decidir demolir tudo. O mais importante é que o Governo não fez qualquer planeamento ou consulta sobre isto, para que nós possamos saber se vale ou não manter isto.”

Mesmo que o Governo destrua e construa de raiz, “um novo estaleiro não vai ter história”, considerou. “Na sociedade há várias vozes contra a decisão do Governo e acho que não se pode manter essa decisão. Quero que Governo desenvolva a parte do turismo na zona de Lai Chi Vun.”

Para Tam Kam Chun, a população deveria ter a última palavra, mesmo que fosse contra a manutenção dos estaleiros. “A indústria naval tem uma grande história, que continuou até aos dias de hoje. Os cidadãos também precisam de avaliar se vale a pena manter. Se disserem que não vale a pena, então concordamos. Mas não queria que o Governo demolisse os estaleiros. O Governo diz sempre que quer salvaguardar a história e o património, mas agora quer destruir isto.”

5 Mar 2017

Ponte do Delta | Au Kam San questiona custos para Macau

Contas são um mistério

O deputado Au Kam San pretende saber o valor total que Macau terá de suportar face às derrapagens orçamentais com a construção da nova ponte Hong Kong-Zhuhai-Macau. E questiona o silêncio do Executivo sobre o assunto

[dropcap]A[/dropcap] nova ponte que vai ligar Hong Kong, Zhuhai e Macau deverá receber os primeiros veículos ainda este ano, tendo um orçamento superior a cem mil milhões de yuan. Porque o projecto foi sofrendo atrasos e derrapagens orçamentais, com Hong Kong a anunciar, recentemente, que as duas regiões administrativas especiais teriam de investir mais na obra, o deputado Au Kam San questionou o Governo sobre o valor da factura que será suportada pela RAEM.

Numa interpelação escrita, o deputado lembra que o orçamento inicial do projecto estava estimado em 38 mil milhões de yuan, sendo que 15,73 mil milhões seriam nanciados pelas três regiões onde a ponte vai ser construída. Por sua vez, os restantes 20 mil milhões de yuan “seriam pagos através do crédito bancário a ser contraído pelo consórcio do empreendimento”.

“De acordo com essa estrutura de nanciamento, Macau teria de assumir 1,980 mil milhões de yuan. Porém, com a contínua derrapagem orçamental que se tem veri cado nesse empreendimento, qual vai ser, a nal, o montante da des- pesa que Macau vai ter de assumir?”, questiona Au Kam San.

O deputado alerta ainda sobre o silêncio do Governo sobre esta matéria, defendendo que “o público tem vindo a ser iludido e completamente deixado às escuras”.

“Quando o membro do Governo responsável pela tutela desse projecto, Raimundo do Rosário, foi questionado sobre o assunto, apenas respondeu que o ‘Governo tem verba já cabimentada para a ponte sobre o Rio das Pérolas’e, quando questionado sobre se aquele montante seria su ciente, apenas a rmou ‘vamos ver à medida que andamos’, sem acres- centar mais nenhuma informação para o público”, lembra Au Kam San.

E AS LIGAÇÕES?

Para Au Kam San, há também muito para explicar sobre o custo das instalações físicas da ilha arti cial. O projecto é da responsabilidade do Governo local, tendo as obras sido entregues a empresas da China Continental.

Contudo, “não foram revelados por- menores quanto ao montante das despesas relativas a essa parte do empreendimento. Qual é o montante das despesas com essas obras? E quando é que as mesmas vão estar concluídas?”, inquiriu.

“O público tem vindo a ser iludido e completamente deixado às escuras.”

Au Kam San destaca ainda o facto de serem necessárias duas ligações para unir a futura ilha artificial aos novos aterros e também à península, além de serem “indispensáveis as infra-estruturas rodoviárias situadas na zona dos novos aterros, que estão relacionadas com essas duas ligações”.

Também para estes projectos o de- putado deseja saber detalhes. “Quando é que vai ser iniciada a construção dessas três ligações? E quando é que estará concluída? Qual é o orçamento para cada uma das referidas ligações?”, perguntou.

UM MILAGRE

Na interpelação escrita, o deputado de- fende também que “Macau tem passado ao lado da construção da ponte Hong Kong-Zhuhai-Macau”, pois “olhando para o que está a acontecer, até agora nada se mexeu”.
“Segundo o secretário Raimundo do Rosário, Macau vai tomar medidas necessárias para que a ponte seja aberta à circulação automóvel em finais do corrente ano. Mas ninguém acredita que, em dez meses, possa estar concluída a ligação do troço de Macau da ponte sobre o Rio das Pérolas, no qual se inclui o edifício da inspecção alfandegária de Macau.”

O deputado duvida ainda que “estejam prontos os canais aquáticos que estabelecem a ligação da ilha artificial à zona dos novos aterros e a conexão desta área com a península de Macau, bem como as obras de infra-estruturas desses dois canais localizados nos referidos novos aterros”.

Au Kam San questiona mesmo se “vai haver algum milagre” para que todos esses projectos sejam edificados a tempo e horas. Ainda assim, “até ao momento, a maior incógnita continua a ser o encargo da construção do troço de Macau da ponte sobre o Rio das Pérolas, e o montante da derrapagem orçamental e da despesa que Macau vai ter de assumir. E, além disso, ainda o montante das despesas com as infra-estruturas rodoviárias para a ligação entre essa ponte e a península de Macau”, rematou.

4 Mar 2017

Lai Chi Vun | As histórias de uma indústria que morreu

Na pequena povoação de Lai Chi Vun, em Coloane, vivem-se dias de incerteza. Os rumores são muitos e a única certeza é a de que os estaleiros não podem ser deitados abaixo de um momento para o outro. Com a primeira fase da demolição prestes a arrancar, os moradores questionam a ausência de concurso público para esse processo e garantem que, sem os estaleiros, Lai Chi Vun perde a sua alma

[dropcap style=’circle’]P[/dropcap]ara chegarmos ao lugar onde ainda cheira a mar é preciso descer umas escadas e andar no meio de casas construídas com folhas de zinco, onde os mais velhos descansam. Em Lai Chi Vun a história teima em manter-se viva através de velhas estruturas onde, outrora, foram construídas centenas de barcos por ano. Numa altura em que a primeira fase das demolições dos estaleiros de construção naval se prepara para arrancar, o HM foi conhecer as histórias de quem não quer apagar o passado. Há, pelo contrário, uma vontade de reconstruir um novo presente e futuro, com outras soluções.

Para Lei Kam Seng, não resta hoje mais nada para fazer a não ser garantir a segurança dos estaleiros. Vai a casa num instante para mostrar, orgulhoso, a licença, encadernada a vermelho, que obteve para trabalhar na área. Era um adolescente quando começou uma vida de trabalho árduo.

“Tenho 67 anos, mas ainda tenho o meu certificado. Já não se fazem licenças destas”, conta ao HM, enquanto mostra a sua juventude a preto e branco.

O estaleiro onde trabalhou tantos anos é um dos que será demolido pelo Governo, situado logo no inicio da rua. “Há mais de 20 anos que não construo barcos, trabalhei durante 40 nesta indústria. Quando era jovem eram tempos muito bons, agora é mais duro. Estava a trabalhar, toda a minha família estava ligada a este negócio. Éramos quatro filhos e, graças à indústria da construção de barcos, conseguimos aguentar-nos.”

Numa altura em que o jogo não dominava a economia, construir barcos era uma opção para muitas famílias. “Na altura esta era a indústria com melhor desenvolvimento. Quando era aprendiz, quando os barcos chegavam tínhamos de os pintar e reconstruir e pô-los de regresso ao mar. E podíamos fazer também barcos muito grandes. Só havia um casino nessa altura”, recorda Lei Kam Seng.

Na pequena povoação, a agitação do dia-a-dia era muita. “A povoação foi criada para a construção dos barcos de pesca e para trazer os barcos do mar para terra [para reparações]. Cortavam-se grandes pedaços de madeira que depois eram trazidos para aqui. No tempo em que fui patrão havia muita gente a trabalhar aqui, e havia sempre alguém a fazer comida para nós”, contou Lei Kam Seng.

João Pedro Ho, que mora uns metros mais à frente com a sua mulher, nunca construiu barcos mas, durante anos, esteve numa fábrica de materiais e produtos para este tipo de embarcações. Com oito ou nove anos lembra-se de ir com o pai para a vizinha aldeia de Ka-Ho, onde se faziam trabalhos de carpintaria. Desse tempo, só restam memórias.

“Fazia tudo o que era necessário para os barcos. Agora estou reformado. Quando deixou de haver trabalho, reformámo-nos. Antes vivia em Macau. Comecei com 14 anos, até que tudo isto acabou”, disse.

Durante a entrevista com o HM bebemos um chá verde enquanto olhamos para a frágil estrutura que permanece bem ao lado da sua casa. A mulher mostra-nos as cordas que eles próprios colocaram para segurar algumas estacas de madeira. “Há cerca de três ou quatro anos fiz queixa sobre a falta de segurança da estrutura, mas como ninguém se preocupou, decidimos colocar estas cordas como suporte.”

Apesar da insegurança, João Pedro Ho não quer deixar o cantinho de uma vida. A mulher acrescenta de imediato que uma operação recente à perna, feita em Hong Kong, não o vai permitir mudar-se para outro lugar.

“Disseram-nos para sair daqui, porque é perigoso [a demolição], mas se eu me mudar onde vou viver? Na rua? Não vou sair e vou ficar aqui a olhar para o que vão fazer. Vou prestar atenção.”

