Hoje Macau China / ÁsiaActivistas de Hong Kong declaram-se culpados de participarem em vigília sobre Tiananmen Doze activistas pró-democracia de Hong Kong declararam-se hoje culpados de participarem numa vigília não autorizada para assinalar o chamado “massacre de Tiananmen”. Os 12 foram acusados de participarem na vigília não autorizada em 04 de junho do ano passado, quando milhares de habitantes de Hong Kong acenderam velas e entoaram cânticos, apesar dos avisos da polícia de que poderiam estar a infringir a lei. Sete deles foram também acusados de incitarem outros a integrarem a iniciativa. Devido à pandemia de covid-19, as autoridades de Hong Kong alegaram riscos para a saúde pública para proibir nos dois últimos anos as habituais vigílias que assinalavam o aniversário da repressão chinesa contra manifestantes na Praça Tiananmen em Pequim, em 1989, que resultou num número indeterminado de mortos. Activistas e oposição ao Governo de Hong Kong criticaram a proibição, argumentando que esta faz parte de uma repressão contínua contra a dissidência no território semiautónomo chinês, após meses de protestos antigovernamentais em 2019. Macau e Hong Kong eram os dois únicos locais na China em que se assinalava, publicamente, a data. Mas, tal como em Hong Kong, as autoridades também proibiram o evento. Entre os activistas que se declararam culpados contam-se o advogado Albert Ho, os antigos legisladores Eddie Chu e Figo Chan, e um antigo líder da Frente Cívica de Direitos Humanos, movimento conhecido por ter promovido as maiores manifestações pró-democracia em Hong Kong. Os 12 réus enfrentam agora uma pena que pode ir até aos cinco anos de prisão. Os activistas fazem parte de um grupo maior de detidos em 04 junho. Alguns deles, incluindo o fundador do Apple Daily, Jimmy Lai, declararam-se inocentes. Já o activista Joshua Wong, assim como três outros, também acusados de reunião ilegal na vigília de 04 de junho do ano passado, já se tinham declarado culpados em abril deste ano, tendo sido condenados a penas de prisão entre quatro e dez meses.
Salomé Fernandes Manchete PolíticaTUI | Au Kam San acha que decisão vai reflectir o futuro das liberdades Au Kam San entende que a decisão do Tribunal de Última Instância sobre o recurso apresentado pela União para o Desenvolvimento Democrático pode dar a entender qual o caminho que as liberdades de expressão, reunião e direito cívico vão seguir [dropcap]A[/dropcap]u Kam San considera que o resultado do recurso que assinou em nome da União para o Desenvolvimento Democrático (UDD) pode ser representativo da “direcção do vento para a liberdade de expressão, de reunião, direito cívico” ou até se o princípio ‘Um País, Dois Sistemas’ está a “perder a sua forma”. O deputado fez uma publicação no Facebook sobre os pontos que considera importantes na análise que o Tribunal de Última Instância vai fazer à decisão da polícia. Em causa está a negação da autorização à UDD para realizar a vigília sobre o massacre de Tiananmen. Au Kam San reitera que os cidadãos que pretendem exercer o direito de reunião ou manifestação devem avisar previamente a polícia, mas que este procedimento não é um pedido de autorização, pelo que não carece de aprovação. Além disso, comenta que o despacho da polícia defendia a decisão com base no princípio de que “sem prejuízo do direito à crítica, não são permitidas as reuniões ou manifestações para fins contrários à lei”. “O ponto crucial é saber se a vigília viola ou não a lei? Se sim, não permitir é justificável. Se não, é irrazoável. Como é que o tribunal vai julgar?”, questiona o deputado. Quanto ao argumento de violação à lei sobre a prevenção, controlo e tratamento de doenças transmissíveis, sublinhou a necessidade de se provar que os organizadores recusaram cooperar com as entidades competentes. Patriotismo linguístico Face a comentários de internautas que criticaram a publicação, nomeadamente de alguém que sugeriu que o deputado teria deixado de tomar medicação, o pró-democracia respondeu apenas ortograficamente. Au Kam San fez nova publicação a salientar que escrever chinês com vários erros “é um insulto à cultura chinesa”, questionando o direito de se falar de “amor à pátria”. “Não sei se alguém tem intenção de supervisionar o meu Facebook. Algumas crianças com um nível educacional muito baixo que vieram comentar, escreveram poucas palavras com vários erros”, escreveu Au Kam San, dando exemplos da escrita com falhas em chinês simplificado. O deputado expressa preocupação que a leitura de frases com má qualidade linguística a longo prazo possa criar habituação e o entendimento de que são palavras correctas. E pôs em causa os valores patrióticos de quem se expressa dessa forma. “Para o amor à pátria, em primeiro lugar tem que aprender bem chinês. Se não escrever bem chinês, e cometer vários erros, isso é um insulto à cultura chinesa. Como podem falar de amor à pátria?”, observou.
