Caminho das Hortas | Dois prédios vão nascer no sítio onde todos querem ficar

O Caminho das Hortas é o um dos poucos lugares que sobreviveu à urbanização da ilha da Taipa. Ali moram pessoas em barracas com parcas condições de higiene e habitação, mas nem isso faz com que desejem sair de um lugar que sentem como seu. Sabem que vão ser construídos dois prédios e que um dia terão de encontrar uma nova casa, mas é ali que encontram a felicidade

[dropcap styl≠’circle’]D[/dropcap]entro dos painéis de zinco forrados a plástico e madeira habitam pessoas que desde sempre só conheceram aquele lugar e aquela casa. No Caminho das Hortas, logo à entrada da ilha da Taipa e no meio dos muros de betão, persiste uma quase aldeia que parou no tempo. As barracas continuam a existir, sem saneamento básico nem condições mínimas de habitação, mas nem por isso as pessoas querem sair daquele lugar pautado pela pobreza. Ainda assim, o tempo marca a hora e também ali o betão vai passar a existir. Em dois terrenos vão nascer dois edifícios com 90 metros de altura. Os projectos são privados e estão neste momento a ser analisados pelo Conselho do Planeamento Urbanístico (CPU).
Todos os dias Alessandra faz aquele caminho de terra batida. Tem a sorte de viver num apartamento localizado bem à entrada do Caminho das Hortas. O vai e vem para ir levar e buscar os filhos à escola faz com que o seu olhar se cruze com os dos moradores chineses.
“Gosto de viver aqui, é tranquilo, calmo, ninguém mexe com ninguém. Mesmo que eu não fale Chinês eles cumprimentam”, disse ao HM. Alessandra desconhece os planos que estão pensados para aquele local, mas não tem dúvidas: com certeza que um dia também aquele local vai ser destruído. caminho_2_sofiamota
“Aqui em Macau tudo se destrói para construir casinos, hotéis e prédios altos. Não queria que isto fosse destruído porque tem muita área verde, até para respirarmos um pouco, temos de manter este pulmão de Macau que é cada vez menor”, diz ao HM.
Se por debaixo do zinco moram pessoas sem nada, que caminham quase por cima dos esgotos e que têm as cozinhas na rua, a verdade é que há famílias que moram em barracas com um pouco mais de condições e exibem o carro que possuem à porta. “O Governo poderia fazer algo por estas famílias, mas provavelmente vai fazer o que faz sempre, que é colocá-las nestes prédios de habitação pública e construir algo aqui”, aponta Alessandra.

O sítio que os viu nascer

Min sai da garagem da barraca que habita com a sua família e já sabe que um dia vai ter de sair dali, mas não vê como pode vencer o braço de ferro com os construtores. Nasceu ali e ali viveu toda a vida. “Os meus avós já aqui moravam”, relembra, e agora divide o lar com os pais e a irmã mais velha. Tem a vida folgada e afirma que se ali mora é por opção. “Não preciso de viver aqui, mas prefiro este sítio”, confessa.
É uma casa de família de quem não conhece outra. Tem um lugar de garagem e Min encara quase com indiferença a mudança nesta terra que está em constante mutação. “Gosto de viver aqui. Mas teremos que procurar outro lugar.” Não sabe ainda onde, nem quando, e aguarda o desenvolvimento do processo “com alguma preocupação”.
Wu, outro residente que ali nasceu diz que “aqui vivem pessoas com poucas posses.” Enquanto fuma um cigarro à porta na entrada do bairro diz ao HM que considera ainda que, por parte do Governo, deve vir uma ajuda. caminho_9_sofiamota
“Não precisamos de ajuda monetária”, afirma, mas sim “de um lugar para viver e acho que o Governo deveria arranjar um apartamento para nós”. Não deixa de referir que considera que as casas normalmente arranjadas pelo Governo “são pequenas para as famílias que ali vivem, sendo que se juntam várias gerações”. Não obstante o tamanho, Wu refere a existência de uma cozinha nos apartamentos, “o que é bom”.
Já para Lang, uma residente com cerca de 30 anos, é precisamente a cozinha que representa a mais valia daquela localização. A sua situa-se na rua, à entrada do quarto de dormir e único também. Lang nasceu e vive ali com o marido. Tem uma vida despreocupada e, apesar de saber do destino do lugar que a sua casa ocupa, não parece ter grandes preocupações. Na perspectiva de mudar para uma casa num prédio, engelha o nariz.
“São casas muito pequenas”, afirma, “com muito pouco espaço”. Lang vive da confecção de petiscos e é a cozinha que mais a preocupa. Ali tem uma placa de fogão improvisada numa banca de madeira ao ar livre em frente ao quarto onde mora.
“Cozinho aqui ao ar livre, o que é bom”, continua, justificando que gosta “de uma cozinha assim”, enquanto aponta com entusiasmo e orgulho para a panela ao lume e a panóplia de tachos e pratos que se acumulam na pequena bancada que é também o seu ganha pão. “Se for para uma dessas casas do Governo não tenho uma cozinha arejada e é tudo muito pequeno. Gosto assim como está”, remata com um sorriso.
Para Lang este lugar é um pouco melhor que “esses prédios altos” dos quais os moradores “não gostam”.
O corredor comum continua beco dentro em direcção ao interior da cozinha-sala-despensa de Hua. A vizinha partilha da opinião daqueles que por sempre ali viveram. Nasceu ali, mas para ela uma das razões fundamentais para lá querer permanecer é mesmo o facto de não gastar dinheiro em rendas.
“Ganhamos muito pouco e aqui também gastamos muito pouco”, afirma. “Pessoas com dinheiro vivem em sítios bons, nós não o temos e temos que viver aqui”, continua, com um sorriso de satisfação. “Eu gosto mesmo é de viver aqui.”
Na perspectiva de ter efectivamente que mudar, Hua tenciona ir procurar uma casa “nova” sendo que “gostaria que fosse semelhante àquela em que habita agora”. Ao mesmo tempo acha que o Governo “não os pode ajudar”.
A preocupação não se sente no bairro. É antes substituída por um certo conformismo, mais ou menos triste, ditado pelo destino. caminho_7_sofiamota
Para nenhum dos moradores a falta de saneamento parece representar um problema maior, sendo que casas de banho são lugares por ali desconhecidos e, se calhar por isso, desnecessários. Para quem sempre assim viveu, a vida ensinou como rodear obstáculos e transformar alguns em vantagens.