Demolição por convite

As notícias sobre o futuro da povoação e dos estaleiros chegam a Coloane a conta-gotas. Os jornais e as televisões ajudam a transmitir informações, mas muitos moradores assumem não fazer a mínima ideia do que se está a passar e do que está para vir.

“A povoação foi criada para a construção dos barcos de pesca e para trazer os barcos do mar para terra [para reparações]. Cortavam-se grandes pedaços de madeira que depois eram trazidos para aqui.”
LEI KAM SENG, ANTIGO CONSTRUTOR DE BARCOS

Um dia, João Pedro Ho viu responsáveis de vários departamentos do Governo, como da Direcção dos Serviços de Solos, Obras Públicas e Transportes (DSSOPT) e da Direcção dos Serviços para os Assuntos Marítimos e da Água (DSAMA), a inspeccionarem o estaleiro ao lado da sua casa. Como tinha dúvidas, resolveu intervir.

“A maior parte das pessoas que vieram aqui não nos disse nada. Vinham aqui olhar para os estaleiros, então fui eu lá falar com eles. Não estão a ser transparentes. Naquele dia calhou eu estar aqui na rua e fui directamente falar com eles. Se não estivesse aqui a prestar atenção ninguém sabia o que se estava a passar”, explicou.

Foi aí que João Pedro Ho soube que as demolições serão feitas através de um convite a uma empresa e não por concurso público. “Eles estavam a ver como iriam demolir a estrutura, e aí eu perguntei: ‘Vai haver concurso público?’ Disseram-me que não, que iria ser por convite directo, porque são necessários pelo menos três meses para preparar um concurso público, e os trabalhos têm de ser feitos antes que chegue a época dos tufões. Disseram-me que o processo seria assim para garantir a nossa segurança.”

O HM tentou confirmar esta informação junto da DSAMA, bem como o nome da empresa que irá fazer a demolição, mas o organismo apenas referiu que todas as informações disponíveis constam nos comunicados de imprensa já divulgados, que não fazem nenhuma referência às informações pedidas.

João Pedro Ho tirou fotografias aos rostos, guardou recortes de jornais. As dúvidas são partilhadas pela esposa e pela vizinha, que entretanto se junta à conversa.

“É evidente que alguém vai fazer dinheiro com estas demolições. Se não fosse para fazer dinheiro, porque o fariam? Não há sequer concurso público para isto. Vai ser um construtor privado”, aponta.

Também o antigo construtor de barcos Lei Kam Seng tem as suas queixas, que não são apenas dirigidas ao Governo. “Há muitas pessoas na associação [Associação dos Construtores de Barcos de Macau-Coloane-Taipa], mas esta deveria ser mais activa.”

“A associação nunca falou connosco. Nunca foi feita uma consulta pública, nunca falaram com quem mora aqui. Não sabemos absolutamente nada. Vivemos aqui e continuamos a não saber nada”, acrescenta Lei Kam Seng.

Nos diversos comunicados emitidos, a DSAMA afirma que muitos dos estaleiros não foram mantidos pelos próprios construtores dos barcos, declaração rejeitada por Lei Kam Seng. “Isso não é verdade. Deveriam deixar as pessoas investir e dar diferentes utilizações aos espaços. Se o Governo permitisse às pessoas investirem, então as pessoas iriam fazê-lo.”

Este antigo construtor afirma que muitos dos que têm falado à comunicação social sobre este assunto já não fazem parte das primeiras gerações de construtores navais e que, por isso, não percebem a essência de Lai Chi Vun.

“Só há uma ou outra pessoa que originalmente fez parte desta indústria, mas todos os outros são só empresários que não compreendem este lugar.”

A China ganhou barcos

Para João Pedro Ho, não foi só o jogo que arrastou consigo todas as outras indústrias. Os estaleiros localizados em Zhuhai, China, começaram a fabricar mais barato e com menos burocracias.

“É uma pena que tudo isto tenha acabado. A partir de uma certa altura a China continuou com a sua indústria de construção de barcos. Não havia trabalho aqui, então muitos foram para a China para continuarem a sua carreira. Além de ser mais barato construir lá, o Governo de Macau manteve uma série de procedimentos que dificultavam a vinda dos barcos para aqui. Deixaram de aparecer, então não havia mais nada para fazer.”

“Queria trazer os estudantes aqui para tirarem fotos e preservarem esta memória. Porque depois já não haverá nada, serão apenas terrenos.”
KOU, PROFESSOR DE HISTÓRIA

João Pedro Ho sabe que, actualmente, há pelo menos um estaleiro em Zhuhai onde ainda se constroem juncos de madeira. “Continuam a construir barcos em Zhuhai e há uma lista de espera. O Governo de Macau não ajuda nesse aspecto e também começou a aparecer muita sujidade no rio, muita areia. Antes o Governo não deu apoio, e antes de tantas mudanças ao nível dos solos, com as obras, era fácil mover os barcos aqui nesta zona.”

O HM chegou a contactar uma das fábricas de construção de barcos na cidade chinesa, mas a promessa de retorno do contacto, com mais detalhes sobre a construção naval do lado de lá da fronteira, não chegou a concretizar-se.

Por estes dias muitos têm aproveitado para visitar o local para verem de perto algo que, em breve, já não deverá existir. Foi o caso de um professor de História, de apelido Kou, que levou a sua turma a conhecer o lugar onde um dia se construíram barcos de madeira.

“Este é um sítio com história e os estaleiros vão ser demolidos, então decidi vir aqui com os meus alunos”, contou ao HM, enquanto segurava um mapa que ele próprio fez da zona. “Queria trazer os estudantes aqui para tirarem fotos e preservarem esta memória. Porque depois já não haverá nada, serão apenas terrenos.”

Kou é mais uma voz que está contra a decisão da Administração. “Gostava que os estaleiros fossem preservados para as próximas gerações. O Governo desenvolveu Macau e a Taipa, então poderia garantir a preservação de Coloane para as próximas gerações, mantendo um espaço verde.”

João Pedro Ho não tem dúvidas. “Estas coisas devem ser mostradas às pessoas”. “A indústria de construção naval em Macau tem uma longa história, e se tudo for demolido vão destruir tudo e já não haverá mais nada”, frisa.

O HM quis confirmar com a DSAMA a data certa para o arranque das primeiras demolições mas, até ao fecho desta edição, não foi obtida uma resposta. O porta-voz dos moradores de Lai Chi Vun, David Marques, acredita que os trabalhos poderão começar entre hoje ou amanhã, mas ontem à noite nenhum sinal de demolição pairava sobre a povoação.

Lai Chi Vun | A história e as razões do fim da indústria

Muito antes de haver jogo e ópio, houve juncos de madeira e um intenso comércio de pescas interno e além-mar. Houve cordoarias que chegaram até à Almeida Ribeiro. Hoje só resta o estaleiro de Lai Chi Vun para contar um pedaço da história da indústria naval em Macau, mas tudo começou há vários séculos. Para o investigador Luís Sá Cunha, a construção naval e as pescas constituíram um ponto fulcral da sociedade e da economia do território.

“O jogo não faz parte do genoma de Macau, só a partir de certa altura. Em 2005 li uma notícia no jornal de que o último barco a ser construído nos estaleiros tinha sido lançado ao mar. Isso foi há pouco tempo! No final dos anos 90 estava tudo a funcionar”, contou ao HM.

Para o investigador, o aparecimento dos casinos está longe de ser a única razão a apontar para o fim da indústria. “Não se conseguiram adaptar às inovações tecnológicas, e aí a culpa foi dos estaleiros. Porque toda a tradição chinesa vive de memória e de tradição de pai para filho, ou de mestre para discípulo. Todas as técnicas e sabedoria eram baseadas na madeira.”

“Não estão a ser transparentes. Naquele dia calhou eu estar aqui na rua e fui directamente falar com eles. Se não estivesse aqui a prestar atenção ninguém sabia o que se estava a passar.”
JOÃO PEDRO HO, MORADOR

Luís Sá Cunha explica também que “a construção naval não tinha planos, era feita com uma grande improvisação”. “Poucos estaleiros conseguiram fazer a implementação dos motores nos barcos. Faziam tudo aqui e os motores eram montados em Hong Kong. Muitos estaleiros na Taipa e Coloane começaram a viver das reparações.”

Depois de um período áureo da indústria, a partir dos finais da década de 90 tudo começa a acabar. Nessa altura havia 19 estaleiros em Macau que faziam 94 barcos por ano, sendo que nas ilhas existiam 16 estaleiros [os que ainda persistem], que faziam 150 barcos por ano. “Um número notável”, considera Luís Sá Cunha.

Além do “conservadorismo” das técnicas, na zona de Lai Chi Vun começou a existir uma grande distância entre a terra e a água, o que dificultou o transporte e recolha de barcos.

Mas o fim do comércio ultramarino também trouxe a crise a Lai Chi Vun. “A partir de certa altura, depois da II Guerra, houve a cessação da emigração chinesa, e já não havia exportações para os chineses ultramarinos. Houve a concorrência do comércio de Cantão. O comércio de Hong Kong, a seguir à II Guerra Mundial, teve uma emergência enorme, e começaram também eles a fabricar barcos, mais modernos.”

Houve depois uma mudança da indústria para Zhuhai. “Os preços começaram a aumentar nesta zona e por isso é que foram todos para lá.”


