Liberalismo e Darwinismo Social

[dropcap style=’circle’]R[/dropcap]obert Nozick nascido em Brooklyn, filho de um empresário judeu oriundo da Rússia, casado com a poetisa, Gjertrud Schnackenberg, Nozick morreu muito precocemente em 2002, após uma prolongada luta contra o cancro, e com menos de 40 anos. Os seus restos mortais estão enterrados no Cemitério Mount Auburn em Cambridge, Massachusetts. Robert Nozick pode ser considerado um filósofo, embora tenha confessado não ter encontrado grande prazer quando cursou filosofia no Columbia College. Contudo esta formação de base em filosofia permitiu-lhe continuar os estudos na Universidade de Princeton onde viria a doutorar-se com uma tese sobre a “Teoria Normativa da Escolha Individual”. E tudo isto lhe permitiu vir um dia a ser Professor na Universidade de Harvard. Se durante a época de Columbia se tinha tornado militante socialista, já em Princeton, na Pós-Graduação, teve contacto com as ideias neoliberais, o que modificou a sua posição política definitivamente: de socialista passou a ardoroso defensor do neoliberalismo. Veio a filiar-se, ideologicamente falando, no neoliberalismo libertário ou anarquista (corrente central do neoliberalismo), cujas raízes remontam a John Locke, Adam Smith, John Stuart Mill, David Ricardo, Paul A. Samuelson, Milton Friedman e Friedrich Hayek. No título do seu doutoramento estão delineadas as suas grandes paixões intelectuais assim como as suas preferências sociais e políticas. Nozick é hoje considerado um dos autores mais importantes do liberalismo contemporâneo para a defesa do qual procurou encontrar as fundamentações não apenas sociais e políticas mas também éticas e sobretudo morais. Robert Nozick desempenhou um papel fundamental na confrontação ideológica que colocou frente a frente, em particular na cultura anglo-americana, liberais e comunitaristas (comunitarians). Os liberais também são identificados nesta polémica como libertários (libertarians), no sentido de libertados da tutela asfixiante do estado, estou a referir-me a estes liberais, ultra individualistas, quase anarquistas (na linha de Murray Rothbard), uma vez que persiste outro tipo de liberais, os liberais igualitaristas (igualitarians) de tipo social-democrata.

Na aproximação à sua obra devem ter-se em conta, desde logo as suas convicções liberais, depois o radicalismo da sua oposição ao comunitarismo e finalmente na sua obra nuclear, Anarquia, Estado e Utopia, o facto de ela representar uma reacção ao não menos importante livro de John Rawls, Uma Teoria da Justiça.
O Respeito de Nozick por Rawls está acima de toda a suspeita. Ele leu com paixão o livro de Rawls e apesar da profunda admiração pela obra, não se sente identificado com os seus objectivos. Ele exprime-se nestes termos: “Uma Teoria da Justiça é uma obra de filosofia política e moral poderosa, profunda, subtil, de grande fôlego, sistemática, à qual nada se pode comparar desde os escritos de Stuart Mill, quando muito. É uma fonte de ideias luminosas, integradas num todo cativante. Os filósofos da política hoje têm ou de trabalhar no seio da teoria de Rawls ou de explicar por que não o fazem (NOZICK, Robert. 1991). A publicação de Anarquia, Estado e Utopia é justamente para Nozick explicar porque não pode nem quer trabalhar no seio da teoria distributiva de Rawls.
A publicação é dividida em três partes. A primeira – intitulada “Anarquia” – busca justificar o porquê da necessidade de um Estado Mínimo; a segunda – “Estado” – apresenta a alegação de que nenhum Estado mais amplo pode ser justificado; e a terceira – “Utopia” – defende o facto de que a teoria apresentada pelo autor não busca impor uma maneira de comportamento que deva ser acatada por todos, mas antes que a sua teoria permita com que todos vivam as suas vidas da forma como bem desejarem, sem terem os seus direitos fundamentais violados.
Neste livro, Nozick defende uma forma de liberalismo radical, na qual se promove, naturalmente, uma posição neutra do Estado, perante as escolhas voluntárias de adultos conscientes. O individualismo consequente e radical faz corpo com a concepção de um estado mínimo, como veremos. Para a coerência da sua posição liberal e individualista, Nozick parte, em primeiro lugar, de uma definição clara dos contornos do Estado, o que significa, das suas áreas de acção, definindo, portanto o papel (restrito) que deve ser desempenhado pelo Estado. Qualquer acção do estado, diversa daquela que está contida dentro dos seus contornos, pré determinados na sua definição, passará a ser considerada uma violação drástica dos direitos individuais dos cidadãos. E assim, esse estado mínimo terá como funções apenas: a protecção da liberdade contratual, a protecção do direito de propriedade e a segurança dos indivíduos. 291015P13T1
O direito de propriedade (O individualismo possessivo de que falava C. B. Macpherson, na linha de autores como Locke, Hobbes e Harrington, por exemplo), é inalienável e perante ele devem parar outras pretensões, mesmo a pretensão à felicidade, se for caso disso. Para opor o seu liberalismo ao utilitarismo, Nozick não hesita em argumentar à maneira kantiana, considerando que a protecção dos direitos individuais é da ordem do imperativo categórico, pois devem ser respeitados independentemente de todas as circunstâncias, ou seja, tal como em Kant, apelando à sua incondicionalidade transcendental. Ora o utilitarismo é um consequencialismo, eu diria mesmo um finalismo instrumental o que choca com o argumento de Nozick, que aponta para uma ideia de liberdade sem instrumentalização. Acima de tudo está a liberdade individual que não cede perante nada.
Voltemos à natureza da génese deste livro. Porque é que Nozick enfrenta o neo contratualismo explícito na obra de Rawls, assim como as teorias distributivas e o estado social nelas contidas pelo menos implicitamente. A resposta está no livro, mas a base de toda a argumentação reside na ideologia libertária liberal que Nozick partilha com a grande tradição do pensamento liberal e individualista.

Nota: Ter em conta o estado de Natureza de Locke, onde esse Estado de Natureza gerava extrema insegurança. E isso acontecia por que quando alguns direitos eram violados, os indivíduos não tinham nenhuma entidade à qual recorrer. A única maneira de fazer justiça seria pelas próprias mãos ou eles mesmos executando a lei que protegeria a propriedade individual.

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