Sem consulta

Os dois terrenos nos quais vão nascer os edifícios fazem parte do Plano de Ordenamento Urbanístico da Zona Norte da Taipa, o mesmo que já levou a Associação Novo Macau (ANM) a protestar e a pedir uma consulta pública sobre mesmo. Jason Chao, membro da direcção da ANM, mostra-se contra a construção sem que tenha havido uma consulta prévia à população.
“Não sei se os habitantes têm outros sítios para viver, mas devem ser realojados em habitações públicas”, disse ao HM. “Estamos contra o plano da zona norte da Taipa porque pensamos que deveriam ser construídas mais zonas verdes.”
Rui Leão, arquitecto e membro do CPU, apenas referiu que “quando as pessoas ocuparam e construíram lá barracas tinham a obrigação cívica de ter consciência de que, mais cedo ou mais tarde, iriam ter de sair dos locais. Quando as pessoas constroem uma barraca têm de ter consciência de que estão a construir num terreno que, à partida, vai ter destino”.
Ainda assim, no tempo da Administração portuguesa foi dado aos moradores do local uma espécie de licença para lá habitar. Para Francisco Vizeu Pinheiro, arquitecto, “as pessoas devem ser compensadas, tal como foi feito noutras zonas de barracas em Macau”.
Isto, apesar das habitações públicas “nem sempre darem às famílias a dignidade que estas merecem”. “Há que ver caso a caso, se há famílias com idosos e crianças. Macau está bem fornecida em termos económicos e não deve tratar estas famílias como refugiados económicos ou sociais, mas sim dar-lhes um tratamento digno.”
O arquitecto lembrou a história do Caminho das Hortas, de um tempo em que o território tinha “muitas áreas com bairros de lata e pequenas povoações”. “A Taipa tinha as suas aldeias pequenas, havia muitas fábricas de panchões e zonas agrícolas que foram sendo invadidas por estaleiros de construção, uns legais e outros ilegais. Antes de ser concluída a ponte entre Macau e Taipa já havia zonas de aterros e essas zonas mais antigas ficaram abaixo do nível dos aterros, dos diques. Era interessante manter a memória dessa zona.”
Para Vizeu Pinheiro, “o grande perigo é autorizar apenas a construção de grandes torres sem que se tenha um plano global da zona com uma boa proporção de zonas verdes, paisagismo e zonas de ventilação”, concluiu.
Nos últimos anos, com o desenvolvimento de Macau e a chegada dos trabalhadores não residentes (TNR), o Caminho das Hortas começou a ser habitado por emigrantes que nada sabem da história daquele lugar. Junto a uma oficina moram Sandro Rana e Rojan Lam, vindos do Nepal. Falam com o HM enquanto fazem o almoço e lavam a roupa na máquina de lavar comum. caminho hortas
As casas são pobres, mas aqui os dois homens conseguem pagar uma renda inferior àquelas que são cobradas nos grandes edifícios: cinco mil patacas. Sandro e Rojan vivem alheados do que se passa com as famílias chinesas e desconhecem os planos de construção que existem para aquele lugar. Também não se preocupam que a História do Caminho das Hortas seja destruída: afinal de contas, sempre é melhor casas novas para morar em vez de barracas de quinze metros quadrados sem casas de banho e onde o plástico serve as vezes de chão.

11 Jul 2016

Que estamos nós aqui a fazer, tão longe de casa? | O estripador

[dropcap style≠’circle’]“M[/dropcap]eu Amor.
Tenho tantas saudades tuas. Faz-me um favor. Coloca a minha música e canta comigo: “Yan jim jeui liu ye gang sam / Joi je yat hak do mo jip gan / Si seung fong chi joi yiu ham / Maau teun ya gang sam // Chang bei po seui gwo dik sam / Yeung nei gam tin hing hing tip gan / Do siu ngon wai kap yi man / Tau tau dik joi saang // Ching naan ji gam / Ngo keuk kei sat suk yu / Gik dou yung yi sau seung dik neui yan / Bat yiu bat yiu bat yiu jau loi jau heui / Ching jan sik ngo dik sam // Yu ming baak ngo / Gai juk ching yun yit lyun / Je go yung yi sau seung dik neui yan / Bat yiu dang / Je yat hak ching yit man // Cheung ye yau nei jeui ya jan / Yeung ngo jung yu jaau dou seun yam / Bat gun yat chai si yi man / Faai lok si ching yan // Chang hoi pa liu je yat saang / Si nei chi jung gam sam kaau gan / Ngo fong ji yung yau jeuk yun fan / Cheung gin ngo seun sam // Chang bei po seui gwo dik sam / Yeung nei gam tin hing hing tip gan / Do siu ngon wai kap yee man / Tau tau dik joi saang // Ching naan ji gam / Ngo keuk kei sat suk yu / Gik dou yung yi sau seung dik neui yan / Bat yiu bat yiu bat yiu jau loi jau heui / Ching jan sik ngo dik sam // Yu ming baak ngo / Gai juk ching yun yit lyun / Je go yung yi sau seung dik neui yan / Jung chi yat saang ya fo bun dik yit man // Cheung ye yau nei jeui ya jan / Yeung ngo jung yu jaau dou seun yam / Bat gun yat chai si yi man / Faai lok si ching yan // Ching naan ji gam / Ngo keuk kei sat suk yu / Gik dou yung yi sau seung dik neui yan / Bat yiu bat yiu bat yiu jau loi jau heui / Ching jan sik ngo dik sam // Yu ming baak ngo / Gai juk ching yun yit lyun / Je go yung yi sau seung dik neui yan / Bat yiu dang / Je yat hak ching yit man // Cheung ye yau nei jeui ya jan / Yeung ngo jung yu jaau dou seun yam / Bat gun yat chai si yi man / Faai lok si ching yan. 1


Por vezes gostava de poder acreditar em cartomancia. Acreditar que existe algo premonitório numa coisa completamente alienatória como uma sequência de cartas. Ou em astrologia. Acreditar que de cada vez que olho para as constelações algo se mexe a meu favor. Ou numa outra coisa qualquer que me desse a sorte que nunca senti ter. Por vezes gostava de poder acreditar em tudo isto se realmente significasse felicidade. Quando assim o não é tenho medo e recuso-me a acreditar. Ontem cruzei-me com esta estranha mulher na casa de chá. Ela olhou para mim, deitou umas cartas na mesa e disse-me que tudo é em vão. Que a confirmação de reunião do meu coração com o da minha alma gémea precisa de dez anos de romance para se confirmar. Dez anos. Nós estamos assim escondidos vai para um ano e meio. Ainda falta muito. Ela disse-me que era tudo em vão porque esse ciclo iria ser quebrado. É inacreditável. Tudo o que tenho sofrido durante este período com este homem. Neste casamento. Onde tudo tem sido amargo ou sem sabor. E tu. Tu que me fazes acreditar na felicidade. Tu que adocicaste a minha vida. Tu, e só tu. E o acreditar que seremos felizes e que o seremos muito, muito felizes. Vou-te contar uma outra coisa para perceberes esta minha súbita ansiedade. É sobre a tua mãe. Mas não fiques triste com ela. Tenta perceber que ela é de outra geração e que, na realidade só quer o melhor para ti. A tua mãe sempre se opôs ao meu relacionamento contigo mas eu também sempre acreditei que com tempo a iria conquistar. Sabes que ela encontrou-se comigo antes de eu vir para o Japão e insistiu que a nossa reunião está errada. Mas está errada porque as estrelas o assim dizem. Porque as estrelas não o querem. Que as nossas datas de nascimento não se conjugam e que esta nossa insistência nos acabará por trazer má sorte. Tenta percebê-la. Tu és filho e ela quer proteger-te. Na altura disse-lhe a brincar que as estrelas estavam tontas e não voltei a pensar muito nisso. Mas ontem, com este estranho encontro, voltei a ouvir o eco da voz da tua mãe. Se assim for é realmente uma história triste. Na realidade sempre odiei esse tipo de adivinhação que não deixa espaço para nada mais. Como se o destino fosse a única coisa que conta. E o que é mesmo o destino? Pergunto eu. Com apenas algumas palavras pode-se arruinar uma pessoa. Pode-se arruinar um par de amantes profundos. E tu meu doce? Acreditas em superstições? ‘Baby’, vamos chegar a acordo, ok? Não importa quantos obstáculos tivermos diante de nós vamos sempre segurar a mão um do outro e passar o resto da nossa vida juntos, ok?
Casar, sei eu agora, que é uma coisa fácil. Mas casar com alguém que te ame a vida inteira, que te respeite, que respeite a tua família, que lute pelo amor todos os dias, que seja sempre compreensivo, isso é difícil. Estou tão ansiosa. Eu acredito em nós. Acredito que quando duas pessoas se apaixonam elas irão tentar o seu melhor para ficar juntos. Não importa o quão difícil a estrada é. Promete-me que não desistes de mim. Que se eu desaparecer tudo farás para me encontrar de novo. Querido, eu sou sincera. Aqui, nesta terra, tão longe de onde estás. Que não te posso ver se assim o quiser. Não quero acreditar nestas premonições. Querido, talvez em todo mundo as pessoas tenham que sofrer. Talvez em todo o mundo exista traição. Mas que digo eu que traio o meu marido contigo. Mas não posso considerar isto traição. A maior traição é ter-te encontrado e não fazer tudo para ficar contigo. A maior traição é para contigo. A maior traição é para comigo. Sabes que por vezes julgo que o meu marido é gay. O que realmente me choca. Como pôde ele casar-se comigo? Nada lhe interessa em mim. A ele só lhe interessa a carreira. E eu sou apenas uma capa. Um instrumento para o reconhecimento dele na sociedade. Porque passa ele mais tempo com o seu assistente que comigo? Tudo isto me deixa imensamente triste. Parece que tudo está errado. Mas serei tola? Mas estarei errada? Estarei errada porque te amo? Então que posso eu fazer? Quando penso em ti tudo é beleza. Tudo é tão puro a meus olhos. Meu amor eu ainda sou apenas uma menina. Uma menina simples que não se quer enganar. Por isso hoje vou-lhe dizer tudo e amanhã volto para ti. Volto para que me contes as tuas histórias. Para que suspires e me digas que me amas a cada frase. Para que me confortes sempre que eu estiver em baixo. E a fraude deste meu casamento terá os seus dias contados. E será mais fácil de o terminar. Porque não posso mais viver com esta dor. Não posso mais perder o nosso tempo. Porque este homem não me valoriza. Porque tu existes e eu quero desfrutar a minha vida feliz, a cantar e a dançar e a portar-me como uma adolescente. Para sempre adolescente. E acreditar que tanto a tua mãe como esta mulher com quem me cruzei estão erradas. E acreditar nas cores. E acreditar na aventura. E acreditar que o amor tudo conquista. E acreditar na beleza. E acreditar na juventude em diferentes idades. E acreditar. E acreditar.
Amanhã vou acordar e vou acreditar que sou muito bonita. Que sou positiva, activa e aberta e que enquanto estiveres a ler esta carta eu vou estar no avião que me levará de volta a ti. Vou acreditar que esta inquietação é por saudades. Tantas saudades. Amanhã vou acordar e serei apenas e só tua e quando chegar iremos nos beijar como fogo.
A tua princesa.
Daphne