Uma construção “misteriosa”

Os primeiros estaleiros começaram por aparecer na península e não nas ilhas, e já no século XVIII os mapas faziam essa referência. Os chamados “mandarins”, olheiros da China, chegaram a decretar que não se podia fazer barcos para estrangeiros. Ainda assim, “havia estaleiros que os mandarins não viam”.

Por essa razão, Luís Sá Cunha defende que a “construção naval em Macau é um bocado misteriosa”. “Não houve durante a história muitos registos escritos sobre isso, mas também havia uma certa clandestinidade dos estaleiros. Estes sempre tiveram um estatuto e uma consciência de grande autonomia.”

Isso acontecia pelo facto de os construtores navais dominarem uma técnica que, à época, era bastante desenvolvida. “Eram importantes, mas muitos dos serviços eram clandestinos.”

A partir da década 60 do século XIX os estaleiros começam a desaparecer da península e a ir para as ilhas, devido aos planos de urbanização do governador Ferreira do Amaral. “Criou-se uma zona de epidemias, porque as aldeias não tinham qualquer higiene, as casas eram improvisadas, e as pessoas viviam em barcos que estavam sempre encostados uns aos outros. Albergava também ilegais e piratas, porque a polícia não ia lá. [Até que] entraram em vigor as novas políticas de urbanização de Macau, a partir dos anos 60 do século XIX até ao final do século.”

Permaneceram as estâncias de madeira e alguns estaleiros na península, e quando Ferreira do Amaral mandou construir uma fortaleza e levar a polícia para Coloane, “os estaleiros começam a ser desviados” para as ilhas.

Anos 30, época dourada

Luís Sá Cunha não consegue apontar uma data concreta sobre o arranque da indústria de Lai Chi Vun, que já tinha alguns habitantes e piratas. Na década de 30 do século XX, começa a “época áurea” da indústria. “Dá-se um grande surto da construção naval em Taipa e Coloane, e um desenvolvimento da principal indústria extractiva de Macau, que era a pesca.”

As emigrações dos chineses para países como a Austrália ou Estados Unidos dinamizaram o comércio e as exportações. “O peixe fresco não era o produto mais procurado, mas sim o peixe seco e as conservas.”

Em 1937, “dá-se algo ainda mais importante, que dá mais força a Taipa e Coloane: passam a fazer-se ligações diárias de barcos a motor a óleo, e instala-se o telefone”. É então que, segundo o investigador, as ilhas se tornam ponto atractivo de turismo para as famílias de Macau.

Nos anos 60, a península voltou a ter estaleiros junto à zona do Patane, “com melhores condições”, tendo chegado a existir um total de 40, fora dez cordoarias que se espalhavam pelas ruas.

Preservar é preciso

Para Luís Sá Cunha, a preservação dos estaleiros é importante para lembrar que, um dia, Macau teve uma vida socioeconómica intimamente ligada ao mar, que se traduz até pela toponímia das ruas. O investigador defende que poderia “haver um estaleiro a construir miniaturas que as pessoas poderiam comprar”.

“E porque não estar lá a construir um barco, um junco pequeno, para andar nas águas com os turistas? Havia a necessidade de juntar isto tudo, a toponímia, fazer um percurso marítimo, um itinerário, com todos estes elementos e explicações”, conclui.

1 Mar 2017

Construção | Governo ainda não publicou legislação sobre seguro

A deputada Kwan Tsui Hang alerta para a ausência de regulação do seguro, no âmbito do regime de qualificações nos domínios da construção urbana e do urbanismo, que entrou em vigor em 2015. O seguro é necessário para a inscrição e a renovação de licenças
Kwan Tsui Hang

[dropcap]O[/dropcap] Governo ainda não implementou o regulamento administrativo relativo ao seguro de responsabilidade civil no âmbito do regime de qualificações nos domínios da construção urbana e do urbanismo. O aviso é feito pela deputada Kwan Tsui Hang, numa interpelação escrita entregue ao Governo.

“O regime das qualificações nos domínios da construção urbana e do urbanismo entrou em vigor em 2015 mas, até agora, ainda não foi publicado o seu respectivo regulamento administrativo complementar que regula a matéria do seguro, e já passou mais de um ano.”

A deputada pretende, portanto, saber qual o calendário do Governo sobre esta matéria. “Quando é que o regulamento administrativo complementar respeitante à parte do seguro de responsabilidade civil do regime vai ser publicado?”, questiona.

A lei em questão abrange o registo e acreditação para a obtenção de licenças profissionais por parte de engenheiros, arquitectos, urbanistas ou arquitectos paisagistas, bem como da sua qualificação para a assinatura de projectos.

Por forma a aceitar novas inscrições ou a sua renovação, a Direcção dos Serviços de Solos, Obras Públicas e Transportes esclarece no seu website que “os requerentes devem possuir um seguro de responsabilidade civil válido e eficaz, que cubra os eventuais danos resultantes do exercício das funções de elaboração de projectos, direcção ou fiscalização de obras, nos termos a definir por regulamento administrativo complementar”. Tal seguro está, portanto, dependente da criação do diploma.

O regime determina ainda que “empresários comerciais e pessoas singulares que possuam ao seu serviço, pelo menos, um técnico inscrito”, devem ter este seguro por forma a garantirem a sua inscrição na DSSOPT.

À pressa

Quando é implementada uma nova lei, podem existir algumas matérias que são reguladas por regulamentos administrativos complementares. A deputada Kwan Tsui Hang, ligada à Federação das Associações dos Operários de Macau (FAOM), defende que os prazos não estão a ser cumpridos. Além do exemplo do seguro no âmbito do regime de acreditação dos profissionais de construção civil, há mais casos.

“O Governo não está a enfrentar a questão a sério.”
Kwan Tsui Hang, deputada

Falando do regime do erro médico, que entra em vigor no próximo dia 26, mas cujos regulamentos administrativos relativos ao seguro, comissão de perícia e comissão de mediação entraram em vigor esta semana, a deputada recorda que “não é a primeira vez que um regulamento administrativo complementar é publicado, à pressa, antes da entrada em vigor da respectiva lei”. Houve mesmo “situações em que o diploma complementar só foi publicado após a entrada em vigor da respectiva lei”.

No caso da lei da segurança alimentar, implementada em Outubro de 2013, “apenas se publicou, antes da sua entrada em vigor, o regulamento administrativo sobre os limites máximos dos resíduos de medicamentos veterinários nos alimentos, e os outros critérios relacionados com a segurança alimentar só foram publicados em 2014 e 2016”.

As falhas de coordenação

Para Kwan Tsui Hang, é evidente que “não se consegue que sejam publicados ao mesmo tempo, ou até antes, da entrada em vigor da respectiva lei”, sendo que “o Governo não está a enfrentar a questão a sério”.

Em termos práticos, “isto não só afecta a aplicação da respectiva lei, mas também os sujeitos que lhe estão relacionados”. “Mais: isso demonstra que há falhas no mecanismo de coordenação na estipulação das leis”, acrescenta.

A deputada da FAOM pretende saber se o Executivo “tem em conta todo o plano e os passos de coordenação da redacção de uma lei e dos seus respectivos diplomas complementares”.

Kwan Tsui Hang deseja ainda saber se existe responsabilização em caso de atrasos. “Como é que o Governo coordena a estipulação dos diplomas dos serviços públicos e quais os prazos para a sua finalização? Exige-se alguma responsabilização nesta matéria, quando isso não é cumprido?”, questiona.


Ausência de seguro “põe Governo numa grande fragilidade”

O arquitecto Rui Leão, também membro do Conselho do Planeamento Urbanístico, considera ao HM que a ausência da legislação sobre o seguro de responsabilidade civil acarreta uma série de consequências, desde logo porque “cria vários problemas ao nível da responsabilidade e acautelamento dos profissionais”. Além disso, “põe o Governo numa situação de grande fragilidade, através das obras públicas, mas também os donos das obras privadas”. “Também acaba por criar fragilidades ao nível contratual”, acrescenta.
Rui Leão assume que só fez o seu seguro quando trabalhou para empresas internacionais no território. “Na quase totalidade não existem seguros [no sector]. As empresas de Macau não fazem seguros profissionais, talvez porque não haja um enquadramento que as proteja. Aí é um risco com um cálculo complicado. Tem de haver uma obrigatoriedade, uma vez que haja a regulação, para as empresas permitirem que os profissionais possam ter esses pacotes de seguro. Acho que [os profissionais] não deveriam poder escolher se fazem ou não, se operam em Macau têm de ter [o seguro]”, conclui.

24 Fev 2017

Centro UNESCO | Um edifício “interessante” com pouca utilização

 

Criado em 1998, ainda durante a Administração portuguesa, o Centro da UNESCO de Macau pretendia ser um espaço de promoção do património e da cultura. Hoje, sob gestão da Fundação Macau, acolhe apenas exposições esporádicas. As informações online e a promoção são escassas. Muitos gostariam de ver um melhor aproveitamento do espaço

[dropcap style≠’circle’]É[/dropcap] no meio de uma avenida barulhenta e caótica que está edificado o Centro da UNESCO em Macau. Criado em 1998, ainda durante o Governo de Vasco Rocha Vieira, o centro passa hoje despercebido aos olhares de muitos, sendo escassas as informações sobre as actividades que desenvolve. Três nomes ligados ao meio cultural consideram que está a fazer-se pouco por este espaço.

