Manchete SociedadePonte HKZM | Entre receios de investimento perdido e o desenvolvimento do Delta do Rio das Pérolas João Santos Filipe - 23 Out 201831 Out 2018 A ponte em Y teve um custo superior a 20,65 mil milhões de renminbis e é inaugurada esta manhã. Xi Jinping é esperado na cerimónia de abertura, mas as regiões de Macau e Hong Kong devem ficar de fora do roteiro do Presidente chinês [dropcap]O[/dropcap]u um elefante branco ou o motor do desenvolvimento da margem Oeste do Delta do Rio da Pérolas, que pode ser uma grande esperança para as províncias de Zhongshan, Foshan, Jiangmen e Zhaoqing. Em relação a Macau, as expectativas são mais moderadas, poderá haver um impacto positivo no transporte de produtos, mas no turismo as esperanças deverão ser mais moderadas. É esta a opinião das pessoas ouvidas pelo HM, face às expectativas para a Ponte Hong Kong-Zhuhai-Macau, que teve um custo superior a 20,65 mil milhões de renminbis. Só os cofres da RAEM entraram com um montante de 2,6 mil milhões de renminbis, o equivalente a 12,59 por cento. “A ponte vai ser muito mais importante para Hong Kong do que para Macau. Aqui, o jogo é a principal indústria, mas o território já recebeu no ano passado cerca de 32 milhões de turistas, por isso não é plausível que o número cresça muito mais, até pelos problemas que também causa aos residentes. Por isso, acho que a construção da ponte não vai trazer grandes mudanças”, disse Camões Tam, comentador e académico na Universidade Macau. Também sobre o turismo local, Bob McKercher, professor na área do turismo na Universidade Politécnica de Hong Kong, acredita que os efeitos serão moderados para Macau, uma vez que a cidade está bem servida com a ligação de barcos para Hong Kong. Contudo, admite que poderá haver algum impacto ao nível do turismo de excursões. “A maior parte do novo tráfego vai ser no sentido Hong Kong-Macau ou Zhuhai. Porém, não consigo imaginar que vá haver uma subida muito significativa no número de chegada de visitantes às duas regiões. Se olharmos para a alternativa do barco, acaba por ser mais rápida para quem pretende ir para o centro de Hong Kong, e também não é de excluir que tenha custos reduzidos”, explicou Bob McKercher, em declarações ao HM. “Mas no que diz respeito ao turismo, Macau vai beneficiar mais do que Hong Kong, porque tem cerca de meio milhão de habitantes, enquanto a RAEHK tem sete milhões”, acrescentou. No entanto, Éric Sautedé, comentador político, tem uma perspectiva diferente e acredita que poderá haver benefícios ao nível dos visitantes de Hong Kong, principalmente entre os que vivem nos Novos Territórios. “Os analistas que criticam o projecto por dizerem que a ligação através da ponte não vai ser mais rápida do que o ferry, talvez tenham razão, caso o objectivo seja ir para o centro de Hong Kong”, começou por reconhecer Sautedé. “Porém, a grande maioria dos habitantes de Hong Kong vive nos Novos Territórios ou Sha Tin, por exemplo, e essas pessoas passam a ter ligações mais rápidas 30 ou 45 minutos. Isto se tivermos em conta a necessidade de se deslocarem para o centro de Hong Kong para apanharem o barco”, defendeu. Em relação ao sector da logística e da importação e exportação de produtos, poderá haver benefícios no curto prazo, até porque grande parte dos produtos importados vêm de Hong Kong. Para os camiões o percurso fica mais reduzido. “O sector da logística vai ser o mais beneficiado, principalmente no que diz respeito à circulação de camiões entre as duas regiões. Não há dúvidas que vai haver benefícios e uma maior interligação”, apontou Bob McKercher. “Os benefícios no transporte de produtos para os sectores da hotelaria e da restauração vão deixar os proprietários muito contentes. Nesse aspecto a ligação é