Isabel Castro Manchete ReportagemAno Novo Chinês | O mundo em movimento Por estes dias, há milhões de pessoas a viajar na China. E para a China. Apesar das alterações sociais da última década, o ano novo lunar continua a ser a principal festa da família e ninguém quer estar longe de casa. Mesmo que o regresso signifique passar dias em comboios ou na estrada [dropcap style≠’circle’]N[/dropcap]ão deve ter mais de 20 anos e confessa que, na noite anterior à partida, não dormiu. É entrevistado pela Xinhua e conta que tem pela frente uma viagem de 41 horas. Vai de comboio ter com os pais, que “morreriam de saudades” se, por esta altura, não cumprisse o ritual da reunião familiar. O homem com quem a agência oficial conversa, logo de seguida, deve andar na casa dos 50. “Claro que tenho saudades de casa”, atira, com as malas na mão. Mostra para as câmaras o que transporta dentro de um saco. “Levo algumas frutas para a minha mãe, tudo importado”, diz, orgulhoso. “Ela já tem 80 anos e não tem dentes. Quero dar-lhe o que há de melhor.” Os dois entrevistados da Xinhua fazem parte de um grupo de milhões de pessoas que, nas vésperas do ano novo lunar, regressam à terra de origem. “Esta movimentação toda na China é a maior migração interna que se conhece da modernidade”, salienta Fernando Sales Lopes, historiador e mestre em Relações Interculturais. O modo como a China se desenvolveu nas últimas décadas, com o progressivo abandono das zonas rurais de pessoas que fugiram ao desemprego procurando trabalho nas áreas urbanas, contribuiu em muito para o fenómeno a que se assiste por estes dias. Aqueles que trabalham e vivem nas fábricas das zonas industriais do país voltam a casa, onde deixaram mulheres e filhos – às vezes, só os filhos. Números de Setembro do ano passado davam conta de que cerca de 61 milhões de crianças foram deixadas nas zonas rurais pelos pais que vão trabalhar nas grandes cidades. Depois há também os que estudam longe da terra natal e que regressam para a entrada do ano novo à mesa dos pais. A juntar ao grupo da migração, há ainda o da emigração. “Também se deslocam uns milhões do estrangeiro para irem para a China comemorar o ano novo com a família”, observa Sales Lopes. O ano novo lunar é também festejado fora do país. A data é assinalada em Singapura, na Malásia e noutros países com comunidades chinesas significativas. Londres e São Francisco reivindicam ter as maiores comemorações fora da Ásia. Quase um sexto da população mundial vive em festa a passagem de ano. Transportes da Primavera Voltemos à China. As autoridades previam para esta semana um dos grandes picos de viagem do “chunyun”, os 40 dias que compreendem o ano novo lunar e que, numa tradução literal, será qualquer coisa como “transporte da Primavera”. É durante esta semana que regressa a maior parte das pessoas que se encontra longe de casa. De acordo com as contas do Ministério dos Transportes, estima-se que, diariamente, sejam feitas mais de 80 milhões de viagens até à próxima sexta-feira. Na semana passada – a primeira do “chunyun” –, tinham sido contabilizados 520 milhões, o que equivale a um aumento anual de 3,1 por cento. Os comboios continuam a ser o meio de transporte favorito, até porque é aquele que fica mais em conta: houve um aumento de quase 22 por cento no número de bilhetes vendidos (61,7 milhões), ultrapassando assim alternativas como as viagens de autocarro ou de avião. Quanto aos fluxos rodoviários, o ministério diz que as viagens nas principais estradas do país devem aumentar entre oito a dez por cento a partir da próxima sexta-feira, dia em que entra em vigor a suspensão temporária da cobrança de portagens. Até ao dia 2 de Fevereiro, os automóveis não pagam nas auto-estradas, o que faz com que haja um aumento do trânsito um pouco por toda a parte. Pequim, Tianjin, a província de Hebei, o Delta do Rio Yangtze e, mais perto de nós, o Delta do Rio das Pérolas serão as zonas onde vai ser mais difícil circular, segundo as previsões do ministério. A Comissão Nacional da Reforma e do Desenvolvimento acredita que, este ano, vão ser feitas 2,98 mil milhões de viagens durante o período entre 13 de Janeiro a 21 de Fevereiro, o que representa uma ligeira subida em relação ao ano passado. Momento da renovação Na origem de toda esta movimentação na China está uma explicação de natureza cultural, uma noção cuja origem se perde no tempo. “É o ano novo, a festa da Primavera, é a renovação”, aponta Fernando Sales Lopes, traçando um paralelismo com o Natal. “Em todas as culturas é assim. O ano novo é sempre uma festa familiar. O nosso ano novo não é tão familiar quanto isso porque temos essa reunião da família uma semana antes, no Natal.” O ano novo chinês, acrescenta, “é uma Primavera, é preparar terras para a sementeira, é preparar tudo para o novo ano, para a abundância, é pedir tudo isso às divindades, pedir felicidade para a família e para que haja comida na mesa”. No tempo em que a China era mais rural, havia uma grande ligação à terra e isso percebia-se nos rituais associados à data. “Hoje uns estarão na terra, outros no meio urbano, e outros ainda estarão noutros sítios do mundo até porque, como sabemos, a emigração chinesa é muito grande”, salienta o investigador. A festa que aí vem “é um tempo também de respeito pelos ancestrais”. Tudo junto “leva a que seja a grande festa da comunidade chinesa”. O investigador, com obra sobre festividades chinesas, recorda que há outro momento do calendário importante para a família: a Festa da Lua. Ainda assim, não chega aos calcanhares do ano novo. Os quilómetros que se percorrem, as horas que se passam dentro de um comboio, o tempo de espera nas estações, muitas vezes em condições precárias, explicam-se pelo valor que é atribuído à família na China. E isto apesar de, com o crescimento económico e um ritmo de vida cada vez mais acelerado, a organização social do país estar a sofrer mudanças com consequências também para a relação dentro dos próprios núcleos familiares. “A família na China é muito valorizada. As famílias chinesas acabam por saber mais quem são e de onde vêm do que nós.” FERNANDO SALES LOPES, INVESTIGADOR “A família na China é muito valorizada. As famílias chinesas acabam por saber mais quem são e de onde vêm do que nós”, explica Sales Lopes. “Nós sabemos quem foi o avô e o bisavô, alguns saberão o nome do tetravô mas perde-se a história da família. Nas famílias chinesas não é assim.” O culto dos antepassados faz com que haja uma grande ligação ao clã e isso acontece independentemente do estrato social. “Poderá parecer algo exclusivo dos ricos, mas não é. Toda a gente tem o seu clã, toda a gente descende de determinado indivíduo que é muito conhecido, ou não, é conhecido na família, mas isso é um factor de união”, vinca o investigador. “A família é um factor muito importante para os chineses, apesar de, às vezes, não parecer, porque a forma como o expressam em público não é tão intensa como a nossa, com muitos beijinhos e abraços.” Os 40 dias de confusão De acordo com os arquivos da empresa pública de transportes ferroviários do país, a expressão “chunyun” surgiu pela primeira vez na imprensa chinesa em 1954, para descrever o trânsito intenso que, já à época, se verificava por esta altura do ano novo chinês. A China sofreu profundas mudanças desde então e também o modo como as autoridades lidam com o fenómeno da migração já não é o mesmo. “Lá vai o tempo em que o fim de ano chinês era comemorado em muito poucos dias. Aliás, era a única folga das pessoas, que trabalhavam o ano inteiro. Hoje é diferente”, diz Fernando Sales Lopes. A juntar à importância social da festa, está a questão económica, que não se deve apenas ao facto de o país ter uma classe média cada vez mais pujante. “A China enveredou por uma economia de mercado há já alguns anos e, a determinada altura, foi necessário acelerar o consumo interno. A razão para o aparecimento das semanas douradas está aí, na economia. Era preciso que o povo circulasse todo pela China para fazer despesa, para comprar coisas para levar para a família”, explica o investigador. Sales Lopes ressalva que não se trata da componente mais importante do ano novo chinês, mas é um aspecto que não pode ser ignorado. Os dias que dura o “chunyun” contemporâneo é ainda uma tentativa de evitar um caos ainda maior nas estações de comboios, de camionagem, nos aeroportos e nas estradas. “Por aqui temos meia dúzia de dias, na China são 40, o que é um período importante para as pessoas poderem movimentar-se. É muita gente a viajar”, sublinha. A rede ferroviária de alta velocidade e as novas tecnologias vieram minimizar o impacto, “mas é na mesma uma certa confusão, porque são milhões e milhões de pessoas”.
Andreia Sofia Silva PolíticaLicenças especiais | Governo nega ilegalidades, mas vai rever a lei de trânsito Os deputados afirmam que há motoristas não residentes a trabalhar em Macau com licenças especiais, mas o Governo nega. Ainda assim, o Executivo promete rever o regime das licenças especiais quando alterar a lei do trânsito rodoviário, por forma a aplicar sanções mais elevadas [dropcap style≠’circle’]H[/dropcap]á anos que o diploma que emite as licenças especiais de condução está por rever, mas o processo só vai avançar em simultâneo com a lei de trânsito rodoviário. A garantia foi dada ontem por Luís Gageiro, subdirector dos Serviços para os Assuntos de Tráfego (DSAT). “Pretendemos introduzir algumas multas. A sociedade pede a alteração da lei de trânsito rodoviário e vamos ponderar, aquando da revisão do decreto-lei (das licenças especiais), alterar também o diploma”, disse ontem Luís Gageiro na Assembleia Legislativa (AL). “O actual decreto-lei só prevê duas situações e isso origina zonas cinzentas. Já preparámos a revisão deste diploma”, explicou. “Na altura [ano de 2012] foi tomada uma nova decisão e foi concluída uma redacção do diploma. As matérias reguladas são complexas e este diploma das licenças especiais é complementar à lei do trânsito, e não contém normas sancionatórias. A nossa ideia é definir normas sancionatórias. Pretendemos ainda introduzir um mecanismo de quotas para evitar abusos”, adiantou Gageiro. A clarificação chegou em resposta à deputada Kwan Tsui Hang, que avançou com uma interpelação junto do Governo que dá conta da existência de condutores em Macau a trabalhar ilegalmente na posse de licenças especiais. O Governo nega essa realidade, tendo apresentado o número de fiscalizações efectuadas desde 2009, ano em que as licenças especiais começaram a ser emitidas. Actualmente existem 863 licenças especiais emitidas. “Verificou-se que todos os veículos fiscalizados tiveram registos de entrada e saída de Macau, e que não se verificou qualquer situação de infracção”, explicou o responsável da Polícia de Segurança Pública (PSP). O subdirector admitiu, contudo, dificuldades na regulação dessa actividade. “Achamos que existem dificuldades na execução da lei, porque os veículos deixam Macau e isso dificulta a obtenção de provas. Queremos que a sociedade chegue a um consenso sobre as licenças especiais, estamos a trocar opiniões com o sector para chegar a esse consenso”, disse Luís Gageiro sem, no entanto, apresentar um calendário para o arranque do processo legislativo dos diplomas. Quem tem razão? Au Kam San refutou os esclarecimentos do Governo e garantiu que “há lacunas”. “Não temos um calendário, mas já oiço isso desde 2012. Estes motoristas agora já trabalham como ajudantes das concessionárias do jogo, que transportam jogadores da China para Macau. Estão a ocupar postos de trabalho que deveriam pertencer aos locais, já não transportam mercadorias e passageiros, mas sim jogadores dos casinos. Porque é que ao fim de sete anos esse trabalho ainda não está feito?”, questionou. Perante a existência de duas posições diferentes sobre o mesmo assunto, o deputado Tsui Wai Kwan questionou onde está, afinal, a razão no que às licenças especiais diz respeito. “A resposta do Governo diz-nos que foram efectuadas quase mil investigações e não foram detectadas ilegalidades. Porque há estas situações tão diferentes? Onde está a fonte do problema?”, questionou, sem ter obtido uma resposta concreta. Já o deputado José Pereira Coutinho lamentou a ausência do secretário para a Economia e Finanças, Lionel Leong. “Sem a determinação do secretário para atingir o objectivo temos os dirigentes que se limitam a executar ordens superiores e não há nenhuma conclusão. Lamento que o secretário não esteja aqui, porque cada um responde à sua maneira, olhamos para os relógios e depois passamos para outra interpelação”, referiu. Revisão da lei das agências de emprego ainda este ano Num debate onde o excesso de importação de trabalhadores não residentes voltou a ser assunto de discussão, o Governo admitiu que a revisão da lei das agências de emprego poderá avançar ainda este ano. “Vamos lutar por tudo para que entre em processo legislativo ainda em 2017”, prometeu Wong Chi Hong, director dos Serviços para os Assuntos Laborais. “Estamos a dialogar com o Conselho Permanente de Concertação Social para ver se, no futuro, as pessoas que cheguem a Macau como visitantes só possam ser contratadas da próxima vez que venham ao território.”