Segundo o website da Fundação Macau (FM), entidade que actualmente gere o Centro da UNESCO, realizaram-se no ano passado várias exposições de arte. A última, com o nome “Dez Anos de Artes Visuais”, data de Junho e foi organizada pela Associação de Artes Visuais de Macau. Em Março do mesmo ano, decorreu a exposição “Uma Centena de Pinturas de Choi Weng Chi sobre o tema da águia”, promovida pela Associação de Pintura e Caligrafia de Terceira Idade de Macau”. Em Outubro, o mesmo espaço foi ainda palco de duas sessões de demonstração realizadas pelo Ballet Nacional da China para estudantes de duas escolas.

O historiador Fernando Sales Lopes, que já vivia em Macau à época da inauguração do edifício, afirma ao HM que o espaço nunca foi muito divulgado junto do público.

“Foi um projecto implementado nos últimos anos da Administração portuguesa, mas nunca teve grande utilidade. Houve algumas exposições, mas nunca houve grande actividade. Depois da transferência, aquilo tem estado um pouco parado e até pensei que estivesse fechado”, diz.

Para o historiador, “Macau tem tão pouco espaço que todos os outros espaços fazem falta”. “Realmente, há muitos anos que não conheço qualquer actividade daquele espaço. O centro poderia ser útil para qualquer outra coisa. Qualquer espaço que não esteja a ser utilizado aqui em Macau é uma pena, porque não temos locais suficientes”, aponta.

O arquitecto Francisco Vizeu Pinheiro, por sua vez, defende que “houve uma mudança de gestão e realmente poderiam fazer mais”, por existirem “poucos espaços para o público”.

Para Vizeu Pinheiro, o facto de o local ter UNESCO no nome pressupõe a realização de actividades relacionadas com o património, algo que não tem vindo a acontecer. “Nesse aspecto, deveria ter mais coisas relacionadas com a UNESCO. Deveria ter uma biblioteca com materiais dessa entidade, como esteve a funcionar há mais de 15 anos.”

“As pessoas passam por ali e pensam que está abandonado, e talvez nem seja o melhor local para uma entidade como esta, porque há poucas escolas e mais hotéis e escritórios”, frisou o arquitecto.

De acordo com o website do centro, a galeria de exposições só foi inaugurada em 2012, sendo que, a partir de 1998, o objectivo do espaço seria “promover actividades com vista a concretizar os fins fixados no Acto Constitutivo da UNESCO e da FM”.

Exposições para que te quero

Uma visita ao website do Centro da UNESCO, que data dos anos 90, pode verificar-se que um dos objectivos é, exactamente, a preservação e promoção do património.

O espaço no NAPE tem como função “promover debates, colóquios, seminários, conferências sobre temas da UNESCO ou afins”, bem como a responsabilidade de “colaborar ou cooperar com as instituições locais, regionais e internacionais, especialmente na área da juventude, nas acções e realizações que têm ligação com os objectivos da UNESCO”.

Cabe ao local gerido pela FM o fomento do “estudo e conservação dos valores e tradições locais, do folclore, lendas e costumes”, bem como “promover o ensino para a preservação do património cultural e natural, bem como campanhas para a protecção e restauro da herança cultural dos antepassados”.

Deve ainda “distribuir as publicações e a documentação da UNESCO, a título gratuito ou venal, em conformidade com o acordo estabelecido entre a Fundação e os competentes serviços da organização”.

Mas o Centro da UNESCO em Macau deve também ter um papel ambiental, ao nível do apoio a “estudos sobre a biosfera, poluição e conservação da natureza”.

Segundo a resposta da Fundação Macau ao HM, o trabalho tem incidido sobretudo ao nível do acolhimento de exposições. “Todos os anos a FM, através da sua subunidade de apoio técnico Centro UNESCO de Macau, organiza e co-organiza diversas exposições, apresentações artísticas e concursos.”

A FM refere ainda que “o edifício tem uma sala de exposições e uma sala multifuncional, as quais são aproveitadas tanto pela própria FM, como pelas associações autorizadas para apresentar diversos tipos de trabalhos artísticos e efectuar intercâmbios, criando também condições para os cidadãos ficarem a conhecer e participar em acções artísticas e culturais”.

Confirmando que não existe, para já, nenhum projecto especial em termos de actividades ou de renovação do próprio edifício, a FM afirma ainda que “tem vindo a conceder subsídios às associações e organizações civis, tais como a Macau Documentation and Information Society”. Tal apoio financeiro serviu para “promover a inscrição dos elementos culturais e históricos únicos de Macau no Registo da Memória do Mundo para a Ásia-Pacífico”.

Como bastidores

Na opinião de André Ritchie, arquitecto, o espaço é pouco conhecido e divulgado, lamentando o facto, até porque o projecto arquitectónico em questão é “interessante”.

“Concordo que não está a ser bem aproveitado neste momento. Mas acho que, para mim, é um edifício muito interessante do ponto de vista arquitectónico. Antes da transição houve ali alguns eventos, era um espaço agradável e uma peça de arquitectura interessante.”

O antigo coordenador do Gabinete de Infra-estruturas de Transportes (GIT) lamenta ainda que o Centro da UNESCO em Macau não esteja a receber a devida manutenção. “Custa-me ver o edifício a não ser tratado como deve ser. Mas este comentário é aplicável a muitas peças de arquitectura que existem em Macau, com valor, que ao nível da manutenção não são cuidadas como deveriam”, defende. “Não falo apenas na manutenção física, pois ao fim de alguns anos os edifícios aparentam algum desgaste, falo também do respeito pelos espaços. Quando passo pelo Centro da UNESCO vejo ali os contentores do lixo mesmo à entrada principal. Isso é uma certa falta de consideração.”

O arquitecto dá outro exemplo de “um edifício que é tratado com os pés”: o Centro de Ciência de Macau. “Tudo parece que é tratado como se estivéssemos nas traseiras dos edifícios”, observa.

Apesar de estarmos perante um espaço que visa promover e debater cultura, o secretário para os Assuntos Sociais e Cultura, Alexis Tam, não quis falar sobre a utilização do Centro da UNESCO de Macau pelo facto de ser gerido pela FM, que está sob alçada do Chefe do Executivo.

O HM tentou ainda chegar à fala com Jorge Rangel que, em 1998, era secretário-adjunto para a Administração, Educação e Juventude, cargo que ocupou entre 1991 e 1999, mas até ao fecho desta edição não foi possível estabelecer contacto.

23 Fev 2017

Higiene | Exigidas sanções para donos de terrenos desocupados

[dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] deputado Ho Ion Sang considera que o Governo deve proceder a uma alteração da estrutura orgânica dos Serviços de Saúde (SS), para que possam ser aplicadas sanções a quem possui terrenos e não leve a cabo a limpeza dos espaços.

“Os serviços administrativos têm a responsabilidade de tratar das questões de salubridade ambiental; e em relação à salubridade ambiental dos terrenos de propriedade privada, segundo o decreto-lei 81/99/M, são atribuições dos SS a defesa da saúde e a prevenção da doença, com o dever de desenvolver os respectivos trabalhos”, assinala o deputado. “Vai o Governo aperfeiçoar o decreto-lei, aditando normas sancionatórias, em prol do impulsionamento dos proprietários dos terrenos para que cumpram as devidas responsabilidades?”, questionou o deputado ligado à União Geral das Associações dos Moradores de Macau (UGAMM, ou Kaifong).

Citando um estudo levado a cabo pelos Kaifong, sobre os terrenos desocupados, Ho Ion Sang referiu que “a situação de higiene” desses espaços “encontra-se em situação grave”. Tal “demonstra que o Governo não conseguiu desempenhar os devidos efeitos da fiscalização, mesmo quando tem essa competência”.

Ho Ion Sang lembrou que uma das conclusões do estudo aponta para a existência de 293 terrenos, ou seja, 75,1 por cento, que estão “desocupados com problemas de higiene ambiental, devido a resíduos sólidos, ervas daninhas, estacionamento de viaturas e lixo”.

Além disso, o deputado pretende saber quais são as medidas para potenciar o desenvolvimento dos terrenos junto dos concessionários. “Que medidas dispõe o Governo para fazer com que o proprietário acelere o aproveitamento dos terrenos? Relativamente a alguns terrenos de propriedade privada com maior dimensão, que reúnem condições para serem desenvolvidos e não têm planos de desenvolvimento, o Governo deve negociar com os respectivos proprietários e liderar os trabalhos, dando prioridade ao desenvolvimento daqueles terrenos em projectos de instalações sociais. Vai fazê-lo?”, questionou.

22 Fev 2017

AL | Chui Sai Peng disponível para continuar como deputado

 

O deputado Chui Sai Peng afirma querer continuar na Assembleia Legislativa, caso o sector empresarial pelo qual é eleito assim o entenda. O também engenheiro civil espera que Macau se possa transformar numa plataforma de startups

[dropcap style=’circle’]P[/dropcap]or vontade de José Chui Sai Peng, deputado eleito pela via indirecta, pouco ou nada vai mudar nas próximas eleições legislativas. À margem da segunda edição do Fórum de Inovação Colaborativa dos Dois Lados do Estreito, Hong Kong e Macau, o também engenheiro civil afirmou ter toda a disponibilidade para continuar no hemiciclo.
“Sou eleito pelo sector empresarial e, se este achar que ainda sou útil na Assembleia Legislativa (AL), então estarei ao seu serviço”, apontou o deputado que, antes da actual legislatura, foi deputado nomeado pelo Chefe do Executivo.
Convidado a fazer um balanço sobre o trabalho do hemiciclo, Chui Sai Peng afirmou que a Assembleia está “sempre a tentar servir os cidadãos”. “Temos muitas questões em discussão, esperamos que possamos reagir a tempo e aprovar as leis que sejam úteis”. “Toda a Assembleia está a trabalhar arduamente para criar uma atmosfera na qual Macau possa ser um bom lugar, governado com base na lei e em prol dos cidadãos”, disse ainda.