muito bem-vinda”, afirmou Éric Sautedé. Motor do desenvolvimento As regiões mais beneficiadas com a ponte poderão ser mesmo as que estão localizada a Oeste do Delta do Rio da Pérolas, como Zhongshan, Foshan, Jiangmen e Zhaoqing, e que fazem parte da Grande Baía. De acordo com esta perspectiva, as empresas em Hong Kong também terão muito a ganhar, uma vez que fica disponível uma nova zona para investimentos. “Em 1997, quando Hong Kong encomendou o “Estudo de Viabilidade Sobre Outras Ligações Transfronteiriças”, foi previsto que a maior parte da circulação de pessoas e produtos nas próximas duas décadas seria entre Hong Kong e as as zonas situadas a Leste do Delta do Rio das Pérolas. Foi isso que aconteceu”, indica Sautedé. “Com a nova ponte, as atenções vão ser focadas nas regiões na Zona Oeste, que à excepção de Zhuhai, onde houve um desenvolvimento mais acelerado, são áreas que ainda estão relativamente subdesenvolvidas. O movimento de produtos poderá alterar esta situação”, frisou. Camões Tam tem uma perspectiva semelhante e destaca as trocas de dois elementos fundamentais para o desenvolvimento: recursos humanos e capitais. “Vai ser muito importante para Hong Kong. As pessoas da RAEHK procuram neste momento novos mercados para investirem em Cantão e quando querem ir a locais como Zhongshan ou mesmo Zhuhai, não é fácil”, justificou. “Com a ponte haverá uma maior circulação de recursos humanos e capitais, que se espera que seja o motor para levar ao desenvolvimento da área Oeste do Delta do Rio das Pérolas e da Grande Baía. Esta é uma região subdesenvolvida face à zona Leste e o principal factor é a falta de infra-estruturas”, acrescentou. Elefante branco? Mas depois de um investimento de 20,65 mil milhões de renminbis para uma ponte que tem uma esperança de vida de 120 anos, será que o projecto arrisca mesmo ser um elefante branco? Para os analistas ouvidos pelo HM não há unanimidade, nem certezas. A falta de informação geral sobre o projecto também complica qualquer previsão. “No meu ponto de vista esta ponte vai ser um elefante branco. Acredito que são poucas as empresas que vão sentir os benefícios da ligação, apesar desse ter sido um dos argumentos para a construção. Mesmo nas comissões de discussão do projecto no Conselho Legislativo de Hong Kong houve várias dúvidas que ficaram sem resposta em relação ao retorno”, referiu Bob McKercher. “Há vários analistas que apontam que o projecto vai ser um elefante branco, e efectivamente é um ‘presente caro’, mas ainda não é possível ter qualquer certeza”, realçou Sautedé. “Por enquanto não é de admirar que possa haver essa opinião e que o projecto seja visto puramente como político, uma vez que as razões por trás do investimento e da construção da ponte não foram muito transparentes e a informação que existe não é actualizada”, destacou. Camões Tam também nega o cenário de uma infra-estrutura sem retorno, mesmo que não seja puramente financeiro: “Vai ser um projecto quase essencial para a Grande Baía. Talvez as pessoas de Macau não devam esperar grandes benefícios directos, mas em Hong Kong e Zhuhai vai ter um grande impacto”, sublinha. Independentemente de ser um elefante branco ou um projecto bem sucedido, a realidade é que durante esta manhã vai decorrer a inauguração da Ponte Hong Kong-Zhuhai-Macau. Depois de ontem ter passado o dia na Província de Cantão, inclusive na Ilha da Montanha, existe a expectativa que o presidente Xi Jinping esteja presente no momento que marca a concretização de um projecto que começou a ser sonhado ainda na década de 80. A circulação do trânsito começa amanhã de manhã, mas só para os veículos autorizados, uma vez que são necessárias licenças especiais para poder circular. Imprensa portuguesa excluída Os órgãos de