Andreia Sofia Silva PolíticaIndústrias Criativas já representam 0,6 por cento da economia [dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] funcionamento do Fundo de Indústrias Culturais (FIC) e a aplicabilidade deste esquema esteve ontem em debate na Assembleia Legislativa. Alguns deputados consideram que, na prática, há muitos projectos que não conseguem apoio, bem como empresas que acabam por fechar, mas Alexis Tam, secretário para os Assuntos Sociais e Cultura, garantiu que o FIC está no bom caminho. “Fizemos um relatório que mostra que as receitas do sector das indústrias culturais atingem os 2,2 milhões de patacas, o que reflecte que a indústria contribuiu bastante para a nossa economia, ocupando 0,6 por cento. Existem mais de mil empresas culturais e criativas, e penso que algumas têm uma vida difícil mas, segundo as regras da economia de mercado, essas empresas ainda conseguem sobreviver, estão confiantes e conseguem ver o futuro. Algumas têm lucros ideais”, afirmou Alexis Tam. “Há muita criatividade em Macau, mas há falta de mercado”, acrescentou. Desde Outubro de 2013 até ao momento, o FIC recebeu um total de 425 candidaturas, tendo sido financiados 88 projectos ligados a 30 sectores de actividade. O secretário falou de alguns exemplos de empresas de áreas como a banda desenhada e o design, que já têm os seus produtos no estrangeiro. O deputado Zheng Anting chamou a atenção para a necessidade de colocar todas as empresas ligadas ao mundo das artes num só local, tendo sugerido a Ilha da Montanha. Alexis Tam optou por responder que muitas das empresas poderão ficar situadas em locais como o antigo matadouro ou a Avenida Coronel Mesquita, aquando da sua renovação. Não foram, contudo, avançadas datas. “Não podemos ter um distrito cultural como o 798, porque Pequim é uma cidade muito grande. Temos muitas concepções para esses locais e vamos divulgar políticas, para que as empresas possam funcionar nestes locais. Podemos revitalizar os locais não aproveitados para permitir que a nossa indústria possa sobreviver, porque no mercado privado as rendas são elevadas”, concluiu Alexis Tam.
Andreia Sofia Silva PolíticaIlha Verde | Governo garante protecção de convento jesuíta A propriedade da colina da Ilha Verde, onde se encontra um histórico convento jesuíta, continua por decidir em tribunal, mas o Governo promete revitalizar o espaço. Poderá mesmo ser criado um grupo interdepartamental para o efeito [dropcap style≠’circle’]P[/dropcap]ouco ou nada mudou desde que o HM foi visitar uma colina na Ilha Verde, em 2012, que alberga um convento jesuíta degradado que servia de casa a trabalhadores da construção civil oriundos do Continente. A propriedade do terreno continua por decidir em tribunal. Ainda assim, o Governo garantiu ontem na Assembleia Legislativa (AL) que vai levar a cabo a revitalização da colina e do convento, mesmo que isso signifique esperar alguns anos pela decisão do tribunal. “Em 2012 emitimos o nosso parecer para a conservação integral do convento. Houve um diálogo e com a clarificação do direito de propriedade podemos continuar a acompanhar o assunto”, apontou Guilherme Ung Vai Meng, que esteve presente no debate de ontem ainda como presidente do Instituto Cultural. O secretário para os Assuntos Sociais e Cultura, Alexis Tam, acrescentou que “essa colina já pertence à lista de património e merece a protecção do Governo”, pelo que “não é necessário fazer mais classificações”. “Segundo informações que recebi, não sabemos ainda quem é o verdadeiro proprietário do terreno. Há moradores e até há pessoas que gerem o convento. O convento tem de ser preservado e não apenas a colina. As Obras Públicas concordaram com a nossa opinião em relação à casamata de Coloane, que também tem de ser preservada”, adiantou Alexis Tam. O secretário garantiu mesmo que será criado um grupo interdepartamental para, no futuro, proceder à revitalização do espaço. “Os trabalhos envolvem diferentes serviços, de diferentes tutelas. Concordo que no futuro será necessária uma unidade interdepartamental para reforçar os trabalhos. Vamos estudar a situação com o Chefe do Executivo para decidir qual será a entidade responsável pelo assunto”, concluiu. Planos no escuro Por estar em causa um terreno de propriedade privada, os representantes do Governo fizeram-se acompanhar por membros da União Geral das Associações de Moradores (Kaifong), associação representada na AL pelo deputado Ho Ion Sang, o mesmo que levantou a questão do convento na Ilha Verde. Alguns deputados lembraram que há o risco de incêndio no local, tendo apelado a medidas mais concretas. “Como é que é possível pensar em planos para desenvolver essa zona se não sabem quem são os proprietários? Como é que se vão preservar essas árvores? Quem é que vai coordenar esta matéria?”, questionou Zheng Anting. Já Wong Kit Cheng, também ligada aos Kaifong, defendeu a implementação de um parque natural. “Muitos dizem que essa zona deve tornar-se um parque municipal e de lazer, e proteger por inteiro a colina”, rematou.
Hoje Macau SociedadeJustiça | Ho Chio Meng entrega ao tribunal lista de recomendações O antigo procurador da RAEM, arguido num processo a correr no Tribunal de Última Instância, entregou ontem uma lista com os nomes que recomendou para o Ministério Público. Já a testemunha do dia explicou porque é que não tocava em adjudicações, apesar de ser adjunta de Ho Chio Meng [dropcap style≠’circle’]É[/dropcap] uma das questões que mais polémica tem gerado e que hoje vai ser, de resto, debatida na Assembleia Legislativa, por implicar membros do Governo. De acordo com a Rádio Macau, que tem estado a acompanhar o julgamento, Ho Chio Meng entregou ontem ao Tribunal de Última Instância (TUI), onde está a ser julgado por mais de 1500 crimes, uma lista com 14 pessoas que diz ter recomendado para o Ministério Público (MP). Mais não se sabe sobre o assunto. O dia ficou marcado pelo depoimento da ex-chefe adjunta do Gabinete do Procurador. Elsa Cheang explicou ao colectivo de juízes que pediu para não ter qualquer intervenção nas decisões sobre a adjudicação de bens e serviços do MP, questão fulcral do julgamento. A testemunha acrescentou que a forma de contratação lhe causava “incómodo” e “transtorno”. Não obstante, manteve-se em funções e até recebeu um louvor do ex-procurador. Louvor na despedida A emissora recorda que Elsa Cheang foi notícia logo após a mudança de Governo ao ser despromovida pelo actual procurador, Ip Son Sang. A promoção, decidida por Ho Chio Meng dias antes de terminar o mandato, foi anulada por questões legais. O despacho de promoção foi assinado pelo então chefe do Gabinete do Procurador, António Lai, também ele arguido neste processo. Além da ascensão, Ho Chio Meng distinguiu Elsa Cheang com uma nota de louvor, publicada em Boletim Oficial, em que elogiou a “forma rigorosa, disciplinada, profissionalizada, séria e dedicada” como a adjunta exerceu funções. No entanto, nas declarações que ontem fez, Elsa Cheang deu conta de divergências com a equipa de Ho Chio Meng, pouco tempo após a transferência. Em 2004, a chefe-adjunta escreveu uma carta ao então líder do MP a pedir escusa nas decisões sobre as contratações. O arguido é acusado de ter desviado 50 milhões de patacas, através de adjudicações a empresas detidas por familiares e pessoas próximas. Elsa Cheang disse a Ho Chio Meng que a forma como os contratos passaram a ser feitos lhe causava “transtorno” e “incómodo”. O mau estar tinha que ver com o facto de o ex-procurador ter criado uma equipa independente, com as mesmas funções do departamento financeiro do MP, para decidir das adjudicações e valores dos contratos. A adjunta de Ho Chio Meng afirmou que a sobreposição de funções causava “contradições”, contou a Rádio Macau, que recordou que houve já vários funcionários do MP que testemunharam que este grupo paralelo ocultava informações relevantes para a liquidação das despesas correntes, como o custo real dos serviços adquiridos. A testemunha deu o exemplo dos gastos das viagens oficiais. Elsa Cheang garantiu que, por duas vezes, alertou António Lai para os preços “acima do valor de mercado” que estavam a ser cobrados. O ex-chefe de Gabinete de Ho Chio Meng terá dito à adjunta para não se envolver no assunto. A testemunha foi também ouvida sobre as alegadas contratações por ‘cunha’ para o Gabinete do Procurador – serão familiares e pessoas próximas de Ho Chio Meng. Elsa Cheang disse que houve recomendações pessoais de António Lai, mas não concretizou. Testemunha contraria Ho Chio Meng Ainda antes do depoimento de Elsa Cheung, o MP continuou a tentar provar que Ho Chio Meng usou instalações oficiais para uso próprio e benefício de empresários próximos. Foi ouvido um funcionário do MP que lidou com matérias confidenciais e encontros secretos. A testemunha foi chefe do Departamento de Apoio Judiciário. Este serviço, como tinha já explicado Ho Chio Meng em audiência de julgamento, foi criado para facilitar a cooperação judiciária entre Macau e a China, face à ausência de acordos entre as duas partes em matéria penal. A testemunha referiu que “ajudava” na investigação de processos, e caso as autoridades da China Continental quisessem entrar em contacto com as partes envolvidas, organizaria um encontro, com natureza confidencial. Pela experiência deste funcionário, estas reuniões não decorriam nos espaços que Ho Chio Meng disse ter estabelecido para o efeito. Um dos exemplos é a chamada “sala de descanso para docentes” que, de acordo com a acusação, era antes usada pelo ex-procurador para serviços de massagem. A testemunha disse ainda que os dirigentes da China ficavam hospedados em hotéis e não na vivenda de Coloane que Ho Chio Meng diz ter arrendado para receber convidados do exterior. O ex-chefe de departamento ressalvou, no entanto, que havia outros serviços responsáveis pela recepção de convidados.