Uma hub que diversifica

Para Chui Sai Peng, o território poderia transformar-se numa hub de empresas ligadas ao ramo da tecnologia, conhecidas como startups, as quais estabeleceriam laços de cooperação com países e regiões vizinhas, sem esquecer Portugal. O deputado deu mesmo o exemplo da Fábrica das Startups, estabelecida em Lisboa.
“O Governo já tem alguns planos para as startups, mas é preciso mais financiamento. Mais do que conceder um espaço [aos empresários] é importante providenciar conselhos e sugestões na área do marketing e gestão, por exemplo, criar uma rede de negócios. Investidores e pessoas inovadoras podem juntar-se e criar algo em conjunto.”
Para o deputado, a realização do fórum visa que jovens empresários e investidores possam criar algo em conjunto, em prol de uma economia diversificada. “Temos de encorajar mais acções de intercâmbio e eventos, e também investigação a nível internacional, para que Macau possa ter uma maior diversificação para além do jogo, com a introdução deste novo elemento que é a ciência e a tecnologia.”
“Temos 12 projectos de Hong Kong, Taiwan, Macau e China, que estão em competição. Os vencedores, e até mesmo os perdedores, têm a oportunidade de mostrar o seu trabalho a empresas e a entidades que dão apoio financeiro. Os mais jovens podem obter mais fundos, porque é impossível pedir ao Governo que apoie tudo, porque não é algo comercial”, acrescentou Chui Sai Peng.
O deputado participou ontem no fórum sobre tecnologia e inovação enquanto presidente da direcção da Associação Promotora das Ciências e Tecnologias de Macau, que coordenou o evento em conjunto com o Governo e a Associação de Ciências e Tecnologia da China.
Na cerimónia de abertura, realizada no Centro de Ciência de Macau, participaram diversas figuras do meio político local, tal como o secretário para a Economia e Finanças, Lionel Leong, e Ho Iat Seng, presidente da AL. Deputados como Chan Iek Lap, Dominic Sio e Lam Heong Sang, vice-presidente do hemiciclo, estiveram também presentes.

Lionel Leong defende aposta na inovação

No discurso de abertura do Fórum de Inovação Colaborativa, o secretário para a Economia e Finanças falou da necessidade de apostar na inovação. “O Governo da RAEM defende vigorosamente que é necessário persistir na inovação e ter na mira uma inovação perfeita, para que ela assuma um papel preponderante no processo de desenvolvimento económico e social.” Além disso, Lionel Leong referiu que o Governo “atribui também grande importância à promoção da educação científica abrangente, insistindo na formação de recursos humanos como pilar da inovação”.

22 Fev 2017

“O Santos, loja portuguesa” | Dos enlatados ao galo de Barcelos

Um dos mais famosos restaurantes portugueses na vila da Taipa emprestou o nome, e apenas isso, ao espaço “O Santos, loja portuguesa”. O projecto de Joana Fonseca e da Vino Veritas quis concentrar num só local tudo o que Portugal tem para oferecer de bom

[dropcap style≠’circle’]N[/dropcap]um cantinho da vila da Taipa, todas as regiões de Portugal estão concentradas numa só. O projecto “O Santos, loja portuguesa” permite-nos ir de Norte a Sul e descobrir as iguarias, os vinhos e as lembranças vindos do outro lado do mundo.

Joana Fonseca é uma das proprietárias, ao lado da empresa de importação Vino Veritas, e conta que o uso do nome do restaurante “O Santos” se deveu à longa amizade que mantém com Santos Pinto, o proprietário da tasca alentejana.

“O restaurante e a loja são negócios diferentes e independentes. A loja adoptou o nome “O Santos” porque já é um nome estabelecido na vila da Taipa, então decidimos procurar o Santos e ver se nos emprestava o nome. Temos uma relação especial com ele e, estando aqui na vila da Taipa, achámos que seria o nome mais correcto”, explicou Joana Fonseca ao HM.

A loja, aberta recentemente ao público, pretende ter uma mostra diversificada do que é genuinamente português. “Temos souvenirs, como o galo de Barcelos, as imagens da Nossa Senhora de Fátima. Temos também um andar só dedicado a vinhos, onde as pessoas podem ter um atendimento personalizado.”

A ideia inicial para o arranque do projecto foi o facto de os produtos portugueses existirem em toda a parte, mas estarem dispersos em lojas e restaurantes. “Muitas vezes, as pessoas procuram produtos portugueses na vila da Taipa e o que acaba por acontecer é que está tudo muito espalhado. As pessoas não têm noção da gama de variedade de produtos que existem. Achámos então que seria boa ideia concentrar tudo no mesmo sítio e seria uma boa maneira de promover produtos portugueses em Macau.”

Olaria e bordados

Joana Fonseca frisa que há mais ideias para dinamizar a oferta de produtos. “Ainda estamos à procura de fornecedores e de produtos diferentes que ainda não existam em Macau. No futuro, vamos ter um terceiro andar que será dedicado apenas a artesanato e produtos portugueses ao nível dos bordados, cerâmicas, olaria. Coisas que sejam artesanato português e que representem as diferentes regiões em Portugal”, adianta.

“Neste momento estamos ainda a fazer um estudo de mercado e a tentar perceber o que as pessoas procuram em Macau. Temos outras ideias nas quais estamos a trabalhar, para trazer, por exemplo, biscoitos tradicionais e mel. Há uma gama de produtos que queremos ter aqui”, explicou uma das mentoras do projecto.

O sucesso das conservas

Além dos habituais vinhos e queijos, as conservas de peixe têm feito sucesso no mercado chinês, sendo bastante procuradas por turistas. Na loja “O Santos” essa procura também se faz notar. “Uma das coisas que vendemos melhor são as conservas portuguesas”, refere Joana Fonseca.

Ainda assim, “temos vendido um pouco de tudo”, adianta a empresária. “Quem tem mais interesse nos produtos são pessoas de Hong Kong e Macau, mas também temos pessoas da China e do Japão à procura de vinhos. O turista vai directamente ao galo de Barcelos ou às conservas e é mais nisso que temos apostado e também vendido.”

Com presença apenas na vila da Taipa, o objectivo é que, no futuro, a península também possa ter a sua loja de produtos portugueses. “Neste momento vamos ver como corre a experiência na vila da Taipa, e qual a receptividade das pessoas em Macau e dos turistas. Mais tarde a extensão a Macau poderá ser uma possibilidade”, afirma Joana Fonseca, que garante que não é objectivo vender produtos da gastronomia macaense, apesar da ligação que existe a Portugal.

“O objectivo da loja é mesmo concentrar-se em Portugal e nos produtos que o país tem para oferecer, além de o promover através dos seus produtos. Não há tanto a ideia de estabelecer uma ligação com os produtos macaenses”, remata.

22 Fev 2017

Erro médico | Juristas apontam falhas na mediação e seguros

O Centro de Mediação de Litígios Médicos entrou ontem em vigor. Um jurista aponta que a legislação está do lado das seguradoras, em vez de proteger os prestadores de cuidados de saúde, indo contra o princípio da mediação. Há também quem critique os baixos valores do seguro obrigatório

[dropcap style≠’circle’]F[/dropcap]oi ontem publicado em Boletim Oficial (BO) o despacho que determina a criação do Centro de Mediação de Litígios Médicos, no âmbito do Regime do Erro Médico, implementado no ano passado. Contudo, um jurista ouvido pelo HM considera que a forma como esta entidade foi legislada não protege os prestadores de cuidados de saúde, sejam médicos, hospitais ou clínicas, indo contra o próprio espírito da mediação presente no direito.

Para o jurista, que não quis ser identificado, o Centro de Mediação de Litígios deveria estar abrangido no mesmo regulamento administrativo sobre o seguro de responsabilidade civil obrigatório. Desta forma, o diploma que institui o centro de mediação determina que “o prestador de cuidados de saúde que adere ao procedimento de mediação deve notificar o acto à sua seguradora, cuja participação no mesmo, conjuntamente com o segurado, é obrigatória”.

Para a mesma fonte, se a seguradora é obrigada a participar no processo de mediação, “é desvirtuado o conceito de liberdade de ambas as partes e, na prática, quem está na mediação é a seguradora e não o médico. A companhia de seguros vai sempre tentar garantir uma indemnização mais baixa”, explicou.

O mesmo jurista afirma ainda que há um elevado número de responsabilidades dos prestadores de cuidados de saúde que ficam de fora do regime do seguro. “É um regime tão restritivo que a maior parte dos danos ficam de fora”, defendeu.

O HM sabe também que a forma como foi feita a legislação se deveu a pressões colocadas pelas companhias de seguro junto da Autoridade Monetária e Cambial de Macau (AMCM). Até ao fecho desta edição, não foi possível obter uma reacção junto da AMCM.

Baixos valores

Outro jurista, que também não quis ser identificado, considera que a forma como a mediação destes casos foi legislada não vai contra os direitos dos prestadores de cuidados de saúde, defendendo, no entanto, que os valores do seguro são demasiado baixos.

