Hoje Macau China / ÁsiaCondenados nove líderes do movimento dos guarda-chuvas em Hong Kong [dropcap]N[/dropcap]ove líderes do maior movimento de desobediência civil na história de Hong Kong foram hoje considerados culpados por actos nos protestos de 2014, e incorrem em penas de até sete anos de prisão por cada acusação. Entre os condenados, estão os também fundadores do movimento “Occupy Central”, em 2013: Chan Kin-man, de 59 anos, professor de sociologia, Benny Tai, de 54, professor de Direito, e Chu Yiu-ming, de 74 anos, ministro da Igreja Batista de Chai Wan em Hong Kong. Os três foram considerados culpados de conspiração para perturbar a ordem pública de incitarem ao motim através da obstrução ilegal de lugares públicos, bem como de incitar e mobilizar manifestantes “para alterar a ordem pública”. De acordo com o tribunal, o objectivo dos activistas era “forçar as autoridades a responder às suas reclamações políticas”. Os deputados Tanya Chan e Shiu Ka-chun, os ex-líderes estudantis Tommy Cheung Sau-yin e Eason Chung Yiu-wa e o vice-presidente da Liga dos Sociais-Democratas, Raphael Wong Ho-ming, foram considerados culpados de incitação para cometer distúrbios públicos. Também o ex-deputado democrata Lee Wing-tat, de 63 anos, foi considerado culpado de uma acusação de incitamento. Os nove, que enfrentam penas de até sete anos por cada acusação, são os últimos activistas condenados pelos protestos, que se prolongaram por 79 dias em 2014, em Hong Kong. Vários activistas foram já julgados pelo Ministério da Justiça, estando a cumprir penas de prisão. Alguns foram proibidos de concorrer às eleições e outros foram desqualificados do Conselho Legislativo da região administrativa especial chinesa. Entre 28 de Setembro e 15 de Dezembro de 2014, centenas de milhares de pessoas paralisaram quarteirões inteiros da antiga colónia britânica para exigir o sufrágio universal na escolha do chefe do Executivo de Hong Kong, nomeado por uma comissão pró-Pequim. Mas as autoridades chinesas não recuaram. Em 28 de Setembro, o movimento “Occupy Central” decretou o início da sua campanha de desobediência civil, juntando-se a outros protestos em curso há dois dias junto à sede do Governo de Hong Kong. A acção da polícia desencadeou manifestações mais importantes, levando ao movimento pró-democracia, também conhecido como a revolta dos guarda-chuvas, usados pela multidão para se proteger das granadas de gás lacrimogéneo. Chan, Tai e Chu renderam-se à polícia em Dezembro de 2014, pondo fim ao movimento “Occupy Central”. Recentemente, o cancelamento de eventos literários e artísticos e a recusa em permitir a entrada de um jornalista do Financial Times em Hong Kong reacenderam a preocupação com a liberdade de expressão naquele território administrado pela China. Em 1997, na transferência de soberania de Hong Kong do Reino Unido para a China foi prometida uma semi-autonomia durante 50 anos, que permitiria manter os direitos de reunião e liberdade de expressão no território.
Hoje Macau SociedadeSarampo | Taxa de imunidade de empregadas filipinas corresponde a 94% [dropcap]O[/dropcap]s Serviços de Saúde estimam que a proporção de empregadas domésticas filipinas com imunidade ao sarampo (porque foram vacinadas ou contraíram a doença anteriormente) corresponde a 94 por cento, uma percentagem “semelhante” à dos residentes com idade igual ou superior a 20 anos. “Os resultados demonstram que o nível de imunidade contra o sarampo nos trabalhadores não residentes e dos cidadãos de Macau é ideal”, refere um comunicado divulgado ontem pelos Serviços de Saúde, na sequência do levantamento do nível de imunidade realizado, no início do mês, junto daquele grupo de trabalhadores não residentes. Os resultados foram retirados da pesquisa por amostragem de anticorpos que abrangeu 107 pessoas, instadas a participar voluntariamente na investigação. Segundo os Serviços de Saúde, todas eram do sexo feminino, com idades compreendidas entre os 23 e os 62 anos. Do total, um universo de 50 tem menos de 40 anos de idade. O número de casos de sarampo desde o início do ano subiu ontem para 32, com os Serviços de Saúde a darem conta de que a ocorrência mais recente diz respeito a um residente, de 21 anos, que estava vacinado, que estuda em Inglaterra. Dos 32 casos diagnosticados desde o início do ano, dez envolveram profissionais de saúde (oito do Hospital Kiang Wu e dois do Centro Hospitalar Conde de S. Januário). Até ontem à noite, 27 pacientes tinham recebido alta hospitalar.
Hoje Macau PolíticaCoutinho pede a Marcelo Rebelo de Sousa para prolongar a sua estadia em Macau [dropcap]J[/dropcap]osé Pereira Coutinho apelou ontem a Marcelo Rebelo de Sousa para ficar mais tempo em Macau, durante a sua próxima visita oficial à China, para “satisfazer as aspirações” dos portugueses que residem no território. “É pouco, muito pouco”, comentou o conselheiro das Comunidades Portuguesas na China à agência Lusa, em Pequim, a respeito da estada do Presidente da República Portuguesa em Macau, onde tem chegada marcada para 1 de Maio. A visita, que está prevista durar 24 horas, integra a visita de uma semana à China, que inclui Pequim e Xangai. “O objectivo fundamental é que os portugueses em Macau vejam o Presidente”, notou o conselheiro. Pereira Coutinho, que falava à margem de uma reunião do Conselho Regional da Ásia e da Oceânia das Comunidades Portuguesas, lembrou ainda o problema “crónico” de falta de recursos humanos nos serviços consulares, exemplificando com Macau. “Há uma gritante falta de recursos humanos”, disse, apontando que os salários pagos são “baixos”, comparando com os valores praticados no território. “Há uma grande instabilidade nos recursos humanos: as pessoas vêm e passados dois meses vão embora”, contou. O responsável referiu ainda as “expectativas” dos empresários sobre uma “maior rapidez” no licenciamento para exportar produtos portugueses para o mercado chinês, afirmando que é preciso um esforço conjunto, nomeadamente uma resposta mais rápida do lado português aos pedidos das autoridades chinesas durante o processo de fiscalização das condições sanitárias. “Cada item leva anos e anos a negociar”, lembrou. Durante a reunião em Pequim, liderada pela presidente do conselho regional, Rita Santos, e que termina amanhã, vai ser ainda discutida a proposta do estatuto dos conselheiros, a eleição anual dos cargos do Conselho Regional da Ásia e da Oceânia, bem como o programa do encontro do Conselho Permanente do Conselho das Comunidades Portuguesas, marcado para 28 e 29 de Maio, em Lisboa.
Jorge Morbey VozesDa identidade dos Macaenses e de outros portugueses do Oriente “O presidente do Instituto Camões, Luís Faro Ramos, destacou o entusiasmo “notável” dos macaenses que querem aprender português como parte da sua afirmação de identidade”. (Hoje Macau : 27.3.2019 : p. 7) [dropcap]1.[/dropcap] Nem todo o natural de Macau é Macaense Entre outras coisas estranhas que acontecem em Portugal, impressionam-me os “fenómenos do Entroncamento” e as jeiras (para usar o léxico corrente do crioulo de Korlai) a perder de vista, onde germinam os sábios que governam o País, que dirigem a Administração Pública e que dão brilho aos Institutos Públicos, do género do Instituto Camões. Macau, à parte, graças a Deus, apesar das incontáveis horas de trabalho e concentração da cintilante inteligência do seu Chefe do Executivo e dos seus leais ajudantes, na procura vã de talentos que, simplesmente, não existem. O presidente da autarquia entroncamentense defende que os fenómenos não são um mito, mas sim algo que “nos deve agradar porque nos diferencia das outras regiões e das outras cidades”. Admite tratar-se de “uma marca distintiva que não tem sido trabalhada”, à qual o executivo camarário pretende “dar mais consistência” com uma nova candidatura a fundos comunitários que permita desenvolver “alguma iniciativa de natureza cultural”. Durante a II Grande Guerra era o volfrâmio. Agora dão pelo nome de “fundos comunitários”. Essa arte portuguesa… A História parece registar uma incompatibilidade irreconciliável dos Macaenses com estes “sábios” de uma antropologia que não existe. Na primeira metade da década de oitenta do século passado, um “sábio” de semelhante estirpe chamou eunucos culturais aos Macaenses. Ficou impune. Talvez porque era “apenas” director dos Serviços de Educação de Macau. Agora, é o próprio presidente do Instituto Camões da Cooperação e da Língua, dependente do Ministério dos Negócios Estrangeiros de Portugal, que vem ofender a memória de muitos Macaenses, Ilustres e Patriotas, e seus descendentes, em Macau, em Portugal e noutras partes onde vive e labuta a Diáspora Macaense… Não se trata de um “lapsus linguae”! Referir-se aos Macaenses com a “ternura” que habitualmente se usa para descrever cãezinhos dóceis, de olhar meigo e rabinho a abanar, é ofensa grave e inadmissível. Revela inaptidão insanável para dirigir o organismo charneira da articulação de Portugal (da sua Língua, da sua Cultura e da sua Economia) com o Mundo. Bradamos em defesa da Memória secular de Macau e em homenagem a todas as Famílias Macaenses: Airosa, Amante, Anok, António, Assis, Assumpção, Azedo, Badaraco, Basto, Batalha, Borralho, Boyol, Braga, Carion, Colaço, Conceição, Cordeiro, Cruz, Demée, Dias, Eça, Estorninho, Fonseca, Gaan, Gracias, Grandpré, Guterres, Hagatong, Hyndman, Jesus, Jorge, Leitão, Líger, Lobo, Lubeck, Maas, Madeira de Carvalho, Magalhães, Manhão, Monteiro, Moor, Nolasco, Noronha, Pedruco, Peres, Pessanha, Pinto Marques, Placé, Prado, Rangel, Rego, Remédios, Ritchie, Robarts, Rosa, Rozário, Sá, Sales, Senna Fernandes, Sequeira, Xavier e outras mais, involuntariamente omitidas. Historicamente, a população de Macau tem duas componentes étnicas principais: Han-chineses (principalmente das províncias de Guangdong e Fujian) e Portugueses, da Europa (reinóis/metropolitanos) e Euro-asiáticos (macaenses). O primeiro recenseamento da população em Portugal (1527-1532) registou a existência de uma população cujo total se situava entre 1 e 1,5 milhão de pessoas. A miscigenação dos portugueses com os povos orientais levou a um aumento da população portuguesa no Mundo e ao aparecimento das primeiras gerações de portugueses euro-asiáticos, no século XVI. Miscigenação (latim miscere “misturar” + género “tipo”) é a mistura de diferentes etnias através do casamento, da coabitação ou, simplesmente, de relações sexuais. Um grupo étnico é uma população humana cujos membros se identificam entre si, geralmente com base numa genealogia ou ancestralidade comum (Smith, 1986). Grupos étnicos também são geralmente unidos por práticas culturais, comportamentais, linguísticas ou religiosas comuns. Neste sentido, um grupo étnico é também uma comunidade cultural. Já tarda a reacção do Ministro dos Negócios Estrangeiros, Doutor Augusto Santos Silva. Serão parentes, também? (continua)
