Bolsonaro quer aproximar-se de Taiwan, mas China deu-lhe os parabéns

[dropcap]A[/dropcap] China felicitou hoje Jair Bolsonaro pela eleição, lembrando que os dois países são parceiros estratégicos, apesar da aproximação do Presidente eleito do Brasil a Taiwan e críticas feitas ao investimento chinês durante a campanha.

“A China e o Brasil mantêm uma parceria estratégica abrangente; desenvolver os laços entre a China e o Brasil é um consenso geral dos dois países”, afirmou hoje à agência Lusa o porta-voz do ministério chinês dos Negócios Estrangeiros, Lu Kang.

Durante a campanha eleitoral, Bolsonaro acusou a China de manter uma atitude “predatória” nos investimentos realizados no Brasil. “A China não está comprando no Brasil, ela está comprando o Brasil. Você vai deixar o Brasil na mão do chinês”, disse.

Bolsonaro tornou-se ainda o primeiro candidato presidencial brasileiro a visitar Taiwan desde que o Brasil reconheceu Pequim como o único Governo chinês, em 1974, aderindo ao princípio ‘uma só China’, visto pelo regime chinês como garantia de que Taiwan é parte do seu território.

Pequim considera Taiwan uma província chinesa e defende a “reunificação pacífica”, mas ameaça “usar a força” caso a ilha declare independência. Já a ilha onde se refugiou o antigo Governo nacionalista chinês depois de os comunistas tomarem o poder no continente, em 1949, assume-se como República da China.

Lu Kang lembrou que o princípio ‘uma só China’ é um “consenso” da comunidade internacional, que está na base do desenvolvimento das relações externas de Pequim.

“A China está pronta a seguir o princípio do respeito pelos interesses fundamentais dos dois países para trabalhar com o Brasil e avançar com a nossa parceira estratégica”, disse.

O porta-voz chinês lembrou que a cooperação entre Pequim e Brasília, em instituições multilaterais como o BRICS [bloco de grandes economias emergentes, que inclui ainda Rússia, Índia e África do Sul] “servem os interesses comuns dos países em desenvolvimento e mercados emergentes”.

A China é o maior parceiro comercial do Brasil e o principal investidor externo no país sul-americano, tendo comprado, nos últimos anos, ativos estratégicos nos setores da energia ou mineração.

O candidato do Partido Social Liberal (PSL, extrema-direita) Jair Messias Bolsonaro, 63 anos, capitão do Exército reformado, foi eleito no domingo, na segunda volta das eleições presidenciais, o 38.º Presidente da República Federativa do Brasil, com 55,1% dos votos.

De acordo com dados do Supremo Tribunal Eleitoral brasileiro, Fernando Haddad, candidato do Partido dos Trabalhadores (PT, esquerda), conquistou 44,9% dos votos, e a abstenção foi de 21% de um total de mais de 147,3 milhões eleitores inscritos.

França e Rússia parabenizam

O chefe de Estado francês, Emmanuel Macron, também felicitou Jair Bolsonaro e manifestou vontade de continuar a cooperação com o país “no respeito” pelos “princípios democráticos”. Em comunicado, a presidência francesa referiu que Macron felicitou Bolsonaro, da extrema-direita, acrescentando “a França e o Brasil têm uma parceria estratégica baseada nos valores comuns de respeito e de promoção dos princípios democráticos”. “É no respeito por este valores que a França deseja continuar a sua cooperação com o Brasil”, referiu-se no comunicado.

Já o chefe de Estado russo, Vladimir Putin, manifestou o seu desejo de desenvolver ainda mais as “relações construtivas” entre os dois países, divulgou o Kremlin. Num telegrama enviado a Bolsonaro, Putin referiu que “aprecia muito a experiência tão significativa de cooperação mutuamente benéfica para em vários campos no âmbito da associação estratégica”.