1. “Mulher frágil” por Faye Wong – Ficamos lentamente bêbados à medida que a noite se adensa / Neste momento em que estamos tão perto um do outro / Trémulos parecem os meus pensamentos / Contradições que crescem profundas // Mesmo que o meu coração tenha sido quebrado uma vez / Hoje deixo-te gentilmente aproximares-te dele / Que reconfortante embora que também existam dúvidas / Secretamente a crescer dentro de mim // O amor é difícil de resistir / Eu sou de facto / Uma mulher frágil que é realmente fácil de magoar / Por favor não, por favor não, por favor não apareças e de repente desapareças / Por favor tem pena e aprecia o meu coração // Se me compreendes / Então continua o teu amor / Com esta mulher frágil que facilmente se magoa / Não esperes mais / Beija-me apaixonadamente // Contigo hoje à noite. É difícil de acreditar mas é real / Eu sou finalmente capaz de recuperar a minha fé / Apesar de toda a incerteza / Na felicidade dos amantes // Eu estive uma vez com medo desta vida / És tu quem eu posso finalmente apoiar-me / Eu sei que devo abraçar este destino / Que irá ajudar-me a reconstruir a minha confiança // Mesmo que o meu coração tenha sido quebrado uma vez / Hoje deixo-te gentilmente aproximares-te dele / Que reconfortante embora que também existam dúvidas / Secretamente a crescer dentro de mim // O amor é difícil de resistir / Eu sou de facto / Uma mulher frágil que é realmente fácil de magoar / Por favor não, por favor não, por favor não apareças e de repente desapareças / Por favor tem pena e aprecia o meu coração // Se me compreendes / Então continua o teu amor / Com esta mulher frágil que facilmente se magoa / Até ao fim desta vida a beijar-mo-nos como fogo // Contigo hoje à noite. É difícil de acreditar mas é real / Eu sou finalmente capaz de recuperar a minha fé / Apesar de toda a incerteza / Na felicidade dos amantes // O amor é difícil de resistir / Eu sou de facto / Uma mulher frágil que é realmente fácil de magoar / Por favor não, por favor não, por favor não apareças e de repente desapareças / Por favor tem pena e aprecia o meu coração // Se me compreendes / Então continua o teu amor / Com esta mulher frágil que facilmente se magoa / Não esperes mais / Beija-me apaixonadamente // Contigo hoje à noite. É difícil de acreditar mas é real / Eu sou finalmente capaz de recuperar a minha fé / Apesar de toda a incerteza / Na felicidade dos amantes (tradução livre)

José Drummond

30 Jun 2016

Que estamos nós aqui a fazer, tão longe de casa? | A empregada do bar

[dropcap style≠’circle’]A[/dropcap]inda atordoada tento perceber porque não me consigo mexer. Começo a sentir partes do corpo. Começo a sentir os meus seios inchados a serem pressionados por qualquer coisa. É uma corda. Estou toda atada. Não sei porque fiz isto. Porque vim contigo para o quarto. Agora sei porque não me consigo mexer. Mas porque estou atada deste modo estranho? Jamais alguém viu o frio na alma do outro. Jamais alguém viu o desencontro entre a mágoa e a máscara do outro. Jamais alguém viu o espasmo final do outro. Aquele espasmo trémulo, recolhido nos escombros da própria existência. Aquele espasmo turbulento que esconde pranto. Aquele espasmo de quando a esperança se apaga. Porque a esperança também se apaga. Por vezes apaga-se assim sem morte. Por ter sido apenas uma insinuação. Um golpe de asa. Um ‘one night stand’. Os meus olhos vagueiam em redor. Não é o fim da festa. Aqui não há traição. Pelo menos a isso poupas-me. Estás agora com um sorriso maldoso. Não é um sorriso de defesa. Dói-me este poder ser e não ser realmente. És um animal ferido. Mais ferido que eu. Existe tão pouco amor neste mundo.

Apontas para o pénis e forças-me a abrir a boca. Nunca fiz isto assim. Sem me conseguir mexer. Volto a tentar mexer-me. Os braços não respondem. Reparo agora que a corda me aperta outras partes do corpo. Arregalo os olhos quando me apercebo que estou no ar. Suspensa. Posição horizontal. Pernas abertas. Braços esticados. A cabeça puxada para trás. Sei disto. Sei do fetiche japonês. As cordas estão apertadas com tanta força que a minha circulação sanguínea demora a recuperar. Sinto um leve formigueiro aqui e ali. Sei disto mas nunca estive numa situação assim. Nunca fiz uma coisa destas nesta posição e muito menos sem me poder mexer. Terei certamente sonhado com isto. Estarei porventura a sonhar? Fazes com que perceba que esta é a realidade e que de algum modo irei ser castigada por acabar na cama com uma pessoa que não conheço. Abres-me a boca e forças a entrada. Sinto tudo no céu da boca. Tento acenar com a cabeça. Por uma razão qualquer fico extremamente húmida. Contra o que quero. Quero fugir. Não. Não quero. Não quero fugir. Quero ver o que me vais fazer. Quero sentir o que me vais fazer. Apertas os meus lábios enquanto introduzes o teu membro mais duro que nunca. Está mais quente do que eu estava realmente à espera. O sabor levemente salgado. Agarras-me a cabeça e lentamente começas a mover movê-la para trás e para a frente. E sorris. Continuas a sorrir. Acho que te odeio quando sorris. Toda a minha vida sexual passa diante de meus olhos num ápice. Não sou propriamente uma novata mas sinto-me como se o fosse. Lembro-me da primeira vez que dei prazer a um homem desta forma. Foi na praia. Tinha 15 anos. Em Boracay. Estava apaixonada por ele. Ele também se forçou. Era 10 anos mais velho que eu. Mas eu queria. Queria muito. Na minha inocência da adolescência acreditei que ele se iria casar comigo. Foi pouco tempo antes de o meu pai ter conseguido trabalho em Manila. Com ele a coisa foi bem diferente. Ele não se demorou. Ele não tinha truques como tu. Depois de o ter chupado continuou. Continuou e fez o que tinha que fazer na parte de baixo. Doeu-me. Saiu sangue. Não foi muito. Lembro-me de ter achado que não tive prazer nenhum. Duas semanas depois estava em Manila. Nove meses depois um bebé. Nunca mais o vi depois de nos termos mudado para capital. Hoje o bebé não é mais bebé. Hoje o meu pai já não tem trabalho. Hoje sou eu que tenho que enviar dinheiro para toda a família.