David Chan Macau Visto de Hong Kong VozesCrimes, escapadelas e computadores (III) [dropcap]H[/dropcap]á algumas semanas atrás, falámos sobre um caso ocorrido numa escola primária. Quatro professores divulgaram as perguntas dos exames e foram acusados de “aceder a computadores com intuitos desonestos”, ao abrigo da secção 161(1)(c) da Lei Criminal, de Hong Kong. Esta secção aplica-se a crimes informáticos. Este caso ficou famoso em Hong Kong e foi inicialmente julgado no Tribunal de Magistrados, posteriormente no Tribunal de Primeira Instância e finalmente no Tribunal de Recurso. A sentença desta última instância foi publicada no dia 4 deste mês. O julgamento durou, na totalidade, cinco anos. Da sentença publicada, destacam-se cinco pontos dignos de análise: Em primeiro lugar, fica bem claro que uma pessoa que cometa um crime abrangido pela secção 161 (1) (c) terá de usar o computador de outrém para satisfazer o pedido “irregular”. Se aplicarmos este princípio legal, a secção 161 (1) (c) não cobrirá situações em que o faltoso usa o seu próprio computador para actos fraudulentos a pedido de terceiros; ou no caso de usar o seu próprio computador para defraudar outras pessoas. Nestes casos, é problemático para o Governo da RAEHK acusar os responsáveis das infracções. Possivelmente, o Governo terá de analisar caso a caso antes de tomar uma decisão. Podemos apenas afirmar que não existe uma norma que regule todas estas situações. Em segundo lugar, na sentença nunca é dito que o smartphone é considerado um computador. Como o Tribunal de Recurso não se pronuncia sobre esta matéria, prevalece o parecer do Tribunal de Primeira Instância; ou seja, os smartphones são vistos como computadores. Relacionando o primeiro e o segundo pontos, não é difícil de concluir que o Governo da RAEHK será levado a legislar de forma a cobrir delitos que ainda não estão abrangidos por leis específicas. Um outro exemplo é o caso das fotos que são tiradas de forma a revelar o que as saias cobrem (muitas vezes sem o consentimento da mulher em questão). Ao abrigo da lei actual, se estas fotos forem tiradas em locais privados, não existe crime. Se não houver uma nova legislação, o fotógrafo pode continuar a cometer este delito sem qualquer punição. No caso de o Governo da RAEHK promulgar uma nova legislação, esta deverá conter, pelo menos, dois elementos: 1. Fotografar partes intímas deverá ser considerado crime, mesmo que ocorra num espaço privado. 2. A nova lei deve estipular que o smartphone é um computador, ou em que circunstância o smartphone pode ser considerado uma ferramenta criminosa, que permita ao fotógrafo registar, à socapa, imagens de zonas intímas. Este elemento é fundamental, porque estas fotos são sempre tiradas com telemóveis e nunca com computadores. Em terceiro lugar, a secretária da Justiça propôs que a secção 161 (1) (c) se aplique a estas situações a bem das boas práticas públicas. Como já foi mencionado, se estas fotos forem tiradas em locais privados, não é possível formular acusação. O Tribunal de Recurso não leva estes argumentos em consideração e afirma que a função do Tribunal é interpretar a lei e tomar decisões baseadas nessa interpretação. As boas práticas públicas são um factor com que o Tribunal não tem de lidar. A maior diferença entre o sistema da common law e o sistema da civil law reside no facto de, no primeiro caso, o Tribunal ter como função a interpretação da lei, ao passo que no segundo não terá. Após o Tribunal ter interpretado a lei, deve tomar a decisão de acordo com o seu próprio entendimento. A interpretação da lei só pode ser feita de acordo com métodos legais e segundo os princípios do estado de direito. Estes métodos não contemplam as boas práticas públicas. A secretária da Justiça apelou às boas práticas públicas por razões de ordem pessoal. Para além de ser representante do Governo da RAEHK, a secretária da Justiça é conselheira jurídica do Executivo. Uma das suas principais funções é a manutenção das boas práticas públicas através da aplicação da lei. No entanto, se o Tribunal de Recurso aceitar que este argumento é válido para recorrer de uma sentença, futuramente poderá usá-lo como critério para tomar decisões. Como as boas práticas públicas não são necessariamente princípios jurídicos, este método de interpretação legal não é, obviamente, compatível com uma interpretação apenas baseada na lei. Em quarto lugar, alguns casos têm estado pendentes à espera da clarificação do Tribunal de Recurso sobre o alcance da aplicação da secção COFA 161 (1) (c). No momento que que o Tribunal de Recurso publicar o seu Normativo estes casos serão retomados. Em função disso, o Governo da RAEHK pode manter ou rever as acusações. Depois das emendas, parece muito improvável que o Tribunal de Recurso venha a receber o mesmo tipo de apelos. Em quinto lugar, o caso dos professores que divulgaram os resultados dos exames foi julgado pelo Tribunal de Magistrados em 2014, depois passou ao Tribunal de Primeira Instência e, após recurso dos réus, ao Tribunal de Recurso, tendo ficado concluído só em 2019. Durou cinco anos. Independentemente de se ser, ou não, considerado culpado, é bastante difícil para alguém aceitar que um julgamento se arraste durante cinco anos. A pressão a que os réus ficam sujeitos é um trauma que dura uma vida. Este foi o preço que os professores tiveram de pagar por divulgarem as perguntas dos exames. Com a democratização da educação, um número cada vez maior de jovens ingressa nas escolas. Estas fugas de informação deveriam acabar, mas acontecem cada vez mais. Talvez o Governo da RAEHK tenha de considerar a possibilidade de legislar sobre esta matéria. Como Hong Kong realiza vários exames públicos, para simplificar, vamos dividi-los em dois tipos: públicos e privados. Antes das provas, as perguntas dos exames das escolas públicas, são consideradas documentos confidenciais do Governo. Mas os exames das escolas privadas são outro caso. Não podem ser considerados da mesma forma. Assim, se alguém divulgar as perguntas dos exames de uma escola privada, não incorre em nenhum crime. No entanto parece impossível que alguém que divulgue perguntas de um exame não venha a ser julgado. Macau tem a “Lei de Combate ao Crime Informático”. Se o caso da Escola Primária Heep Woh aqui tivesse acontecido, haveria forma de lidar com o assunto. Em breve irão realizar-se exames nas escolas primárias e secundárias e também provas de admissão às Universidades. Haverá necessidade de promulgar legislação especial para punir quem divulgue as perguntas dos exames? Conselheiro Jurídico da Associação para a Promoção do Jazz em Macau Professor Associado do Instituto Politécnico de Macau Blog: http://blog.xuite.net/legalpublications/hkblog Email: legalpublicationsreaders@yahoo.com.hk
admin h | Artes, Letras e IdeiasO criador e a mentira [dropcap]O[/dropcap]lhando bem para o infinito, e há pessoas que o fazem, conseguimos observar o início de NÓS e descrevê-lo. Lá, nessa obscuridade sempre em expansão – cegueira, ignorância, melancolia -, diz-se que em preciso momento, do nada, a luz se acendeu. Especulação total. Nada se pode confirmar. Não existiam observadores para ver. Mas existem agora. E vemos. Porque a velocidade a que o passado se desloca não é suficiente para chegar até aqui, agora. Não é que o passado já se tenha ido, na verdade, o início disto tudo ainda não chegou. Pior, não se sabe qual será o primeiro a dar de caras com esta coisa a que chamamos presente, se o fim, se o princípio. Ontem é amanhã. Tenho quase a certeza que o mais fascinante que há na vida, mais do que ver, embora esta faculte a outra, é a leitura. Processo que mexe com todos os sentidos e que coloca a mente noutras alturas, não há muitos assim. Atilhos de palavras que constroem uma visão sem ela existir. Uma utopia a cada folha. O rigor de uma cascata, a chegar no fluxo, sem ordem. Por isso, leio. Observo. Escrevo. E sinto-me nutrido. Inicio uma nova experiência em páginas de jornal. Como um passageiro, deixo a torrente desabar e fico à espera do resultado. Gostava que estas crónicas saíssem de forma natural como quem colhe uma peça de fruta do ramo de uma árvore. Uma peça de fruta, o ramo da árvore, é o que esta crónica vai ser. Percorrem-se estradas sem querer fazer contas ao destino. Sigo pelo pavimento, não sei onde vou desaguar. Não é relevante. Certa vez, não sei porque me lembro disto, fui cicerone da região onde habito para uma estrela cadente da televisão. Mostrei-lhe o que havia, vistas, artesanato, costumes e gastronomia. Pelo meio, falámos do medíocre panorama televisivo, sem perceber que estava a participar nessa paisagem. O programa era péssimo, vi mais tarde, dando laivos de humor barato àquilo que levava desta zona. Respondeu-me: “É o que as pessoas querem”. Mas terá de ser assim, não se consegue vencer este estigma e nivelar um pouco mais alto? Nesta mesma terra, um homem de descendência algarvia, com apelido de uma família de artistas macaenses, está revoltado com o que se passa por cá. Viveu na Germânia, onde foi bem recebido e aceite pela comunidade local; e passou alguma parte da sua vida nas américas, tendo feito grandes amizades com os aztecas, onde ainda é respeitado. É uma pessoa só, no sentido em que na terra onde vivemos há muito poucos do lado dele, a gritar em consonância e a contestar os desígnios da autarquia, enraizada até aos cabelos