João Luz Manchete SociedadeIPM suspende licenciatura em Relações Públicas O HM recebeu uma carta que dava conta da impossibilidade de inscrição no curso de Relações Públicas. O IPM confirmou que suspendeu as matrículas para o próximo ano, mas que o curso não será cancelado, prosseguindo as aulas sem problemas [dropcap style≠’circle’]U[/dropcap]ma carta anónima chegou às redacções dos jornais dando conta da preocupação dos pais de estudantes que frequentam o curso em Relações Públicas da Escola Superior de Artes. Em causa estava a impossibilidade de novas matrículas no próximo ano lectivo, algo que terá amedrontado alguns alunos. Em resposta à referida missiva, o Instituto Politécnico de Macau (IPM) fez um comunicado a alertar que “não é verdade que haja intenção de encerrar o curso; é, apenas, uma suspensão, por ser esta a melhor forma de aumentar o número de estudantes”. A carta anónima também adiantava que chegaram aos ouvidos dos actuais estudantes que algumas disciplinas poderiam não voltar a ser leccionadas não só no próximo semestre, como nos anos vindouros. Fonte do IPM comentou ao HM que esta parte da carta está completamente errada. “A única coisa que é verdade é que em 2017/2018 não há candidaturas”, explicando ainda que “o IPM garante a todos os actuais estudantes a continuação dos cursos, assim como épocas de avaliação suplementares”. Também em comunicado, a instituição de ensino garante a possibilidade de retoma do curso quando este recomeçar a qualquer aluno que tenha ficado para trás, ou com cadeiras em atraso do primeiro ano. No entanto, entre alguns alunos as preocupações são muitas. “Estou muito nervosa com o futuro da minha carreira, porque se o curso for cancelado não sei se será levado a sério no mercado de trabalho. Conheço mais pessoas que também estão preocupadas, algumas que até já completaram o curso”, revela uma estudante que falou com o HM, mas que preferiu não ser identificada. Uma preocupação semelhante vem patente na carta anónima, onde se diz que “as incertezas quando à segurança da continuidade do curso trazem inseguranças nas futuras carreiras dos estudantes”. Professores para manter Outra das reclamações elencadas na carta anónima, que diz representar os pais dos alunos do curso, prende-se com a suposta falta de transparência da administração do estabelecimento de ensino a lidar com esta matéria. O IPM responde declarando que falta de transparência “seria abrir inscrições para 2017/2018, sabendo-se que o curso não iria abrir”. Por parte da estudante que ouvimos, a aluna afirma que não foram contactados, que ninguém os informou pessoalmente. A mesma estudante adiantou ainda que não tentou falar com a administração por achar que “a decisão estava tomada e que não podiam fazer nada”. No entanto, o instituto garante que o curso não sofrerá perturbações. “Todos os recursos humanos que existem neste momento continuam a ser utilizados”, garante ao HM fonte da escola. No esclarecimento formal do IMP lê-se que o estabelecimento “possui recursos qualificados, humanos e materiais, para prosseguir a formação dos actuais estudantes, com a qualidade que é sua característica”. Para a instituição de ensino, o que está em causa é uma descida substancial do número de estudantes inscritos no curso em questão. A procura da licenciatura diminuiu 64 por cento em relação aos últimos três anos, enquanto as matrículas caíram para metade. Acrescente-se ainda que “o sucesso nos exames de admissão foi muito baixo no último ano”, de acordo com o comunicado do IPM. A fonte do instituto ouvida pelo HM comentou ainda que “quando isto acontece num curso temos de parar para pensar, faz uma restruturação e continuar, procurando tornar o curso mais apetecível, de forma a servir melhor a população”.
Isabel Castro Manchete SociedadeEstudo dos Kaifong revela quase 400 terrenos por desenvolver Os Moradores não estão satisfeitos com a forma como o Governo tem estado a lidar com os lotes vazios do território. Fizeram um novo estudo sobre a matéria e chegaram à conclusão que há demasiada burocracia. Os Serviços de Saúde também levaram um puxão de orelhas Com Vitor Ng [dropcap style≠’circle’]H[/dropcap]á 390 terrenos vazios só na península de Macau. O número é dos Kaifong – a União Geral das Associações de Moradores de Macau fez um estudo sobre a matéria, à semelhança do que já tinha acontecido em 2013, e detectou vários problemas, sendo que vai agora apresentar uma série de sugestões às autoridades. Uma das questões que mais preocupa tem que ver com a saúde pública: os Kaifong não gostaram do que viram em 75 por cento dos terrenos que visitaram. A pesquisa foi feita entre Agosto e Dezembro do ano passado e permitiu ainda perceber que, do total de terras por aproveitar, 43 por cento pertencem a privados. Ho Veng Hong, que trabalha no gabinete dos Kaifong na zona norte, explicou que, com o relatório, se pretende perceber como estão a ser utilizados os recursos disponíveis. Ao contrário do que aconteceu há três anos, quando os Moradores analisaram todo o território, desta vez concentraram-se apenas na península. O grupo responsável pelo trabalho visitou as zonas vazias e obteve dados junto de vários serviços públicos. Ao todo, foram passados a pente fino 495 locais. E a saúde pública? A grande conclusão da pesquisa tem que ver com a forma como a Administração lida com os terrenos vazios. Os Kaifong detectaram demasiada burocracia, um fenómeno que se explica com o facto de serem vários os serviços públicos que lidam com a matéria. “As autoridades demoram muito tempo”, afirmou o director do Comité dos Assuntos Sociais da organização, Chan Ka Leong. “Em resposta a vários tipos de situações que podem acontecer, temos autoridades diferentes para tratar do assunto: as Obras Públicas, o Instituto para os Assuntos Cívicos e Municipais, o Corpo de Bombeiros e os Serviços de Saúde”, contextualizou. “Entretanto, quando um desses serviços não se responsabiliza pelo caso que tem em mãos, transfere-o para outros serviços, o que faz com que o processo demore mais tempo.” O problema é que há questões que devem ser tratadas de forma urgente, por colocarem em causa a saúde pública. “Há casos que envolvem questões de higiene ou ambientais”, referiu. Chan Ka Leong disse ainda que, “de acordo com a lei, os Serviços de Saúde têm de assegurar a salubridade dos terrenos, quer sejam privados ou do Governo”. Mas, aponta o representante dos Moradores, “os Serviços de Saúde raramente fazem isso”. A pesquisa permitiu detectar limitações ao nível legal que os Kaifong gostariam de ver resolvidas, para que as autoridades possam tomar medidas rápidas para os terrenos vazios que coloquem em causa o interesse público. “Às vezes, não se consegue entrar imediatamente em contacto com o dono do terreno. O Governo deve criar uma série de medidas para que se possa tratar do problema nesse espaço e depois tentar, de novo, comunicar com o proprietário.” Esvaziar o vazio Os Kaifong são ainda do entendimento que as autoridades devem apropriar-se “temporariamente” dos lotes que se encontram vazios de forma permanente. Além disso, como no centro e na zona sul existem vários terrenos privados por aproveitar, “o Governo pode aumentar os impostos que são cobrados ou adquirir as parcelas que são adequadas para a utilização de construção de habitação pública, de modo a servir os cidadãos de Macau”. A Lei de Terras também foi chamada à colação, com os Moradores a defenderem que deve ser executada “de forma rigorosa”.
João Luz EventosCatalyser | Pop rock made in Macau Numa cidade com pouco mercado para o pop rock, os Catalyser formaram-se a partir de um grupo de amigos de escola com uma paixão em comum: a música [dropcap style≠’circle’]C[/dropcap]omo muitas bandas de rock, os Catalyser conheceram-se na escola secundária, um percurso habitual numa idade em que a identificação musical é muito importante. Nos últimos meses de liceu, em 2012, fizeram um pequeno concerto para os amigos, sem grandes ambições, que viria a ter repercussões pouco tempo depois. No fim do ano lectivo, o grupo de amigos que subiu a palco e que partilhava o amor pela música decidiu que chegara a altura de formar uma banda. Assim nasciam os Catalyser, nome inspirado no conceito químico que aprenderam numa aula de Ciências. “Queríamos que a nossa música fosse um catalisador entre pessoas, algo que promovesse a união, que incitasse, por isso escolhemos este nome”, conta Daniel, guitarrista da banda, que também trabalha com vídeo, principalmente em publicidade. A banda, inevitavelmente, foi influenciada pela cena cantopop de Hong Kong, como os Supper Moment. Este tipo de sonoridade é fortemente inspirado no pop chinês, assim como nas sonoridades pop de bandas que inundaram as MTV durante a década de 90. Dessa forma, não é de estranhar que o Ocidente musical também tenha chegado aos ouvidos e às influências dos Catalyser, como não podia deixar de ser. Bandas com projecção global como Green Day, Coldplay e Radiohead são alguns dos pontos de conexão dos Catalyser com as sonoridades mais ocidentais. Reflexões em disco No ano passado, a banda reuniu as composições que tinha e foi para estúdio. O resultado foi um disco chamado “Reflections”, que projectou a banda para a cena cantopop de Macau. Com concertos tocados na rua, e para qualquer palco que os convide, a popularidade da banda cresceu, dentro da dimensão do território, com o seu nome a passar de boca em boca. Em 2015 ganharam o prémio de música da TDM, um evento que marcou a banda. “Foi um momento memorável, deixou-nos muito felizes, apesar de achar que havia outros melhores do que nós, foi algo que nos surpreendeu muito e que não poderia ser conseguido sem a ajuda de outras bandas”, conta Daniel. O prémio deu-lhes alguma visibilidade, além de uma injecção de confiança para comporem algo mais arrojado. Em Setembro do ano passado, a banda mudou de rumo e passou a ter uma voz feminina, Iron. Uma mudança que não trouxe disrupção no sentido condutor que guia a sonoridade dos Catalyser. Apesar de ser uma banda de gente jovem, na casa dos 20 anos, o som tem alguns contornos maduros, principalmente no que toca aos arranjos. Com composições algo melancólicas e canções que evocam perda, a banda de Macau fez uma transição suave de uma voz masculina para a voz de Iron. A vocalista encaixou bem na sonoridade do conjunto, e sente-se como peixe na água em palco. Aliás, tocar ao vivo é algo que lhe enche a alma, em particular quando sente “que o público está a gostar da música”. “Apesar de todos enfrentarmos a nossas dificuldades, seguimos os nossos caminhos, porque a música é o catalisador das nossas vidas”, sintetiza a banda no seu canal de Youtube. https://www.youtube.com/watch?v=KCg1rmpcQbE
Hoje Macau China / ÁsiaInternet | Lançada campanha para prevenir acesso a páginas censuradas [dropcap style≠’circle’]A[/dropcap] China anunciou uma campanha de 14 meses para eliminar servidores e combater o uso de VPN (Virtual Proxy Network), a única maneira de aceder aos milhares de ‘sites’ bloqueados pelas autoridades chinesas. O Grande Firewall da China permite censurar ‘sites’ como o Facebook, YouTube e Google. Nos últimos anos, foi aperfeiçoado, bloqueando selectivamente páginas com termos “sensíveis”, em vez de uma censura integral. Em Novembro passado, o poder legislativo chinês aprovou um projecto de lei que reforça os poderes do Governo para aceder a informação, obter registos de mensagens e bloquear a difusão de dados que considera ilegais. Várias empresas e cibernautas recorrem, porém, ao uso de VPN para aceder à Internet sem restrições. As empresas de telecomunicação ou servidores passarão a estar proibidos de configurar ou alugar linhas especiais como VPN sem aprovação oficial, disse no domingo o ministério da Informação e Tecnologia. A campanha de “limpeza” vai durar até Março de 2018, segundo um comunicado difundido pelo ministério. Ordem na rede O anúncio surge dias após o Presidente chinês, Xi Jinping, ter defendido a globalização e denunciado o proteccionismo, num discurso no Fórum Económico Mundial, em Davos, na Suíça. O líder chinês insistiu no compromisso da China em se abrir ao mundo. A oferta de serviços de acesso à Internet tem crescido rapidamente e “os primeiros sinais de desenvolvimento desordenado surgiram também, criando uma necessidade urgente de regulação”, afirmou o comunicado. As novas regras foram necessárias para “fortalecer a gestão da segurança da informação na Internet”, lê-se na mesma nota. Citado pelo jornal oficial Global Times, Li Yi, especialista em tecnologias de informação, considerou as novas regulações “extremamente importantes”. Enquanto algumas multinacionais, como a Microsoft, necessitam de VPN para comunicar com as sedes localizadas no estrangeiro, outras empresas e cibernautas “acedem a páginas electrónicas estrangeiras com intuitos ilegais”. Em 2015, um relatório do grupo de pesquisa Freedom House considerou que a China tem a Internet mais fechada em 65 países analisados, abaixo do Irão e da Síria. Dados oficiais divulgados este fim de semana revelam que o número de chineses ligados à Internet ultrapassou os 730 milhões no ano passado.