João Santos Filipe Manchete SociedadeMês de Portugal | Cônsul defende decisão do Governo sobre vigília Na apresentação das comemorações do 10 de Junho, em versão reduzida devido à pandemia da covid-19, Paulo Cunha Alves afirmou que a proibição do evento que assinala Tiananmen se deve a “um ano especial”. Também a romagem ao Jardim de Camões e a recepção à comunidade na residência consular foi cancelada [dropcap]O[/dropcap] cônsul de Portugal considera que vivemos um ano atípico e que por isso é expectável que haja eventos cancelados. Foi desta forma que Paulo Cunha Alves, de forma pessoal, ontem reagiu à proibição por parte do Corpo de Polícia de Segurança Pública da Vigília do Massacre de Tiananmen. “Considero que num contexto extraordinário e de pandemia que as regras não podem ser as mesmas. Têm de ser adaptadas à realidade”, começou por dizer Paulo Cunha Alves, quando questionado sobre a decisão do Governo da RAEM. “Com base nos argumentos utilizados pelas autoridades, este ano que é um ano diferente, esse evento não terá lugar”, acrescentou. O representante do Estado português esteve ontem no Consulado a apresentar o programa para as celebrações do 10 de Junho, dia de Portugal, Camões e as Comunidades Portuguesas e o mês de celebrações. A cerimónia do içar da bandeira vai decorrer dentro da normalidade, apesar de os participantes terem de utilizar máscaras e manterem uma distância social, mas não haverá a tradicional romagem, pelo menos com carácter público, ao Jardim de Camões para deixar uma coroa de flores e ler poesia. Também a recepção à comunidade portuguesa na residência consultar foi cancelada. Face a estes constrangimentos, e ao facto de se manter o içar da bandeira, Paulo Cunha Alves recusou ainda haver qualquer tratamento diferenciado. “À partida já sabíamos que este ano ia ser diferente. Não é todos os anos que temos uma pandemia a decorrer. Nessa perspectiva, a comissão recebeu bem as orientações gerais dos Serviços de Saúde para a organização de eventos”, indicou. “Não podemos misturar assuntos e creio que a mesma tabela é aplicada a todos”, sublinhou. Sobre a opção de realizar o içar da bandeira, mas não a romaria, a diferença foi justificada com o número de participantes. “São mundos completamente diferentes. Dentro do consulado podemos manter limitações. Lá fora não. Também temos de considerar que na romagem há a participação de escolas, com muitos alunos”, considerou. “No evento do içar da bandeira, pela minha experiência, nunca foi algo que estivesse esgotado e é fácil manter uma distância social”, partilhou. Prata da casa Este ano, os eventos de celebração do mês de Portugal na RAEM vão começar no dia 4 de Junho com uma exposição de Adalberto Tenreiro, artista português radicado em Macau desde 1983. No dia seguinte, a Cinemateca Paixão arranca com uma mostra de nove filmes que vai decorrer durante dois dias. No mesmo dia 6 de Junho, Elisa Vilaça leva à Casa Garden um espectáculo de marionetas. Já a 11 e 28 de Junho, a Casa de Vidro vai receber uma exposição de Madalena Fonseca. E no dia 12 terá lugar o único concerto do programa, que fica à responsabilidade da banda da Casa de Portugal de Macau. A Casa Garden é o espaço escolhido. Este espaço vai igualmente acolher nos dias 13 e 14 de Junho a exibição de várias curtas-metragens, que fizeram parte do Festiva New York Portuguese Short