Deste vazio de dentro de mim algo nasceu que eu não posso tocar. Algo que eu não posso explicar. Uma dor que eu não consigo ilustrar. Que se esconde. Que me puxa para o abismo. E sei que tu também. Tu também tens um vazio que pariu algo que não podes tocar. Algo que devias deixar escondido. Mas não deixas. É o demónio. Decido que devo deixar tudo e fazer tudo. Decido mostrar que sei como fazer isto. E que gosto. E que estou a gostar. E que estou mesmo a gostar. Porque na realidade estou mesmo a gostar. Soltas um “mhhm” enquanto começas a girar os ancas para a frente e para trás com mais força. Com mais rapidez. Empurras-me a boca que deixo aberta. Suspendes o movimento por um momento. E lentamente, em crescendo, recomeças. Até que deixas de segurar na minha cabeça. E empurras o pénis até ao fundo da minha garganta. Sinto-me amordaçada pelo teu sexo. Lágrimas. Lágrimas rolam pelos meus olhos. Não por medo. Por prazer. Parte de mim gosta de ser usada desta forma. Estupidamente quero te dar prazer. Quero que te sintas bem. Estupidamente acredito que sentes algo por mim. Estupidamente acredito que me vais salvar. Que tudo se vai resolver e que temos um futuro em conjunto. Dás-me um estalo. E outro. E continuas o teu movimento. E rapidamente recuas e ordenas-me que te diga que és um homem horrível. “És um homem horrível” digo a medo. Mas o medo faz-me ficar mais húmida. Libertas-me apenas levemente. Apenas o suficiente para que eu me consiga apoiar de novo na cama. E ordenas-me para que estique os braços e me apoie bem. Viras-me o corpo. Reforças a posição das minhas pernas. Levantas-me o rabo. Tento esticá-lo. Faz tudo o que queres fazer. Oh, sim, faz tudo o que queres fazer de mim. Começas a dar palmadas, uma atrás da outra, na minha bunda redonda. Sinto o sangue a ferver. Os teus dedos brincam com a minha vagina. Os sucos escorrem. E penetras-me. Mais violentamente que nunca. Em estocadas precisas maceras-me o sexo. E em intensidade crescente sinto a vagina a dilatar-se. Transpiras. Transpiro. Paras antes do clímax. “Oh” sussurro. A minha voz é luxúria. Enfias dois dedos no meu ânus. “Ohhhh”. Seguras com força a carne nas bochechas do rabo e violentamente fazes aquilo que nunca antes algum homem tinha feito comigo. “Estou-me a vir” gritas. A tua voz é cortada por um grande gemido. É o ponto de ruptura. Dói. Dói-me tanto. Dói-me tanto, tanto, tanto. Mas não consigo dizer nada. Não consigo soltar um qualquer som. E, quando estás quase a vir-te, retiras o pénis de dentro de mim. “Ahhhhhhhh”. E o esperma que se vomita sobre o meu corpo. Sinto-me usada. Sinto-me tão usada. Tu ainda gemes. Levemente. Depois do orgasmo o sémen ainda pinga do teu pénis flácido. Reparo como pinga sobre o soalho do quarto. Não consigo pensar. Estou sem forças. Dás-me uns minutos antes de me voltares a suspender os braços e me colocares numa nova posição. Ainda nem te disse o meu nome. Sabes como me chamo? “Nicole” digo-te. Pareces surpreendido. Sorris. Ah como te odeio quando sorris. E desapareces. Quando voltas trazes uma garrafa de litro e meio de água. “isto ainda não acabou”, dizes, “agora vai ser a melhor parte”.

José Drummond
23 Jun 2016

Que estamos nós a fazer, tão longe de casa? | Ela

[dropcap style=’circle’]O[/dropcap] pôr do sol perdeu o seu brilho púrpura e tornou-se, de um azul escuro. Um azul frio. Um azul que se obscurece. Que surge de dentro de um cinza pálido e que se deixa desaparecer sem cor. Um pôr do sol que nunca mais foi primaveril. Desde que te foste embora que este pôr do sol existe, assim, sem vida, e, por isso, não existe mais primavera, e, por isso, só existe inverno. O sol aparece, mas aparece sempre desaparecendo. E desaparece, e desaparece. Como uma ilusão qualquer de um ilusionista sem talento. Aparece mas não o vemos. Sabemos que ele lá está e quando estamos quase a acreditar desaparece. Desaparece, sem nos darmos conta, em tons de azul escuro. Uma ilusão de maus fígados, destinada a maltratar a esperança. O sol que se foi onde não havia laranja. Não havia mais laranja. Nem amarelo. Nem havia mais qualquer cor de rosa na névoa fina. O sol frio, e como o sol tu, tu que desapareceste. E eu que começo a sentir frio. E eu que desço para o jardim e permaneço à volta de mim, à volta de nós. E eu que volto a esta janela, a esta cama, a estes amontoados de roupa por lavar onde consigo ainda sentir o teu cheiro. E eu que desapareço, assim, como o sol, como uma ilusão sem talento de um ilusionista de rua. Aqui onde desapareço é o lugar onde me vou encontrar. Aqui onde desapareço é o lugar por onde me vou embora. E vou conseguir. Vou conseguir atravessar aquela ponte faça sol ou chuva.
E o porteiro irá dizer aos novos inquilinos que eu era uma mulher jovem. E irá confundir-me com a vizinha do 10º andar que tem o mesmo corte de cabelo. E irá dizer que me chamo “Sushi” porque não confia em japoneses. Porque ela, embora não seja japonesa, tem uma tatuagem de um “koi Fish” nas costas em estilo japonês. E ele imediatamente a colocou nessa gaveta. Não confiar nos japoneses é vulgar na China. Dores históricas e políticas que pouco têm a ver com as pessoas dos dias de hoje mas que mantêm a sua influência nas relações dos dois países. Não confia neles porque o pai teve que fugir de Cantão durante a invasão e nunca mais viu a mulher que deixou para trás. Repetia vezes sem conta que quando o pai voltou para a buscar ela tinha desaparecido. Uma vez chorou em modo de confissão culpabilizando-se que ela tinha desaparecido por causa dele. Porque quando ele chegou a Macau uma semana depois do pai, ainda bebé de meses, no meio de um transporte de galinhas, ela teria ficado para trás por não haver lugar para ela. E que quando o pai conseguiu voltar a Cantão nunca mais a encontrou. E que, como se isso não bastasse, o pai foi morto quando ele tinha 6 anos por causa de um erro cometido num serviço, no qual, o ‘patrão’ o deixou ser emboscado pela seita adversária. Ninguém nunca saberá a verdade do que aconteceu à mãe daquele septuagenário. E muito pouca gente saberá realmente o que aconteceu ao pai. Disse ainda nessa vez que o pai foi-lhe entregue numa urna na qual sentiu o cheiro a sangue nas cinzas. Irá confundir-me com ela de todas as vezes e no final irá sempre lembrar-se da vez que viemos de férias da Europa e eu lhe ofereci um pacote de queijadas de Sintra. Irá lembrar-se disso porque as memórias, boas ou más, nunca desaparecem.

