4 de Junho | Rejeitada vigília no Senado por violar Código Penal

Pelo segundo ano consecutivo, a vigília em memória do massacre de Tiananmen não irá acontecer. Segundo Au Kam San, para além de argumentar que a organização do evento não tem capacidade para cumprir medidas de prevenção da pandemia, o CPSP apontou que a vigília pode resultar em crimes de incitamento à alteração violenta do sistema estabelecido, calúnia e ofensa a pessoa colectiva

 

O Corpo de Polícia de Segurança Pública (CPSP) rejeitou pelo segundo ano consecutivo a realização da vigília em memória do massacre de Tiananmen, agendada para o próximo dia 4 de Junho. A decisão consta de um despacho emitido ontem pelas autoridades e enviado a Au Kam San, que assenta, não só na falta e capacidade da organização de cumprir as medidas de prevenção da pandemia, mas também no facto de considerar que, à luz do que aconteceu em anos anteriores, o evento constitui uma violação ao código penal.

Segundo revelou ontem Au Kam San, um dos organizadores da iniciativa da União para o Desenvolvimento Democrático, esta foi a primeira vez em mais de 30 anos que a polícia apontou razões políticas e alegou que o evento pode violar o Código Penal.

Mais concretamente, explicou o deputado, no despacho do CPSP pode ler-se que, tendo por base os acontecimentos e práticas dos anos anteriores, o pedido de realização da vigília viola os artigos do Código Penal que correspondem aos crimes de “Publicidade e calúnia”, “Ofensa a pessoa colectiva que exerça autoridade pública” e “Incitamento à alteração violenta do sistema estabelecido”.

“No despacho enviado pela polícia constam, em anexo, explicações sobre a forma como a nossa organização viola os artigos do Código Penal. Os anexos citam slogans plasmados em cartazes das vigílias dos anos anteriores e alguns deles, de facto, não estão relacionados com o tema. Por exemplo, durante as vigílias realizadas em anos anteriores, algumas pessoas mostraram cartazes onde se podiam ler palavras de ordem como “o Governo Central prejudica o país e a população” e a polícia considerou que fomos nós que criámos esses cartazes. Mesmo que esses cartazes não tenham sido responsabilidade da nossa organização, a polícia juntou tudo e usou-os como justificações para nos acusar das violações [à lei], acabando por recusar o nosso pedido de reunião”, partilhou com o HM.

Au Kam San acrescentou ainda que considera a decisão injusta porque “os materiais referidos no despacho não estavam dentro da área da vigília” e foram considerados calúnias dirigidas ao Governo Central.

“É feita referência a um cartaz que diz ‘os mártires da democracia vivem para sempre’ e que a polícia afirmou tratar-se de uma calúnia ao Governo Central”, acrescentou. Os organizadores vão apresentar recurso ao Tribunal de Última Instância (TUI), revelou ainda Au Kam San.

Em vão

O aviso prévio para a realização da vigília em memória do massacre de Tiananmen foi entregue pela União para o Desenvolvimento Democrático na semana passada, com a previsão inicial da participação de 100 pessoas entre as 20h e as 22h no Largo do Senado.

Antes de ser conhecida a decisão da polícia, Au Kam San revelou ter reunido na passada segunda-feira com representantes do CPSP e dos Serviços de Saúde para discutir os detalhes da vigília. Na altura, a única preocupação demonstrada pelas autoridades estava relacionada com a capacidade de garantir que não existe concentração de pessoas na zona envolvente ao evento.

“Basicamente, transmiti que conseguimos estipular um número de participantes [100] e garantir, tanto a verificação do código de saúde e da temperatura corporal à entrada, como a manutenção do distanciamento social e a utilização de máscaras durante a realização do evento. No entanto, fui questionado sobre a forma como será controlado o fluxo de pessoas que decidirem assistir à vigília. Sobre isso, respondi que não temos solução, pois não detemos o poder público para exigir, eventualmente, a saída dessas pessoas, que não fazem parte dos participantes”, explicou Au Kam San ao HM.

Ng Kuok Cheong, outro organizador do evento, quando questionado inicialmente se esperava obter o aval para realizar a vigília, disse acreditar que “seria realizada se não fossem considerados factores políticos”.

Recorde-se que 2020 foi a primeira vez em que a data não foi assinalada no território em 30 anos, no seguimento de as autoridades terem proibido a vigília do ano passado devido à impossibilidade cumprir regras de prevenção da pandemia. Ainda assim, no dia 4 de Junho a presença da polícia fez-se sentir, com várias pessoas a ser identificadas e detidas.

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