nos poucos habitantes que a compõem. Um sítio grande, pequeno. Vem isto a propósito de quê? Vem a propósito do mundo bloqueado que se sintoniza todos os dias. Aqui, parto do princípio, não sei nada. Pego disto e daquilo e misturo. Agito. Um, dois, três. Já está! De um beco surge uma rua, um ponto cardeal que aponta para aquilo que é vivido, no cerne deste turbilhão. Estatela-se nas folhas deste papel. E vice-versa. A cascata, o fluxo, a desordem. A questão. Quero elucidar as pessoas mais novas para a necessidade da leitura. Ler e desprender a imaginação para outros mundos, como alimento. Escrevo com essa intenção primária, de explorar o planeta cinzento atrás dos olhos. Os germanos, os aztecas, o infinito. A roupa suja. O que sei e o que não sei. Não importa. Aquilo que se sabe é uma ínfima parte do que não se sabe. A luz que se reacende. Ininterrupta. Relatá-lo como verdade é uma incoerência tão grande como a ignorância de um animal rastejante acerca da desventura humana. O passado é a única coisa que temos à frente. Se serve de alguma prova. Inventar é mentir. As pessoas deturpam o verdadeiro para chegar mais longe. Quando estou a criar estou a mentir. Estou a lutar contra a precisão. Contra os factos. Ou o estado das coisas. Uma invenção, uma nova descoberta, com pouco se torna palpável e com contornos de realidade. Inventar é dizer a verdade. Cegueira, ignorância, melancolia. E a crónica segue. Rasura o tempo corrente. Aventura-se na geometria do acaso. Despede-se. Tudo o que experimenta é desconhecido. Conheço-te, sei quem tu és, murmuras. Frase por frase, vai por aqui, a tentar encontrar o texto. E a poesia. Levando água entre as mãos e escrevendo-a no papel. Esse líquido cristalino que é um poema, que é uma ideia. Não fica lá tudo porque, a ideia e o poema, não se compadecem com uma superfície plana e limitada. Mas no pensamento, vago e alheio, fica alguma coisa, se tiver habilidade para isso. Para não entornar mais do que de menos, talvez reste algo perceptível. Cosendo as linhas de um poema. Ou de uma ideia. Que interessa isso dos nomes, e das verdades, se podemos voltar sempre ao início. Mas, diz este descendente de algarvios, aqui todos têm medo. Medo até de o cumprimentar. Não vá estar ligado a forças progressivas que impugnem – porque nem tudo tem o formato visível da Lua– o edil camarário. E sabe-se lá o que existirá amanhã. “Estavas a falar com aquele, não era? Escreveste num poste. Não apareceste na cerimónia. Agora, amola-te”. Não é assim, porque a indiferença vem primeiro. A invisibilidade. Nem se chega às falinhas mansas, a coisa morre ali, muito antes de chegar ao vislumbre de terra firme no horizonte. A ilusão é plena. Cheia de estrelas cadentes e coisas por lavar. Desventura, é certo. Parecemos animais rasteiros, sem ser de laboratório, esses sempre têm mais categoria, mas daqueles que abandonam primeiro o navio, antes das crianças e dos idosos. Muitas vezes, vejo as palavras dos outros – as entranhas, o sentir – e deparo com aberrações, com intolerâncias, com vacuidades. Humor barato. Sinónimos. “O que o povo quer.” Há sempre o nome. Joel, Martins, Sambuca. O que seja. Nomes que vêm à cabeça. Não importa a designação ou o número. Por isso não é de se ligar. As palavras, sim, importam. Vão caindo. Referem, ditam, apropriam. Mesmo deturpadas, porque as mãos não conseguem levar toda a água ao seu moinho, deixam uma raiz. Uma erva daninha. É preciso pensar nelas. Regá-las. Dar-lhes vida. Enxertá-las para que gerem mais peças de fruta. E possivelmente mais árvores. E lençóis por lavar, claro. O criador e a mentira, ditei como ponto de navegação, em letras mais gordas. No início, quando nada há, antes do tudo, a raiz aflora. A realidade não consta. Não há o eu, não há o outro. Não há a saudação, nem a ameaça da mão apertada. Só o coração aperta. Que fazer, senão inventar e criar uma realidade qualquer? Coisas vãs e alheias. Choques. Caos. Caroços. Restos de coisa nenhuma. Revejo esse ponto lá ao fundo, não tão longe como isso, do primeiro momento, um sopro, um evento singular. Luminárias a piscar. Cosmologia física. Densidade infinita. Filosofia quântica. Vivemos num mundo irreal, que não sentimos. Que rodopia numa espiral catastroficamente controlada, composta por fórmulas atómicas não possíveis de percepcionar. Uma vírgula, um ponto final. Vive-se na impossibilidade, é tudo recreio. A invenção do dinheiro. O poder. A água, as palavras, os poemas. Para que serve tudo isso, se não está cá ninguém para nos cumprimentar?
António de Castro Caeiro Filosofia a pés juntos h | Artes, Letras e IdeiasFronteiras II [dropcap]P[/dropcap]onho-me debaixo do duche. Tiro o shampoo ainda da cabeça. A mão direita chega melhor à nuca. A esquerda retira a espuma do lado esquerdo da cabeça. Sinto a água que cai directamente sobre a cabeça e depois escorre pelo corpo todo, ombros, braços, barriga, mas também costas, nádegas. Não vejo as costas, nem a nuca, nem em geral a parte de trás do corpo, como não vejo o interior. Saio do banho. Limpo-me em frente ao espelho. Puxo a toalha da direita para a esquerda e depois da esquerda para a direita, de cima para baixo, para limpar as costas. Vemos sempre só o que está à nossa frente, nunca o que está atrás de nós. Quando olho, com esforço por cima do ombro, para baixo, deixo de ver o que habitualmente vejo e passo a ver o que habitualmente não se apresenta. Sinto as costas quentes e molhadas e depois secas, a refrescar. Mas é pelo tacto. Sinto cócegas, comichão, no exterior e no interior, mas não vejo as cócegas nem o prurido. São fenómenos tácteis. Todo o nosso corpo tem em si a perpassá-lo estruturalmente uma textura táctil, háptica. Sentimos uma dor de cabeça, como uma pontada, a vir do interior para o exterior, mas sem ir ao limite fronteiriço da cabeça. É lancinante, do lado direito da cabeça, um pouco acima dos olhos, no seu interior. É como uma agulha a espetar, mas não de fora. Esta é de dentro. Sinto dores musculares do treino. É no interior da coxa, ou na testa por um golpe sofrido. Não é só superfície nem na pele. Entra-me pelo corpo adentro. Podemos perceber que dói tudo ou que o mal-estar é geral, como quando se tem uma febre de gripe e todos nós estremecemos. Olho através da janela para ver como está o tempo. O céu azul abobadado, sem nenhuma nuvem. Nenhuma folha mexe nos ramos das árvores. Eu toco o céu com um olhar que se expande por todo o azul que eu consigo ver. O azul abobadado serve de plano de fundo ao horizonte. Haverá alguma correspondência entre os raios que saem da abóbada que são os olhos para cada ponto do céu azul? Ou será ao contrário, no plano de fundo azul, em toda a sua extensão, há pontos reais que servem de ponto de aplicação aos raios que saem do semi-globo ocular? Ou dos pontos do céu em toda a extensão a que acedo pelo olhar chegam como dardos raios azuis que formam a extensão. O azul do céu é a soma de todos os pontos azuis? Ou há uma extensão já em forma de plano curvo que é mais do que a soma das suas partes e forma faixas azuis? É o céu azul composto por faixas azuis como a fuselagem de um avião que parece feito de remendos? E o ver azul vem de onde? É do olhar ou da visão? A visão é mais do que o olhar. Eu posso olhar da direita para a esquerda e de cima para baixo, perto ou longe e, ainda assim, não estar a ver nada. Por outro lado, ao olhar numa determinada direcção, de repente, vejo formado, de uma só vez, o céu azul de um dia sereno. Quando eu toco em toda a sua extensão o céu azul, vejo formarem-se em todos os planos até aos meus olhos diversos objectos. Um objecto forma um plano. Há tantos planos quantos os objectos e mesmo sem haver objectos referenciáveis há planos possíveis que se podem estabelecer imaginariamente. O objecto que eu vejo mais longe é a ponte 25 de Abril. Para lá dela, só vejo azul. Mas entre ela e mim, vejo várias edifícios, uns mais longe do que outros, depois vejo a janela que está suja, depois vejo os meus óculos de ler que estão limpos. Mas já não vejo a película que reveste os meus olhos. Não vejo as lentes de contacto. Mas quando procuro ver as lentes de contacto, percebo que estou já fora dos olhos. Concentro-me nos óculos e vejo a sua armação. Depois vejo o que está fora da armação. Concentro-me agora na janela e percebo a sua forma geométrica composta de duas partes. Já não vejo a armação nem as lentes dos óculos. Percebo de forma desfocada a paisagem para lá da janela. Agora toco na ponte 25 de Abril: vejo os carros passarem da direta para esquerda. Não consigo se não adivinhar os carros que vêm de sul para entrar em Lisboa. Vejo, a ponte 25 de Abril deslocar-se para a esquerda, quando os carros são perseguidos por mim a diversas velocidades, na direcção contrária. Deixo de prestar atenção à ponte no seu todo, deixo de ver a ponte e percebo o azul que serve de plano de fundo a tudo. O horizonte da visão é construído por uma projecção que torna todos os planos visíveis, de lá dos olhos até lá ao horizonte. É como se tudo estivesse metido numa esfera de que só percebe a semiesfera abobadada em que eu estou metido com todas as coisas. Vejo agora da ponte 25 de Abril a minha casa, a janela de onde eu há pouco estava a olhar para cá. Desloco-me no tabuleiro. O Cristo Rei lá ao fundo que eu antes não via, passa a estar visível. A foz do Tejo passa a estar visível e a costa de Almada. Lá ao fundo estarão as portagens que eu ainda não vejo. Olho para a Junqueira e percebo o verde dos jardins nas proximidades. Vejo o paredão entre as docas e Belém. E vejo a casa onde está a janela de onde eu via a ponte. Não consigo fazer congruir nada do que vejo com o que via. As proporções estão trocadas. Mas tudo está fora da minha cabeça. A visão só vê fora. Não vejo o interior dos olhos nem o interior da cabeça. Por mais que olhe para o cimo e para baixo e para cada um dos lados e faça mexer o globo ocular, não consigo ver o interior. Só vejo o exterior. Do ângulo da minha visão dou tamanhos às coisas, ponho-as em múltiplas relações que só existem no interior do espaço de visão. O interior é o exterior e o interior é dentro do horizonte complexo da visão.