O líder russo manifestou a sua “confiança no desenvolvimento de todo o tipo de relações russo-brasileiras, bem como na cooperação construtiva no marco das Nações Unidas, no G20, nos BRICS e outras organizações multilaterais na defesa do interesse dos povos da Rússia e do Brasil”, referiu-se na nota do Kremlin.

29 Out 2018

Brasil/Eleições | Frases da campanha de Bolsonaro entoadas nos festejos da vitória em Brasília

[dropcap]”A[/dropcap] nossa bandeira jamais será vermelha”, “mito” e “eu vim de graça” foram algumas das palavras da campanha eleitoral de Jair Bolsonaro entoadas no domingo pelos brasileiros nos festejos da vitória da extrema-direita, em Brasília.

Não faltou fogo de artifício, música, buzinas, insufláveis gigantes e até comida feita no momento para as centenas de pessoas que se concentraram na esplanada dos ministérios, na capital brasileira, para celebrar euforicamente a eleição de Jair Messias Bolsonaro para o cargo de Presidente da República do Brasil.

Felicidade foi mesmo o termo mais usado pelos habitantes de Brasília, para descrever o momento.

“Estamos muito felizes. O nosso país está a livrar-se do grande mal que há no mundo que é o comunismo. O nosso país começa um novo ciclo de prosperidade, de esperança, de crescimento e abundância. Estamos aqui para comemorar isso. Viva o Brasil. Glória a Deus”, disse um casal de namorados, à agência Lusa.

“Estou muito feliz porque o Brasil está a entrar numa fase que a gente tanto sonhava. Foram muitos anos que vivemos de forma precária por conta do governo que antecedeu durante estes anos todos e hoje estamos a viver um sonho, algo que todos desejávamos, e a prova está aqui”, disse um dos apoiantes de Bolsonaro, apontando para a multidão em festa.

Um brasileiro que participou ativamente na campanha política do Partido Social Liberal (PSL) afirmou que não podia estar mais feliz com esta vitória, após muitas horas dedicadas a fazer propaganda a favor da extrema-direita.

“Estou muito, muito feliz. Valeu a pena o sofrimento, a guerra, a batalha. Agora vamos passar mais quatro anos de muita felicidade, de muita conquista. Valeu muito a pena o esforço e o sofrimento, a campanha que fizemos de graça contra a corrupção”, declarou o ajudante da campanha do confesso defensor da ditadura militar.

Um grupo de jovens, vestido a rigor com camisolas e bandeiras com o rosto de Bolsonaro mas ainda sem idade para votar, não quis perder a oportunidade de dizer à Lusa o motivo de acharem que o Bolsonaro é a pessoa ideal para liderar o país.

“Se formos analisar as propostas de governo, Haddad quer aumentar os impostos e Bolsonaro quer diminuir, Bolsonaro quer também cortar em alguns ministérios. Ele é liberal, conservador e de direita, enquanto que o outro (Haddad) é de esquerda e já está há 13 anos no poder, já está na hora da mudança”, disseram os jovens antes de interromperem a entrevista em alvoroço após um insuflável de Lula da Silva, vestido de prisioneiro, ser içado.

Uma das apoiantes de Bolsonaro fez-se acompanhar do seu filho, ainda pequeno, e afirmou que com Bolsonaro no Governo as crianças estarão mais protegidas.

“Ele preza pela família e ele também tem a questão da ideologia de género, por isso preza pela família e pelas crianças. (…) É uma pessoa de bem, que não tem histórico com roubalheira, ele é um polícia e serva a pátria. É um patriota”, afirmou.

Outra família presente na esplanada dos ministérios disse estar “aliviada por depois de 16 anos ter a oportunidade de mudança de rumo, de retomada do crescimento, da segurança e da credibilidade no país”.

“O país precisa de mudança, de disciplina e de educação. Está tudo perdido e abandonado e Bolsonaro vai mudar isso, com certeza”, disse mais uma apoiante de Bolsonaro acompanhada pela filha.

De facto, foram muitas as famílias que se juntaram às festividades em nome do Brasil e da vitória do capitão do exército reformado, Jair Bolsonaro. Um ambiente familiar e de festa, sem registo de incidentes e violência, que promete durar a noite toda.