Film. A última exposição do mês de Portugal é inaugurada no dia 19 de Junho, também na casa Garden. Os trabalhos expostos são da autoria de António Mil-Homens. No dia 24 apresenta-se o livro Rio das Pérolas, com a presença dos autores que participaram na elaboração da obra, na Casa de Vidro, no Tap Seac. Dois dias depois, a 26, está agendada uma sessão literária, com vários convidados relacionados com a escrita. Finalmente, para 27 e 28 de Junho estão agendadas as últimas mostras de cinema, na Casa Garden, a pensar nas crianças. Este é um programa definido por Paulo Cunha Alves como “o possível”. No entanto, o cônsul mostrou-se confiante que será “coroado de sucesso” e apelou à participação da comunidade. CPSP | Presença não confirmada Faz parte da tradição, já após o estabelecimento da Região Administrativa Especial de Macau, que o Corpo de Polícia de Segurança Pública toque o hino de Portugal, durante o içar da bandeira. No entanto, este ano, a participação da polícia ainda não está confirmada, como reconheceu o cônsul. “Ainda não sabemos se o Corpo de Polícia de Segurança Pública vai estar presente”, admitiu Paulo da Cunha Alves. Ao contrário do que é habitual, também o horário da cerimónia foi alterado para as 9h00. Uma mudança justificada com a intenção de evitar o calor que se faz sentir a partir das 9h30.
João Santos Filipe PolíticaSulu Sou quer promessa que vigília de 4 de Junho vai ser autorizada em 2021 [dropcap]O[/dropcap] deputado Sulu Sou considera que a proibição da vigília sobre o Massacre de Tiananmen tem impactos internacionais para a imagem de Macau e quer que o Chefe do Executivo prometa que o evento vai ser autorizado em 2021. É este o conteúdo de uma interpelação escrita do legislador ligado à Associação Novo Macau, que foi divulgada ontem. “Quando o Instituto para os Assuntos Sociais e o Corpo de Polícia de Segurança Pública foram questionados sobre as razões da proibição, as respostas dos dirigentes foram pouco convincentes e incapazes de justificar a decisão. Este aspecto causou danos internacionais à imagem do Governo da RAEM que têm reflexo na imprensa internacional”, começou por apontar o deputado. “Por isso, quero perguntar ao Governo, à excepção deste ano que precisa das chamadas medidas de prevenção, se pode prometer às pessoas que vão ter o direito e a liberdade de organizarem eventos públicos tal como está estipulado na lei?”, perguntou. Em relação a esta questão, o mais jovem deputado do hemiciclo aponta que a população local está preocupada com o facto de estar a perder o direito de falar abertamente sobre o massacre de 4 de Junho. O legislador recorda que, até esta altura, Macau e Hong Kong eram os únicos locais da China onde tal era possível. Regras com regras Na interpelação, Sulu Sou pede ainda ao Corpo de Polícia de Segurança Pública (CPSP) que admita que a decisão de proibir a vigília não tem base legal. Por outro lado, aponta baterias ao IAM e afirma que a forma como foram alteradas as “regras”, de forma aleatória, reduz substancialmente o direito de liberdade e utilização dos espaços públicos. O Massacre de Tiananmen aconteceu a 4 de Junho de 1989, quando depois de meses de manifestações pró-democracia, o exército de Libertação do Povo Chinês disparou e dispersou os manifestantes. Segundo o Governo Central da altura terão morrido cerca de 200 pessoas durante este incidente.
