Covid-19 | Obrigação de teste em casinos e obras gera caos e leva Governo a recuar

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A exigência de apresentar um teste de ácido nucleico levou a uma corrida aos centros de testagem, na manhã de ontem. Após várias horas de confusão, corridas, gritos e aglomerações, o Governo anunciou a retirada da medida

 

O dia de ontem começou com uma corrida ao centro de testes por parte de milhares de trabalhadores de casinos e da construção civil. Face à obrigação de terem de apresentar o resultado negativo de um teste de ácido nucleico com a validade de 48 horas, os trabalhadores geraram grandes aglomerações, muita confusão, gritos, empurrões e até insultos.

Para piorar a situação, por volta do almoço, e numa altura em que estava içado o sinal número um de tufão, a chuva apareceu e apanhou muita gente desprevenida. Sem chapéu de chuva, muitos não tiveram outro remédio que não fosse aceitar a molha.

As críticas à situação não se fizeram esperar, ao mesmo tempo que os vídeos começaram a circular nas redes sociais. E depois de várias horas de concentrações, por volta das 14h40, o Governo voltou atrás. Como justificação, o Centro de Coordenação de Contingência do Novo Tipo de Coronavírus apontou que a aglomeração de pessoas “não é condizente nem favorável ao combate epidémico”.

Em alternativa, passa a haver a obrigação de fazer testes rápidos para estes trabalhadores. “Foi decidido cancelar o requisito de que os trabalhadores da construção civil e casinos devem ter um certificado de teste de ácido nucleico negativo 48 horas antes de irem para o trabalho”, foi reconhecido.

Desastre anunciado

Antes da aplicação da exigência do teste, várias vozes na sociedade tinham alertado para a possibilidade de haver concentração excessiva nos centros. Uma dessas vozes foi a de Cloee Chao, a presidente da Associação Novo Macau pelos Direitos dos Trabalhadores de Jogo. Ao HM, a dirigente da associação revelou ter enviado na noite de terça-feira um email à Direcção de Inspecção e Coordenação de Jogos (DICJ) a sugerir que o prazo do teste fosse de sete dias.

“Não sei com que antecedência foi pensada esta política, porque parece que os trabalhadores que precisavam de um teste negativo são mais do que o número estimado pela DICJ”, afirmou Cloee Chao. “Quando os residentes vão fazer os testes em massa, têm uma flexibilidade de horários, podem ir a várias horas, mas estes trabalhadores não têm essa flexibilidade, o que faz com que haja uma concentração. Parece que isso não foi tido em conta”, acrescentou.

Cloee Chao justificou ainda a corrida aos centros com receios de represálias, no caso de não conseguirem fazer os testes. Numa altura em que a economia atravessa a fase mais negra dos últimos anos, Chao apontou que os funcionários tiveram receios de não poder trabalhar e ficar sem o bónus de presença.

Além disso, segundo Cloee, houve vários trabalhadores que apareceram nos postos de trabalho sem qualquer marcação, porque não conseguiram fazê-la online.

A brincar com as pessoas

Por sua vez, José Pereira Coutinho, deputado ligado à Associação de Trabalhadores da Função Pública de Macau (ATFPM), lamentou a situação causada e a incoerência governativa. “O Governo está a proceder muito muito mal porque quando é confinamento é geral, independentemente de serem casinos, estaleiros ou construções das obras públicas dos aterros”, afirmou Coutinho, ao HM. “Se o Chefe do Executivo e as autoridades de saúde a dizem às pessoas para ficarem em casa, porque é que estas pessoas têm de sair de casa e ir trabalhar?”, questionou.

Neste sentido, toda a situação das aglomerações mereceu críticas do legislador. “Andam a brincar com as pessoas. Ora dizem que é necessário fazer um teste, ora dizem que já não é necessário. Lamento ter de criticar o Governo sobre esta questão de haver excepções”, admitiu. “Mas, se também não há jogadores por que é que não fecharam os casinos?”, perguntou.

José Pereira Coutinho alertou para o “grande risco de propagação” entre os presentes, incluindo os trabalhadores destes locais, como as autoridades públicas. “Há um polícia que está no local de uma das grandes aglomerações e teve muitas pessoas em cima dele. Ele corre o risco de ficar contaminado”, atirou. “Há vários agentes que me telefonaram a dizer que foram contaminados em serviço. Eu recebi informações directas”, revelou.

O deputado defendeu ainda que os acontecimentos de ontem mostram que mais tarde ou mais cedo o Governo vai ter de aceitar a realidade e adoptar uma política de coexistência com o vírus, que se encontra “disseminado em todo o lado”.

572 casos

Ontem, às 17h, quando foram apresentados os dados havia 572 casos de covid-19 ligados ao surto actual, um aumento de 88 face ao número anterior. Além desses, de acordo com as estatísticas apresentadas pelo Executivo, 35 pessoas tinham testado positivo, mas de forma preliminar, pelo que os casos tinham de ser confirmados. Entre os 88 confirmados ontem, 48 foram detectados na comunidade e 40 nos postos de controlo.

Código de saúde | Advogado alerta para penas por uso indevido

Um advogado ouvido pelo jornal Ou Mun alertou para o facto de que a utilização de códigos verdes de outras pessoas para entrar em determinados espaços pode resultar em consequências legais. Segundo Mak Heng Ip, recorrer ao código verde de terceiros para entrar em determinado local é uma violação clara às medidas de prevenção epidémicas, aumentando assim o risco de propagação do vírus. Ao jornal Ou Mun, Mak Heng Ip vincou ainda que a população tem a obrigação de colaborar com as medidas da prevenção da pandemia lançadas pelo Governo.

Teste em massa | Falha afectou resultado de 132 pessoas

Uma anomalia detectada durante a análise de 22 amostras mistas recolhidas durante a última ronda de testes em massa levou a que o resultado de 132 pessoas permaneça desconhecido. De acordo com o Centro de Coordenação e Contingência, a situação está a ser revista, estando em causa falhas detectadas numa máquina de testagem da empresa Kuok Kim.

“Após investigação, o Centro de Coordenação apurou que a Companhia de Higiene Exame Kuok Kim (Macau) Limitada, que participa no trabalho de teste massivo de ácido nucleico, não conseguiu detectar normalmente resultados em 22 amostras devido a falhas de uma das máquinas que deu erros no teste e que envolve 132 pessoas. Estas situações estão em revisão”, pode ler-se num comunicado divulgado ontem.

No rescaldo do incidente, o Centro de Coordenação pediu desculpa a todos os residentes pelo atraso na publicação dos resultados e diz lamentar “profundamente” os erros da empresa, tendo solicitado à mesma que proponha “medidas práticas de melhoria para evitar que incidentes semelhantes aconteçam novamente”.

O teste em massa realizado nos dias 27 e 28 de Junho resultou na recolha de 652.544 amostras, das quais 652.124 são negativas. No total, foram detectados 48 conjuntos de amostras mistas positivas.

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