Perspectivas VozesMigração questão milenar José Simões Morais - 22 Set 2015 “JHA is a fragmented policy field that responds to different policy-making rules (intergovernmental and supranational. The development of a JHA external dimension is dependent upon two variables: states’ preferences and historical legacies. The different combination of those variables border management, counter-terrorism and rule of law promotion leads to different patterns and trends. The most general trend identified is that the JHA external dimension, applied to the Mediterranean region, is more dependent upon institutional processes (historical legacies and Member states’ preferences) than upon ideational elements. Contrary to widespread belief, the development of a JHA external dimension started well before 9/11 and was the result of various institutional factors, in particular path-dependency and states’ preferences.” The Mediterranean Dimension of the European Union’s Internal Security Sarah Wolff [dropcap style=’circle’]A[/dropcap]maior parte das vezes por necessidade, outros obrigados por outros conflitos e guerras, e umas quantas mais pelo desejo de alargar o seu poder, há milhares de anos o ser humano tem emigrado, ou foi deslocado pela força para novos locais ou países, sendo um fenómeno que se repete actualmente, com o fluxo descomunal de cidadãos provenientes de África e do Médio Oriente para a Europa. As previsões da “Organização Internacional para as Migrações (OIM) ”, calculam que mais de quatrocentas e trinta mil pessoas atravessaram o Mediterrâneo para a Europa, desde o início do ano, e cerca de duas mil e oitocentas pessoas morreram ou desapareceram nessa tentativa, e cujo número aumenta diariamente. As previsões podem estar muito aquém do número real, pois milhares de pessoas têm atravessado as fronteiras a pé, provenientes da Síria, Iraque, Afeganistão, Irão e Paquistão à procura de um futuro melhor para si e suas famílias e, muitas das vezes fugindo de conflitos, perseguições e da crise económica. Assim aconteceu na antiguidade com grandes migrações, e movimentos de deslocamento relativamente recentes como as duas grandes guerras mundiais ou a crise dos refugiados na antiga república da Jugoslávia, em que desenraizados carregando nas costas os seus poucos pertences, se sujeitaram a caminhadas enormes de centenas ou milhares de quilómetros. O Alto-comissário das Nações Unidas para Refugiados (ACNUR) estima que existem cinquenta milhões de vítimas de deslocação forçada, incluindo refugiados, requerentes de asilo, apátridas e deslocados internos. As primeiras migrações deram-se há milhares de anos de África para a Europa e Ásia, assim como, deste último continente para a América, através do Estreito de Bering, aproveitando o congelamento do mar e o menor nível das águas. É de considerar os povos asiáticos que povoaram partes da Europa. Há mais de dois milénios, indo-europeus que inicialmente podem ter vindo de regiões da Ásia estenderam-se pelo centro e sul da Europa e assim nasceu o mundo greco-latino, embora para o Ocidente foram outros, conhecidos como celtas e germânicos. Os povos gregos e fenícios habitaram extensas terras do norte da África e outras regiões no território europeu e fundaram as “polis”, termo que passou a denominar as primeiras cidades antigas. Ainda existem alguns indícios, de que os Vikings, povos do norte da Europa, pudessem ter chegado ao que é actualmente a América do Norte, muito antes de Cristóvão Colombo, e dessas supostas viagens não existem indicações de que tal facto, tenha criado uma migração, como aconteceu depois da primeira viagem dos genoveses em 1492. Os “Descobrimentos” deram lugar a um grande movimento migratório dos países europeus, liderados por Portugal, Espanha e Inglaterra para o “Novo Mundo”. A extensão do território americano e a sua imensa riqueza natural, também, deram origem à chegada de todo o tipo de europeus que não vieram necessariamente com boas intenções, como ficou provado pela devastação de muitos povos da América Central e do Sul. O capítulo mais vergonhoso da humanidade, após a descoberta da América, foi o tráfico de negros de África para trabalhar e explorar os recursos naturais do novo continente, uma vez que a subjugação dos povos indígenas não foi suficiente para fornecer mão-de-obra para a grande quantidade de trabalho existente. A escravidão que se deu, desde 1500 até 1850, fez chegar doze milhões de negros ao continente americano. Ainda que o descobrimento da América tenha gerado vagas sucessivas de emigrantes europeus, o grande fluxo de pessoas em busca de outras oportunidades no “Novo Mundo”, ocorreu depois de 1800 e não conseguiu parar até à primeira metade do século XX. Estima-se que em quase um século e meio vieram para a América cinquenta e cinco milhões de pessoas. Aos Estados Unidos, desde o final do século XIX chegaram mais de um milhão de emigrantes por ano, particularmente ingleses, irlandeses, italianos, austríacos e gregos que se instalaram inicialmente na costa leste e centro do país, embora muitos tenham atravessado o país para Ocidente, onde a corrida ao ouro durou várias décadas. A primeira e a segunda Guerra Mundial foram, por causa do seu impacto e brevidade, as duas fontes de deslocação e migração dentro da Europa e de outros continentes por comunidades expulsas. Os movimentos que foram criados pelos dois conflitos e que também incluía a redefinição das fronteiras de muitos países são estimados em quarenta e cinco milhões de pessoas. A Guerra Civil espanhola foi um conflito que resultou no exílio de mais de um milhão de pessoas que foram principalmente para a América e, em menor grau para outros países europeus. A independência, e posterior divisão do subcontinente indiano, levou ao deslocamento de mais de quinze milhões de pessoas, principalmente por motivos religiosos, dois anos após o término da II Guerra Mundial. A guerra de três anos e a posterior divisão da Coreia em duas, em 