Sempre pensei nela como a heroína de um romance policial. Uma rapariga solteira capaz de atrair jovens empresários e que após uma sucessão de más decisões se vê acusada do assassinato de um político. Não sei se porque sempre que olho para ela nunca traço um retrato realista e me deixo inebriar por entre imagens e sentimentos ficcionais ou se porque por vezes penso em como seria bom poder ter uma aparência perfeita e afinal ser mesmo como ela. Ser mesmo como ela por eu querer ser a heroína de um romance. Ter realmente importância. E não este lento desaparecer nesta ténue insipidez do tédio. Neste pôr de sol que perdeu o seu brilho. Outras vezes penso nela daqui a vinte anos. Penso nela casada e feliz e sem mágoas. E sem lágrimas derramadas em paixões juvenis. E sem lágrimas derramadas em amores perfeitos. Ter esperança é o que me tem ajudado a passar por momentos difíceis. Mas essa desaparece como desaparece o sol. O sol que aparece desaparecendo.

Ela é assustadoramente bonita. Ao pé dela eu sou assustadoramente vulgar. Quis sempre acreditar que essas diferenças escapassem ao porteiro por causa da sua idade. Que com a idade dele não se consiga apreciar os cânones de beleza dos dias de hoje. Lembro-me de quando a vi pela primeira vez. Os meus olhos fixos e ela indiferente. Como se estivesse habituada a ter pessoas a olhar para ela com os olhos fixos. A pergunta “Quem é ela?” repetiu-se na minha cabeça em eco infinito, com ressonância intensa, percorrendo de um lado ao outro todos os compartimentos da memória numa tentativa louca de encontrar uma resposta. Ela fez o seu melhor para parecer indiferente mas a sua intuição feminina deve lhe ter dito que eu já estava à mais de 10 minutos de olhos abertos na sua direcção. A empregada do café surpreendeu-me ao perguntar-me se desejava alguma coisa mais. Nesse momento, em que o feitiço foi quebrado por momentos, os papéis inverteram-se e quando voltei a olhar para ela dei com os seus olhos como setas a fazer uma avaliação de mim de alto a baixo.

José Drummond
16 Jun 2016

Que estamos nós aqui a fazer, tão longe de casa? | 15 – O estripador

*por José Drummond

[dropcap styçe’circle’]“M[/dropcap]eu Amor.
Escrevo-te aqui de uma cidade perdida nas montanhas do Japão. Espero que esta minha primeira carta desde que nos separámos te acalme e que te possa dar alguma esperança. É importante que saibas que eu não te esqueci. Vives dentro do meu coração. Sempre. Desculpa não ter conseguido contactar-te antes da minha partida. Tenho a certeza que ele desconfia de alguma coisa. Estou a ficar assustada. Ontem a voz dele alterou-se e frequentemente fica em suspenso e não acaba as frases. Como se estivesse realmente a pensar noutra coisa. Não sei porque não tive coragem de acabar isto aí. Deixei arrastar tudo e depois pensei que seria mais fácil de lidar com este palerma durante a viagem. Na verdade gostava que estivesses aqui ao meu lado. Agora. Neste preciso momento, para não ter que te escrever e poder sussurrar tudo ao teu ouvido. E deixar-me abraçar. E deixar-me beijar. Só estou bem ao pé de ti. Quero dar-me toda. Para que me conheças ainda melhor do que eu própria me conheço. Espero que não estejas triste. Não tolero o pensamento de que possas estar triste. Como sabes não sou o tipo de mulher que se enrola em infidelidades. Tudo isto é tão complicado. Tudo isto é tão novo para mim. Não sei como tens paciência para mim. Não sei o que vês em mim. Posso garantir-te que não estou nesta relação contigo para perder tempo ou para brincar com os teus sentimentos. Por favor acredita na minha sinceridade. Tu és o homem que eu amo. Que mais me iluminou. Que mais me faz feliz. O único que realmente me faz feliz. Aqui, ao lado dele, sinto-me rodeada por esta miséria. Untitled1

Espero com todo o meu ser que acredites que sou honesta quando te digo que tu és aquele que o meu íntimo deseja. Aquele que trago sempre no peito. Como gostaria de poder planear o tempo exclusivamente em tua função. Desculpa-me, sabes que nunca tive jeito para escrever, mas todas as palavras são puras e saem do meu coração. Contigo sou tão diferente. Estou sempre com vontade de fazer coisas. Como gostava de voltar a cantar ópera cantonense. Aquelas escapadas à sala privada de karaoke, onde acabamos uma vez por fazer amor, acordaram em mim o meu gosto em cantar. Sabes que quando era pequenina sempre quis ser como a minha mãe. Ela cantava frequentemente na associação de bairro. Ouve um período, no qual, fui a muitos concertos tradicionais com ela. Lembro-me que ela chegou a ganhar prémios. Dava gosto ouvi-la. ‘Uma mulher que sabe cantar bem pode hipnotizar o homem certo’, dizia-me ela com frequência. Ela podia cantar em todos os lugares. Era uma mulher muito corajosa e confiante de si própria e das suas decisões. Como gostava de ser um bocadinho mais como ela. Depois aquela horrível pneumonia acabou com as forças dela. Foi nessa altura que os meus tios me levaram para Macau. Nunca mais a vi e eles esconderam-me a sua morte até eu fazer 16 anos. Mentiram-me durante anos e anos. Nessa altura a minha vida começou a deixar de fazer sentido. Acreditei que o mundo estava contra mim e que Deus não existe. Acabei por seguir o trabalho mais estúpido do mundo. Como sempre odiei estar por ali a deitar fichas para jogadores porcos, almas penadas, pessoas sem interesse nenhum. Por causa do meu trabalho eu tinha que usar aquele uniforme completamente amorfo e sem estilo. Sempre que saia dirigia-me às casas de banho, na parte de trás do hotel, e carregava um pouco nos cosméticos até alterar o rosto. Trazia sempre um vestido leve num saco que me ajudava a voltar a fazer sentir-me pessoa de novo. Era mais forte que eu. Era o desejo de conseguir ter uma existência.

Sabes que a verdade é que eu sonhava um dia ainda conseguir fugir para Paris e estudar moda. Foi numa dessa noites depois do trabalho no Casino Lisboa que acabei por conhecer este palerma. Levou-me a comer ostras e lagosta e confesso-te que me deixei seduzir pelo seu dinheiro. A cada encontro comprava-me a alma com mais uma jóia. Não demorou muito até nos casarmos. Proibiu-me logo de trabalhar. Muitas vezes pensei que a minha vida acabou ali. Mal sabia eu que ainda te viria a conhecer. Uma vez resolvi pintar o cabelo com tons vermelhos. Nessa noite não me falou e na manhã seguinte deixou-me um bilhete, antes de sair para o trabalho, que dizia: ‘é favor mudar a cor do seu cabelo. Não é uma cor decente para a mulher de um político. Se alguém a vê com esse aspecto o meu lugar na assembleia fica em risco.’ E foi assim que nunca mais mudei o meu corte de cabelo nem o pintei de outra cor que não preto. Lembro-me que quando era miúda cuidava imenso do meu cabelo longo. Sonhava encontrar o meu príncipe e sonhava que ele me ajudava a lavar o cabelo. E que depois, com imenso carinho ajudava-me a secá-lo. E que brincava com ele quando encostava a minha cabeça no seu peito. A minha felicidade quando nos conhecemos. Meu amor. Finalmente alguém brinca com o meu cabelo. Finalmente alguém despertou em mim o romance. Esta paixão que me revelou que afinal a vida não tinha acabado.
Agora, aqui perdida de saudades tuas, sei que estou pronta para te dar todo o meu amor. Tu és tão especial. Espero que nunca te arrependas de estar comigo.
Sonha comigo meu amor. Dá-me tempo para acabar isto que estarei de volta muito, muito em breve.

Sempre tua.
Daphne.”

2 Jun 2016

Que estamos nós aqui a fazer, tão longe de casa?