Diz o regulamento administrativo que um médico de medicina tradicional chinesa, um farmacêutico ou um técnico de farmácia devem ter um seguro de 500 mil patacas, enquanto médicos e médicos dentistas devem ter um no valor de um milhão de patacas. Um médico que realize cirurgias deve estar abrangido por um seguro de, no mínimo, dois milhões. Já o seguro de pessoas colectivas, como clínicas ou hospitais, poderá atingir as 20 milhões de patacas.

“Os montantes mínimos obrigatórios são muito baixos”, defendeu este jurista ao HM. “Caso ocorra o dano de morte ou invalidez permanente parece-me um valor muito baixo, tendo em atenção o rendimento médio potencial dos utentes e a esperança de vida útil. São valores baixos para o potencial dano que o médico pode causar.”

“Se for um idoso em fim de vida, dois milhões de patacas chega. Mas imagine um juiz aposentado que tenha 70 anos e que ainda tem uma esperança média de vida considerável, ou mesmo uma pessoa em início de carreira. Parece-me muito pouco. Mas, comparando com o que temos agora, é um princípio”, acrescentou ainda o mesmo jurista.

Ontem foi também publicada em BO a criação da Comissão de Perícia do Erro Médico, que determina que um pedido de perícia vai custar quatro mil patacas.

21 Fev 2017

Obras do edifício do Fórum Macau arrancam este ano

[dropcap style≠’circle’]A[/dropcap] Direcção dos Serviços de Solos, Obras Públicas e Transportes (DSSOPT) admitiu nove das 12 propostas que recebeu para a “empreitada de concepção e construção do Complexo de Serviços para a Cooperação Comercial entre a China e os Países de Língua Portuguesa”, mais conhecido como edifício do Fórum Macau.

O projecto será edificado na zona do Lago Nam Van e a construção “poderá ter início no segundo semestre do corrente ano”. Prevê-se que a obra demore cerca de um ano e meio a ser realizada, segundo as previsões da DSSOPT.

De fora ficaram três propostas, que não foram aceites porque “não cumpriam as disposições definidas no programa do concurso e nos esclarecimentos prestados por escrito aos concorrentes”, aponta um comunicado.

O edifício irá albergar o Centro de Exposição dos Produtos dos Países de Língua Portuguesa, o Centro de Serviço das Empresas da China e dos Países de Língua Portuguesa, o Centro de Informações, o Pavilhão de Exposições sobre as Relações Económicas e Comerciais entre a China e os Países de Língua Portuguesa e as Respectivas Culturas, o Centro de Formação entre a China e os Países de Língua Portuguesa, bem como o Pavilhão de Exposição sobre o Desenvolvimento Urbanístico de Macau.

O concurso público para a entrega de propostas esteve envolto em polémica, uma vez que vários arquitectos relataram ao HM que a tradução para português das cláusulas técnicas chegou com um mês de atraso. Além disso, houve diversas alterações ao projecto a meio do processo.

Olhando para a lista de concorrentes disponibilizadas pela DSSOPT, conclui-se que nenhuma empresa portuguesa participou no concurso público, que previa candidaturas em regime de consórcio.

21 Fev 2017

Construção civil | Maioria dos cursos de formação são em chinês

Não há cursos de formação suficientes em português ou inglês para arquitectos, engenheiros ou urbanistas, apesar de ser obrigatória a sua frequência para a renovação das licenças profissionais. Arquitectos falam de uma situação “lamentável”, que pode afastar muitos do mercado de trabalho

[dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] novo regime de acreditação de arquitectos, engenheiros e urbanistas, implementado em 2015, passou a obrigar estes profissionais a frequentarem cursos de formação por forma a conseguirem renovar as suas licenças. Cabe à própria Direcção dos Serviços de Solos, Obras Públicas e Transportes (DSSOPT), ou a associações do sector, como a Associação dos Arquitectos de Macau (AAM), a realização de acções de formação, mas estas têm sido escassas e insuficientes para atingir o número de créditos exigido.

A situação é preocupante ao nível das acções de formação em português ou inglês. As novas regras constantes no “regime de qualificações nos domínios da construção urbana e do urbanismo” está a deixar os não falantes de chinês de mãos atadas, por não conseguirem cumprir algo que é obrigatório e que os pode afastar da assinatura de projectos.

Maria José de Freitas, arquitecta, considera a situação “lamentável”. “Infelizmente é o que está a acontecer. Para quem já está inscrito na DSSOPT só em 2018 é que vai ter a necessidade de apresentar essa formação contínua. Pode ser que até lá existam outros cursos que providenciem o número de pontos necessários”, disse ao HM.

A arquitecta considera que a própria AAM “tem de estar ciente de que as pessoas, para terem a carteira profissional e exercerem, têm de renovar a licença na DSSOPT, e para isso têm de ter um certo número de pontos. Tem de haver uma entidade que proporcione estes cursos.”

A situação tanto afecta os profissionais com anos de carreira em Macau como os que acabaram de chegar ao território, já que todos têm de renovar a sua licença profissional de dois em dois anos. É necessário chegar às 50 horas de formação, metade na área de trabalho, outra metade em áreas relacionadas com a profissão.

DSSOPT em chinês

Rui Leão, arquitecto e presidente da Docomomo Macau, defende que “estão a criar-se condições bastante desagradáveis para uma coisa que sabemos ser uma situação de Macau, ou seja, a existência de profissionais que usam línguas diferentes e o facto de termos duas línguas oficiais. Está a criar-se um desequilíbrio numa coisa que é obrigatória”.

Para o responsável, o ónus da culpa não recai apenas na AAM. “É um problema com que todos os profissionais de língua não chinesa se debatem, porque não há acções de formação suficientes para completar os créditos exigidos. É muito complicado para as associações conseguirem assegurar tradução simultânea.”

Do lado da DSSOPT, a maioria das acções tem sido realizada em cantonês. “Não tenho sequer conhecimento de que haja cursos em português”, explicou Rui Leão. “Penso que são em chinês e é uma coisa que estranho, porque se os cursos são obrigatórios, deveriam ser assegurados para todos os profissionais. Acho que há vários ateliers de arquitectura e engenheiros que têm de fazer a formação em português ou inglês e que têm uma dificuldade especial em conseguir cumprir [os requisitos]”, adiantou o arquitecto.

A Docomomo Macau, enquanto entidade internacional que debate a arquitectura e a preservação de edifícios, com presença em vários países e regiões, fez o ano passado formações viradas para a renovação da licença profissional. Rui Leão assegura que é quase impossível ter acesso a tradução. “Tentei de várias maneiras ter apoio e não consegui. Não há essa preparação.”

AAM quer fazer mais

Até ao fecho desta reportagem não foi possível chegar à fala com o presidente da AAM, mas Nuno Soares, arquitecto e membro da direcção da associação, assegura que a AAM tem de realizar, por ano, oito acções de formação, e que o objectivo é fazer mais do que isso.

“Nem todos os cursos são em português ou inglês, e a regra é que a maior parte deles sejam em inglês, para permitir que todos os membros possam assistir. Há algumas formações em chinês, mas serão a excepção. Sempre que pudermos, faremos em português”, frisou Nuno Soares.

As queixas já chegaram à associação mais representativa do sector. “Todos nós queremos fazer mais formações, a AAM já tinha essa preocupação. Vários membros têm manifestado o facto de não terem muitas horas de formação, e por isso estamos a tentar fazer mais do que aquelas com as quais nos comprometemos. Estamos a tentar aproximarmo-nos de um curso por mês. O programa está activo e estamos a tentar intensificá-lo”, apontou.

Segundo a página oficial da AAM, o ano passado foram realizadas sete acções de formação. Muitas delas foram realizadas em inglês ou com recurso a legendas.

“Tem sido difícil”

Dominic Choi preside à associação Arquitectos sem Fronteiras, é falante nativo de chinês e reconhece a falta de formações para todos. “Sei que há falta de cursos em inglês ou português. É algo novo em Macau e obter 50 horas em dois anos tem sido difícil para muitos profissionais. As pessoas estão a tentar obter créditos. Há quem só consiga obter 20 horas, mesmo falantes de chinês.”

Para o dirigente da Arquitectos sem Fronteiras, “há um elevado risco” de muitos profissionais não verem a sua licença profissional renovada. “É um problema crucial. Neste momento alguns colegas, sejam arquitectos ou engenheiros, sentem que o tempo está a esgotar-se e que os cursos não são suficientes para preencher todos os requisitos. Não houve uma grande consideração pela realidade e pode haver muita gente desqualificada.”

Dominic Choi fala ainda das consequências do lado de quem investe. “Se estou a construir um edifício agora, com contrato assinado [e depois não tenho a licença renovada], do ponto de vista dos investidores será difícil encontrar um arquitecto.”

Para além disso, “não houve planeamento, porque quando estabeleceram esta regra deveriam ter pensado nas condições do mercado para realizar as acções de formação”, remata Dominic Choi.

Que soluções?

Rui Leão considera fundamental a criação de um website com todas as informações dos cursos a realizar. “A informação está dispersa. Seria uma plataforma à qual todos tivessem acesso. As associações esforçam-se por realizar este tipo de iniciativas mas metade dos associados acaba por não saber o que acontece.”