O candidato do Partido Social Liberal (PSL, extrema-direita) Jair Messias Bolsonaro, 63 anos, capitão do Exército reformado, foi eleito no domingo, na segunda volta das eleições presidenciais, o 38.º Presidente da República Federativa do Brasil, com 55,1% dos votos.

De acordo com os dados do Supremo Tribunal Eleitoral, Fernando Haddad, candidato do Partido dos Trabalhadores (PT, esquerda), conquistou 44,9% dos votos, com o escrutínio provisório (99,99% das urnas apuradas) a apontar para 21% de abstenção do total de eleitores inscritos (mais de 147,3 milhões).

Numa declaração à porta de sua casa, na Barra da Tijuca, Rio de Janeiro, ainda no domingo, o Presidente eleito prometeu que o seu Governo “será um defensor da Constituição, da democracia e da liberdade”.

“Este é um país de todo nós, brasileiros natos ou de coração, de diversas opiniões, cores e orientações”, disse Jair Bolsonaro.

29 Out 2018

Jair Bolsonaro eleito Presidente do Brasil com 55,15% dos votos

[dropcap]O[/dropcap] candidato da extrema-direita às eleições presidenciais brasileiras Jair Bolsonaro (PSL) venceu a segunda volta da votação, domingo, com 55,15%, quando o apuramento está praticamente fechado (99,99% das urnas apuradas), segundo dados do Tribunal Superior Eleitoral.

De acordo com os dados oficiais, Jair Messias Bolsonaro foi eleito 38.º Presidente da República Federativa do Brasil com 57.765.131 votos (55,15%), enquanto Fernando Haddad (PT, esquerda), conquistou nesta segunda volta 46.969.763 votos (44,85%).

Os resultados praticamente finais foram divulgados pelo Tribunal Superior Eleitoral cerca das 21h00 locais, duas horas após o fecho das últimas urnas. Jair Bolsonaro sucede a Michel Temer como Presidente da República.

Capitão do exército reformado e defensor da ditadura militar – regime que vigorou no Brasil entre 1964 e 1985 -, Jair Messias Bolsonaro nasceu a 21 de março de 1955 (63 anos) e iniciou a carreira política como uma figura caricata de posições extremas e discursos agressivos em defesa da autoridade do Estado e dos valores da família cristã.

Chamado de “mito” e “herói” pelos seus apoiantes e de “perigo à democracia” por críticos e adversários, Jair Bolsonaro está na política brasileira há 28 anos e foi eleito deputado (membro da câmara baixa) sete vezes consecutivas, mas sem nunca ter ocupado um cargo importante no Parlamento.

Bolsonaro ganhou notoriedade nos últimos anos e transformou-se num líder capaz de mobilizar milhares de eleitores desiludidos com a mais severa recessão económica da história do Brasil, que eclodiu entre os anos de 2015 e 2016, ao mesmo tempo em que as lideranças políticas tradicionais do país têm sido envolvidas em escândalos de corrupção.

As promessas

Jair Bolsonaro anunciou que a intenção de “reduzir a estrutura e burocracia” do Governo e comprometeu-se a “respeitar a federação” brasileira, transferindo os recursos federais diretamente para os estados.

Numa declaração à porta de sua casa, na Barra da Tijuca, Rio de Janeiro, o candidato do Partido Social Liberal (extrema-direita) declarou-se empenhado em “construir um futuro melhor”, que disse passar por um Governo que “crie condições para que todos cresçam”. “Isso significa que o Governo federal dará um passo atrás, reduzindo a sua estrutura e a burocracia, cortando desperdícios e privilégios, para que as pessoas possam dar muitos passos à frente”, afirmou.