Fernando Sobral Folhetim h | Artes, Letras e IdeiasA grande dama do chá Macau, Dezembro de 1937 [dropcap]A[/dropcap] guerra já tinha chegado a Macau. Mas ninguém ousava falar dela. Muitos pensavam que, evitando o tema, o medo acabaria por se dissolver. Naquela pequena sala, mal iluminada, falava-se de guerra. Ali todos sabiam que os japoneses, depois de terem tomado Xangai avançavam a caminho de Nanjing. A China era o seu inimigo. Mas o conflito já chegara à calma e descontraída Macau. Não se via, nem se ouvia. Germinava nas sombras, à espera da luz do dia. Mesmo que os ocidentais não quisessem ver a realidade, como muitas vezes acontecia. A luz era escassa, mas era a suficiente para se ver a face de Jin Shixin, onde nenhum músculo se movia. Os seus olhos estavam semicerrados, concentrados no homem sentado à sua frente que, de vez em quando, baixava a cabeça, incapaz de aguentar o olhar fixo da chinesa. Nela não havia afecto, mesmo quando a sua voz era de veludo, como acontecia naquele momento: – Sabes, Zhang, o melhor chá verde tem de equilibrar o sabor amargo com a doçura. De outra forma é impossível conseguir a perfeição. Não parecia que esta explicação interessasse ao chinês, com as mãos e pés atados por cordas. Mal se conseguia mover. O banco em que estava sentado era pouco confortável. Tinha uma das ripas partida e a outra torta. Sentar-se nele já era um castigo. Mas se merecia ou se tudo aquilo estava a ser uma injustiça não o preocupava. Tinha a mente dominada por outros pensamentos. Jin Shixin dirigiu-se a uma mesa e inspirou o aroma que ia saindo do bule de chá que ali estava colocado. Depois, com rigor, colocou o chá nas três chávenas que estavam em cima da mesa e deixou que o aroma se espalhasse por toda a pequena sala. Estavam no interior de uma casa que funcionava como armazém, na frenética Rua de Camilo Pessanha, entre as locandas onde se jogava o fantan, as lojas de penhores e os locais onde se fumava o ópio. O comércio estava sempre aberto, e ali ninguém escutava nada. E todos se calavam. Ela não escolhera o local por acaso, quando chegara a Macau há pouco mais de um ano. À vista de todos, ficava suficientemente escondido para desenvolver as suas actividades secretas. Era ali que Jin Shixin guardava as encomendas de chá vindas da China e que depois levava para a sua loja, “O Jardim Celestial”, na Avenida Almeida Ribeiro, que se tornara conhecida em Macau pela qualidade dos seus produtos. Ela sabia prepará-los como ninguém. Como sempre, toda a arte tem sempre um lado obscuro. Atrás de Zhang, e atento a qualquer eventual movimento deste, estava Wen Xiao. Tinha os braços cruzados e tentava, também ele, perceber o que escondiam os olhos e as palavras de Jin Shixin. Na penumbra, encostado a uma parede junto à porta, apenas se via a casaca branca de Vladimir Potapoff, que há muitos anos se apresentara em Xangai como o conde de Lvov. Um dos muitos russos brancos que, sem alternativas de vida, acabara como guarda-costas dos maiores magnates da cidade chinesa. Viera com Jin Shixin para Macau, um ano antes, para a proteger. – Tal como este chá, as tuas acções têm dois sabores. Pareceram doces, mas resultaram amargas. Sabemos o que fizeste, Zhang. Só desconhecemos a mando de quem. E é só isso que desejamos que partilhes connosco. A voz de Zhang soou pela primeira vez: – Admito que matei Wu. Mas foi por uma questão sentimental. – Eu sei que ambos desejavam a mesma mulher. Mas isso foi apenas uma desculpa. Sabemos que há um inimigo a rondar-nos. O problema é que não conhecemos a sua face. Mas tu conheces, Zhang. E, em nome do passado, deves dizer-nos quem é. Perante o silêncio dele, agarrou numa chávena e levou-a até junto das narinas. – Todos procuramos um aroma perdido. Um sonho que nos faz afastar do caminho certo. Qual era o teu? Dinheiro? Zhang abanou a cabeça. Ela insistiu: – Glória? Vingança? Perante o contínuo silêncio dele, Jin voltou-lhe as costas por um momento. Depois agarrou calmamente uma faca que estava em cima da mesa e rodou-a entre os dedos. – A sombra é parte da luz. É o outro lado dela. Eu peço para sermos invisíveis. Sabes porque? A invisibilidade é o mais difícil dos dons. O teu problema é que te tornaste demasiado visível. Mataste um amigo teu. E, com isso, ameaçaste-nos a todos. Sabes que podes trair os teus amigos, o teu país, a tua esposa, a tua amante. Podes trair por dinheiro, por sexo, por amor, por ódio ou por qualquer motivo fútil. Mas não podes trair a tua família. E nós sempre fomos a tua família. Sabes qual é o nosso único problema? Não sabemos quem é que te encomendou a morte de Wu. E, assim, não sabemos quem é o nosso inimigo. Não sabíamos quem eram os inimigos de Wu. E agora não sabemos quem são os nossos. Porque ele fazia parte da família. Potapoff aproximou-se devagar e colocou-se atrás dela. Ao levantar a cabeça, Zhang ficou com os olhos fixos no russo. Jin notou uma ponta de terror no olhar do chinês. – Estamos a chegar a algum lado. Foi um russo que te encomendou a morte de Wu, não foi? Zhang olhou novamente para Patapoff. Para as suas barbas e olhos negros impassíveis. Julgou, por momentos, que era Ivan Sapojnikov. Não era. Mas cometera o mais terrível dos erros: o seu olhar tinha-o atraiçoado. Sabia, a partir daquele momento, qual era o seu destino. Ele era um homem perigoso para a chinesa. Era um homem que odiava. Não era possível esperar dele qualquer lealdade futura. Jin ficou a olhar para ele, trespassando-o. Por momentos, ela recordou-se da sua vida em Xangai. Lembrou-se do seu chefe, Du Yuesheng, na sua mansão na Rue Wagner, na zona da concessão francesa em Xangai. Imaculado no seu casaco de mandarim e na roupa de seda, enquanto dirigia o seu enorme negócio de ópio. Jin tornara-se uma das suas subordinadas mais fiéis. Fora ele que, prevenindo o futuro, a enviara para Macau. Jin agarrou novamente na sua dadao, a faca que tinha sido utilizada pelos rebeldes Boxers, na sua luta contra o poder. Não era uma arma sofisticada, nem o poderia ser. Deu-a a Wen. Zhang olhou para os dois e para o sorriso malévolo de Wen. Sabia que ia morrer. Jin agarrou na chávena de chá e levou-a à boca. Depois de beber um pouco, acrescentou: – Já não conhecemos os nossos inimigos. Estão nas sombras, onde é mais difícil ver. Estão dentro de nós. É pena que assim seja. Zhang olhou com ódio para ela e disse: – Eles vão matar-te. Sabem quem és. E o que tens. – Não te iludas, Zhang. Fui treinada para não ter medo da morte. Não acredito na morte. Só acredito no fim dos meus inimigos. [CONTINUAÇÃO]
Hoje Macau China / ÁsiaUE-China | Cimeira com quase tudo para não correr bem As questões comerciais voltam a assumir um papel preponderante nas divergências entre o gigante asiático e a Europa. A falta de uma declaração conjunta durante a 21ª cimeira bilateral, à semelhança do que aconteceu em 2017 e 2016, não deverá constituir uma surpresa para ninguém [dropcap]U[/dropcap]nião Europeia e China celebram esta terça-feira, em Bruxelas, a 21ª cimeira bilateral, que parece reunir quase todos os ingredientes para não ser bem-sucedida, sendo possível as partes não chegarem a acordo sobre uma declaração conjunta. Do lado europeu, muitas vozes defendem que não estão reunidas as condições para acordar uma declaração com Pequim, face ao que a UE classifica como um reduzido empenhamento da China no cumprimento dos seus compromissos, ou mesmo promessas não cumpridas, a nível de comércio, economia, clima e direitos humanos. Fontes diplomáticas explicaram que as partes “ainda estão a negociar o texto”, mas ninguém ficará surpreendido se UE e China não adoptarem no final da cimeira uma declaração conjunta, o que de resto já aconteceu em 2016 e 2017. Desta feita, a ausência de um texto firmado conjuntamente por Bruxelas e Pequim representará um insucesso ainda mais visível, atendendo à actual conjuntura geopolítica, designadamente com a guerra comercial entre Estados Unidos e China como pano de fundo. O comércio é um dos grandes temas sobre a mesa e um dos pomos da discórdia, face à política proteccionista chinesa, que a Europa tem tentando, em vão, convencer Pequim a alterar, de modo a proporcionar às empresas europeias as mesmas condições no mercado chinês de que as empresas chinesas beneficiam na Europa. Ainda a nível do comércio, e olhando com alguma apreensão para a “nova rota da seda” através da qual os chineses pretendem chegar cada vez a mais países do globo, a UE reclama da China um maior empenhamento na reforma da Organização Mundial do Comércio (OMC), outro dos temas centrais da cimeira, na qual o bloco europeu estará representado pelos presidentes da Comissão Europeia, Jean-Claude Juncker, e do Conselho Europeu, Donald Tusk, e a China pelo primeiro-ministro, Li Keqiang, acompanhado de vários ministros. Outras conversas A economia é outra pasta que não promete discussões fáceis, numa altura em que a UE aperta a vigilância aos investimentos chineses em sectores-chave da economia europeia, e em que, indiferente às inquietações de Bruxelas, Pequim vai negociando acordos bilaterais com Estados-membros europeus. Para esta semana, precisamente, está prevista a expansão da presença chinesa nos Balcãs Ocidentais, com a assinatura de uma série de acordos com países da Europa central e de Leste, numa cimeira a ter lugar na Croácia. Também na agenda estará a questão dos dispositivos da quinta geração móvel (5G), outro tema “pouco pacífico” nas actuais relações UE-China, face às preocupações de Bruxelas a nível de segurança, designadamente de riscos de espionagem pela “gigante” chinesa de telecomunicações Huawei, como alega Washington, que levaram mesmo a Comissão Europeia a emitir no mês passado recomendações aos 28. Entre outros temas que têm tudo para não reunir consenso à volta da mesa, os líderes abordarão questões de política externa (e são muitos sobre os quais as partes têm diferentes entendimentos, como o conflito russo-ucraniano), o combate às alterações climáticas e, esperam os europeus, os direitos humanos, que fonte diplomática admitiu tratar-se de um tema “que “nunca é fácil de abordar” com Pequim.