Hoje Macau China / ÁsiaPequim convida Trump a combater em conjunto alterações climáticas [dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] Governo chinês convidou ontem a nova administração dos Estados Unidos, encabeçada por Donald Trump, a combater em conjunto as alterações climáticas e sublinhou que todos os países devem cumprir com o Acordo de Paris. Hua Chunying, porta-voz do ministério chinês dos Negócios Estrangeiros, garantiu em conferência de imprensa que Pequim tem “mantido contacto” com o novo Executivo norte-americano. “A China está disposta a trabalhar com todas as partes, incluindo a nova Administração dos EUA, para continuar com o diálogo e a cooperação sobre a questão das alterações climáticas”, disse Hua. A porta-voz do ministério considerou o Acordo de Paris um “marco histórico”, que a China tem intenção de implementar nas suas políticas domésticas e quer promover no exterior. “É um feito que não foi fácil de alcançar. Todos os países deviam seguir a tendência, aproveitar a oportunidade, adoptar acções e implementar o acordo para benefício das gerações futuras”, referiu. Hua insistiu na vontade da China de trabalhar com Trump, apesar das críticas do Presidente norte-americano às políticas comerciais do país asiático ou a sua aproximação a Taiwan, que Pequim considera território seu e não uma entidade política soberana. “Estamos prontos para trabalhar com a nova Administração (dos Estados Unidos) de uma forma construtiva, para solucionar as nossas diferenças e evitar que perturbem as relações gerais entre os dois países”, afirmou a porta-voz. Todos a perder Durante a campanha e já como Presidente eleito, Donald Trump culpou o país asiático de “manipulação da moeda”, ou “batotice”, e ameaçou taxar os produtos chineses em 45%. Alguns analistas consideram que poderá ocorrer uma guerra comercial entre as duas maiores economias do planeta. “As guerras ou confrontações comerciais não produzirão vencedores, apenas prejudicarão os interesses de ambos e de todas as partes”, afirmou Hua, que instou Washington a resolver com Pequim as suas disputas e desacordos em matéria comercial.
Rui Filipe Torres h | Artes, Letras e IdeiasO Porto veste cinema [dropcap style≠’circle’]E[/dropcap]ntre 20 de Fevereiro e 5 Março nas ruas adjacentes ao Teatro Municipal Rivoli, mas com franca probabilidade numa qualquer rua da cidade, centenas de pessoas vestem-se para ir ao cinema. Poucas vestem Prada ou Chanel, estão a caminho de uma das 96 sessões do 37º Festival Internacional de Cinema do Porto, e vestem heróis, ou anti-heróis do grande ecrã; “Eduardo Mãos de Tesoura”, “Freddy Krueger”, “Nosferatu”, “The Joker”, “Mulher Aranha”, para referir apenas alguns exemplos do vastíssimo guarda roupa/ícone(s) do cinema. O 37º FANTASPORTO reafirma a sua marca, fortíssima no circuito dos Festivais de cinema de género do mundo, com a presença confirmada de 125 filmes inéditos, (ante estreia nacional, ante estreia europeia, ante estreia internacional e em ante estreia mundial) O filme de abertura é “The Age of Shadows” de Jee-woon Kim, já passou na Selecção Oficial dos Festivais de Veneza e Toronto, teve o prémio do Melhor Filme do Festival de Filadélfia. É uma superprodução, e é o candidato aos Óscares pela Coreia do Sul, e um êxito de bilheteira no mercado asiático. O realizador, Jee-woon Kim, ganhou a 24ª edição FANTASPORTO (2004), com o filme “ A Tale of Two Sisters”. Na Selecção Oficial estarão 33 países, a concurso ou fora de competição. Todos os filmes novos abordam o modo como o real de hoje nos afecta, nomeadamente às guerras ( “Bloodlands “ da Albânia), o drama dos migrantes (“The Citizen”da Hungria), a realidade das mulheres muçulmanas face ao adultério ( “Sins of the Flesh”, do Egipto, produzido pelo celebrado Youssef Chahine) ou a realidade económica da Europa (o filme grego “Lines”). Reflexões também quanto à sustentabilidade do nosso futuro com o espanhol de ficção científica “ReAlive” ou o britânico-americano “Division 19” . Também presente a crítica social à burocracia com (“A Repartição do Tempo”, uma das maiores e mais divertidas superproduções do Brasil deste ano. Destaque ainda para um dos maiores realizadores mundiais do momento, o coreano e amigo multi-premiado do Fantasporto, Kim Ki Duk com “The Net” . Também coreano, e do meste da animé Yeon Sango, “Seoul Station” vai estar no ecrã do Rivoli. Os filmes portugueses em competição que fazem a sua estreia Mundial nesta edição do festival são as longas metragens ”A Ilha dos Cães” ,“A Floresta das Almas Perdidas” e “Comboio de Sal e Açúcar”. A longa-metragem “Rewind” produção suíça do português Pedro Joaquim, também tem aqui a sua ante-estreia mundial. Destaque ainda para o Prémio de Cinema Português que vai novamente escolher o melhor filme e a melhor escola de cinema. Na programação, como é usual, fazem parte inúmeras curtas-metragens. Nas retrospectivas o destaque vai para o CINEMA DE ACÇÃO DE TAIWAN, organizada oficialmente pelo governo local de Taiwan, um conjunto de clássicos, muitos inéditos em Portugal. Igual destaque merece a retrospectiva do moderno CINEMA ARGENTINO , com, entre outros, os recentes “ El Ataud Blanco” e “ El Muerto Cuenta su Historia”. Nesta apresentação síntese, de referir ainda o programa especial de cruzamento com outras artes com um conjunto de conferências e workshops. O filme de encerramento, deste 37º festival Internacional de Cinema do Porto, actualmente classificado como um dos 10 melhores festivais independentes no mundo, ainda não está anunciado. O Festival vive de uma programação objecto de grande atenção, de uma cidade e de um público muito particular. Um público de festival que vive intensamente a alegria partilhada de ver cinema na sala escura, exuberante, capaz de gritos, berros, falas para o ecrã, na melhor tradição dos afectos do grande público ao grande ecrã. Nas edições anteriores do festival foram muitos os nomes com destaque na cinematografia mundial presentes na cidade do Porto, aqui ficam alguns; Ben Kingsley, Luc Besson, David Lynch, Neil Jordan, Max von Sydow, Rosana Arquette, Danny Boyle, Serguei Paradjanov , Anthony Minguela, John Hurt, Pedro Almodóvar, Paul Anderson, Danny Boyle, James Cameron, Nick Cassavetes, Joel Coen, David Cronenberg, John Carpenter, Roland Emmerich, David Fincher, Terry Gilliam, Peter Greenaway, Michael Haneke, Peter Jackson, Takashi Miike, Anthony Minghella, Vincenzo Natali, Tim Robbins, Roberto Rodriguez, Ridley Scott, Quentin Tarantino, Guillermo del Toro, Lars von Trier ou Larry Wachowski. E muitas as retrospectivas, Jean Cocteau a Orson Welles, Vivente Aranda, Juan Luis Bunuel, Brian de Palma, Bigas Luna, Dario Argento, George Mélies, André Delvaux, Mario Bava, Terence Fisher, David Cronenberg, René Laloux, Tobe Hooper, Georges Franju, Luis Bunuel, Andrzej Zulawski, Paul Verhoeven, Harry Kumel, René Clair, Marcel Carné, John Waters, Andy Warhol, Leni Riefenstahl, Michele Soavi, David Lynch, Walt Disney, Alfred Hitchcock, , Mojica Marins, Nelson Pereira dos Santos, Jesus Franco, Alex Cox, Julien Temple, Oswaldo Caldeira, Hershell Gordon Lewis, Lucio Fulci, Christpher Lee, Takashi Miike, Sabu, Shynia Tsukamoto, Jean Renoir, Ed Wood , António de Macedo, José Fonseca e Costa, Fernando Lopes, não citando todas. É fácil perceber o prazer da cidade neste Festival que, com o património edificado e simbólico e o mundialmente conhecido vinho e rio Douro, que aqui a si mesmo se esquece no sal Atlântico, afirma de forma brilhante o Porto no mundo contemporâneo.
Amélia Vieira h | Artes, Letras e IdeiasTodo este deserto [dropcap style≠’circle’]E[/dropcap]screvemos devagar, os dias são lentos, as estradas fugidias, as ausências gigantes. Estamos a ver passar a carruagem de um morto, o passeio fúnebre da vã glória de se ser mortal e, com todos os sinais num ar já farto daqueles que do chão desistem e tão de Inverno feitos, seguimos silenciosos o cortejo. Um encanto nostálgico fica destes dias em que engalanámos a morte de passeio e as vestes eram escuras como de abrigos estivéssemos envolvidos. Sem choro nem bonança, abraçamos o tempo do fim, que de finita estrutura nos mantemos atrás dos outros como uma esquálida água que perpassa. Os dias embriagados de um já quase luar de Janeiro, o das noites altas e esguias como catedrais, anunciam, sim, lá longe, a Primavera que sempre virá, os gatos em cio, as longas noites frias de quem tem nos sonhos a vida que não lhe é dada já viver no momento breve e, com toda a elegância de estirpes moribundas, seguimos o esquife. Frios como sombras, tristes sem saber porquê, pois que se tudo é demora na morte sempre certa, que silêncio é este que nos deixa tão sós? A morte aqui não é de assombro de suspeita ou de aflição: é um dote a mais na marca de um homem e quem nela tiver assento passeia-se entre avenidas e ruas espalhando o sossego da sua condição. Ele, que de alma nua e corpo inerte avança, não sabe da morada nem do estado das coisas que acontecem. Os cavalos são altos e belos e escoltam a sua natureza toda por entre a abnegação dos rostos ao redor. Para se ser feliz há que ser-se jovem e contar os dias para entrar de férias e ter aquele amor nos países a visitar e as noites com fundos sonos que insistem em entrar pelos dias dentro. Assim, somos felizes, temos o tempo da espera que se prevê sempre rápida, pois os jovens não gostam de esperar e este quase lá marca a tónica de uma vibrante expectativa e por isso todos ficam de lado na sua marcha lenta para não lhes inibirem os passos. Se um país fosse a enterrar ele seria como todos os senhores: um velho ser passeando-se entre as nossas vistas cansadas, um elemento cuja urna seria um sinal da Aliança, a Arca, tão móvel quanto vazia, pois que o seu mistério continua para além das paredes cerradas e do cumprimento de Deus. Seria uma tribo a transportá-la no deserto onde nela se fundou e criou a imagem do Santo dos Santos e nós, na retaguarda, sentiríamos a presença do eterno sem que nos fosse recordada a brevidade da vida, sem vontade andaríamos quilómetros para testemunhar o desejo de que dentro dos elementos fechados vai a união, que nunca sem a sua viseira conseguiríamos manter os cavalos que são os arlequins e guardiões bem amestrados, o que está dentro não se vê, passeia-se na mobilidade de uma essência sagrada cuja natureza deixámos de saber interpretar. Toda a nossa visão é um lastro bonito e triste sem entendimento prévio, pois que a guarda das coisas a algo ou a alguém nos emociona como um recanto privado e, sempre privados de argumentos, escutamos o que dizem saber os que mais pensam entender sem que tal explicação seja mais eloquente que a nossa inabilidade para trocar palavras diante da verdade bela e fria de um imenso adeus. Entramos na corrente ociosa do sentimento das coisas e, de tão filtradas as águas, há um canto finíssimo de uma vaga maresia… deve ser o Tejo espraiando-se entre as gentes… ou deve vir mais frio e não sabe da dureza de o implantar. Está tudo assombrosamente envelhecido, parece que estamos aqui vai para milhares de anos, mas o calendário afirma que não, que a rotatividade ainda é muita e que estendidos como a morte na linha horizontal temos que desenrolar muitos anos. E tudo é subitamente horizontal, as linhas dos Jerónimos – as belas linhas – o rio, o tráfego… todos prestamos preito àquela morte em pedra que não nos espreita porque de uma vaga eternidade se mantém e esta curva suave para a recta adormecida é um pouco a arquitetura do nosso Fado que só levanta quando a dor acorda, gemendo então na vertical como um alto uivo. Os lobos estão nas suas florestas e elas são escassas, ao levantarem a boca para uivar à Lua cantam estranhas melodias que nos dizem inspirar até sonhos de belos machos Alfas espalhando o seu domínio: e quem no reduto mais estreito das suas fantasias não procurou o seu poder para se sentir protegido e amado como convém quando estamos frágeis? Na lassidão da morte ninguém entra. Todos somos o cortejo, o estilete com que esculpimos a marcha, fazemos as últimas homenagens e vemos passar o significado das vidas que foram anunciadas, que pode muito bem deleitar as nossas já sem nenhuma anunciação. Ninguém se nos anuncia num devir breve e todos deslizamos para o nada, o tanque vazio das nossas lágrimas diz-nos que passamos o estertor do medo dela. Tudo está em paz, mas a paz não é redentora, a paz não mora na esperança da vida, ela silencia a sua força e contrai “dívidas” à felicidade do melhor de nós em turbilhão. Mas nós gostamos da paz, com ela parece-nos a linha mais comprida… os dias mais lentos… o amor menos agreste – a paixão… retirai-a: é fonte de aflições, de desamparos e ardores – o vício pode entrar desde que seja só vício e se, paradoxalmente, ninguém se agarrar a ele, da violência doméstica retenhamos apenas que não é amor – não, não é amor – é outra coisa que os lobos nos ajudariam a pensar. E com todo o deserto aberto para o povo, passa então entre manás a turba que fugida anda de Faraós agrestes e que de tanto já não poder andar se revolveram nas areias até nelas quase terem ficado por todas as gerações… Ao longe, a Terra Prometida, mas Moisés morreu ao vê-la… partiu Tábuas, gritou do cimo da montanha… Um homem não é de ferro e pode destruir o que lhe custou silêncios e padecimentos por caprichos muito humanos e tem esse imenso direito. Do outro lado quem estaria à sua espera? Quem nos espera para sermos coroados? Na agnóstica República cumpriu-se o ritual da passagem e só não ouviu a voz de um além quem estava desprevenido. Quem sabe se era de novo o nevoeiro! Quem nos diz que chegou Sebastião montado em inúmeros cavalos brancos que de crina em dias sem vento andava movendo o seu estandarte de imperturbável construtor de Desejados? Todos, algures, fôramos desejados e ninguém mais nos deseja… os nossos desejos são cordas lassas. Ficamos a ver como entrelaçamos as fachadas manuelinas para fazermos delas um nó tão apertado que parecemos não caber. E soltam-se os cabelos, o fio de Ariadne, a vontade de ser Penélope numa ilha muito ao largo… e que venha sim, que apareça Ulisses. E a noite chegou com o sarcófago nos Prazeres. Prazeres de vida eterna. O postigo está fechado. Janus, o senhor das duas caras, repousa enfim. Janeiro é um mês lindo.