Pedro Arede VozesSilêncio incómodo [dropcap]O[/dropcap] momento em que Chan Chak Mo pede a palavra, em plena troca incendiada de argumentos sobre decisão do IAM de proibir a exposição do 4 de Junho, para perguntar se seria aceitável que o deputado Sulu Sou viesse “vestido com roupa de Verão”, faz lembrar aquela falta a meio campo, que serve apenas para quebrar o ritmo e impedir um contra-ataque perigoso. Não que seja particularmente entendido em futebol, mas a partir desse momento a sensação que ficou, foi que o debate no plenário tinha acabado, dando lugar a um duelo engenhoso, mas mal disputado. A entrada a pés juntos de Chan Chak Mo foi eficaz e bem capaz de ter evitado danos maiores na imagem do Governo. As atenções, focadas até aí nas graves insinuações de Joey Lao sobre a inconstitucionalidade do evento que acusou de violar a primeira parte do princípio “um país, dois sistemas”, passaram para a t-shirt de Sulu Sou alusiva ao massacre de Tiananmen e acabaram na troca de acusações pessoais. Joey Lau foi certamente poupado a responder a mais questões incómodas se o debate tivesse seguido outro caminho e o presidente da Assembleia Legislativa, Kou Hoi In, obrigado a intervir. A troca de palavras sobre o tema voltaria, mas já sem a mesma intensidade, com o deputado eleito pelo Governo a manter o que tinha dito. Além disso, talvez motivado pelo bloqueio estratégico, o silêncio que se fez sentir foi, no mínimo, incómodo. É que além de Ng Kuok Cheong, Au Kam San, Sulu Sou e Mak Soi Kun, parece que as palavras de Joey Lau não fizeram estremecer mais ninguém no hemicíclio. Nem conservadores, moderados ou pró-democratas. Afinal de contas, estamos só a falar de declarações que colocam em causa a identidade e a lei de Macau das últimas décadas.
Salomé Fernandes PolíticaTiananmen | Alvis Lo defende medidas de prevenção contra a covid-19 [dropcap]M[/dropcap]edidas de prevenção, como o distanciamento social, devem manter-se, caso contrário a situação epidémica de Macau pode alterar-se. Foi esta a ideia defendida ontem pelo médico Alvis Lo Iek Long, em conferência de imprensa, perante as questões sobre o Corpo de Polícia de Segurança Pública (CPSP) não ter dado autorização à realização da vigília que assinala o massacre de Tiananmen. A decisão foi justificada com as medidas de contenção recomendadas por causa do novo tipo de coronavírus. Lei Tak Fai, representante da CPSP, reiterou que o Governo apela a que não se façam reuniões e a evitar a concentração de pessoas. A explicação foi curta, remetendo para uma nota de imprensa anterior sobre o tema. “Gostaríamos de concentrarmo-nos nas questões sobre a epidemia nesta conferência de imprensa”, disse. Macau registava ontem 42 dias sem novos casos, e todos os que se registaram até ao momento já receberam alta hospitalar, estando seis pessoas a cumprir o período de convalescença no centro clínico de saúde de Coloane. Alvis Lo Iek Long, recordou que a situação actual de zero casos foi conseguida com o esforço do Governo e da população, através do distanciamento social. “Mas se ficarmos relaxados ou baixarmos a guarda a situação pode ser diferente. Isso é [algo] que a população não quer ver. Agora Macau parece muito estável, mas os trabalhos têm de continuar, ainda precisamos de fazer bem os trabalhos de controlo da epidemia. Do início até agora, os Serviços de Saúde mantiveram sempre as mesmas orientações para evitar aglomeração de pessoas. No futuro, quando se registar abrandamento, podemos fazer uma alteração das medidas”, disse o médico adjunto da direcção do Centro Hospitalar Conde São Januário (CHCSJ). Sem comentários Perante a insistência dos jornalistas sobre a possibilidade de a vigília se realizar em moldes diferentes, e o recordar de que se vão realizar outras actividades propensas a aglomerações de pessoas, tais como as Regatas de Barcos-Dragão, o médico não prestou quaisquer esclarecimentos. “O conteúdo deve ser focado no combate à epidemia, não vamos comentar qualquer caso individual”, declarou, comentando que o foco deve estar nos assuntos comuns e não devem comentar casos ou pedidos específicos. “A ideia desta conferência é partilhar as sugestões gerais para o combate à epidemia”, acrescentou o médico. Pouca segurança O médico Alvis Lo Iek Long indicou que noutros locais do mundo “as medidas não são tão seguras como em Macau”. Em causa estava a possibilidade de pacientes com alta voltarem a testar positivo para a covid-19. Por outro lado, o responsável explicou também que há pessoas com isenção de quarentena em Zhuhai porque as duas cidades têm situações semelhantes, recordando a necessidade de testes regulares e a apresentação do código de saúde. O médico reiterou ainda a necessidade de atenção, já que entre a primeira e segunda vagas houve uma diferença de 40 dias. Questionado sobre Donald Trump estar a tomar hidroxicloroquina para protecção contra o novo coronavírus, Lo Iek Long disse que não podia comentar, mas ainda assim indicou que sem a doença não considera aconselhável a tomada do medicamento. E observou que para se confirmar se um medicamento deve ser usado para tratar a covid-19 são precisas “muitas provas científicas”.