Para Maria José de Freitas, é ainda necessário clarificar de que forma é que outras acções de formação contam para a obtenção de créditos. “Pessoas que fazem outros cursos, em universidades por exemplo, não sei como vêem o reconhecimento das suas formações. É algo que ainda não está devidamente explicado. Se não há cursos suficientes em língua inglesa ou portuguesa, então que alternativas há? Tudo isso tem de ser ponderado.”

A arquitecta que não acredita que esta situação vise prejudicar os não falantes de chinês. “Não me parece que haja qualquer intuito de prejudicar os arquitectos de língua portuguesa. Será antes uma questão que ainda não foi devidamente ponderada sobre as suas implicações.”


Aprovações demoradas

Não só o número de cursos não é suficiente, como o Conselho de Arquitectura, Engenharia e Urbanismo leva tempo a aprovar as acções de formação a pedido das associações. A entidade “demora algum tempo a aprovar as acções de formação, e tem sido prática a realização de acções cujos créditos ainda não estão aprovados. Só quando se recebe a aprovação dos créditos é que os certificados são emitidos aos participantes”, disse Rui Leão. Dominic Choi alerta ainda para o facto de os “critérios quanto à aceitação dos cursos não serem claros”. “Tínhamos sempre de submeter os pedidos e não havia uma explicação clara se iriam ou não aprovar essas acções. Iríamos demorar muito tempo a preparar um ou outro curso e depois poderia não ser aprovado, e conheço casos de cursos que não obtiveram aprovação antes.” É por esse motivo que a Arquitectos sem Fronteiras só foca as suas atenções em projectos humanitários, neste momento.

20 Fev 2017

Erro médico | Decisões da mediação sem hipótese de recurso

As decisões adoptadas pelo Centro de Mediação dos Litígios Médicos não terão direito a recurso, pois o pedido do processo tem carácter voluntário. Os limites mínimos do seguro para hospitais, clínicas e médicos variam entre 500 mil a 20 milhões de patacas

[dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] Conselho Executivo apresentou ontem os diplomas relativos à constituição do Centro de Mediação de Litígios Médicos e da Comissão de Perícia do Erro Médico. Foi ainda apresentado o regulamento administrativo que institui a obrigatoriedade dos prestadores de cuidados de saúde de serem portadores de um seguro. Os articulados estão relacionados com o Regime do Erro Médico, implementado o ano passado.

Conforme explicou Leong Heng Teng, porta-voz do Conselho Executivo, não haverá direito a recurso das decisões do centro de mediação. “Não há lugar a recurso porque tem carácter voluntário. A mediação pode ter resultados positivos para ambas as partes ou não.”

Em relação aos relatórios da comissão de perícia, “os utentes têm o direito de questionar a comissão”, caso não concordem com os resultados. Efectuada a perícia, o documento será fornecido a utentes, Serviços de Saúde (SS) e prestadores de cuidados de saúde, ou seja, médicos, clínicas ou hospitais.

O relatório terá de estar pronto no prazo de 90 dias, podendo ser alargado o seu prazo, conforme a gravidade do caso. Ainda assim, Leong Heng Teng deixou claro que a decisão “não se deve prolongar por um tempo indefinido”.

A realização da perícia técnica irá obrigar ao pagamento de taxas por parte dos “prestadores de cuidados de saúde, utentes e, em determinadas situações, os familiares dos utentes”. O valor será fixado por despacho do Chefe do Executivo.

A comissão de perícia será constituída por sete membros, cinco deles ligados ao sector da saúde e dois da área do direito, sendo que devem ter “um mínimo de dez anos de experiência”. O seu mandato será de dois anos, sendo que o regulamento administrativo não explicita quantas vezes é que os mesmos membros podem ver a sua nomeação renovada.

Tanto o centro de mediação, como a comissão de perícia entram em funcionamento no próximo dia 26. Caberá ao Chefe do Executivo decidir, por despacho, quem são os nomes escolhidos para o centro de mediação.

Seguro a quanto obrigas

A obrigatoriedade de adopção de um seguro por parte de médicos, clínicas e hospitais preocupou o sector desde o início da discussão sobre o Regime do Erro Médico. O Governo fixou os limites mínimos do seguro entre 500 mil e 20 milhões de patacas, ficando prometido o apoio da Autoridade Monetária e Cambial de Macau (AMCM) caso o médico ou entidade veja recusado, por três vezes, o pedido por parte da seguradora.

“A AMCM criou um mecanismo para apoiar o prestador de cuidados de saúde na comunicação com a seguradora, para que acabem por conseguir o seguro. Vamos tentar saber quais as razões para a recusa por parte de três seguradoras. Pode dever-se à natureza da área médica, por ser muito complexa. É com esse mecanismo que vamos obrigar as seguradoras a aceitar a venda do seguro”, explicou uma representante do organismo.

A título de exemplo, a medicina tradicional chinesa ou farmácia são áreas que ficam abaixo das 500 mil patacas de seguro, sendo que a medicina ocidental obriga a patamares mais elevados, com seguros entre um e dois milhões de patacas. Clínicas privadas e hospitais, como o Kiang Wu, por exemplo, terão de adquirir seguros na ordem dos 20 milhões de patacas.

O seguro irá abranger situações como “indemnizações por danos para a saúde física ou psíquica dos utentes, causados por acto médico, com violação dos diplomas legais”, as indemnizações “por danos decorrentes do auxílio médico urgente prestado”, ou ainda o pagamento das custas judiciais e honorários dos advogados. São excluídos os actos de erro médico praticados com dolo, pois entram no âmbito da prática criminal.

17 Fev 2017

Lídia Adelina Lourenço, artista de doçaria | Prémios de açúcar

[dropcap style≠’circle’]L[/dropcap]ídia Adelina Lourenço nunca tinha feito um bolo daqueles que parecem verdadeiras obras de arte e que nem apetece comer, para não estragar. Contudo, foi lendo, experimentando, até se transformar na primeira artista de pastelaria em Macau a fazer bolos a três dimensões. Foi a descoberta de um talento que estava escondido.

Tudo começou em 2009, quando um problema pessoal a levou a experimentar um novo mundo. “Sentia-me triste, não tinha confiança”, contou Lídia Adelina Lourenço, que à época trabalhava na Teledifusão de Macau.

“Senti que, quando saía do trabalho, tinha de fazer outras coisas. Então comecei a fazer bolos com base em vídeos no YouTube e aí sentia-me contente. Era difícil sentir-me contente naquela altura. Comecei a levar bolos todos os dias para o trabalho, até que a minha chefe me sugeriu que abrisse uma página no Facebook para tentar vendê-los. Achei que não conseguia fazê-lo, porque nunca tinha estudado nesta área. Mas a verdade é que comecei a vender desde a primeira publicação que fiz, já há sete anos”, contou ao HM.

Começou por vender bolos comuns, até que surgiram as primeiras encomendas para bolos diferentes de todos os outros. A artista aprendeu tudo aquilo que sabe sozinha.

“Mandei vir livros do Reino Unido e comecei a ler sozinha como podia fazer bolos a três dimensões. Naquela altura mais ninguém fazia isso em Macau. Comecei a ter mais confiança em mim”, recorda.

Anos depois, Lídia Adelina Lourenço obteve o terceiro lugar a nível mundial na modalidade de arte em pastelaria, e conta com seis prémios, incluindo quatro medalhas de ouro em competições. Este ano, vai participar numa competição em Nova Iorque, em Maio, e noutra na cidade italiana de Milão, em Outubro.

Para esta artista, alinhar em concursos representa muito mais do que trazer troféus para casa. “Gosto de participar em competições porque assim posso adquirir mais experiências e conhecer mais pessoas, não é apenas para ganhar. É algo positivo. O facto de perdermos neste tipo de campeonatos não quer dizer que seja um mau trabalho, pois todos os trabalhos são bons”, explicou.

A arte de Lídia Adelina Lourenço já chegou à televisão, tendo protagonizado um programa de culinária de alguns episódios na TDM. O programa deverá regressar este ano ao pequeno ecrã, contou a artista.

Ensinar os outros

Lídia Adelina Lourenço também faz parte do Conselho das Comunidades Portuguesas, na qualidade de suplente, mas são os bolos que são o seu ganha-pão, apesar das horas de trabalho que representam. “Muitas vezes penso que deveria mudar de profissão e poderia ganhar mais, mas gosto de fazer isto”.

A artista recorda o momento, numa competição em Birmingham, no Reino Unido, em que despendeu 15 horas por dia a fazer duas esculturas, no período de duas semanas. O esforço, porém, compensou: ficou em terceiro lugar ao nível mundial, numa competição que recebe artistas de todo o mundo.

Lídia Adelina Lourenço abriu, em Maio de 2015, a sua loja, intitulada “Linalenço Dessert”, onde também promove workshops com outros artistas de renome mundial. Nestas sessões os interessados podem, por exemplo, aprender a fazer bolos iguais às famosas malas Birkin, da Hermés.

“Antes paguei as minhas deslocações para aprender esta arte em países como a Inglaterra e os Estados Unidos, então tive a ideia de começar a convidar estes artistas para que, assim, as pessoas possam aprender alguma coisa sem saírem de Macau. Todos os dias tenho encomendas e dou aulas.”

Apesar de reconhecer que ganha pouco tendo em conta as horas que gasta com cada obra de arte, Lídia Adelina Lourenço não se vê a mudar de profissão. “Adoro fazer isto porque cada bolo, para mim, é especial. Gosto de fazer bolos em forma de escultura, embora demore muito tempo.”