David Chan Macau Visto de Hong Kong VozesDirectrizes para 2017 em Hong Kong [dropcap style≠’circle’]A[/dropcap]s linhas de acção do Governo de Hong Kong para 2017 foram anunciadas esta semana. Foi decidido o cancelamento do apoio do Fundo de Providência Obrigatório (Segurança Social) às empresas, para fins de indemnização de funcionários. Estas indemnizações poderiam efectuar-se ao abrigo do Long Service Payment – LSP (Compensação por termo de Contrato Prolongado) ou do Severance Payment – SP (Indemnização por Despedimento). Actualmente, tanto o empregador como o empregado contribuem com 5% do valor do salário para o FPO, entrando mensalmente neste Fundo um total de 10% do salário de cada pessoa, a ser aplicado na saúde e na reforma. Em Hong Kong as pessoas reformam-se aos 65 anos. O SP foi pensado para compensar pessoas que trabalham para a mesma entidade num mínimo de dois anos consecutivos e que são dispensadas por extinção do posto de trabalho, ou simplesmente demitidas. A extinção do posto de trabalho acontece quando: O empregador encerra, ou pretende encerrar, o negócio; O empregador cessa, ou pretende cessar, a actividade nas instalações onde o empregado prestava serviço; As expectativas do negócio relacionadas com a função que o empregado exerce cessam ou diminuem. “Despedimento” enquadra-se no ponto 3. Considera-se despedimento quando, o funcionário trabalha menos do que: metade dos dias normais de trabalho durante quatro semanas consecutivas; ou um terço dos dias normais de trabalho durante 26 semanas consecutivas. No entanto, se o empregado não receber o seu salário referente ao período mencionado, considera-se que foi despedido pelo patrão. O LSP é a garantia do trabalhador ao abrigo da Lei do Trabalho. Define-se como a compensação devida a quem tiver exercido funções numa empresa por um período mínimo de cinco anos consecutivos, sem que tenha havido justa causa para o despedimento nem extinção do posto de trabalho. Nestas circunstâncias o empregador deverá indemnizar o funcionário, excepto se o funcionário: morrer, ou se se demitir por razões de saúde se reformar por ter atingido ou ultrapassado os 65 anos. Quer as indemnizações tenham por base o LSP ou o SP, o cálculo é feito a partir da seguinte formula: (média dos salários dos últimos meses x 2/3) x número total de anos de serviço= valor total da indemnização Antes do anúncio da Linhas de Acção Governativa para 2017, o valor acumulado nos Fundos LSP e SP provinha das contribuições sobre os salários. Ou seja, quando era necessário indemnizar o empregado o patrão não pagava do seu bolso, recorria sim a estes fundos da Segurança Social. Mas se as novas medidas forem implementadas os empregadores terão de pagar as compensações às suas custas. Estas medidas vão obviamente lesar os interesses da classe patronal. Para amenizar o conflito, o Governo da RAEHK avançou duas sugestões: reduzir as indemnizações do trabalhador. Como já vimos, o empregado podia ser compensado numa proporção de 2/3. Mas agora, o Governo pretende reduzi-la para 1/2. Seria criado um fundo governamental para ajudar ao pagamento destas indemnizações. Foi sugerido que este Fundo estaria operacional dentro de 10 anos. Passado este período, o patronato terá de suportar o pagamento das indemnizações e deixar de contar com ao Fundo de Providência Obrigatório. Mas a criação deste fundo governamental não é o suficiente para satisfazer a classe patronal. Alguns empresários alegam ter de pagar duas vezes pelos empregados. Estas queixas são facilmente compreensíveis. Quem mais sai a perder com estas medidas é o trabalhador, porque a indemnização será reduzida de uma proporção de 2/3 para 1/2. Não há dúvida que terminar com a contribuição da Segurança Social para estes Fundos compensatórios é uma boa medida. porque a inflação em Hong Kong é altíssima e desta forma as verbas da Segurança Social não poderiam de futuro vir a assegurar as pensões de reformas. Estas medidas previstas nas Linhas de Acção Governativa para o corrente ano, a serem implementadas, não agradarão nem a patrões nem a empregados. As verbas do Governo de Hong Kong provêm sobretudo das taxas sobre os salários, não existe uma actividade principal que lhe garanta rendimentos. Estas medidas que incidem sobre o emprego terão sérias consequências. Ao contrário de Macau, que tem como negócio central a indústria do jogo e que tem assegurada uma fonte de rendimento suficiente. Este é o mérito de um negócio único. Mas os negócios únicos têm um inconveniente. Se abrandarem, todos serão afectados. Provavelmente a única forma do Governo da RAEHK resolver esta situação é passar a participar nos pagamentos das indemnizações, através dum fundo governamental e não das contribuições para a Segurança Social. No entanto, se seguir por esse caminho, o Governo pode comprometer a sua situação financeira pois é sabido que o Governo de Hong Kong não é rico. Se a implementação destas medidas estiver em consonância com os princípios enunciados nas Linhas de Acção Governativa, pensamos que serão políticas bem-vindas. Professor Associado do Instituto Politécnico de Macau Consultor Jurídico da Associação para a Promoção do Jazz em Macau
Tânia dos Santos Sexanálise VozesA marcha das mulheres [dropcap style≠’circle’]N[/dropcap]inguém sabe ao certo se se trata de um momento de catarse episódico ou de uma tendência ideológica em ascensão. No dia 21 de Janeiro convocaram-se as mulheres deste mundo para uma marcha que se pensava não ser mais necessária, mas ainda é. As senhoras com muitos anos de experiência andavam por lá com cartazes: ‘Não acredito que ainda tenho que manifestar-me por isto’. Porquê? Porque a maior potência mundial elegeu um Presidente que faz questionar certos valores contemporâneos. Tal como uma criança de 10 anos afirmou, ao ser entrevistada nas ruas de Washington DC, o Presidente eleito não dá o melhor exemplo de como as mulheres deverão ser tratadas. É-me difícil ficar indiferente a estas questões. São anos de luta e de consciencialização para que a desigualdade de género seja esmiuçada ao tutano e que desapareça de uma vez por todas. Surpresa das surpresas: ainda constitui um dos maiores desafios da humanidade. Se nos últimos 200 anos tem-se lutado por maior respeito e mais direitos para as mulheres, estas causas continuam a fazer sentido hoje em dia. Esta marcha das mulheres mostrou-nos que o activismo ainda existe, e que nós ainda temos armas para mostrarmo-nos descontentes. Fiquei muito comovida ao ver as imagens de gerações de mulheres acompanhadas pela família e amigos. Aviões e autocarros cheios de mulheres e homens com barretes cor-de-rosa de orelhinhas de gato em peregrinação para um espectáculo de descontentamento social. Acreditar que as mulheres merecem um papel social diferente ao que é proposto hoje em dia e que merecem oportunidades para alcançarem tudo aquilo que quiserem, não é conversa especial de feministas. É uma conversa para todos aqueles que acreditam numa sociedade mais justa, igualitária e capaz de ser solidária. Ao mesmo tempo, foram expostas exigências que são praticamente universais. As mulheres têm direito a ser as senhoras donas do seu corpo, têm o direito a ter as mesmas oportunidades que todos, têm direito a serem tratadas com respeito. Mas se há temas que são claros como água, há outros que não são. Ser a favor da legalização do aborto é ser a favor da escolha de poder abortar: é ter o total controlo do nosso corpo, ter direito a informação reprodutiva e ao planeamento familiar. Penso que isso seja claro. Mas o que é que quer dizer ter as mesmas oportunidades? Em especial, o que significa respeitar as mulheres? Pela minha experiência, cada vez mais me apercebo que as opiniões divergem grandemente, apesar da causa ser a mesma. O cliché é de que tudo é relativo: mas é preciso ouvir com atenção as definições e redefinições que as pessoas fazem sobre o que é respeito, por exemplo. Isto é só um exercício de reflexão do dia-a-dia feminino. Mas se para a maioria é óbvio que é extremamente ofensivo um sujeito gostar de se vangloriar por poder agarrar uma mulher pela sua genitália, do que é que pensamos sobre homens que mandam piropos na rua ou que ficam especados a olhar só porque alguém está a usar uma mini-saia, por exemplo? Será que podemos falar de uma má objectificação feminina e de uma ‘boa’? Eu, por exemplo, mantenho uma posição muito clara de como gostava de ser respeitada, e isso passa por querer poder dançar numa discoteca em paz e não ser incomodada constantemente por homens, ou poder usar uma mini-saia porque está calor e porque me sinto bem assim, ‘boa’ objectificação feminina é coisa que para mim não existe. Contudo, quem sou eu para definir universalmente o que quer que seja? Há mulheres que gostam de sair à noite e de ser admiradas – pode ser bastante empoderador. Há quem goste de ser interpelada para que a sua beleza seja elogiada (com classe, não à construção civil). Há pessoas para todos os gostos. O respeito passa muito mais por aí, o respeito passa por perceber que há tendências diferentes. O respeito é ouvir e escutar com atenção as necessidades e vivências não só de um grupo como um todo (neste caso, as mulheres), mas as necessidades individuais também. Porque não existe uma fórmula perfeita para como estas coisas são vividas, mas é especialmente importante reconhecer estas idiossincrasias. Apesar de uma marcha ter o poder unificador de um conceito, de uma causa, ter a capacidade de lutar, de mostrar a força colectiva, nunca se esqueçam de cada uma de nós. Nós temos cores diferentes, ideias diferentes, experiências diferentes. Nós temos as pussies de ferro e ninguém nos vai parar.