Hoje Macau PolíticaTiananmen | Deputado Au Kam San vai estar no Senado mesmo sem aprovação da vigília [dropcap]S[/dropcap]e o Corpo de Polícia de Segurança Pública (CPSP) não aprovar a vigília que anualmente assinala o massacre de Tiananmen, a organização da iniciativa vai pedir à polícia o direito a reunião e, se esta não concordar, os organizadores “insistirão em sentar-se, pois não há regulamentação para que um cidadão não possa sentar-se numa área pública”, sublinhou Au Kam San. O deputado pró-democracia, em declarações enviadas à Lusa, afirmou que o Governo Central nunca concordou com a realização deste evento, que se realiza todos os anos em Macau. As declarações surgem na sequência da proibição das habituais exposições fotográficas que marcam a data, que fazem com que o deputado tema que a própria vigília seja proibida pelo CPSP também com o pretexto das medidas de prevenção face à covid-19.
Diana do Mar Manchete SociedadeTiananmen | Vigília juntou aproximadamente 200 pessoas no Largo do Senado O Largo do Senado foi ontem palco da tradicional vigília em memória das vítimas de Tiananmen. A chuva pode ter beliscado a adesão, mas não o espírito de quem teima em lembrar para não esquecer o que aconteceu a 4 de Junho de 1989 em Pequim [dropcap style≠’circle’]É[/dropcap] “em respeito por quem perdeu a vida a lutar por um ideal” que Leong, de 30 anos, participa na vigília em homenagem às vítimas de Tiananmen. Acompanhada por uma amiga, procura manter a chama viva de uma memória que a idade não lhe permite ter, à semelhança de outros jovens que, como ela, marcaram presença no Largo do Senado. “A minha mãe não vê com bons olhos que eu participe, mas já vim várias vezes. Para mim, é como quando vamos ao cemitério prestar homenagem aos entes queridos que perdemos”, diz a jovem assistente social, natural da China, para quem “o Governo chinês deve reconhecer o incidente do 4 de Junho de 1989”. Penny Lam também participa sempre que pode: “Venho todos os anos, sempre que estou em Macau. Tento perceber o que a sociedade vai fazendo, quem e quantos vêm para me actualizar um pouco do sentimento em geral”. “Esta vigília lembra que este tipo de acontecimento pode ocorrer em qualquer parte do mundo, mostra o lado mau do ser humano e que coisas más como Tiananmen podem acontecer”, sublinhou o jovem, também de 30 anos. Sofia Margarida Mota “Penso que é importante organizar e participar neste tipo de iniciativa para mostrar às pessoas, particularmente aos jovens, o que aconteceu. Até mesmo para os turistas é interessante, porque desperta-lhes curiosidade”, sustentou Penny Lam. Flora Fong, que participa na vigília pelo segundo ano, partilha da mesma ideia. “Este dia é muito importante. Não devemos esquecer o que aconteceu”, afirmou, defendendo que iniciativas como esta devem ser apoiadas. Na primeira fila, ainda mal as velas estavam acesas, estava Cheung que participa do tributo às vítimas de Tiananmen desde os primeiros tempos, embora a memória não lhe permita precisar desde quando. Quando questionada sobre a razão que a leva a juntar-se à vigília, a nonagenária foi peremptória: “Sou chinesa”. Isto para ressalvar de seguida “chinesa, mas de Macau”. Mais resguardado estava Chao, de 60 anos, encostado a um pilar, a ouvir os cânticos a invocarem o 29.º aniversário da “tragédia”. “Continua a valer a pena e a ter significado vir”, diz o residente de Macau, para quem “mais do que admitir a responsabilidade pelos acontecimentos, o Governo chinês devia tratar e não perseguir os familiares das vítimas”. António Katchi também marcou presença. “Vim pelas mesmas razões pelas quais me juntei em anos anteriores: pelo facto de continuar a existir na China um regime altamente repressivo, que esmagou as manifestações de Tiananmen, que nunca reconheceu os seus erros, que nunca se penitenciou pelos seus crimes e que continua a perseguir impiedosamente os estudantes, trabalhadores, artistas e outros intelectuais, agora também advogados, professores, camponeses, etc.”