A empregada do bar

Têm estado dias de nevoeiro. Dias nos quais não se vê o outro lado da ponte. Uma cerração que se estende e que entra nas nossas cabeças. Ofuscando a visão. Aglutinando a alma. Até não existir mais nada. Até só existir esta intensa camada que envolve os nossos corpos. Nada mais que este estar em surdina. Esta pressão que aperta o coração. Olho para ti. E és? Existes realmente? Ou subsistes apenas como reminiscência no espaço cinza claro?
Desde que aqui vens que me parece poderes estar interessado em mim. Mas algo se passou na tua vida que te deixou com uma dor profunda. Vens aqui todas as noites. Vens beber até não poderes mais. Sou sempre eu que te sirvo. E sirvo-te o tempo todo. Primeiro vieste uma noite e não ficaste muito tempo. Depois as visitas tornaram-se cada vez mais frequentes. Já encontrei os teus olhos a passear pelas linhas do meu corpo. Por vezes demoras-te no decote do meu vestido e, a medo, nos meus seios. Sinto que imaginas coisas, mas ainda não percebi bem o quê. Não sei se te sentes tão atraído por mim como eu me comecei a sentir por ti. A verdade é que uma mulher sente sempre o olhar de um homem. Ao mesmo tempo parece que tens medo de ti. Do que pode acontecer. E até, de podermos acabar na cama. E, se calhar, tens razão. Não sei se tens medo de te ligar a mim. Se calhar tens medo de ti. Se calhar tens medo que eu seja sádica, abusiva ou dominadora. Se calhar tens medo de seres tu o sádico. Se calhar tens medo que, apesar de trabalhar num bar, eu seja uma pessoa dócil. Que seja quase como uma flor. Uma flor que tu poderás danificar. Mas eu digo que não poderás. E digo que não poderás, porque se eventualmente acontecer algo entre nós, eu tudo farei para ser, primeiro a tua princesa, e depois a tua rainha.


Hoje é terça-feira, e tu, mais uma vez, estás sozinho. Estás sentado ao balcão, no mesmo lugar de sempre, não muito longe do aquário. As tuas mãos variam de posição frequentemente. As tuas mãos existem em alternância, entre o copo e a cabeça, que se percebe mais confusa que nunca. Num gesto repentino bates com o copo no balcão e bebes o que resta de uma vez só. Ainda não estás bêbado como já te vi. Algumas vezes por esta altura já estás preparado para subir ao teu quarto. Mas hoje a tua confusão tem uma determinação qualquer que não te deixa ficar bêbado.
Vou agora passar à tua frente. Devagar. Com um leve agitar do corpo. Fazendo com que este rebolar me insinue. Esperando que este rebolar te acorde e te faça olhar para mim. Vou-o fazer sem aviso prévio, de modo a que sintas um arrepio na espinha. Daqueles arrepios que fazem tremer o sexo. Daqueles arrepios que ampliam a imaginação. E assim me perco no sonho, no desejo, a olhar para ti. A olhar para ti. Mas tu não me vês. E que vejo eu? Vejo um homem que já não é novo. Talvez um pouco rebelde. Um homem estranho, abatido, e, sempre à procura, sempre tão perdido. Tudo o que quero neste momento, é mostrar-te que o que quer que seja que te tenha acontecido, não merece esta forma dolorosa de suicídio em andamento lento. Mas sou tímida, e nunca seduzi ninguém nesta situação, a partir do lado de dentro do bar.

Eu sei. Eu sinto. Eu sei que podes ser bastante convincente. Eu sinto que, com vontade, com a tua voz calma, com o teu olhar que sei pode ser quase sedutor, podes fazer qualquer mulher sucumbir em desejo. Eu sei. Eu sinto. Mas estas não são as melhores circunstâncias. Tu não és tu. És tu e dor. E eu sei que posso fazer com que te esqueças. Nem que seja por um momento. Se me deres oportunidade para isso. Deixa ver se me consigo surpreender e me lanço para ti. “Que fazes hoje à noite depois disto?” Uma onda de antecipação parece crescer no meu peito quando penso nessa possibilidade. De algum modo não quero admitir mas parece que tenho estado à espera de ti. Parece que tenho estado à espera que te sentes nesse banco e que olhes para mim. Parece que és tu que irás preencher o vazio que sinto. Olho-te nos olhos e sorrio. Os teus olhos permanecem perturbados. Os teus olhos frios que seguram tanta dor. Olha para mim. Obedece-me. Toco-te na mão. Tu pareces não sentir. As tuas mãos frias. Imagino a minha mão pequena dentro da tua. Ensaio mais um toque rápido e desajeitado. Quero que as minhas intenções sejam mais claras. Quero-te. Quero um homem misterioso como tu.
“A polícia anunciou pela primeira vez a existência de um assassino em série relacionado com o caso das mulheres com abdómenes cortados. A polícia decidiu agora colocar vigilância em todas as ruas principais da Taipa.”

José Drummond

6 Abr 2016

Que estamos nós aqui a fazer, tão longe de casa? | O homem sem rosto

Quando a viúva ficou em silêncio, ouviu-se claramente o chilrear de um pássaro através da vidraça. Um som que se prolongou durante algum tempo, até que se ouviu um bater de asas e o pássaro voou para um qualquer outro lugar.
As pálpebras da viúva tremem de raiva quando fala. Por momentos está em silêncio. Mantém a calma. Pouco depois perde-a e os lábios mexem, e as pálpebras tremem de raiva. Tenta recordar-te. Quem poderá saber da nossa existência? Quem poderá ter encomendado este trabalho? Observa bem o espaço. O que poderá ser usado para nos libertar?  Tem que existir alguma coisa. Tem que existir uma saída. A viúva não vai ficar o tempo todo nesta sala. Quieto nesta sala sombria. A viúva continua a remexer nos armários. Ali daquele lado existe uma pequena janela. Existe esperança. Uma esperança diferente daquela que vivi nos dias seguintes aos teus olhos se apagarem. Uma esperança que perdi na base da colina, atrás da casa. Atrás de um alto monte de terra. Uma casa com a entrada escondida por ervas daninhas. Uma casa modesta. Uma casa onde me escondi até esquecer que nome era o meu. Até esquecer que nome era o teu. Entre as ervas daninhas floresceu um grupo de flores de cor azul. Violetas. De um azul forte. Um azul brilhante.

O que a viúva não sabe é que nessa casa, com a entrada escondida, uma estranha aparição surgiu uma vez à porta. Uma estranha mulher que parecia estar em baloiço. Para frente e para trás. Parecia que estava realmente em baloiço. Talvez fosse por causa da paisagem ao fundo. Uma paisagem com grossas folhas e sobrepostas camadas de gelo. Grossas folhas que antecipavam uma cadeia de montanhas nevadas. Nevadas como só as montanhas podem ser e com aquela sensação de imensidão que só as montanhas possuem. Essa estranha mulher parecia em baloiço mas podia ser o fundo. Lembro-me que eu próprio me senti em baloiço. Em baloiço com aquela cascata de montanhas nevadas que eram de um branco-neve fria. E eis que o frio da neve tornou-se cor quente soltando uma música inebriante. A mulher começou a soltar sons. Consonantes.

As consonantes dos teus olhos que ao chocarem na neve não eram mais um uniforme branco. Estas consonantes não eram um uniforme branco mas sim muitas cores harmonizadas. Eram consonantes com muitas cores e muitas outras tonalidades dentro de cada cor. Com variações de vermelho, e verde, e azul, e roxo, e amarelo, e muitas outras cores, e muitos outros tons. Talvez fossem os pinheiros vermelhos. Os mesmos pinheiros que se erguiam para além do telhado de palha. Essa estranha aparição que parecia em baloiço, para frente e para trás, e que parecia desvanecer-se nesse movimento tinha os mesmos olhos consonantes. Essa estranha aparição tinha os teus olhos e eu levei esses olhos até uma sala ao fundo da casa. Uma sala onde comemos bagas de uvas e todas as pétalas das violetas de azul forte que floresceram por entre as ervas daninhas. Essa mulher não me mostrou logo todo o seu rosto. Não me mostrou logo tudo. Demoraram meses até que ela me mostrasse as marcas dos meus dedos no seu pescoço. No teu pescoço. O que a viúva não sabe é que tu voltaste para nunca mais me deixares. O que a viúva não sabe é que me acompanhas para todo o lado e que estás agora aqui sentada no sofá e que tudo vês, e que tudo ouves, e que tudo sentes.

