HRW pede libertação de Wang Yi, pastor protestante de Chengdu

Wang Yi, líder de uma das mais importantes igrejas protestantes da China, foi detido, assim como crentes católicos, no início desta semana. A Human Rights Watch exige a libertação do homem conhecido pelas suas posições críticas do Partido Comunista Chinês

 

[dropcap]E[/dropcap]ntre domingo e segunda-feira as autoridades chinesas levaram a cabo a busca e detenção de várias pessoas ligadas à Early Rain Covenant Church, localizada em Chengdu e tida como uma das mais importantes igrejas protestantes da China. Com 500 membros, esta igreja é considerada subversiva porque não está registada junto das entidades oficiais.

A Human Rights Watch (HRW) reagiu ontem ao caso exigindo a libertação do pastor e líder da igreja Wang Yi, que está acusado de “incitar à subversão do poder do Estado”, de acordo com uma carta que as autoridades enviaram para a sua mãe.

“As autoridades chinesas deveriam libertar imediatamente o pastor e outros membros de uma igreja protestante independente situada em Chengdu. As autoridades deveriam também devolver todas as propriedades da igreja e permitir aos seus membros regressar aos trabalhos religiosos”, escreveu a HRW, que volta a acusar a China de não respeitar o direito à liberdade religiosa no país.

“O encerramento da igreja protestante em Chengdu enfatiza as recentes acções de assalto do Governo de Xi Jinping no que diz respeito à liberdade religiosa na China”, disse Yaqiu Wang, investigador da HRW. “É irónico o Governo afirmar que respeita as crenças religiosas da população”.

Outro dos detidos foi Li Yingqiang, ancião da igreja. A sua esposa recebeu informações da polícia chinesa que apontam que este foi preso por “provocar desacatos e distúrbios”. Contudo, os familiares de cerca de uma centena de pessoas detidas não receberam quaisquer informações sobre a sua prisão ou estado de saúde.

A HRW escreve que “a igreja é considerada subversiva porque não está registada junto do Governo local”. Alguns dos detidos, entretanto libertados, denunciaram situações de tortura perpetrados pelas autoridades.
“Alguns membros da igreja, libertados horas mais tarde, disseram que a polícia os agrediu. Um deles relatou que foi atado a uma cadeira e privado de comida e bebida durante 24 horas. Dezenas de membros da igreja permaneceram sob custódia policial.”

Além das detenções, as autoridades chinesas terão feito buscas nas casas dos membros da igreja, além de terem selado várias propriedades pertencentes à igreja protestante, tal como escritórios, um jardim de infância e o colégio bíblico.

A HRW aponta ainda que “a polícia forçou os membros da instituição a assinar um juramento onde prometem que não voltarão à igreja e que não podem mais ter acesso às suas propriedades”. Além disso, as contas que a Early Rain Covenant Church detinha na rede social WeChat foram removidas.

Uma voz crítica

Wang Yi, um dos mais importantes membros da comunidade cristã na China, é também académico na área do Direito. De acordo com a HRW, é conhecido no país pelos seus “sermões apaixonados e críticos do Partido Comunista Chinês (PCC)”.

Pouco tempo antes da sua prisão, Wang Yi publicou um ensaio crítico do controlo rígido da religião por parte do Governo chinês, uma vez que vários cristãos chineses têm sido acusados do crime de desobediência civil. As autoridades têm aplicado ordens como a proibição de rezar fora das igrejas e a proibição do acesso das crianças à igreja.

Dois dias depois da publicação desse ensaio, o pastor foi detido, não sem antes partilhar na internet uma carta aberta onde afirmou recorrer “a todos os meios pacíficos para resistir a todas as medidas governamentais e judiciais que perseguem a igreja e interferem com as crenças cristãs”.

“Na base do ensinamento da Bíblia e na missão de pastor, respeito as autoridades que Deus estabeleceu na China. Como pastor numa igreja cristã, tenho os meus próprios entendimentos e visões, baseados na Bíblia, sobre o que é um bom Governo e qual a ordem certa que deve tomar. Ao mesmo tempo, sinto-me zangado e revoltado com a perseguição que esta igreja tem sido alvo por parte do regime comunista, com a maldade de privar as pessoas da sua liberdade de religião e consciência”, escreveu Wang Yi.

Esta não é a primeira vez que a Early Rain Convenant Church é alvo de perseguições. O comunicado de ontem da HRW dá conta de que este ano a igreja lançou uma petição de protesto contra as novas regras incluídas no documento oficial do Conselho de Estado chinês que regula as práticas religiosas.

A petição apontava o dedo à proibição de “ensinamentos religiosos ‘não autorizados’ e à participação em acções de formação religiosa no estrangeiro”, além de ter sido expandido “o papel das autoridades locais no controlo das actividades religiosas”.

Para a HRW, “as regulações vieram aumentar mais o controlo religioso que existe na China, que tem vindo a restringir a prática de apenas cinco religiões reconhecidas oficialmente, de acordo com regras previamente estabelecidas, de entre outras restrições”.

A petição juntou mais de 400 assinaturas de pastores em toda a China, o que levou a detenções em massa, estima a HRW. Em Setembro deste ano, as autoridades de Chengdu já tinham informado a igreja de que as suas actividades estavam a violar as medidas em vigor.

O apoio ao PCC

A detenção de Wang Yi surge numa altura em que se fala de um maior controlo das religiões existentes no país por parte do Governo de Xi Jinping. A ideia, escreve a HRW, é levar a que essas religiões adoptem as “características chinesas”. “Por outras palavras, o que se pretende é que os grupos religiosos são apoiados pelo PCC e Governo chinês.”

Neste sentido, “as autoridades têm demolido centenas de igrejas católicas, destruído cruzes, despejado congregações, confiscado bíblias e outros materiais religiosos, e instalado câmaras de videovigilância nas igrejas para vigiar o seu funcionamento”.

Desde Abril que as vendas online da Bíblia estão proibidas na China, além de que em Setembro, as autoridades de Pequim encerraram a igreja Zion, uma das instituições independentes de maior dimensão da cidade e ligada à religião protestante.

À espera de esperança

Apesar de, em Setembro deste ano, a China e o Vaticano terem selado um acordo histórico para o reconhecimento da figura do Papa no país, a HRW considera que há ainda muito a fazer para travar as perseguições a bispos e pastores.

“Muitos tinham a esperança de que o novo acordo trouxesse o fim às perseguições de bispos de igrejas independentes, mas em Novembro as autoridades de Zhejiang forçaram o desaparecimento do bispo Shao Zhumin, sendo este o seu quinto desaparecimento. O seu paradeiro actual continua a ser desconhecido”, aponta a HRW.

Em Março, o pastor John Sanqiang Cao foi condenado a sete anos de prisão por “organizar travessias ilegais na fronteira” entre a China e o Myanmar, quando estavam em causa projectos educacionais virados para minorias étnicas da antiga Birmânia. Em 2014, o pastor Zhang Shaojie foi condenado a 12 anos de prisão pelos crimes de “fraude” e “reunião de multidões para distúrbio da ordem pública”.

Além do cristianismo, as autoridades chinesas também criaram restrições adicionais a práticas budistas tibetanas e reforçaram o controlo do exercício de práticas religiosas na região muçulmana de Xinjiang.

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