. Isto “sempre para benefício de uma casta dirigente do Partido Comunista e dos capitalistas que dependem e gravitam em torno dela”, sublinhou o professor de Direito. Radicado em Macau há mais de duas décadas, António Kacthi entende que nos tempos que grassam faz ainda mais sentido participar: “Agora, com a intensificação das características mais negativas desse regime, nomeadamente com o restabelecimento do culto da personalidade, penso até que temos mais razões”. Especificidades de Macau Em paralelo, argumenta, também há “razões específicas” em relação a Macau: “Esse regime, obviamente, tem sempre influenciado Macau e nomeadamente desde a transferência de soberania está a influenciar o Governo, a maioria oligárquica da Assembleia, o Ministério Público, eventualmente até os tribunais de uma maneira cada vez mais nítida, mais forte. Portanto, em Macau também vemos aqui ameaças às liberdades fundamentais”. Sofia Margarida Mota O docente referia-se nomeadamente a “tudo o que tem sido anunciado pelo secretário para a Segurança” e aos “processos de perseguição a democratas desde 2014, nomeadamente por causa do chamado referendo civil que desencadeou processos que ainda não terminaram até aos agora [apresentados] contra Sulu Sou e Scott Chiang”. “Tudo isso é sintoma de facto de que Macau está a evoluir para um regime cada vez mais autoritário que, claro, não é produto apenas de factores endógenos, embora também os haja, mas também da sua subordinação ao regime totalitário da China”. Sulu Sou foi outro rosto visível no Largo do Senado no 4 de Junho. “É um dia especial para mim. Não quero que os jovens esqueçam este dia que também representa a liberdade”, afirmou o deputado, actualmente com o mandato suspenso, congratulando-se com o facto de haver em Macau liberdade de expressão ao abrigo da qual é possível falar publicamente e organizar iniciativas como esta. Para Sulu Sou, que ficou a saber através da Internet o que foi efectivamente Tiananmen por ocasião do 20.º aniversário da repressão estudantil, entende, porém, que os jovens dominam pouco esse ponto negro da história da China, desde logo porque esse conhecimento não lhes é transmitido na escola. Neste sentido, é com “grande preocupação” que Sulu Sou olha para o futuro, atendendo a que, a seu ver, o recente manual sobre a história da China, elaborado pela Direcção dos Serviços de Educação e Juventude (DSEJ) em colaboração com uma editora estatal chinesa, omite aspectos importantes, como o 4 de Junho de 1989. A vigília em memória das vítimas de Tiananmen é organizada, todos os anos, pela União para o Desenvolvimento Democrático de Macau, dos deputados Au Kam San e Ng Kuok Cheong. O tempo “afectou a adesão”, mas não “a qualidade nem o espírito” da iniciativa, sublinhou Ng Kuok Cheong. Macau figura como o único local em toda a República Popular da China, a par de Hong Kong, onde se assinala a repressão do movimento estudantil pró-democracia. Hong Kong a perder fôlego Em Hong Kong, a dimensão foi sempre mais expressiva. Em 2014, por exemplo, aquando do 25.º aniversário de Tiananmen, a tradicional vigília no Parque Vitória juntou mais de 180 mil pessoas, segundo a organização, e sensivelmente 100 mil, de acordo com a polícia. No entanto, a iniciativa, organizada pela Aliança de Apoio aos Movimentos Democráticos e Patrióticos na China, tem vindo a perder fôlego por força de uma divisão no seio do campo pró-democracia. No ano passado, por exemplo, a vigília teve a menor adesão pelo menos desde 2008 (110 mil segundo a organização e 18 mil na versão da polícia). “Resista ao autoritarismo” foi um dos ‘slogans’ da vigília de ontem, com os organizadores a prometerem não parar de exigir o fim do regime de partido único na China independentemente de qualquer “linha vermelha” traçada