A viúva desloca-se a espaços, para observar a sopa que tem no fogão. Ali ao fundo existem umas portas de vidro deslizantes. Penso que dêem para a casa-de-banho. Levanta-te e vai até lá. Espera até que ela aqui volte e investiga se existe algo que possamos usar. Podes olhar-te ao espelho para te certificares de que não há problemas com a tua aparência. Enquanto isso investiga o espelho. Vê se é grande e se o poderemos de algum modo utilizar. Investiga se tem banheira. E depois segue até ao corredor e investiga o resto da casa.
A viúva respirou fundo várias vezes antes de dizer. “Tu vais ser o meu último trabalho. Uma vez que faça isto desapareço”. Vai já. Vai agora que ela se inclina sobre mim. Estamos aqui agora, mas não amanhã. Eu amanhã nem vou saber quem sou, nem vou voltar a ter um nome diferente, nem uma cara diferente, nem sequer te vou conseguir ver. Vai agora. Por favor. Não consigo sacudir a consciência. Sinto a minha respiração a aumentar ao mesmo tempo que o meu bater de coração acelera. Sinto uma gota de suor. Um formigueiro na pele. Sinto a droga que ela me injectou começar a fazer efeito. Não quero ter nenhuma premonição. Mas sinto algo de mau. Como um aviso. Desta vez é diferente. Estou a ficar demasiado tenso. Não quero dar indícios de medo à viúva. Olha. Ela vai aumentar o som da televisão. Vai agora.

“A polícia revelou que foi descoberta uma outra mulher grávida morta na Vila da Taipa. A mulher, também com 32 anos, foi igualmente encontrada com o abdómen aberto. O marido terá chamado a polícia depois de ter chegado a casa e ter encontrado a mulher na sala de jantar do apartamento. O feto, de 7 meses, foi encontrado deitado ao lado dela, dando ideia que o assassino não teve tempo para o levar como nos casos anteriores. A polícia está agora num impasse, procurando por novos indícios, depois de ter preso um suspeito de 23 anos que havia confessado ser o responsável dos anteriores casos. Em relação à rapariga da ponte não existem mais desenvolvimentos.”

José Drummond

30 Mar 2016

Norte da Taipa |Defendidos incentivos para proprietários privados

Três anos depois, o plano de reordenamento da zona norte da Taipa continuam sem grandes detalhes. Lau Veng Seng quer que o Governo crie incentivos para os terrenos privados. Porque o contexto económico não é favorável

[dropcap style=’circle’]O[/dropcap] plano para o ordenamento turístico da zona norte da Taipa parece ser um parto difícil de acontecer. Anunciado em 2013, pouco ou nada foi feito até então. Ao HM, a Direcção dos Serviços de Solos, Obras Públicas e Transportes (DSSOPT) confirmou que desde o lançamento do plano já foram emitidas 13 plantas de condições urbanísticas (CPU), sendo que, destas, há duas “cujos anteprojectos de obra já foram apresentados”. Para além disso, “existem ainda dois pedidos de emissão de CPU que estão a ser tratados”.
O Governo não avança um calendário para a conclusão do plano, já que “é complicada a natureza dos terrenos localizados na zona norte da Taipa”, por existirem terrenos públicos, terrenos privados e terrenos concedidos por arrendamento. “É necessária que haja uma coordenação com os proprietários dos respectivos terrenos para implementação do plano”, disse a DSSOPT. Esta tem sido, aliás, a justificação constante do Governo para não avançar com o projecto.
Ao HM, o deputado nomeado Lau Veng Seng, também presidente da Associação de Construtores Civis de Macau, considera que o Governo deveria criar incentivos para os proprietários de terrenos privados.
“Gostaria de ver mais terrenos a ser desenvolvidos, para aumentar o número de habitações. Contudo, as questões ligadas aos concessionários são muito complicadas, já que a maioria dos terrenos estão nas mãos de privados. Acredito que a Administração tem de implementar uma espécie de incentivos para esses promotores, para que estejam dispostos a sacrificar os terrenos para dar lugar às infra-estruturas”, disse o deputado.
“Pelo que sei em relação aos detalhes do projecto, vão existir novas casas e infra-estruturas sociais pensadas para a zona. Então, para construir tudo isso e para promover esse desenvolvimento algum tipo de incentivos devem ser estabelecidos. Temos falta de terrenos e a Administração tem de estudar que tipo de planos vai propôr para encorajar os proprietários a começar a construção”, apontou.
O deputado Chan Meng Kam, que é proprietário de dois terrenos através da Companhia de Investimento e Desenvolvimento Jinlong (Golden Dragon), em sociedade com o deputado Chui Sai Cheong e Li Amber Jiaming, recusou prestar declarações ao HM sobre este assunto. Há dois anos, referiu ao jornal Exmoo News que as condições apresentadas pelo Executivo eram inaceitáveis.

Três ou quatro anos

Questionado sobre o projecto, o deputado Ng Kuok Cheong considera normal o atraso. “O Governo tem falta de recursos humanos e não pode resolver os processos relativos aos terrenos de uma só vez. Penso que o Governo tem noção de que vamos ter que esperar alguns anos, talvez três ou quatro anos, para ver os projectos avançar”, apontou.
O plano de reordenamento da zona norte da Taipa inclui a Taipa Grande, a povoação de Cheok Ká, povoação de Sam Ka e ainda a zona de aterros do Pac On. Para Mak Soi Kun, é também “normal” o atraso no desenvolvimento do plano.
“Depois da entrada em vigor da Lei do Planeamento Urbanístico, os processos de aprovação das PCU demoram algum tempo, é normal que nestes dois anos não tenha sido construído nenhum projecto.”
O deputado defende que o abrandamento da economia faz com que muitos proprietários privados não queiram investir. “Há proprietários que acham que as condições não são as ideais, nós sabemos isso. Alguns deles ainda estão a analisar a viabilidade do plano, devido a factores económicos. A economia abrandou, como é que eles têm vontade de acelerar a construção dos edifícios? Os proprietários preferem avançar devagar com o projecto porque não têm confiança para investir”, disse ao HM.
Mak Soi Kun recordou que os terrenos, por estarem nas mãos de privados, não têm de responder a prazos, pelo que não existe pressa na coordenação com os planos do Governo. “É um mercado económico livre”, rematou.

8 Jan 2016

Taipa | Alexis Tam promete Casas-Museu com restaurante e esplanadas

As Casas-Museu da Taipa vão ganhar vida. É o que promete Alexis Tam. O projecto está em cima da mesa e a Casa de Portugal já foi convidada para ser o braço direito do Governo. Um restaurante português, momentos culturais, semanas gastronómicas e esplanadas são os planos do Secretário para os Assuntos Sociais e Cultura

[dropcap style=’circle’]A[/dropcap]zona das Casas-Museu da Taipa vai ter mais vida. É o que promete o Secretário para os Assuntos Sociais e Cultura, Alexis Tam, que ontem, durante uma visita às instalações das oficinas da Casa de Portugal, na Areia Preta, oficializou o convite ao grupo para se assumir como parte integrante do projecto idealizado pelo Governo.
“Hoje em dia aquela zona só tem actividades durante uma semana, isto para mim não chega. Vou dar mais vida àquela parte”, prometeu o Secretário.
Para já, sem grandes detalhes, sabe-se que o projecto vai ceder a única casa vazia – sendo que as restantes são museus – à casa presidida por Amélia António, para que esta possa avançar com os projectos que já tinham vindo a ser falados.
Um restaurante português, algumas esplanadas, momentos culturais e semanas gastronómicas são os planos para aquela zona que, actualmente, a única coisa que recebe é a Semana da Lusofonia.
“Vamos montar um restaurante português, cafés e mais esplanadas naquela zona. Arranjar alguns [artistas] portugueses para tocarem. Vai ser interessante”, argumentou Alexis Tam, acrescentando que conta ter festa e animação “todas as noites”.

