Uma doce ilusão

[dropcap style=’circle’]O[/dropcap]caso da médica macaense, que tirou o curso e fez a especialização em Portugal, rejeitada pelos Serviços de Saúde, pode servir-nos para perceber melhor como funciona realmente a sociedade local. Neste sentido, convém aquilatar o real poder do Governo e a sua efectiva capacidade para implementar decisões.

Isto porque uma coisa é Alexis Tam ordenar a contratação de médicos e outra coisa é o processo através do qual essas contratações vão ser feitas e que o Secretário, obviamente, não controla.

Ora é precisamente nesse segundo nível que os problemas parecem surgir e não apenas na área da Saúde. Não sabemos se estarão interesses obscuros em jogo ou mesmo outros mais claros e evidentes.

Mas a verdade é que o modo como os processos se desenrolam deviam estar sujeitos a um extremo grau de transparência. Se assim fosse, limitar-se-ia o raio de acção de quem, julgando-se estribado nalguma arrogância ou impunidade, decide não em função do interesse público ou de uma lógica sonante mas antolhado por preconceitos ou por objectivos menos claros.

Temos de considerar, por outro lado, que a sociedade local e a própria administração se encontram fragmentadas em pequenos poderes (interesses) que vão recolhendo dividendos que, à partida, não lhes pertenceriam.

Contudo, este poder é, na minha opinião, algo ilusório, desde Dezembro de 1999. As coisas continuam a funcionar mas tal sucederá unicamente enquanto não criarem desarmonia social.

Neste sentido, é bom entender as limitações dos Secretários, quando estes esbarram constantemente com segundas linhas, cujo programa não é exactamente o governamental. Pelo contrário, estamos perante agendas privadas, sem ideologia nem sentido prático, cujo desenrolar atrapalha amiúde os eventuais objectivos do Governo.

Quinze anos depois da transferência de soberania, se o Governo não conseguir controlar as referidas agendas, o risco estará no anunciado desfazer, progressivo e sistemático, de uma doce ilusão.

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