Hoje Macau EventosFRC | Jornalista Alexandre Afonso discute importância da voz esta quinta-feira [dropcap]A[/dropcap] Fundação Rui Cunha acolhe esta quinta-feira, às 18h30, uma conferência intitulada “A importância da voz: cuidados, treino e descanso fundamentais ao jornalista”. A iniciativa está integrada no âmbito das celebrações do Dia Mundial da Voz 2019, e conta com a organização do Centro de Ensino e Formação Bilíngue Chinês-Português e do Centro de Investigação de Estudos Luso-Asiáticos do Departamento de Português da Universidade de Macau. Alexandre Afonso trabalha há 21 anos na Antena1, tendo assumido funções de Coordenação em 2005. Desde Novembro de 2012 que é coordenador geral do desporto da Antena 1. Agraciado com vários prémios, do Sindicato dos treinadores a outras entidades privadas, destaque para o prémio Artur Agostinho, após ter acompanhado a selecção portuguesa no Europeu de 2016, quando relatou o inesquecível golo marcado por Éder que daria o título a Portugal. Actualmente, está também ligado a dois projectos televisivos, na narração de jogos da Liga espanhola para o canal Zap – LaLiga, para Angola, e na narração de futebol internacional nos canais de desporto da ElevenSports.
Hoje Macau EventosEstudo | Consumo de música está mais barato e mais poluente [dropcap]A[/dropcap] compra e escuta de música estão mais baratas, por causa da Internet, mas têm um maior impacto no ambiente pelo consumo de energia poluente, segundo um estudo divulgado ontem pela Universidade de Glasgow, Escócia. A investigação, intitulada “O custo da música”, analisou a indústria discográfica e o consumo de música nos Estados Unidos, concluindo que os consumidores gastam menos pela música que ouvem, em particular com o aumento dos serviços de escuta ‘online’ em ‘streamming’. No entanto, a energia gasta para carregar a bateria de todos os dispositivos para a partilhar e ouvir, como telemóveis e computadores, representa um aumento das emissões de gases de efeito de estufa no ambiente. No estudo são avançados dados concretos sobre o panorama nos Estados Unidos: em 1977, no pico das vendas dos discos de vinil, o consumo de música gerou 140 milhões de quilos de dióxido de carbono, mas em 2016 o armazenamento, transmissão e escuta de música ‘online’ levou à emissão de 200 milhões a 350 milhões de quilos de CO2. Do ponto de vista do impacto ambiental, os investigadores apresentam um dado positivo sobre a desmaterialização do consumo de música. O uso de plástico na indústria discográfica desceu drasticamente para oito milhões de quilos, em 2016, quando em 1977 foi de 58 milhões de quilos, produzidos e utilizados. Em 1988, altura em que prevaleceu o uso e compra de cassetes, a indústria discográfica usou 56 milhões de quilos de plástico e produziu 136 milhões de quilos de gases poluentes. Em 2000, considerado o período de maiores vendas de CD, os valores subiram para 61 milhões de quilos de plástico e 157 milhões de CO2 emitidos.
João Luz EventosHangar 18, Emily Burns e Kiri T amanhã ao vivo no espaço Live Music Association O palco do LMA recebe amanhã três concertos. A vocalista de Hong Kong Kiri T, a britânica Emily Burns e os neozelandeses Hangar 18 prometem inundar a Coronel Mesquita com pop e rock alternativo [dropcap]P[/dropcap]op rock musculado, movido a guitarras com distorção e composições apelativas em termos comerciais a puxar para o refrão. Estas são as imagens de marca dos Hangar 18, o quarteto oriundo de Auckland, que toca amanhã no LMA. A banda neozelandesa vai partilhar o palco com duas artistas pop, a britânica Emily Burns e a Hong Konger “via Nova Iorque” Kiri T. Com uma sonoridade que pisca o olho a Green Day e afins, os Hangar 18 formaram-se em 1995, altura em que o pop rock e o punk se fundiram num género musical capaz de agradar a um público mais vasto. Depois de baterem as estradas da Nova Zelândia e de tocarem em todo o lado no seu país de origem, o grupo foi para estúdio e gravou um EP que seria o prelúdio para “Grey Area”, o primeiro disco da banda lançado em 1997. Com um álbum na bagagem, conquistaram os mercados asiáticos, em especial Filipinas, Malásia, Singapura, Hong Kong e Índia. “Grey Area” foi o catalisador que levou os Hangar 18 em tour pela Ásia. Com uma vasta experiência ao vivo, os Hangar 18 partilharam palcos com bandas como No Doubt, Collective Soul, Ocean Colour Scene, Silverchair, Everclear, entre outros. Em 1997, em plena fase de transferência de soberania em Hong Kong, a banda fez parte do cartaz de luxo do “The Unity Music Festival”, onde actuaram ao lado de vultos como Grace Jones e Boy George De seguida, a banda entrou num hiato de 16 anos. O regresso fez-se compondo novo material. Antes do lançamento do novo disco, o grupo publicou IDKY, um single escrito em parceria com uma lenda viva do rock Kiwi, Jason Kerrison. O novo registo dos Hangar 18 contou na produção e mistura com a mestria de Steve James que produziu bandas como The Sex Pistols. No feminino Mas nem só de riffs de guitarra se vai fazer a noite de amanhã no LMA. Emily Burns, promessa da pop britânica, também sobe ao palco da Coronel Mesquita. Nascida em Edimburgo, na Escócia, Emily cedo desenvolveu uma paixão pela escrita que, naturalmente, a levaram à criação de letras que acabaram por ganhar músculo sonoro. A perseguição do sonho de uma carreira musical levou-a passar a sua música em rádios locais da BBC e, mais tarde, a gravar o mini-disco “Seven Scenes From The Same Summer” e o single “Damn Good Liar”. Como um barómetro dos tempos modernos, Emily Burns conseguiu atingir o impressionante número de mais de 15 milhões de streams, e conquistar audiências com sonoridades que têm um apelo universal e teimam em ficar no ouvido. Baseada em Nova Iorque, mas oriunda de Hong Kong, Kiti T também sobe ao palco do LMA esta quarta-feira. A compositora, cantora, pianista e produtora é um fenómeno de pop, dona de um som polido e voz aveludada acompanhada por batidas fortes. Nos últimos anos, a cantora actuou em palcos como o Clockenflap e acabou de lançar “Golden Kiri” o disco de estreia que deverá marcar grande parte do alinhamento que programou para o público do LMA. A música começa na Coronel Mesquita por volta das 21h30 e os bilhetes custam 100 patacas se forem comprados antecipadamente e 120 patacas à porta.
Sofia Margarida Mota SociedadeHotel 13 | Acordo para exploração de jogo está a ser negociado [dropcap]A[/dropcap] South Shore Holdings Ltd admite que ainda “continua em vigor” um memorando entre uma “filial” de uma operadora de jogo de Macau e o Hotel 13 tendo em vista a exploração de um casino naquela estrutura hoteleira, apontou ontem o GGRAsia. “Nenhum acordo formal foi celebrado com qualquer operadora [de Macau], concessionária ou subconcessionária, em relação a quaisquer operações de jogo no Hotel 13 embora o memorando de entendimento (…) permaneça em vigor”, apontou a South Shore à Bolsa de Hong Kong, refere a mesma fonte. “A celebração de um acordo formal continua a ser sujeita, entre outras coisas, ao pedido de aprovação por parte da operadora ao Governo de Macau para poder explorar o jogo no Hotel 13”, acrescentou. Segundo o GGRAsia nenhuma das seis operadoras de jogo de Macau confirmou publicamente este memorando de entendimento. A South Shore Holdings Ltd é a empresa proprietária do Hotel 13 que abriu portas no passado mês de Agosto. No que respeita à exploração do jogo, a empresa tinha planeado a abertura de um casino com 66 mesas, um quarto delas destinado ao sector VIP e o restante ao segmento de massas. Em Janeiro, a South Shore Holdings Ltd afirmou ter assinado um memorando de entendimento “não vinculativo” no valor de 191 milhões de dólares americanos. Na passada quinta-feira, a companhia disse que as partes concordaram em adiar a data de validade do negócio, em 30 dias, até 4 de Maio, admitindo a existência de mais atrasos para que as negociações possam continuar a ser realizadas.
Hoje Macau SociedadeTelemóveis | Governo autoriza fim da tecnologia 2G [dropcap]O[/dropcap] Governo publicou ontem uma alteração aos contratos de concessão das operadores de telecomunicações CTM, Smartone e Hutchison, conhecida pela marca 3, que permite que as concessionárias acabem com o serviço de 2G. A medida entra em vigor a partir de Agosto e responde a um pedido das concessionárias, que defendiam não haver procura para este serviço. Segundo o canal chinês da Rádio Macau, actualmente não há utilizadores da tecnologia 2G em Macau e 93 por cento dos utilizadores de telemóveis recorre à tecnologia 4G.
Sofia Margarida Mota SociedadeJogo | Morgan Stanley prevê que cotação do sector duplique até 2022 Um relatório da Morgan Stanley acerca da indústria do jogo de Macau indica que a capitalização das acções ligadas ao jogo duplique para o valor de 200 mil milhões de dólares americanos na bolsa de Hong Kong até ao final do ano de 2022. O mesmo documento aponta que as receitas brutas do sector possam atingir os 50 mil milhões de dólares americanos até à mesma data [dropcap]A[/dropcap]nalistas da Morgan Stanley apontam para a duplicação do capital do jogo de Macau cotado na bolsa de Hong Kong até ao final do ano de 2022, com valores na ordem dos 200 mil milhões de dólares americanos. A informação é dada pela GGRAsia tendo em conta um relatório da instituição financeira. Segundo a mesma fonte, trata-se de uma perspectiva optimista do mercado tendo em conta a reestruturação do sector em Macau e a possível concorrência que pode vir a ocorrer devido a abertura ao jogo noutras regiões da Ásia Pacífico. Em relação à concorrência no mercado, “a maior ameaça deve vir do Japão”, apontou a Morgan Stanley. No entanto, as preocupações não serão para já, até porque “o primeiro casino [japonês] pode não estar pronto antes de 2024”, refere a instituição financeira citada pela GGRAsia. Recorde-se que cinco das seis operadoras de casinos de Macau estão cotadas na Bolsa de Valores de Hong Kong. A Melco Resorts and Entertainment Ltd, apenas está cotada Nova Iorque, nos Estados Unidos. Apostas compostas De acordo com o mesmo relatório, as receitas brutas do sector podem chegar aos 50 mil milhões de dólares americanos até ao ano de 2022, implicando um crescimento anual de oito por cento. Os números são apoiados pelo desenvolvimento de infra-estruturas associadas ao jogo, ao aumento da oferta de quartos nos hotéis, ao crescente número de visitantes chineses e ao aumento do poder de compra destes turistas, aponta a mesma fonte. Os analistas indicam ainda que Macau está a iniciar um novo ciclo de crescimento idêntico àquele que terminou em 2014 em que o capital das operadoras de jogo atingiu um recorde de 196 mil milhões de dólares americanos. Nessa altura, a Melco Crown Entertainment Ltd ainda estava cotada na bolsa de Hong Kong apesar de a maior parte das transações serem efectuadas nas bolsas dos Estados Unidos da América. Actualmente, as receitas do jogo são fortemente sustentadas pelo sector VIP, apesar dos esforços por parte do Governo em incentivar as operadoras locais a diversificarem a oferta e a arrecadarem receitas através de outros serviços, salienta a pesquisa. “Neste ciclo [actual], pensamos que a qualidade do crescimento será melhor [do que foi até 2014], pois mais de 80 por cento do lucro previsto deve partir do segmento do mercado de massas”, afirmou a equipa de Morgan Stanley no relatório sobre Macau. Por outro lado, a abertura da Ponte HKMZ e a ligação ferroviária do continente a Hong Kong podem permitir um maior acesso dos turistas chineses ao território, salienta o mesmo documento. O relatório defende ainda que o risco associado ao término dos contratos de exploração de jogo é pequeno e afirma mesmo que é “improvável” um cenário em que sejam negadas licenças às operadoras de Macau ou que lhes sejam exigidas “taxas significativas para a renovação”.