por Pequim. A iniciativa, além de reivindicar justiça para as vítimas de Tiananmen, incluiu ainda um tributo ao dissidente e Nobel da Paz Liu Xiaobo, que morreu há quase um ano, tendo juntando 115 mil pessoas segundo a Aliança de Apoio aos Movimentos Democráticos e Patrióticos na China, apesar do boicote, pelo quarto ano consecutivo, das federações de estudantes universitários. De acordo com fontes policiais da região vizinha, participaram na vigília 17 mil pessoas. O “sonho chinês” Já no centro do poder, em Pequim, os acontecimentos de 1989 continuam a passar em branco, não obstante os repetidos apelos das “Mães de Tiananmen” para que o Governo quebre o silêncio e assuma as responsabilidades. “Ninguém dos sucessivos governos, nos últimos 29 anos, perguntou por nós, nem nunca houve uma palavra de desculpa, como se o massacre que comoveu o mundo nunca tivesse acontecido. Houve uma total falta de respeito pela perda de inestimáveis vidas humanas. Sentimos profundamente a indiferença e a frieza das autoridades”, escreveram as “Mães de Tiananmen”, numa carta aberta ao Presidente chinês, Xi Jinping. A missiva é assinada por 128 familiares de jovens que perderam a vida na noite de 3 para 4 de Junho, quando o regime chinês enviou tanques para a Praça de Tiananmen, esmagando os protestos no coração de Pequim, onde manifestantes estavam concentrados há sete semanas a exigir reformas democráticas. “Nos últimos 29 anos, não tememos nenhum tipo de tribulação, despotismo e intimidação. Em vez disso, guardámos a nossa memória, a nossa consciência e dignidade humana (…). O nosso ‘sonho chinês’ é que a tragédia do 4 de Junho seja alvo de uma clara responsabilização e que a justiça seja feita”, sublinha o grupo. Já aos olhos da Human Rights Watch (HRW) o “sonho chinês” de Xi Jinping parece ser outro: “Vinte e nove anos depois do massacre de Tiananmen, o ‘sonho da China’ do Presidente Xi Jinping significa fazer com que o mundo se esqueça, mas suprimir a verdade apenas alimentou as reivindicações por justiça e responsabilização”, afirmou a directora da HRW para a China, Sophie Richardson. “A única maneira de remover esta nódoa na China é reconhecê-la”, sustentou, num comunicado divulgado ontem. “À medida que se aproxima o aniversário, o Governo chinês continua a negar irregularidades durante a brutal repressão dos protestos. As autoridades encobriram assassínios, falharam em levar os responsáveis à justiça e perseguiram vítimas e familiares dos sobreviventes”, apontou a organização não-governamental de defesa dos direitos humanos. “Sob a liderança do Presidente Xi Jinping, o Governo recuou ainda mais nos ideais democráticos que os manifestantes defendiam e está a apertar agressivamente o controlo, atacando grupos da sociedade civil e prendendo activistas dos direitos humanos”, afirmou a HRW, sustentando com exemplos que, “tal como no passado, as autoridades chinesas estão a reprimir os esforços para assinalar a repressão de Tiananmen”. Sofia Margarida Mota O futuro também não se afigura promissor na perspectiva da HRW, atendendo a que, em Março último, Xi Jinping eliminou o limite de mandatos presidenciais o que faz adivinhar “um futuro ameaçador” no rumo da China. O número exacto de mortos continua a ser segredo de Estado, mas as “Mães de Tiananmen” identificaram mais de 200, havendo estimativas que apontam para milhares. Em Dezembro, porém, foi tornado público um telegrama secreto da diplomacia britânica dando conta de uma “estimativa mínima de 10.000 civis mortos”. O número, facultado a 5 de Junho de 1989 pelo então embaixador da Grã-Bretanha, Alan Donald, é quase dez vezes superior ao comummente aceite à época. No entanto, foi considerado credível pelo sinólogo francês Jean-Pierre Cabestan que assinalou então que os documentos confidenciais que foram sendo divulgados nos últimos anos nos Estados Unidos sugerem a mesma ordem de grandeza.