Outras culturas

Com um grande destaque e aposta na cultura portuguesa, Alexis Tam disse ainda querer aproveitar outras culturas presentes no território.
“Não é só a Casa de Portugal, também vou convidar outras associações e outros governos, por exemplo, Consulados de outros países, para organizarem algumas festas, festivais da gastronomia de todos os países”, acrescentou, sublinhando contudo que a cultura principal será sempre a portuguesa.
“Actualmente a cultura portuguesa é, para nós, a mais importante”, defendeu, indicando que faz todo o sentido convidar a Casa de Portugal para assumir essa função. “Quero transformar a zona numa área multicultural. Ainda vamos convidar alguns países, como a França, Itália, Brasil e, também, países asiáticos. Acredito que os governos tenham interesse em promover as suas actividades, principalmente num festival de gastronomia e nas artes”, adiantou.

Um projecto bonito

Para já ainda não há data para que o projecto entre em funcionamento, mas promete o Secretário que no início do próximo mês, durante a apresentação das Linhas de Acção Governativa (LAG), irá explicar o plano mais detalhadamente.
“Já falei com os meus colaboradores, com o presidente do Instituto Cultural, com a Direcção do Serviços de Turismo, com o presidente do Instituto de Desporto e vamos trabalhar todos juntos. Por mim podemos trabalhar juntos como uma sinergia. Podemos fazer um projecto maior e mais bonito”, rematou.
Sem adiantar muito, Amélia António indicou que irá pensar “num plano de dinamização daquela casa e do espaço”.
A ideia, diz, é criar um projecto de divulgação da gastronomia portuguesa, dos seus produtos e cultura.
“Exactamente aquilo que, há anos, o Governo nos pediu para fazer quando fomos para a Casa Amarela (…) No fundo, aqui, o que se pretende, de certa maneira, é recriar o que se pretendia fazer nessa altura”, apontou.
O Fado e a “música portuguesa” serão factores importantes e de aposta no projecto. “Não temos forçosamente de ter um estilo de música, podemos ter várias coisas. Penso que dentro da ideia que o Secretário manifestou de, naquele espaço poder ser uma mostra de outros países e culturas, (…) eventualmente se pode repescar uma ideia apresentada ao Instituto para os Assuntos Cívicos e Municipais (IACM) há uns anos, em que nos propúnhamos, com outras associações dos países lusófonos, a fazer, ali, naquele espaço, um evento mensal de todos os países de Língua Portuguesa”, indicou.

Tudo dentro da lei

Questionado sobre o cumprimento da Lei do Ruído – questão que se levantou durante a semana do Festival da Lusofonia, obrigando os espectáculos a terminar às 22h00 – Alexis Tam garantiu que a lei terá de ser cumprida da melhor forma para que o barulho não prejudique ninguém. A zona é boa para isso, diz, apresentando ainda como hipótese a possibilidade de eventos começarem mais cedo e terminarem a horas, conforme a lei.

Lusitanvs é uma incógnita

Questionado sobre a possibilidade do restaurante português idealizado para o projecto poder ser o actual Lusitanvs, da responsabilidade da Casa de Portugal, Alexis Tam não confirmou. “Isso é da responsabilidade da Casa de Portugal, só lhe chamamos projecto de restaurante português. É a única coisa que podemos dizer, é um restaurante que ficará muito bem naquela zona, um café, uma esplanada, uma exposição destinada à cultura portuguesa. Poderemos arranjar um grupo de dinamizadores, ou artistas portugueses, macaenses, chineses. Podemos aproveitar estes produtos artísticos para vender aos turistas ou residentes. Tudo é possível”, reforçou. Amélia António não confirmou se será o restaurante que é acolhido neste momento pela Casa de Portugal. Estando o Lusitanvs “em transição” nas instalações actuais, Amélia António indica que esta é uma questão “dramática” e que, por agora, é preferível não tomar qualquer decisão. “Quanto tudo estiver decidido aí teremos de tomar decisões”, rematou.

Saldo Positivo

O convite foi feito depois de Alexis Tam e a sua equipa visitarem durante mais de uma hora as oficinas de trabalho da Casa de Portugal. “Foi com gosto que visitei as instalações da Casa de Portugal, penso que esta tem desenvolvido muitas actividades, muitos cursos para jovens, não só portugueses mas também macaenses e chineses”, indicou o Secretário no final da visita. O trabalho realizado pelo grupo foi ainda elogiado por Alexis Tam que reconheceu o papel “positivo” e “importante” da Casa de Portugal. “Tenho acompanhado as actividades realizadas e desenvolvidas pela Casa de Portugal e penso que o Governo, principalmente a minha Secretaria, deve continuar a apoiá-la”, indicou, frisando a necessidade de tornar Macau num centro de artes e culturas.

10 Nov 2015

Deputada quer habitação pública à entrada da Taipa

A deputada Ella Lei questionou o Governo sobre a ausência de aproveitamento de um terreno localizado à entrada da Taipa, cuja concessão caducou em 2008. Nessa área, a deputada acredita que poderia ser construída mais habitação pública

[dropcap style=’circle’]N[/dropcap]a década de 90 chegou a ser pensado para a construção de um parque temático com semelhanças ao Ocean Park de Hong Kong, o qual teria a designação de “Parque do Mundo Marítimo” e iria atrair mais de um milhão de visitantes por ano. Contudo, anos depois, o terreno situado na Estrada Marques Esparteiro, à entrada da Taipa, continua por aproveitar, sendo muitas vezes destinado à queima de panchões por altura do ano novo chinês. A concessão do terreno caducou em 2008.
Ella Lei defende, na sua interpelação escrita entregue ao Governo, que os residentes de Macau têm necessidades urgentes de mais habitação pública, defendendo que o terreno poderia ter esse fim. A deputada lembrou as recentes declarações do Governo quanto à falta de terrenos como argumento para não responder às necessidades da população.
“Segundo um anexo onde estão as plantas de concessão dos terrenos de Macau de 2008 na Lei de Terras e a proposta de revisão dos regulamentos preliminares, o prazo de arrendamento desse terreno expirou nesse ano. Há dúvidas se esse lote já está na lista dos terrenos desocupados ou se estão a ser levados a cabo processos de recuperação”, escreveu a deputada.

Urgente dar uso

Para Ella Lei, o Governo deveria tratar com prioridade os 18 terrenos que estão desocupados para resolver em tempo oportuno as dificuldades de habitação em Macau. A deputada pede ao Governo para tratar rapidamente dos processos referentes a esses lotes, incluindo os que dizem respeito a declarações de caducidade e recuperação. Ella Lei quer que o Executivo “implemente um calendário de trabalhos claro”, por forma a evitar mais demoras. A deputada lembrou que até ao momento nenhum desses terrenos foi recuperado, tendo mostrado dúvidas sobre o projecto do parque marítimo.
Já em 2009 o deputado Au Kam San havia questionado o Executivo sobre o projecto, por forma a saber se o terreno em causa pertencia à Universidade de Macau. Em nota oficial, o Governo garantiu que o espaço serviria para um parque temático que iria ligar a Taipa ao novo aterro na zona norte da Taipa. O terreno serviria “para conectar o trânsito, infra-estruturas e instalações públicas das duas áreas, aliviando a pressão sobre o trânsito”. Ficou a promessa de que “os organismos de transportes e obras públicas irão acompanhar os trabalhos ligados ao projecto”.

18 Ago 2015