Hoje Macau SociedadeSegurança Social | Governo injecta 7000 patacas nas contas individuais [dropcap]O[/dropcap] Governo vai voltar a injectar, este ano, 7.000 patacas nas contas individuais do regime de previdência central não obrigatório. A atribuição da verba, a título de repartição extraordinária de saldos orçamentais, consta de um despacho do Chefe do Executivo, Chui Sai On, publicado ontem em Boletim Oficial. Com esta nova verba, sobe para 74.000 patacas as contribuições do Governo para cada conta individual do regime de previdência central não obrigatório, no caso dos residentes permanentes abrangidos desde o início do programa e que não tenham efectuado qualquer levantamento desde então.
Hoje Macau SociedadePatrimónio intangível | Consulta pública termina quinta-feira [dropcap]O[/dropcap] Instituto Cultural está a organizar, até à próxima quinta-feira, uma consulta pública sobre as manifestações de património cultural intangível de Macau. As 12 manifestações recomendadas para inscrição na Lista do Património Cultural Intangível incluem: Ópera Yueju (Ópera Cantonense), Preparação do Chá de Ervas, Escultura de Imagens Sagradas em Madeira, Naamyam Cantonense (Canções Narrativas), Música Ritual Taoista, Festival do Dragão Embriagado, Crença e Costumes de A-Má, Crença e Costumes de Na Tcha, Gastronomia Macaense, Teatro em Patuá, Procissão de Nosso Senhor Bom Jesus dos Passos e Procissão de Nossa Senhora de Fátima. O processo de recolha de opiniões da população começou no passado dia 13 de Março.
Diana do Mar SociedadeAmianto | Proibida importação e trânsito a partir de hoje [dropcap]O[/dropcap] Governo decidiu proibir a importação e o trânsito de mercadorias contendo amianto. A interdição produz efeitos a partir de hoje. As medidas destinadas ao controlo da importação e trânsito de amianto, constantes de um despacho do Chefe do Executivo, publicado ontem em Boletim Oficial, têm como objectivo “assegurar a qualidade ambiental e a saúde da população, atendendo a razões de interesse público”. O amianto “pode ser desintegrado em fibras muito finas, que, depois da libertação, ficam a flutuar no ar por um longo período de tempo” e a “a inalação das mesmas provoca doenças graves, nomeadamente asbestose, cancro dos pulmões, mesotelioma e outras”, justifica o despacho, assinado por Chui Sai On, que elenca categorias de produtos que, a partir de hoje, não podem ser importados nem transitar pelo território. O despacho prevê excepções como, por exemplo, mercadorias destinadas a utilização em investigação laboratorial ou como padrões de referência, bem como para outras que satisfaçam requisitos. O Governo comprometeu-se a substituir, em 2019, todas as canalizações de amianto. Segundo a Direcção dos Serviços de Assuntos Marítimos e de Água (DSAMA), encontram-se actualmente, por substituir, tubos de aproximadamente 1,5 quilómetros, que representam 0,3 por cento do comprimento total da rede de distribuição de água. O amianto é uma fibra mineral natural, abundante na natureza, com propriedades físicas e químicas como resistência mecânica às altas temperaturas, durabilidade, facilidade de ser trabalhada como um tecido. Além disso, é um material de baixo custo.
Sofia Margarida Mota SociedadeSegurança alimentar | José Tavares alerta para riscos de compras online No capítulo da segurança alimentar, a compra online de alimentos é a principal preocupação do presidente do Instituto para os Assuntos Municipais. José Tavares aconselha os residentes a comprarem comida em lojas e mercados, especialmente produtos de risco como o marisco [dropcap]O[/dropcap]s produtos alimentares adquiridos online representam o maior desafio para Macau ao nível de segurança alimentar, pelo menos de acordo com o presidente do Instituto para os Assuntos Municipais (IAM), José Tavares. O responsável referiu esta preocupação ontem à margem da cerimónia de abertura da 51ª Conferência da Comissão do Código Alimentar que se realiza até ao próximo dia 13 no Hotel Studio City. “Acho que o nosso maior desafio agora é o facto de as aquisições serem demasiado sofisticadas, é tudo comprado online. Tudo o que é comprado online não é controlado”, apontou. Em causa está a aquisição de produtos frescos, especialmente mariscos. “Neste momento, fazemos um controlo sobre alguns produtos. Normalmente, são produtos com menos risco, por exemplo bolachas e chocolates. Agora coisas de alto risco, como sushi e ostras, são produtos que nos deixam mais preocupados. No entanto, o governante sublinhou os esforços feitos para controlar o nível de pesticidas nos alimentos. “Em 2018, atingimos um alto nível de qualidade dos produtos agrícolas em termos de utilização científica de pesticidas, de protecção do ambiente e de garantia de segurança na utilização de pesticidas. Vamos continuar a melhorar e a optimizar esta área”, apontou. Formação lusitana Para garantir a segurança alimentar dos produtos consumidos em Macau, o Governo estabeleceu vários protocolos com Portugal, nomeadamente com a Autoridade da Segurança Alimentar e Económica (ASAE), apontou ontem o presidente o Instituto para os Assuntos Municipais (IAM), José Tavares. Estas colaborações incluem acções de formação dadas pela entidade portuguesa. “Fazem-nos formação e também há uma cooperação”, referiu. A próxima visita da ASAE a Macau está prevista para Junho, acrescentou o responsável.
João Santos Filipe Manchete SociedadeAcusações contra empresa ligada a Onida Lam no MP A queixa de oito residentes contra a empresa TH Group foi reencaminhada pela Polícia Judiciária para o Ministério Público e está em fase de inquérito, segundo informação fornecida por ambas as instituições [dropcap]O[/dropcap] caso dos oito residentes que apresentaram queixa por burla contra a empresa TH Group, onde trabalha Onida Lam, irmã da deputada Agnes Lam, foi entregue ao Ministério Público (MP). A informação foi avançada pela Polícia Judiciária (PJ), na terça-feira passada, que já tinha admitido estar a investigar a situação que envolvia 5,36 milhões de patacas. “O caso foi entregue ao Ministério Público”, respondeu fonte da PJ ao HM, quando questionada sobre o andamento do caso. Também o MP confirmou que está a decorrer uma investigação: “Vimos por este meio informar que o caso está em fase de inquérito, pendente de decisão”, respondeu o organismo liderado por Ip Son Sang, ao HM, numa resposta com a data de quarta-feira passada. Por sua vez, a empresa TH Group optou por não comentar a situação remetendo a seguinte resposta ao HM, na passada quinta-feira, em que refere o segredo de justiça: “Seguindo os conselhos da nossa equipa legal, o processo, como mencionado, está sob investigação o que significa que ninguém PODE falar sobre ele (ou prestar quaisquer declarações sobre ele). Neste caso, a nossa companhia e os órgãos de comunicação têm de seguir esta lei, especialmente se houver qualquer publicação que possa ser interpretada como difamação para a TH Group”. No email endereçado ao HM foi ainda deixada uma recomendação: “Sugerimos vivamente ao vosso jornal que suspenda a publicação, para evitar qualquer violação da lei”, consta na resposta enviada, em inglês. O facto de um processo estar em fase de inquérito não significa que a empresa é culpada. Durante esta fase as autoridades limitam-se a analisar o caso a fim de decidirem se existe matéria de facto para uma acusação formal ou se o inquérito é arquivado. Foi em Setembro de 2018 que o caso veio a público, depois de ter sido inicialmente reportado pela MASTV. Com recurso a depoimentos anónimos, a estação de televisão avançou que 56 residentes tinham sido alegadamente burlados, após terem investido, cada um, entre 600 mil e 800 mil dólares de Hong Kong num projecto de imobiliário na Indonésia. Os investimentos teriam sido alegadamente feitos através da representação de Macau da empresa TH Group, que, segundo o portal da companhia, tem Onida Lam como directora de operações no território. Segundo as condições relatadas pela MASTV, a troco do investimento no projecto que fica na Ilha de Bintão, os investidores ficavam com as fracções ou poderia arrendá-las, com um retorno que poderia chegar a 200 por cento do montante investido. Fraudes negadas Após a divulgação das notícias, a empresa TH Group recusou a existência de fraude e num comunicado, que também foi assinado por Onida Lam, reservou o direito de processar quem fizesse alegações deste teor. Na mesma reacção, foram também pedidas provas sobre um alegado envolvimento dos serviços consulares indonésios. “Os entrevistados e a MASTV devem fornecer a carta oficial do Consulado Geral da Indonésia em Hong Kong com as alegações dos contratos mencionados, assim como prova de que os contratos são ilegais”, foi referido, na altura. “Caso contrário, a empresa reserva o direito de agir legalmente contra as pessoas e o órgão de comunicação social”, foi acrescentado. No mesmo documento, a empresa TH Group e Onida Lam negaram ainda qualquer envolvimento da deputada Agnes Lam no projecto, e prometeram agir, face a eventuais danos causados à família da legisladora. Dias depois, a PJ confirmou que havia uma investigação em curso, após uma queixa de oito residentes e que envolvia 5,36 milhões de patacas.