“Já fiz mais de mil desenhos para bolos, gosto que cada pessoa tenha o seu próprio desenho, um bolo diferente. Não sei muito bem o que me inspira. Só sei que todos os dias faço algo diferente, depende do que o cliente gosta ou deseja”, disse ainda. Atenta às últimas tendências em termos de alimentação, Lídia Adelina Lourenço admite criar receitas para quem é alérgico a ovos ou farinha. O açúcar, corantes e cremes especiais é que não podem faltar.

17 Fev 2017

Biblioteca Central | Orçamento final será conhecido em 2019

O secretário para os Assuntos Sociais e Cultura confirmou na Assembleia Legislativa que o orçamento de 900 milhões de patacas poderá não chegar para erguer a Biblioteca Central no edifício do antigo tribunal, mas os valores exactos só serão conhecidos em 2019. A localização é para manter, apesar de algumas críticas dos deputados

 

[dropcap style≠’circle’]“S[/dropcap]e o edifício do antigo tribunal fosse utilizado para albergar serviços públicos, seria um desperdício.” As palavras são do secretário para os Assuntos Sociais e Cultura, Alexis Tam, e servem para confirmar que a futura Biblioteca Central vai ser mesmo construída no centro da península, apesar de alguns deputados terem ontem defendido a sua edificação na zona dos novos aterros.

Quanto ao orçamento, Alexis Tam deixou claro que 900 milhões de patacas, o valor já anunciado, não deverão ser suficientes para erguer o projecto. Contudo, o orçamento exacto só será conhecido daqui a dois anos, quando for aberto o concurso público para as obras. O processo para o projecto de arquitectura só terá início em 2018, sendo que a inauguração da biblioteca ficou prometida para 2022.

“Penso que não vai ser suficiente o orçamento de 900 milhões de patacas, não é um número preciso”, apontou o secretário. “A Biblioteca Central de Hong Kong custou 700 milhões de dólares de Hong Kong, mas trata-se de um número de há dez anos. No futuro, vai haver um concurso público e só aí é que vão existir números precisos.”

Afirmando tratar-se de uma “estimativa por baixo”, o secretário acabou por afirmar que o orçamento poderá ser inferior ou superior às 900 milhões de patacas.

“Quando há muito dinheiro fazem-se as pessoas passar por tolos”, disse o deputado Ng Kuok Cheong. “Se não fosse uma cidade com tanto dinheiro, jamais um governante diria isso. Tal só acontece porque há eleições num circuito restrito”, criticou o deputado.

“Se conseguir atrair os nossos jovens, criar hábitos de leitura e fazer algo pela população, 900 milhões de patacas não é nada”, defendeu, por sua vez, Mak Soi Kun.

No debate, proposto pela deputada Song Pek Kei, Alexis Tam levou maquetas do projecto e distribuiu dados de outras bibliotecas centrais construídas em várias cidades do mundo.

O secretário prometeu manter as fachadas dos dois edifícios onde ficará albergada a biblioteca. “Não vamos desmantelar nada. Trata-se de um edifício histórico, solene, e é o local ideal para a revitalização. Há muitos exemplos de transformação de edifícios históricos para actividades culturais ou actividades comerciais”, frisou Alexis Tam.

Vários deputados questionaram a localização da futura Biblioteca Central por se tratar de uma zona com muito fluxo de pessoas e tráfego, mas o secretário confirmou que há “1600 lugares de estacionamento nos auto-silos perto, incluindo 30 itinerários de autocarros, o que facilita o acesso das pessoas”.

Mais bibliotecas de bairro

Alexis Tam repetiu ao longo da tarde que a Biblioteca Central irá servir não apenas estudantes e idosos, mas também académicos, além de constituir uma plataforma para publicações históricas. A construção de mais bibliotecas comunitárias está nos planos do Executivo.

“Já ponderámos outros locais, perto do Centro de Ciência e nos novos aterros. Se, no futuro, houver espaço podemos construir aí mais bibliotecas comunitárias. Também na zona de Seac Pai Van pensámos criar uma biblioteca comunitária. Estas bibliotecas comunitárias desempenham o papel de uma sala de leitura mas, comparando com a Biblioteca Central, as funções são diferentes”, apontou. “Há universidades que têm bibliotecas ainda maiores do que esta, que não é assim tão grande quanto isso”, acrescentou ainda Alexis Tam.

Chui Sai Peng ausente

O deputado Tsui Wai Kwan lembrou a polémica ocorrida em 2008, quando o Comissariado contra a Corrupção (CCAC) foi obrigado a intervir perante o facto de o gabinete do engenheiro civil e deputado José Chui Sai Peng ter feito a consultadoria para o projecto, sendo que a vencedora do concurso acabaria por ser uma arquitecta da sua empresa, de nome Vong Man Ceng. “Houve um problema com o concurso público e isso levou a um desperdício de tempo”, afirmou.

Numa sessão plenária em que Chui Sai Peng não esteve presente, o secretário optou por não comentar o caso. “Não queria aqui abordar o que se passou. Só posso dizer que todos os projectos demoram tempo e esta obra será concluída no próximo mandato. Mas, se não iniciarmos agora o trabalho, o próximo Governo demorará mais tempo a realizá-lo.”

Alexis Tam referiu ainda que o projecto “não entrará em conflito com as habitações públicas”, pois também “faz parte da vida quotidiana da população”. “Não é lógico que sejam construídas habitações públicas neste edifício. Se construirmos a futura biblioteca nos novos aterros, a obra poderá levar dez a 20 anos, e penso que este local é o mais adequado”, reiterou Alexis Tam.

 

 

Angela Leong defende preservação do Hotel Lisboa

A deputada Angela Leong defendeu no debate de ontem a necessidade de preservar o Hotel Lisboa. “Temos edifícios que podem transformar-se e ter outra finalidade, mantendo o seu valor histórico, como é o caso do Hotel Lisboa. Houve casos em que a Fundação Macau adquiriu esse tipo de edifícios, que devem ser preservados, pois só assim será conhecida a nossa história. Está a olhar para mim, mas sim, vou preservar a Pousada de São Tiago. Não vou entregar ao Governo para fazer pressão.” Esta terça-feira a deputada confirmou que a pousada vai fechar temporariamente devido às obras do metro ligeiro, mas afastou a possibilidade de alterações profundas ao edifício.

16 Fev 2017

Casinos | Governo admite continuação das salas de fumo e reforça medidas

 

A ideia de acabar totalmente com o consumo de tabaco em espaços fechados não é para já. Em resposta aos estudos feitos pelo sector do jogo, os Serviços de Saúde moderam o discurso da tolerância zero. Continua a ser uma meta a longo prazo e há mais exigências às operadoras. Alexis Tam diz que não há cedência a pressões

[dropcap style≠’circle’]O[/dropcap]s Serviços de Saúde (SS) anunciaram ontem medidas que vão de encontro às sugestões dos casinos para as salas de fumo, aumentando, porém, os padrões de exigência. “Os critérios agora estabelecidos têm validade no mundo inteiro, são de nível elevado. Espero que as salas de fumo salvaguardem a saúde dos funcionários dos casinos.” As palavras são de Cheang Seng Ip, subdirector dos SS, que demonstra concordância com as conclusões dos estudos apresentados pelo sector do jogo.

Para os serviços liderados por Lei Chin Ion, as propostas das operadoras têm de ser consideradas com seriedade, não significando, no entanto, que todas as sugestões foram aceites. O subdirector dos Serviços de Saúde refere que são uma referência, mas que “os serviços propõem um critério mais elevado na salvaguarda da saúde dos trabalhadores dos casinos”.

O fim do tabaco em espaços fechados continua a ser o grande objectivo dos Serviços de Saúde. “A instalação de salas de fumo é um passo avançado na progressão para a proibição total mas, da nossa parte, gostaríamos que fosse mais rápido, ainda há muitas considerações a serem tomadas”, revela Tang Chi Ho, chefe do Gabinete para a Prevenção e Controlo do Tabagismo.

Exigências aumentam

À margem do debate sobre a Biblioteca Central, Alexis Tam reiterou a ideia de que as salas de fumo serão o caminho a seguir. Apesar de afirmar que ainda não tinha recebido o documento dos SS, o governante tomou conhecimento do mesmo achando que “a proposta é viável”. O secretário para os Assuntos Sociais e Cultura comentou ainda que, “se as salas de fumo forem bem instaladas e não afectarem os outros, então não há problema”.

Agora a bola está do lado das operadoras, que terão de se pronunciar acerca das exigências técnicas do Governo. Alexis Tam afasta a ideia de cedência aos casinos, uma vez que, aquando da “aprovação da lei na generalidade na AL, foram auscultadas opiniões da população e dos trabalhadores”. O Executivo “tem de balançar os interesses de todos, isso é a democracia, mas é difícil obter consenso de cem por cento das partes”, acrescentou.

De acordo com as sugestões dos Serviços de Saúde, os casinos têm de cumprir as normas do Regulamento de Segurança contra Incêndios e Regulamento Geral de Construção Urbana. Além disso, as salas de fumos precisam de estar separadas fisicamente das restantes instalações dos casinos. As exigências dos serviços impõem também que os revestimentos dos tectos, paredes e pavimentos devem impedir o vazamento de fumos. Além disso, as portas das salas de fumo devem ser deslizantes e com fecho automático. Nestas zonas não se poderá jogar, nem podem ser afixados anúncios que incentivem o consumo do tabaco. Aguarda-se resposta das operadoras.

16 Fev 2017