Hoje Macau China / ÁsiaJapão | Proposta legislação especial para renúncia de imperador [dropcap style≠’circle’]A[/dropcap] comissão encarregada pelo governo japonês de estudar a abdicação do imperador Akihito propôs ontem a criação de uma legislação especial para a renúncia, naquela que pode ser a primeira abdicação em dois séculos no país. Uma legislação especial, que se aplica apenas a uma parte de uma categoria (pessoa, coisa ou lugar), neste caso ao actual monarca, poderia evitar trâmites complicados para emendar a lei que rege a Casa Imperial, que não permite a sucessão em vida, ou possíveis intromissões políticas nas decisões do imperador. De acordo com a Constituição, o papel do imperador é simbólico. O relatório preliminar da comissão de seis peritos foi apresentado após nove sessões de deliberações, nas quais a ideia de estabelecer um sistema de abdicação permanente encontrou mais opositores do que defensores. O documento, difundido pela agência noticiosa japonesa Kyodo, cita a dificuldade em estabelecer as condições específicas para abdicar de futuros imperadores “por ser difícil criar um sistema que possa impedir um imperador de ser obrigado a renunciar contra a sua vontade”, eventualmente condicionado pelo governo da altura Relativamente ao estabelecimento de um regente, para aliviar a carga do imperador, o relatório apresenta preocupações relativas à possibilidade de uma estrutura de poder dual. Esta posição é também a do governo do primeiro-ministro japonês, Shinzo Abe, que deverá apresentar uma proposta de lei, em Abril, ao parlamento (Dieta), depois de a comissão elaborar o relatório final, em Março. Bruscamente no Verão passado No Verão de 2016, o imperador Akihito, de 83 anos, manifestou a vontade de abdicar depois de quase três décadas no “trono de crisântemo”, uma das mais antigas monarquias do mundo, devido à idade avançada e uma saúde enfraquecida. Se acontecer, a renúncia de Akihito será a primeira na linha de sucessão imperial desde a do imperador Kokaku, em 1817. Os meios de comunicação japoneses tinham noticiado que o governo está a planear a renúncia de Akihito e a sucessão do filho mais velho, Naruhito, de 56 anos, a 1 de Janeiro de 2019. O debate alargou-se a outras possíveis modificações, como permitir o acesso das mulheres ao “trono de crisântemo”, já que o herdeiro de Naruhito é a princesa Akio, de 15 anos. A aprovação de uma legislação especial deixará esta questão fora do debate.
João Luz Internacional MancheteEstados Unidos | As primeiras palavras do Presidente Trump É um dia novo. O mundo inteiro assistiu à cerimónia de tomada de posse de Donald Trump, ao mudar de página em que a maior potência militar e económica do mundo se vira para dentro. O novo capítulo deverá acabar com uma política externa que vem desde o fim da 2ª Grande Guerra Mundial Com agências [dropcap style≠’circle’]“D[/dropcap]e hoje em diante, será primeiro a América”, foi a frase que Donald Trump proferiu durante o discurso de investidura de poder em Washington que melhor resume o seu pensamento e as propostas de campanha. O solipsismo americano, o virar para o umbigo, que jura romper com décadas de política externa que teve falhas terríveis, mas que assumiu as despesas da NATO. Em declarações à Agência Lusa, o antigo ministro da Defesa Nuno Severiano Teixeira comentou que o novo Presidente norte-americano “vai acabar com a tradição dos Estados Unidos como Estado cruzado que visa exportar o modelo democrático para o mundo.” O socialista comenta que a América, desde a sua constituição, tem oscilado entre a ideia da terra prometida e a do Estado cruzado que leva os seus valores ao mundo. A maioria das vezes à lei da bala. Esta é “a ordem mundial, liderada pelos Estados Unidos, em que o mundo vive desde 1945”, acrescentou Severiano Teixeira. “Não queremos impor o nosso modo de vida a ninguém mas, em vez disso, serviremos de exemplo”, discursou o 45º presidente. Orgulhosamente sós No fundo, a tomada de posse de Donald Trump enfatizou muito os valores e tradições da cultura norte-americana, pelo menos vista de uma perspectiva muito conservadora. Sendo assim, é de prever que as linhas de desenvolvimento do país se centram mais no interesse nacional e na política interna, em vez do multilateralismo, de cooperação com a comunidade internacional. “Compra americano, e contrata americano”, como resumiu o Presidente no seu discurso. O analista Arnaldo Gonçalves projecta um “fechamento dos Estados Unidos durante um período de três, ou quatro anos, para se resguardar um pouco da exposição que tiveram durante os oito anos de mandato do Bush, nomeadamente no que toca às aventuras militares no Iraque e no Afeganistão”. O especialista em assuntos de política externa acrescenta ainda que “não se tinha visto ainda um Presidente com uma visão tão isolacionista no período de história moderno”. O isolamento internacional com os aliados tradicionais, e o virar para o umbigo norte-americano parecem decalcadas da mente de Steven Bannon, um dos conselheiros mais próximos do ouvido de Trump, oriundo da ala de extrema-direita. Desde que Obama ganhou as eleições, o ex-director do site alt-right Breitbart, tem seguido um discurso apocalíptico em relação à emigração e à economia. Foi o que se viu, apesar dos números do deficit e desemprego terem melhorado, substancialmente, durante o consulado do primeiro afro-americano eleito. Ainda assim, o discurso do magnata de Nova Iorque seguiu a linha de que os Estados Unidos vivem numa espécie de cenário Mad Max, enferrujados e áridos, devastados pelos bichos papões exteriores, ou seja, acordos comerciais internacionais, e imigração ilegal. “Protecção levará a grande prosperidade e força”, foi uma das frases chave do discurso. Outro dos pontos interessantes foi a promessa de apostar em infra-estruturas, como a construção de pontes, estradas, túneis. Uma medida que os sucessivos Presidentes democratas tentaram implementar, mas que esbarraram na forte oposição republicana que se justificava com a preocupação de aumento do deficit. Neste sentido, Trump marca uma viragem nas políticas conservadoras em direcção a uma visão mais liberal em termos de despesa pública. Europa por sua conta Ainda no plano global, Severiano Teixeira comentou à Lusa a visão de Trump que considera a NATO uma organização obsoleta, assim como a aproximação à Rússia de Putin e a vontade de denunciar os acordos comerciais com a Europa e o Pacífico, são marcas isolacionistas. “Vamos ver o fim das Alianças Permanentes, o fim do comércio livre, o fim do regime de não proliferação nuclear e o fim do regime de intolerância quanto aos regimes autoritários”, acrescentou o socialista. Numa vertente nacionalista, Trump afirmou em entrevista ao alemão Bild acreditar que existirão mais países a deixar a União Europeia, e aplaudiu a decisão do Reino Unido após o referendo que levou ao Brexit. “As pessoas, os países querem a sua própria identidade e o Reino Unido quis a sua própria identidade”, disse o futuro residente da Casa Branca, acrescentando uma das suas tiradas habituais: “O Reino Unido foi muito esperto em sair da UE”. Como é óbvio, para o novo ocupante da Casa Branca, a vaga de insatisfação em que está submergido o eleitorado europeu prende-se com a crise migratória. Nesse domínio, Trump destacou a Alemanha e “o erro catastrófico” que acha que Angela Merkel cometeu ao abrir as fronteiras alemãs a migrantes e refugiados, ou, nas palavras do magnata, “ilegais”. “Desaliança” Atlântica “O próprio site da NATO já diz que Trump vai desinvestir em termos do comando europeu da Aliança Atlântica, no fundo os Estados Unidos não vão suportar os encargos do ponto de vista financeiro a operacionalidade militar na plataforma europeia”, comenta Arnaldo Gonçalves. O especialista em assuntos externos acrescenta ainda que “após as eleições, alemães e franceses têm de se pôr de acordo como é que vão gerir esta situação de transição para assumir as responsabilidades de defesa da Europa”. Para tal, o analista considera que os países europeus devem aumentar as suas despesas para o orçamento da NATO. Esses fundos virão, provavelmente, de um aumento dos impostos, sendo que já foi “aventado por vários secretários-gerais da NATO, a criação de um imposto de um, ou dois, por cento do rendimento nacional para efeitos de defesa”. Mais um sinal de alarme que soou nos países da Aliança Atlântica foi a menção às fronteiras que Trump pretende descurar, em prol da defesa da fronteira com o México. Apesar de ter sido uma declaração algo vaga, parece apontar para a colocação de efectivos militares da NATO junto à Polónia, assim como à instalação de plataformas de lançamentos de mísseis virados para leste. Neste aspecto, Trump referiu que “está na altura de parar de investir no exército dos outros, e direccionar esses fundos para reforçar o poder militar americano que tem estado em decadência”. O que é uma dramatização não assente nos números do orçamento federal, continuando a defesa a ocupar a mais larga fatia do dinheiro dos contribuintes. Uma das razões pelas quais o Presidente norte-americano considera a NATO obsoleta prende-se com a inoperância que Trump vê na aliança a lidar com o terrorismo islâmico, outro dos temas em destaque no discurso de tomada de posse. No entanto, apesar de ter prometido acabar com o terrorismo, o magnata ainda não foi claro em que medida terá uma posição diferente face ao Estado Islâmico, em comparação com o seu antecessor. Também o Afeganistão continua a ser uma incógnita, depois de 15 anos da ocupação das tropas americanas, já que Trump não elenca soluções para o imbróglio afegão. Ou seja, é a prioridade absoluta, no entanto continua sem uma política estabelecida. Para Arnaldo Gonçalves isso é natural, “uma vez que só agora a equipa de política externa de Trump se começa a consolidar, até porque este tipo de decisões são tomadas com o input de vários gabinetes”. Então e a China? Este é o outro reposicionamento em termos de política externa que terá mais importância nos próximos quatro anos. “Eu acho que Xi Jinping está um bocado preocupado, nota-se na declaração que fez em Davos, mas é um tipo pragmático e autoritário, tal como o Trump. Do meu ponto de vista eles vão-se dar bem, porque percebem qual é o terreno que podem pisar”, comenta Arnaldo Gonçalves. Ouvidos pelo South China Morning Post, um conjunto de analistas internacionais considerou que Xi Jinping devia contactar pessoalmente o novo Presidente norte-americano, de forma a resfriar as tensões que têm crescido. Na agenda devem estar a Coreia do Norte e a cooperação económica.