Hoje Macau PolíticaCooperação | Chui elogia Xangai na divulgação de português [dropcap]O[/dropcap] Chefe do Executivo, Chui Sai On, elogiou ontem o papel de Xangai nas áreas de formação em língua portuguesa, durante um encontro com a presidente do Comité Permanente da Assembleia Popular Municipal de Xangai, Yin Yicui. O “Chefe do Executivo referiu ainda que as relações bilaterais entre Macau e Xangai são duradouras, tendo os dois lados consolidado ao longo do tempo a cooperação nas áreas de formação em língua portuguesa, acções de formação para trabalhadores da administração pública, desporto, turismo e assuntos juvenis”, pode ler-se num comunicado, sobre o encontro que decorreu no Palácio do Governo. Por sua vez, Yin Yicui afirmou vir à Grande Baía para aprender com o plano geral para esta zona e afirmou que o posicionamento de Macau como “um Centro, uma Plataforma, uma Base” pode criar mais oportunidades de desenvolvimento.
Sofia Margarida Mota PolíticaPereira Coutinho quer mais cooperação com hospitais estrangeiros [dropcap]J[/dropcap]osé Pereira Coutinho questiona o Governo sobre apoios dados a residentes que se vejam na necessidade de recorrer a hospitais fora do território. Em interpelação escrita, o deputado que preside à Associação dos Trabalhadores da Função Pública de Macau (ATFPM) começa por questionar o Executivo acerca das medidas que tenciona tomar para “simplificar, melhorar e acelerar o processo administrativo do envio de pacientes para serem tratados nos hospitais púbicos de Hong Kong”. O deputado vai mais longe e quer saber se existem planos no mesmo sentido para o acesso aos hospitais privados da região vizinha. Singapura e Tailândia também estão nos planos do deputado que questiona se é possível estabelecer protocolos no âmbito da saúde com instituições destes países de modo a permitir o acesso de residentes a cuidados prestados naquelas regiões, principalmente para aqueles que se encontrem em viagem. Na missiva, o deputado não deixa de elogiar o Executivo que anunciou recentemente a intenção de promover a transferência de pacientes entre os hospitais das regiões que integram o projecto de cooperação regional da Grande Baía. “Trata-se de uma medida muito positiva, porque, de facto, desde o estabelecimento da RAEM recorrem aos cuidados de saúde da vizinha Hong Kong face à saturação do hospital público e aos custos elevados praticados pelos hospitais privados da RAEM”, aponta o deputado.
João Santos Filipe PolíticaCibersegurança | 1,4 milhões SIM vão ter de ser registados em quatro meses Quando a Lei da Cibersegurança entrar em vigor os cidadãos vão ter 120 dias para registar cartões SIM pré-pagos. Caso não o façam, os cartões serão cancelados pelas operadoras [dropcap]C[/dropcap]om a implementação da nova Lei da Cibersegurança cerca de 1,4 milhões de cartões SIM vão ter de ser registados com a informação dos respectivos utilizadores. O número de cartões SIM cedidos no território foi divulgado pelo presidente da 1.ª Comissão Permanente da Assembleia Legislativa, Ho Ion Sang, que ontem se voltou a encontrar com o secretário Wong Sio Chak, para discutir uma nova versão do diploma. “No futuro, em relação aos cartões SIM pré-pagos, estava previsto que houvesse um prazo de 60 dias para fazer o registo. Mas foi alterado para os 120 dias. Segundo o Governo, há 1,4 milhão de cartões vendidos em Macau”, começou por contar Ho Ion Sang, presidente da comissão. “O registo vai ser feito junto dos Correios e também nas lojas, através da rede informática. Mas considerámos que era necessário mais tempo [do que os 60 dias] porque os Serviços de Correios e Telecomunicações (CTT) não têm uma estrutura como, por exemplo, os Serviços de Migração. O Governo aceitou a sugestão”, acrescentou. Desta forma, quando a lei entrar em vigor, quem tiver cartões pré-pagos vai ter de fazer o registo dos mesmos. Quem não o fizer terá o cartão cancelado. O mesmo acontece na compra de um novo cartão SIM, que vai passar a exigir a disponibilização de alguns dados pessoais, como a identificação. Em relação aos trabalhos com o Governo na discussão deste diploma, Ho elogiou a postura de “abertura” encontrada e afirmou que os deputados da comissão ficaram “satisfeitos” com os resultados obtidos. Neste aspecto, o presidente considerou que há garantias que a liberdade de expressão fica protegida e que as competências das entidades envolvidas na monitorização do tráfego de dados nas redes de comunicações ficaram definidas. Acesso ao conteúdo Ainda no que diz respeito à monitorização das actividades nas redes de comunicação, o presidente da comissão da AL voltou a insistir que não haverá acesso ao conteúdo por parte do Centro de Alerta e Resposta a Incidentes de Cibersegurança, que vai ser coordenado pela Polícia Judiciária. “É a PJ que vai fazer a monitorização dos dados, mas estes vão ser puramente linguagem mecânica”, apontou. Caso haja uma investigação em curso os dados guardados podem ser acedidos. No entanto, esta situação apenas poderá ocorrer com autorização de um juiz, à semelhança do regime actual adoptado para as escutas telefónicas, uma realidade que não tem relação directa com o diploma da cibersegurança. “A consulta dos conteúdos tem de seguir o que está previsto nas outras leis. É um regime que se encontra em vigor e esta lei [da Cibersegurança] não alarga a competência da PJ nesta área”, garantiu Ho Ion Sang. Por outro lado, ficou definido no novo documento que a Comissão Permanente de Cibersegurança – organismo que aplica medida excepcionais em causa de ataques ou situações anómalas – vai ser liderada pelo Chefe do Executivo e que integra igualmente todos os secretários.
Diana do Mar Manchete ReportagemAdopção | Dois lados de histórias de família Em quase 20 anos, foram adoptadas em Macau menos de 40 crianças. Uma mãe e uma filha partilham a experiência de adoptar e ser adoptado, vivida por poucos numa terra onde ainda há caminho por desbravar [dropcap]T[/dropcap]alvez tenha sido o destino, mas Mariana também não sabe. Certo é que, contra todas as probabilidades, regressou a Macau, a terra que a viu nascer há 20 anos, para estudar a língua e descobrir a cultura associada aos traços chineses que lhe talham o rosto de menina. Mariana Vivas foi adoptada sensivelmente um ano depois de ter nascido, mas desde que abriu os olhos esteve sempre nos braços daquela a que viria a chamar mãe. “Eu nasci em Fevereiro de 1999, ela ficou como minha tutora durante um ano e a adopção foi declarada pelo tribunal apenas em Março de 2000”. Um hiato temporal que coincidiu precisamente com a transferência do exercício de soberania que, aliás, esteve em vias de pôr em causa o pedido de adopção. “Tenho de admitir que me considero muito sortuda”, graceja Mariana Vivas que, aos cinco meses, foi viver para o Ribatejo, porque a mãe, solteira, queria que crescesse em Portugal com a família. Foi em Almeirim que Mariana passou a infância e a adolescência, sem nunca franzir a sobrancelha à imagem que via diante do espelho. “Às vezes até eu me esqueço que sou chinesa”, brinca Mariana, relatando que sempre soube dar a volta a troças na escola. “Tinha personalidade para ultrapassar isso”, diz, confiante. O facto de ser adoptada “nunca foi uma questão ou algo do outro mundo”. A descoberta foi ainda em tenra idade, surgindo com as primeiras noções dadas na escola sobre donde vêm os bebés: “Perguntei à minha mãe como era quando estava na barriguinha dela e ela respondeu que eu nasci na barriguinha de outra senhora”. Mariana ficou “a pensar”, mas a sua principal preocupação não era ter sido adoptada, mas antes saber se a melhor amiga também o era. “Ela era o meu modelo, eu queria ser em tudo como ela, ter tudo o que ela tinha e, por isso, a minha reacção foi perguntar se ela também tinha sido adoptada. Por acaso, tinha”, enfatiza. Embora sempre de bem com as origens, Mariana, que celebra dois aniversários (o de nascimento e o da adopção), confessa que só compreendeu na perfeição quão “importante” e “séria” era a adopção aos 14 anos. “A minha mãe ofereceu-me uma caixinha, com fotografias e cartas da minha mãe biológica [em chinês, depois traduzidas para inglês], e com os documentos todos do processo do tribunal. Fiquei a saber mais da minha história, porque na altura quase não sabia nada da minha mãe biológica”. Nos primeiros anos de vida, Mariana recebia postais da mãe biológica pelo aniversário ou pelo Natal, mas depois esse contacto cessou. “Para mim é uma pessoa que, de certa forma, parece estranha. Nunca a vi e não sinto nenhuma conexão em especial quando vejo as fotografias. As cartas também nunca referiram nada sobre um reencontro, apenas explicavam a razão pela qual não podia ficar comigo”, conta. “Muitas pessoas perguntam-me se gostava de conhecer a minha mãe biológica. Se eu um dia tiver a oportunidade, claro que a aceito, mas caso contrário não me faz confusão. Há sempre uma curiosidade, mas não é algo muito muito forte”, partilha. À terceira de vez Mariana veio a Macau pela primeira vez há dez anos, com a mãe, a melhor amiga e a mãe da melhor amiga. Seguiu-se uma segunda viagem, em 2015, desta feita apenas com a melhor amiga. Foi, aliás, a primeira vez que saiu de Portugal sozinha. Dois anos depois, em 2017, veio ‘definitivamente’ para estudar mandarim no Instituto Politécnico de Macau, eventualmente outra obra do acaso. Mariana estudou ciências, sempre esteve inclinada a enveredar pelas engenharias, mas quando surgiu a informação sobre o curso lançou-se sem medos, apoiada também na bolsa de estudos. “Uma coisa que me chamou a atenção e uma das razões para vir foi ser em Macau, o que me permitia conhecer um pouco da minha história”. A reacção maternal foi a típica de uma mãe: “Inicialmente, ela estava um pouco apreensiva, com medo de que a minha escolha tivesse sido tomada por impulso e que eu não estivesse a pensar no meu futuro, mas só na parte económica [por ter uma bolsa de estudo] sempre sem me querer tirar o entusiasmo”. Luz ao fundo de túnel Entusiasmo é a palavra quando Rita (nome fictício) fala da filha, apressando a exibir com orgulho as fotografias da sua pequena de três anos e meio. Rita, natural de Macau, que prefere falar sob a condição de anonimato, casou em 1999 e sempre quis ter filhos. Esperou durante anos, mas natureza não quis e a possibilidade de engravidar com a ajuda da ciência foi sempre uma carta fora do baralho. “Somos católicos e não queríamos fazer nada contra a vontade de