1953, foi também motivo de deslocamento de aproximadamente quatro milhões de pessoas. Os conflitos nos Balcãs, que ocorreram na década de 1990, através de um conjunto de guerras étnicas e religiosas, e que causou a fragmentação da República da Jugoslávia, deixaram quatro milhões de pessoas deslocadas. A África foi assolada por vários conflitos que ocorreram no Sudão, Libéria, Ruanda, Serra Leoa, Tanzânia, Guiné e Etiópia, dos quais resultaram dez milhões de refugiados e pessoas deslocadas. O “Conselho Europeu para a Justiça e Assuntos Internos” reuniu-se em Bruxelas, a 14 de Setembro de 2015, para debater a actual crise de migração, sabendo que a União Europeia (UE) se encontra profundamente dividida quanto à gestão da maior crise de refugiados desde a II Guerra Mundial. A Alemanha tinha anunciado que iria proceder à reinstalação dos controlos na sua fronteira sul com a Áustria. A Áustria, de seguida instalou o mesmo procedimento na sua fronteira com a Hungria e a Eslováquia. A Holanda reforçou os seus controlos e a Polónia e a Bélgica estudam semelhantes medidas. Os ministros do Interior e da Justiça da UE, perante este trágico cenário não conseguiram chegar a um acordo sobre a distribuição de cento e vinte mil refugiados, que seriam adicionados aos quarenta mil que tinham sido aceites em Maio de 2015, dado não ter havido unanimidade, porque a Hungria, Eslováquia, Polónia, República Checa e Letónia, recusaram a proposta. A Presidência do Conselho concordou que antes da realização de uma cimeira de líderes, existiria uma nova reunião a 8 de Outubro de 2015, na qual se poderia votar por uma decisão que não carecia de unanimidade, e o grupo de Estados-membros que se recusaram a aceitar a proposta apresentada, não constituem uma maioria que impeça a aprovação das medidas postas a discussão. Os ministros apenas aprovaram um conjunto de medidas, a maioria quanto ao encerramento de fronteiras e impedimento da chegada de mais refugiados, sendo um dos principais pontos de consenso, a construção de centros de retenção na Grécia e Itália e a detenção de quem pise solo europeu, para separar os refugiados com direito a asilo dos emigrantes económicos. É de recordar que entre os refugiados se encontram muitos terroristas do estado islâmico, que as autoridades europeias se recusam a aceitar, apesar dos avisos de todos os quadrantes, incluindo do Papa Francisco. Os emigrantes económicos estão sujeitos à repatriação. A Alemanha quer incluir na lista dos países donde provêem os refugiados com direito a asilo, o Iraque, dado ter mais de três milhões de pessoas deslocadas internamente, e trezentas e setenta mil refugiados no exterior, sendo lar de duzentos e cinquenta mil refugiados sírios, e ter mais de oito milhões de pessoas a precisar de assistência humanitária e o estado islâmico controlar quase um terço do território. A Turquia não estaria em princípio na lista dada a situação dos curdos. Além disso, não haveria nenhuma distribuição dos refugiados na Europa até os centros de retenção estarem a operar e as fronteiras externas estarem mais cerradas. A Itália solicitou que a “Frontex”, a agência de controlo da fronteira europeia, seja responsável pelo repatriamento de emigrantes sem direito de asilo e que sejam financiados com fundos comunitários. Os ministros também estudaram a criação de mais campos de refugiados na África e no Médio Oriente para declarar que quem se encontre nesses campos não estaria em perigo e, logo, não tem direito de asilo. Além disso, concordaram em aumentar os fundos europeus para o “ACNUR” com o fim de melhorar a vida em campos de refugiados nos países vizinhos da Síria, Turquia, Líbano e Jordânia. A Turquia podia cooperar impedindo a saída de barcos das suas costas. A UE aprovou a segunda fase da operação militar EUNAVFOR Med, destinada a combater militarmente as máfias de traficantes de pessoas no Mediterrâneo. A primeira fase que se iniciou há quatro meses, apenas realizou a vigilância área e marítima, enquanto a segunda fase terá por objectivo deter os traficantes de pessoas e desmantelar o seu modelo económico. A missão só actuará em águas internacionais em virtude da ONU se negar a fazer aprovar uma resolução que permita ao dispositivo europeu a entrada em águas territoriais da Líbia. A hipotética terceira fase incluiria a inutilização nos seus portos, por meios militares, das embarcações que servem de transporte a emigrantes e refugiados desde a Líbia até Itália, mas para ser activada carece de um pedido expresso do governo líbio ou de uma resolução da ONU. As questões relacionadas com a migração serão objecto de novo debate no Conselho JAI de 8 de Outubro de 2015 e no Conselho Europeu, de 15 e 16 de Outubro de 2015. A cimeira especial sobre a migração, realizar-se-á, em La Valetta, a 11 e 12 de Novembro de 2015. Em Setembro de 2010, Kadafi ameaçou a UE de que a Europa se tornaria um continente negro se não lhe fossem pagos cinco mil milhões de euros por ano para parar a vaga de emigrantes de África para a Europa. Esta anedota, que agora pode ser meditada a partir da perspectiva da guerra na Líbia, é realmente triste e sintomática das contradições das políticas da UE para a região ao longo dos últimos anos. O espírito positivo inicial do “Processo de Barcelona” foi ultrapassado por preocupações da “realpolitik” que levaram os europeus a ser menos contundentes sobre a promoção de princípios normativos, tais como a democratização. Em vez disso, parece que as preocupações da migração, controlo de fronteiras e segurança interna da UE tomaram precedência sobre a promoção do Estado de direito e da democratização. Talvez tenha chegado a hora de rever a política externa e de segurança da UE para a região e investigar como as políticas JAI não só devem servir a segurança interna da Europa, mas também poderem contribuir para a segurança dos cidadãos da região. O objectivo de acelerar a liberdade, segurança e justiça na região é mais do que nunca desejável.