Isabel Castro Manchete PolíticaGoverno é hoje confrontado com declarações de Ho Chio Meng Dois deputados escreveram ao Chefe do Executivo porque querem saber o que vai fazer Chui Sai On em relação às questões suscitadas em tribunal pelo ex-procurador da RAEM, relacionadas com Florinda Chan e Sónia Chan. Hoje há explicações na Assembleia [dropcap style≠’circle’]S[/dropcap]ão perguntas dirigidas directamente ao Chefe do Executivo, pelo que se impõe a pergunta: quem vai hoje à Assembleia Legislativa responder a Ng Kuok Cheong e José Pereira Coutinho? Por norma, o líder do Governo delega as questões abordadas nas interpelações orais consoante a tutela a que dizem respeito. Sucede que, desta vez, os deputados pretendem obter esclarecimentos sobre a responsabilização política de uma secretária em exercício, Sónia Chan, e da sua antecessora, Florinda Chan, pelo que não fará sentido a actual responsável pela tutela da Administração e Justiça ir a plenário ser advogada em causa própria. Porém, é altamente improvável que Chui Sai On se desloque ao edifício do Lago Nam Van. Em causa estão declarações de Ho Chio Meng proferidas no Tribunal de Última Instância, durante o julgamento em que é arguido. O ex-procurador da RAEM, acusado de mais de 1500 crimes, disse ter recebido telefonemas de Florinda Chan e de Sónia Chan, quando a actual governante ainda era a responsável pelo Gabinete de Protecção dos Dados Pessoais, com recomendações acerca de familiares interessados em trabalhar no Ministério Público. As pessoas em questão foram admitidas. Esta revelação de Ho Chio Meng tem dado que falar e o Comissariado contra a Corrupção tem em mãos uma queixa para analisar. Ao Ministério Público já chegou também um pedido de investigação, submetido pela Associação Novo Macau. Pior do que antes “Dirigentes de alta categoria a aproveitarem-se dos seus poderes para ajudar familiares a obter emprego na Função Pública é uma situação que se tem agravado desde a transferência de administração de Macau”, começa por escrever Ng Kuok Cheong na interpelação oral que hoje vai estar em análise. “O tráfico de interesses, a troca de interesses e o nepotismo, entre outros fenómenos, agravam a tendência de corrompimento na Administração Pública de Macau, provocando lesões graves e profundas ao desenvolvimento” do território, prossegue o deputado, que chama a atenção para o facto de os cidadãos não disporem de quaisquer meios para impedir “esses fenómenos”. O pró-democrata cita depois as declarações de Ho Chio Meng, reproduzidas pelos jornais, lembrando que o gabinete da secretária para a Administração e Justiça confirmou que Sónia Chan telefonou ao antigo procurador para “recomendar” um familiar para trabalhar no MP, “familiar este que foi mesmo recrutado”. Recordando que existem regras para o ingresso na Função Pública, Ng vinca que a população “questiona a ‘apresentação’ ou ‘recomendação’ envolvendo aquele tipo de altos dirigentes”, havendo dúvidas sobre a legalidade do que aconteceu. Neste contexto, o deputado defende que o Governo deve regulamentar os actos de “apresentação” ou “recomendação” de familiares entre os altos dirigentes, perguntando ao Executivo como é que tenciona fazê-lo. Ng Kuok Cheong quer ainda saber se “o Chefe do Executivo chegou a imputar as devidas responsabilidades” às titulares dos principais cargos da área da Administração e Justiça. Onde fica a lei Pereira Coutinho faz uma interpelação mais directa, em que considera que a conduta de Sónia Chan “viola o Estatuto dos Trabalhadores da Função Pública de Macau”. Ao ter telefonado a Ho Chio Meng, recomendando um familiar que conseguiu um emprego no MP, a secretária “violou directamente o dever de isenção, que consiste em os funcionários não retirarem vantagens que não sejam devidas por lei, directas ou indirectas, pecuniárias ou outras, das funções que exercem, actuando com imparcialidade e independência em relação aos interesses e pressões particulares de qualquer índole”. Coutinho salienta que o telefonema ao antigo procurador da RAEM foi feito numa altura em Sónia Chan que era “responsável máxima de um serviço público”. E não afasta a possibilidade de ter sido violado o Código Penal, “quanto aos abusos de poderes inerentes às suas funções, com intenção de obter, para si ou para terceiro, benefício ilegítimo ou de causar prejuízo a outras pessoas”. “Que medidas vão ser adoptadas pelo Governo para apurar responsabilidades da antiga e da actual secretária para a Administração e Justiça, nomeadamente na ‘colocação de pessoas dentro do MP e eventualmente noutros serviços públicos?”, lança o deputado. Pereira Coutinho gostaria ainda de saber se o Executivo vai apurar “a extensão do abuso de poderes derivados dos cargos públicos que ocupam” e quais as medidas que vão ser implementadas no sentido de evitar que estas situações se repitam. Assuntos às dúzias As interpelações orais de Ng Kuok Cheong e Pereira Coutinho fazem parte de um conjunto de 12, num plenário dedicado exclusivamente ao exercício deste mecanismo de fiscalização da acção governativa. Vão ser abordados os mais variados temas, desde a protecção da Ilha Verde, assunto que preocupa Ho Ion Sang, à melhoria dos estabelecimentos de prestação de cuidados infantis, questão levada ao plenário por Wong Kit Cheng. Kwan Tsui Hang não desiste de lutar pelos direitos dos motoristas locais, o seu mais recente cavalo de batalha, e Lam Heong Sang insiste na urgência da revisão da lei da importação de trabalhadores não residentes. Mak Soi Kun quer explicações sobre as perspectivas demográficas do território e Si Ka Lon interroga o Executivo sobre o tal “quarto espaço”, ainda em fase inicial de concepção. Já Angela Leong está preocupada com as indústrias culturais e criativas, e Song Pek Kei propõe o alargamento dos serviços non-stop prestados pelo Instituto para os Assuntos Cívicos e Municipais.
Andreia Sofia Silva Manchete PolíticaDebate | Agnes Lam pede novo sistema para ouvir população A Associação Energia Cívica promoveu ontem um debate sobre a ausência de consulta de opiniões em polémicas como a Biblioteca Central ou o aumento das taxas de veículos. Agnes Lam defende a implementação de um novo sistema [dropcap style≠’circle’]H[/dropcap]á temas que são alvo de consulta pública, enquanto que outras medidas são simplesmente implementadas sem que a população seja ouvida sobre o assunto. É para combater aquilo que considera ser um problema recorrente que Agnes Lam, presidente da Associação Energia Cívica, promoveu ontem um debate no Jardim das Artes, intitulado “Como resolver o problema de Macau?”, o qual contou com três oradores, um deles o activista Joe Chan. Em cima da mesa estiveram polémicas recentes, como o caso da construção da Biblioteca Central, no edifício do antigo tribunal, ou o aumento das taxas de veículos e motociclos. Ao HM, Agnes Lam disse que acredita ser necessário apostar num novo mecanismo que permita às pessoas decidirem sobre as medidas que influenciam o seu dia-a-dia, em vez de se apostar apenas na realização de consultas públicas. “Não temos um sistema efectivo de consulta da população, e por isso é que temos sempre o mesmo tipo de problemas. O Governo quer implementar algo, fazem consultas públicas sobre determinados assuntos, mas sobre outros simplesmente não fazem nenhuma consulta e esperam que o assunto passe. Estamos constantemente dependentes do facto de não haver estruturas e recursos suficientes e pensamos que esses problemas de longo prazo merecem uma discussão. Deve haver uma mudança sistemática”, referiu. Agnes Lam deu o exemplo de Hong Kong, onde existem assembleias populares que decidem questões semelhantes à dos aumentos dos veículos. “É certo que é necessário um aumento ao fim de 20 anos, mas é preciso fazer uma grande consulta sobre esse assunto. Em Hong Kong têm uma assembleia que decide esse tipo de aumentos, mas em Macau não temos esse tipo de sistema. Não temos um mecanismo para fazer as coisas.” Alterar a origem A ex-candidata às eleições legislativas e docente na Universidade de Macau considera que a própria regulação base das consultas públicas tem de ser alterada. “Há uma regulação que determina como é que o Governo deve fazer as consultas públicas, mas esse tipo de regulação, ela própria, nunca foi alvo de uma consulta. É certo que o Governo lança uma ideia e recolhe as opiniões, mas não temos um sistema ou uma lei específicos.” Sobre os aumentos das taxas de veículos, que já motivaram um protesto, Agnes Lam frisa que a população lida diariamente com a falta de estacionamento e recursos. “Não temos muitas das estruturas construídas, mas ao mesmo tempo não há estacionamento para as pessoas e transportes públicos. O Governo está a tentar promover um sério controlo quanto ao estacionamento ilegal, mas mostra que não temos um planeamento, uma ideia concreta, um planeamento da cidade com base em diferentes recursos”, concluiu a docente.
Hoje Macau PolíticaMembros do CCPPC entregaram relatório sobre Macau a Chui Sai On [dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] Chefe do Executivo recebeu das mãos dos delegados do Comité Nacional da Conferência Consultiva Política do Povo Chinês (CCPPC) um relatório “de pesquisa sobre as novas oportunidades do desenvolvimento de Macau”, no contexto do 13º Plano Quinquenal da República Popular da China. Um comunicado oficial explica que este documento foi entregue a Chui Sai On num encontro ocorrido na passada sexta-feira com cinco membros do CCPPC: Eric Yeung, Liu Chak Wan, Ngan In Leng, Ma Iao Lai e Leong Wa. Este foi o oitavo relatório realizado pelos delegados do CCPPC. Citado no comunicado, Eric Yeung referiu que foram analisadas “novas oportunidades do desenvolvimento de Macau, as estratégias de crescimento das indústrias culturais e a inovação da ciência e tecnologia”. O relatório “apresenta de forma breve os desafios que Macau enfrenta”, tal como o “ajustamento profundo da economia”, sem esquecer a “exigência da diversificação das indústrias referindo em destaque as novas oportunidades do desenvolvimento das indústrias sob o 13º Plano Quinquenal”. A pesquisa realizada pelos delegados do CCPPC aborda ainda a “diversificação adequada económica de Macau, o desenvolvimento do sistema financeiro com características próprias, a expansão da rede ligada à indústria de natureza financeira, desenvolvimento da economia marítima, abertura de novos espaços de crescimento, bem como a implementação de medidas de garantia, entre outros.” Chui Sai On prometeu entregar estas conclusões ao Gabinete de Estudo de Políticas “para acompanhamento e análise”, sendo que “muitos dos resultados obtidos nas pesquisas podem servir como referência na futura acção governativa”, defendeu. O Chefe do Executivo falou ainda da cooperação que tem sido mantida com os delegados do CCPPC, sobretudo no “trabalho da delimitação das áreas marítimas sob a jurisdição da RAEM”.
Hoje Macau SociedadeEstudo | Economia de Macau deve crescer 3,2 por cento São previsões optimistas dos economistas da Universidade de Macau, sujeitas a ajustamento caso se revele necessário. A economia vai crescer, a inflação vai ser baixa e o desemprego não sofrerá alterações [dropcap style≠’circle’]A[/dropcap] Universidade de Macau (UM) prevê que a economia do território regresse ao crescimento positivo este ano, antecipando uma expansão de 3,2 por cento, e baixas taxas de inflação e desemprego. Esse valor situa-se no intervalo entre uma previsão mais pessimista – de queda de 6,9 por cento – e uma mais optimista de crescimento de 13,2 por cento, explica o Departamento de Economia da UM que apresentou, na sexta-feira, a sua perspectiva macroeconómica de Macau para 2017. O cenário traçado afigura-se bastante mais positivo do que o antecipado pelo Fundo Monetário Internacional (FMI), apesar do Departamento de Economia da UM ressalvar que os dados sinalizam a possibilidade de haver um “contínuo ajustamento” do crescimento económico de Macau durante este ano, pelo que a previsão será actualizada para reflectir eventuais mudanças. Arrastada pelo desempenho da indústria do jogo, a economia de Macau entrou em queda no terceiro trimestre de 2014, ano em que, pela primeira vez desde a transferência de administração, em 1999, o Produto Interno Bruto (PIB) diminuiu (-1,2 por cento). Em 2015, o PIB caiu 21,5 por cento. Já no primeiro e segundo trimestres de 2016 contraiu-se 12,4 por cento e sete por cento, respectivamente, em termos anuais homólogos. Ao fim de dois anos de contracção, a economia de Macau voltou a crescer, com o PIB a aumentar quatro por cento no terceiro trimestre de 2016. Os dados relativos ao quarto trimestre e ao cômputo do ano passado vão ser publicados no início de Março. O FMI estimou, em Outubro passado, que a economia de Macau iria cair 4,7 por cento em 2016, antes de retomar o crescimento positivo este ano (+0,2 por cento). As receitas dos casinos caíram em 2016 pelo terceiro ano consecutivo, mas a parte final do ano mostrou sinais de recuperação da indústria que constitui o principal motor da economia de Macau, com Dezembro a marcar o quinto mês consecutivo de subida das receitas em termos anuais homólogos. Pouco desemprego Na perspectiva macroeconómica para 2017, o Departamento de Economia da UM antecipa ainda uma baixa taxa de desemprego de dois por cento – idêntica à actual (era de 1,9 por cento em Novembro). Já a taxa de inflação, medida através da variação do Índice de Preços no Consumidor (IPC), deve “continuar a diminuir devido à fraca procura por parte dos residentes”, com o Departamento de Economia da UM a antecipar que se fixe em 2,6 por cento este ano.