Deus”, explica. A hipótese de adoptar surgiu quando a notícia de uma bebé abandonada num caixote do lixo mexeu com Rita que, pouco tempo depois, decidiu contactar o Instituto de Acção Social (IAS) para se inteirar dos procedimentos. Sete meses depois, Rita tornava-se mãe. “Estávamos no festival do meio outono, em 2016, quando ela veio para nossa casa”, conta. Rita reconhece que o processo foi “bastante rápido” para a média normal, algo que, a seu ver, pode ter que ver com o facto de não terem imposto requisitos em termos de nacionalidade, atendendo a que a menina não é chinesa. “Os chineses têm dúvidas em adoptar crianças estrangeiras. Penso que é algo cultural, porque temem que as gerações mais antigas – como os avós – possam não aceitar”, contextualiza. Importante a facilitar o processo foi também o papel da mãe biológica que não abandonou a criança, mas antes prescindiu da guarda quando ainda estava grávida. “Ela deixou os papéis todos preenchidos, tudo tratado. Ela fez algo pela criança. Se não a amasse provavelmente teria abortado. Foi um acto de amor”, realça. Rita vê a adopção como “uma bênção”. “É realmente algo muito bom e bonito. Não apenas para a criança, mas também para os pais”, sublinha, sem esconder o desejo de adoptar outra criança. “Estou à espera que a minha filha me peça um irmão para avançar”, graceja Rita, hoje com 47 anos. A experiência relativamente ao processo de adopção foi positiva, mas Rita entende que existem melhorias que podem ser feitas pelo IAS sobretudo ao nível da informação. “Era bom haver seminários e aconselhamento para quem quer adoptar – tanto antes como depois”, sugere. Em defesa da criança Em entrevista ao HM, a chefe de divisão de Serviços para Crianças e Jovens do IAS, Christine Lao, defende que, comparativamente a outros países e regiões, a parte burocrática, além de gratuita, é “muito simples e prática”, algo corroborado, aliás, por pais adoptivos. O incógnito tempo de espera surge, porém, como um dos pontos apontados por quem aguarda por acolher uma criança. No entanto, como explica o IAS, afigura-se difícil definir uma meta temporal, sobretudo porque “em Macau “existe um número reduzido de crianças abandonadas”. “Sabemos que os futuros pais querem que o seu desejo seja concretizado o mais rapidamente possível – e compreendemos isso –, mas têm de estar cientes das diferentes etapas [VER TABELA] e que é difícil calcularmos o tempo da fase de espera”. Como realçou a responsável do IAS, desde 2000, houve anos sem registo de adopções, mas também outros com quatro, como em 2012, por exemplo. “A postura do IAS é a defesa do interesse superior da criança. Nós ajudamos as crianças a encontrar pais e não o contrário, pelo que as expectativas dos candidatos não são o factor mais importante a ter em conta”, sublinha Christine Lao. Desde a transferência do exercício de soberania, 68 menores foram encaminhados para o IAS, dos quais 14 regressaram à família de origem, deixando de ser classificadas como abandonadas. Das 54 crianças, 38 reuniam condições para ser adoptadas, segundo decretou o tribunal, e foram-no efectivamente ao longo dos últimos 19 anos. Actualmente, há oito crianças para a adopção: uma já concluiu a fase experimental, estando a aguardar que o tribunal a decrete, duas estão na fase experimental, enquanto três encontram-se na etapa de emparelhamento, havendo ainda duas crianças com necessidades especiais sem futuros pais à vista. De acordo com o IAS, entre as crianças abandonadas, quatro saíram da lista de potenciais adoptandos por terem atingindo os 16 anos, enquanto outro menor expressou a vontade de não ganhar uma nova família. Neste momento, existem 70 pedidos de adopção de famílias/indivíduos de Macau, a somar a cinco de estrangeiros, que não residem no território. Condições para adoptar Casais: – Devem ter mais de 25 anos, casados há mais de três anos ou a viver em união de facto há mais de cinco Solteiros: – Deve ter mais de 28 anos e menos de 60 anos à data em que o adoptando lhe for confiado; a diferença de idades entre o adoptante e o adoptado deve ser superior a 18 anos e inferior a 50 Condições para ser adoptado: -Quem seja filho de pais incógnitos ou falecidos Aquele relativamente ao qual tenha havido consentimento prévio para a adopção Quem tenha sido abandonado pelos pais A pessoa, cujos pais, por acção ou omissão, ponham em perigo a sua segurança, saúde, formação moral ou educação em termos que, pela sua gravidade, comprometam seriamente os vínculos afectivos próprios da filiação Quem tenha sido acolhido por uma pessoa ou por uma instituição, contando que os seus pais tenham revelado manifesto desinteresse pelo filho, em termos de comprometer seriamente os vínculos afectivos próprios da filiação durante, pelo menos, os seis meses que precederem o pedido de confiança Etapas do processo Apresentação da intenção de adopção ao IAS Avaliação para a adopção Escolha do adoptando Período de pré-adopção Sentença judicial Duas centenas de crianças vivem em lares, mas têm família Actualmente, há sensivelmente 200 crianças a viver em lares, mas que não se encontram disponíveis para adopção. Parte figuram como ‘crianças de ninguém’: os pais não cuidam (porque não podem ou não querem) mas também não abrem mão da guarda dos filhos. Em entrevista ao HM, a chefe de divisão de Serviços para Crianças e Jovens do Instituto de Acção Social (IAS) deixa claro que cada é um caso. “Essas crianças que vivem nos lares encontram-se em situações diferentes, mas a maioria vive num lar por os progenitores terem dificuldades em cuidar delas”, explicou Christine Lao. As razões por detrás são da mais variada ordem, desde problemas financeiros a problemas de saúde. Também há crianças cujos pais não se encontram em Macau e que não têm mais ninguém com quem ficar, bem como outros que têm os progenitores presos ou a braços com problemas como a droga. Estes cenários levam a que “pais e filhos se separem temporariamente”, mas o objectivo último é que, uma vez solucionados os problemas, possam regressar a casa e, mais importante, à família. Linha vermelha No entanto, nem sempre tal sucede, existindo crianças no paradoxo de terem uma família que não abdica de si, mas que a deixa crescer num contexto institucionalizado. Se bem que, “em nome do interesse superior da criança”, o ideal será que volte ao seio da própria família, o IAS observa que existe uma ‘linha vermelha’. “O IAS tenta sempre manter o contacto com os pais/familiares das crianças. Quando deixam de contactar ou de visitar os filhos durante mais de seis meses, conforme a lei, o IAS pode entrar em contacto com o Ministério Público que vai inteirar-se da situação e ver se a melhor solução é a adopção. Se assim o entender, vai propor ao tribunal que, após estudar o caso, decide se decreta ou não a criança como abandonada, qualidade necessária para se considerar que reúne condições para ser adoptada”, esclareceu Christine Lao. Embora sem dispor de números concretos, o IAS estima que, desde 2000, tenha havido uma dezena de casos em que tal sucedeu. As crianças podem viver num lar até aos 18 anos. As outras mães Depois de conquistas quanto à possibilidade de menores de 18 anos entregarem os filhos para adopção, a directora do Centro Bom Pastor, Juliana Devoy, espera agora mudanças relativamente às grávidas não residentes. É um dos pontos na agenda do Grupo de Acção para a Adopção, fundado em 2017, por Juliana Devoy, para evitar “histórias tristes” como a da trabalhadora birmanesa, de 27 anos, que se encontra actualmente em prisão preventiva, após ter dado à luz na casa-de-banho dos patrões e abandonado o recém-nascido na varanda “por pânico”. “Do que tem sido a nossa experiência, se a mãe não for residente tem de levar o bebé para o seu país de origem, mas parece tão injusto. Em Hong Kong, por exemplo, podem dar o bebé para adopção se assim o entenderem”, realça Juliana Devoy. “Pedimos ao Instituto de Acção Social [IAS] para ver se há formas de resolvermos este problema, para olhar para estes casos”, apontou ao HM. Para a directora do Centro Bom Pastor, os ventos que correm auguram sinais positivos: “O IAS tem estado muito interessado nas mulheres grávidas – independentemente da idade – e abertos às nossas sugestões”. “Estou contente com os progressos significativos, apesar de não podermos mudar do dia para a noite uma cultura”, realçou Juliana Devoy, referindo-se à recente conquista relativamente às menores de 18 anos. “O IAS mudou a atitude e, no ano passado, duas jovens de 15 anos puderam entregar os filhos para adopção sem problemas, porque o IAS compreendeu a importância de uma criança ser integrada, o mais cedo possível, no seio de uma família”, observou. A lei não o proibia, mas a política do IAS durante anos foi a de seguir a posição de um juiz que entendia que uma grávida com menos de 18 anos era muito imatura para estar em condições de decidir dar o filho para a adopção. “Como resultado, houve muitas histórias infelizes”, destacou a directora do Centro do Bom Pastor, radicada em Macau há 30 anos. “Não sou ‘naive’ ao ponto de pensar que vamos conseguir grandes mudanças, mas o essencial é que temos avançado”, afirmou Juliana Devoy, elogiando o trabalho da chefe de divisão de Serviços para Crianças e Jovens do IAS, que tem, aliás, participado nas actividades promovidas pelo Grupo de Acção para a Adopção. “A Christine [Lao] tem uma mente muito aberta e feito o seu melhor”. Na agenda do Grupo de Acção para a Adopção figura também a intenção de promover o ‘foster care’, ou seja, o conceito de famílias de acolhimento, que possibilita que uma criança seja acolhida temporariamente, em vez de estar numa instituição. “Não há esse tipo de política, mas podia haver. Claro que há uma grande diferença em relação à adopção, mas também permite que seja providenciada uma família a crianças que estão em lares”, destacou. Acelerar processos Em termos genéricos, Juliana Devoy entende que os procedimentos da adopção devem ser acelerados para que as crianças cheguem o mais rápido possível às famílias que tanto os desejam. “Antigamente, segundo os relatos que ouvia, os candidatos sentiam-se muito desencorajados com a resposta do IAS quando não havia bebés disponíveis para adopção. O processo ainda é lento, mas se houver uma avaliação antecipada [dos candidatos], mal haja crianças, pode ser logo activado em vez de demorar meses. Tenho membros da minha família que foram adoptados logo na maternidade”, exemplificou.