comunicação social em língua portuguesa de Macau não foram convidados para a inauguração da Ponte Hong Kong-Zhuhai-Macau, que tem lugar hoje. Contactado pelo HM, o presidente da Associação de Imprensa em Português e Inglês de Macau (AIPIM), José Carlos Matias, afirmou que “a AIPIM é da opinião de que a generalidade dos órgãos de comunicação social, incluindo os jornais em língua portuguesa e inglesa, deviam ter oportunidade de marcar presença na abertura de um projecto tão importante para a região como a abertura da Ponte Hong Kong-Zhuhai-Macau”. “Consideramos que seria muito importante que os jornais pudessem estar no local para fazer a cobertura de modo a prestar um melhor serviço aos seus leitores e ao público que servem”, acrescentou José Carlos Matias. Xi Jinping na Ilha da Montanha O presidente Xi Jinping esteve em Hengqin, durante a tarde de ontem, onde visitou o Parque de Medicina Tradicional Chinesa, de acordo com a informação do China Daily. Esta é a primeira visita de Xi à Província de Cantão, desde Dezembro de 2012. No programa consta ainda a inauguração da Ponte Hong Kong-Zhuhai-Macau e, segundo o South China Morning Post, o Presidente da China visitará igualmente um centro de inovação em Qianhai, Shenzhen, naquela que era uma vila piscatória e se tornou na primeira Zona Económica Especial, aquando da abertura económica liderada por Deng Xiaoping. Cronologia da Ponte 1983 – Empresário Gordon Wu sugere construção de uma ponte ao longo do Delta do Rio das Pérolas 2002 Setembro – Encontro entre governantes de Hong Kong e do Interior da China decidem realização de estudo sobre viabilidade da ponte 2003 Agosto – Criado o Grupo de Coordenação Avançada para os Trabalhos da ponte, que inclui representantes dos governos de Cantão, Hong Kong e Macau 2004 – Concepção preliminar da ponte com a forma de Y 2008 Agosto – Governos acordam financiamento do projecto e responsabilidade de construção das diferentes partes 2009 15 de Dezembro – Cerimónia de arranque das obras de construção na parte do Interior da China 2010 Julho – Criada a Autoridade da Ponte HKZM 2011 Dezembro – Início das obras em Hong Kong, após um atraso causado pela necessidade de realizar estudos sobre o impacto ambiental 2016 Junho – Instalação da última torre do tabuleiro principal da ponte e início da colocação do asfalto 2016 Setembro – Conclusão das obras do tabuleiro principal da ponte 2017 Maio – Detenção de 21 pessoas ligadas à construção da ponte na parte de Hong Kong devido a irregularidades nos testes de segurança 2017 Junho – Conclusão das obras do túnel subaquático principal 2017 Julho – Conclusão da colocação do asfalto 2017 Novembro – Conclusão das obras de todas as estruturas 2017 Dezembro – Cerimónia de iluminação da ponte 2018 Março – Conselho de Estado autoriza a entrega da Zona de Administração de Macau na Ilha Fronteiriça Artificial à RAEM. Visita de Chui Sai On às instalações 2018 Junho – Finalização da inspecção das obras e entrega para gestão dos diferentes Governos 2018 23 de Outubro – Cerimónia de inauguração 2018 24 de Outubro – Abertura à circulação Os números da ponte 55,5 quilómetros; extensão da ponte 20,65 mil milhões; custo em reminbis do projecto 2,6 mil milhões; reminbis pagos pelo Governo de Macau 120 anos; vida útil da ponte 29.100 veículos; estimativa do número de a circular na ponte em 2030 126 mil; estimativa sobre o volume diário de passageiros em 2030 170 e 200 dólares de Hong Kong, preço para o percurso entre o centro das duas RAE no serviço de autocarro privado 60 e 70 patacas; preço pelos shuttles disponibilizados que fazem a ligação entre as diferentes fronteiras 420 mil toneladas de aço utilizadas 20 mortos, número de vítimas, 11 em Hong Kong e pelo menos 9 no Interior da China