Hoje Macau SociedadeInvestigação | “Sanção penal” à Sands sobre práticas corruptas em Macau A Las Vegas Sands acordou pagar 6,96 milhões de dólares para pôr termo a uma investigação sobre supostas práticas corruptas à luz da lei norte-americana. Em causa estava uma antiga relação com um consultor em Macau e na China [dropcap style≠’circle’]C[/dropcap]om o acordo – em que Las Vegas Sands aceita pagar 6,96 milhões de dólares como “sanção penal” –, a empresa do magnata Shledon Adelson coloca termo a uma investigação, que dura há mais de cinco anos, sobre se violou a lei federal sobre práticas de corrupção no estrangeiro (FCPA, na sigla em inglês) ao pagar a um consultor para a ajudar a fazer negócios em Macau e na China, indica um comunicado divulgado no final da semana passada pelo Departamento de Justiça norte-americano. A lei proíbe empresas com sede nos Estados Unidos e os seus executivos de efectuarem pagamentos a membros de governos estrangeiros para tentar influenciar, conseguir ou manter negócios. Este acordo com o Departamento de Justiça dos Estados Unidos segue-se a um outro relacionado, alcançado em Abril, em que a empresa aceitou pagar uma multa de nove milhões de dólares para encerrar uma investigação da Comissão de Valores Mobiliários dos Estados Unidos, de acordo com a qual alguns pagamentos ao consultor não foram devidamente autorizados ou documentados. A empresa não foi acusada por crime, nem admitiu a culpa em nenhum dos casos. No comunicado, citado pelo portal especializado em jogo GGRAsia, o Departamento de Justiça norte-americano afirma que determinados executivos da Las Vegas Sands “consciente e deliberadamente falham em aplicar um sistema de controlos internos de contabilidade”. Esses mecanismos seriam necessários para garantir a legitimidade dos pagamentos ao consultor de negócios “que ajudou a Sands a promover a sua marca em Macau e na República Popular da China, e impedir a falsa inscrição desses pagamentos nos seus livros de registos”, indicou ainda o Departamento de Justiça. A investigação, levada a cabo pela divisão criminal do Departamento de Justiça, indica que, entre 2006 e 2009, a Las Vegas Sands – através das suas subsidiárias em Macau e na China – transferiu aproximadamente 60 milhões de dólares para um consultor com o objectivo de promover o seu negócio e marcas. A Las Vegas Sands admitiu ter pagado cerca de 5,8 milhões de dólares ao consultor “sem qualquer objectivo de negócios legítimo discernível” entre 2006 e 2009, de acordo com o Departamento de Justiça dos Estados Unidos. “Apesar das advertências do seu pessoal financeiro e de um auditor externo”, a Las Vegas Sands terá continuado a fazer pagamentos ao consultor de negócios, descrito na investigação do Departamento de Justiça norte-americano como uma pessoa baseada no interior da China, que se apresentava como “um antigo membro do Governo da República Popular da China”, e publicitava as suas ligações políticas com membros do Governo chinês como “a sua principal qualificação” para facultar assistência. Tudo resolvido Ron Reese, porta-voz da Sands, citado pela agência AP, saudou o desfecho do processo: “A empresa congratula-se com o facto de a sua cooperação e compromisso para com o cumprimento [da lei] de longo prazo terem sido reconhecidos no alcance desta resolução”, e que “todos os inquéritos relacionados com estes assuntos estejam agora completamente resolvidos”. O Departamento de Justiça afirmou que a Las Vegas Sands “cooperou totalmente com a investigação”, e destacou a adopção de extensas medidas correctivas, acrescentando que a empresa ou as suas subsidiárias já não empregam nenhum dos indivíduos implicados no caso. As investigações do Departamento de Justiça e da Comissão de Valores Mobiliários dos Estados Unidos foram anunciadas ao mesmo tempo, em 2011, e resultaram dos mesmos alegados actos no quadro dos esforços da empresa para se transformar num dos principais ‘players’ em Macau, que se tornou numa mina de ouro para as operadoras norte-americanas que aproveitaram a liberalização do sector.
Hoje Macau SociedadeUng Vai Meng distinguido com louvor por Alexis Tam [dropcap style≠’circle’]A[/dropcap]lexis Tam, secretário para os Assuntos Sociais e Cultura, vai distinguir com louvor o ex-presidente do Instituto Cultural (IC), Ung Vai Meng, que irá “aposentar-se brevemente”, aponta um comunicado oficial. Enquanto isso, o novo presidente do IC, Leung Hio Ming, irá tomar posse a 17 de Fevereiro. Falando sobre o assunto no âmbito do jantar de primavera do IC, Alexis Tam disse que Ung Vai Meng “demonstrou um elevado sentido de serviço público, grande dedicação, lealdade, zelo e espírito de responsabilidade na implementação das políticas na área da cultura, no impulsionamento do desenvolvimento das infra-estruturas culturais e na protecção do património cultural da RAEM, tendo contribuído decisivamente para alcançar resultados relevantes”. No cargo desde 2010, Guilherme Ung Vai Meng, também reconhecido pelo seu trabalho enquanto artista, distinguiu-se, na opinião de Alexis Tam, “pelo sentido de missão, tendo colocado ao serviço da causa pública o seu vasto domínio de conhecimentos culturais e capacidades artísticas”. O secretário da tutela defendeu ainda que, na era Ung Vai Meng, o IC se pautou pela mudança. O ex-presidente “revelou abnegação e espírito de sacrifício na liderança da equipa daquele Instituto onde incutiu, permanentemente, o espírito empreendedor e de brio na inovação, preservação e realização de variadíssimas actividades culturais”, aponta o mesmo comunicado oficial.
João Luz SociedadeManifestação | Motoristas protestam em frente da sede do Governo Não foram muitos mas fizeram-se ouvir. Motoristas manifestaram-se ontem em frente da sede do Governo para exigir medidas contra a importação de mão-de-obra estrangeira e o fim das taxas aos veículos, que consideram exageradas Com Vitor Ng [dropcap style≠’circle’]N[/dropcap]a praça de Iao Hon os poucos presentes foram-se reunindo enquanto uma coluna tocava o hino da internacional socialista. Antes de começar o seu discurso, falámos com Iam Veng Hong, organizador do protesto e responsável da Associações dos Motoristas Locais, “que será inaugurada a curto prazo”. O também camionista elencou entre as razões para a manifestação o “aumento exagerado das taxas aos veículos, que influencia gravemente a vida dos cidadãos”, explica. Além disso, o outro objectivo é “mostrar o desagrado contra a importação de mão-de-obra, sobretudo de motoristas, e o impacto que daí advém para os direitos e interesses dos profissionais locais”. Para Iam Veng Hong Macau já tem motoristas suficientes, considerando ainda que nos dias se hoje se despede com grande facilidade. “Tenho um amigo que foi despedido pela empresa por ter batido num espelho retrovisor, uma situação que era resolvida com uma multa”. O camionista conta também um caso em que um colega seu ficou sem emprego depois de ter saído apenas dois minutos atrasado. Para o activista, a razão destes despedimentos injustos prende-se com a vontade dos patrões quererem contratar motoristas não residentes. Quando confrontado com a verdadeira taxa de desemprego, na casa dos 1,9 por cento, o organizador do protesto contra a importação de mão-de-obra estrangeira deu uma resposta evasiva. “Em relação às taxas de desemprego, acho que há muitas pessoas que não têm emprego agora”, disse. Pão para a boca Seguindo a mesma linha, Chan Chak, motorista de entrega de pão, e um repetente neste tipo de manifestações, considera que “com a vontade dos patrões em quererem contratar não residentes, os locais sofrerão com salários baixos e a vida vai tornar-se mais dura”. O motorista, que aufere um salário de 14,1 mil patacas mensalmente, acha que os primeiros a perderem os empregos serão os condutores profissionais mais velhos. Para o camionista, nem tudo está mal na acção do Executivo. “Na verdade, o governo já fez muitas coisas, tal como a formação para motoristas de autocarros, dessa forma muitas pessoas foram trabalhar para as companhias de transportes públicos, e ficaram menos para conduzir os camiões de mercadorias”, comenta Chan Chak. Além disso, o motorista acha que os patrões conseguem pagar mais do que dizem, além de exigirem mais horas dos trabalhadores. Quando questionado sobre a taxa de desemprego, Chan Chak tem em conta o crescimento rápido de Macau e a necessidade de contratação de trabalhadores que têm de acompanhar esse crescimento. O motorista considera que a contratação de trabalhadores não residentes (TNRs) é algo a ponderar com cuidado, e de forma equitativa. “Se o governo insistir em importar TNRs, deve também empregá-los noutros departamentos, e dar-lhes salários e trabalhos iguais aos dos residentes locais. Neste contexto, de forma justa, as autoridades podem escolher se ainda querem empregar estrangeiros”, comenta. Para o homem que conduz um camião que transporta pão, os trabalhadores locais são melhores para economia, porque gastam o seu dinheiro cá.
João Luz EventosPintura | Inaugurada amanhã a exposição de Manuela Martins [dropcap style≠’circle’]C[/dropcap]om uma vida recheada, Manuela Martins foi professora de meia Macau, viveu em Moçambique, constituiu família, mas apesar das trocas de continente teve sempre uma constante na sua vida: a pintura. Já com idade avançada, 84 anos, e com problemas de saúde, não pudemos chegar à fala com a pintora. Como tal, falámos com um dos seus filhos, Rui Calçada Bastos, artista plástico, que organizou a exposição. O público poderá ver uma selecção de peças que a artista tinha em casa, desde quadros de 2009 até mais recentes “da última vez que esteve cá, mas sempre muito direccionadas para temas relacionados com Macau”, explica o filho. Entre os quadros escolhidos há retrato do emblemático Padre Teixeira, o que vem de encontro ao modo de pintar de Manuela Martins, retratar aquilo que vê pelos sítios por onde vai passando, daí o nome da exposição: Observações. Quem se deslocar à Casa Garden poderá ver entre 25 a 28 telas, no habitual óleo que caracteriza a carreira da pintora. Enquanto deu aulas em Macau, Manuela foi expondo com regularidade, todos anos havia sempre algo a apresentar. Mesmo hoje, com 84 anos, continua com uma produção considerável. “Isso já vai muito além dos conceitos, se é arte contemporânea, ou não, já não interessa muito, acho que é mais a demonstração de acreditar na pintura e de manter uma enorme curiosidade no olhar”, comenta o artista plástico. Traço de uma geração Com uma formação muito académica como artista, fiel ao óleo sobre tela e às representações figurativas, Manuela Martins faz parte da geração que estudou nas Belas Artes nos anos 50. Colega de artistas conceituados como Lourdes Castro e José Escada, Manuela trilhou um caminho diferente, não inteiramente dedicado às artes. “O que aconteceu com a minha mãe foi ter mudado de vida várias vezes, foi viver para Moçambique, apaixonou-se, teve filhos, tudo rumos complicados para uma carreira artística”, explica o filho. Ao contrário dos seus colegas que investiram a sério numa carreira, Manuela seguiu a vida “normal” de uma mulher. Para Rui Calçada Bastos, a mãe poderia ter chegado a outro patamar de visibilidade, se tivesse apostado apenas na pintura. No entanto, a vida deu-lhe experiência que se reflecte na sua arte. “Sempre foi honesta consigo própria, pintando aquilo que via”, explica o filho, e organizador da exposição, acrescentando ainda que acha que a mãe deixa um legado genial, porque tem “pinturas dos costumes africanos dos anos 50/60, e depois a visão que ela teve de Macau”. “A minha mãe foi o trigger disto tudo, eu cresci a vê-la pintar”, conta o artista plástico. Dos quatro filhos que Manuela teve, Rui foi o que decidiu também abraçar as artes. Foi pelo pincel da mãe que percebeu “que há coisas no mundo externo que não estão lá ao primeiro olhar, essa curiosidade foi ela que me imprimiu”, explica. Certamente que Rui não será a único a ser inspirado por uma figura incontornável desta cidade, de alguém que transformou a sua visão de Macau em arte.