Bolsonaro adiantou que o seu executivo “vai quebrar paradigmas”. “Vamos confiar nas pessoas, vamos desburocratizar, simplificar e permitir que o cidadão e o empreendedor tenha mais liberdade para criar e construir o seu futuro. Vamos desamarrar o Brasil”, declarou. O 38.º Presidente brasileiro referiu, como “outro paradigma a quebrar”, que o executivo que irá liderar “respeitará, de verdade, a federação”. “As pessoas vivem nos municípios, portanto os recursos federais irão diretamente do Governo central para os estados e municípios. Colocaremos de pé a federação brasileira”, declarou.

Além disso, prometeu também que o seu Governo “será um defensor da Constituição, da democracia e da liberdade”. “Faço de vocês minhas testemunhas de que este Governo será um defensor da Constituição, da democracia, e da liberdade. Isso é uma promessa, não de um partido, não é uma palavra vã de um homem, é um juramento a Deus”, afirmou o candidato (Partido Social Liberal, extrema-direita) às eleições presidenciais do Brasil, numa declaração à imprensa à porta da sua casa, na Barra da Tijuca, Rio de Janeiro.

Haddad apela à “coragem” dos brasileiros nos próximos quatro anos

O candidato presidencial do Partido dos Trabalhadores (PT, esquerda) Fernando Haddad afirmou que os mais de 45 milhões de eleitores que votaram na sua candidatura presidencial, derrotada nas urnas, “têm outro projeto de Brasil na cabeça” e apelou à “coragem” do povo nos próximos quatro anos.

Fernando Haddad falava em São Paulo, minutos depois de Jair Bolsonaro, o candidato da extrema-direita (PSL), ter feito o discurso da vitória, como 38.º Presidente da República Federativa do Brasil, eleito este domingo na segunda volta da eleição presidencial, com mais 11 milhões de votos que o candidato do PT.

“Talvez o Brasil nunca tenha precisado mais do exercício da cidadania do que agora. Eu coloco a minha vida à disposição deste país, tenho a certeza que falo por milhões de pessoas”, afirmou Haddad, numa intervenção de cerca de oito minutos, durante a qual nunca se referiu Jair Bolsonaro.

“A soberania nacional e a democracia como nós a entendemos é um valor que está acima de todos nós. Nós temos uma nação, nós temos que defendê-la daqueles que de forma desrespeitosa pretendem usurpar o nosso património, o património do povo brasileiro”, disse ainda Fernando Haddad.

 

Michel Temer convicto de que Bolsonaro fará um Governo de “paz e harmonia”

O Presidente brasileiro, Michel Temer, mostrou-se convicto de que o seu sucessor, Jair Bolsonaro, “fará um governo de paz e harmonia” que o Brasil precisa. “Tenho a convicção de que o presidente eleito fará um governo de muita paz e harmonia que é o que o nosso país necessita”, disse Temer numa conferência de imprensa no Palácio do Planalto, sede da Presidência da República.

Temer afirmou já ter cumprimentado o Presidente eleito e que percebeu, através do seu entusiasmo e das declarações que Bolsonaro já fez ao país que “busca a unidade, a pacificação e harmonia do país que seguramente todos desejam”.

Assinalou ainda que as “eleições são o momento adequado para o povo exercitar o seu poder”, o que se deu “com tranquilidade e harmonia”. Temer acrescentou que a “transição vai iniciar-se já a partir de amanhã” e disse que espera continuidade das políticas já em curso no plano económico, bem como das políticas de natureza ambiental, educacional e na saúde.

29 Out 2018

O monstro do id

[dropcap]M[/dropcap]onstros não têm faltado ao cinema, abundantes em forma e proveniência, quase sempre barulhentos e escamudos, mas todos alardeando um incorrigível mau-feitio, dedicados a escangalhar a vida à humanidade. Quase nunca dão explicações acerca dos motivos da sua grande arrelia e, na verdade, nem é preciso: basta serem monstruosos para ficarmos esclarecidos quanto ao mal que aí vem.

Deste vasto bestiário uma galeria de celebridades incrustou-se no imaginário popular contemporâneo como ícones das nossas piores e recônditas inseguranças. Contudo uma das criaturas malévolas mais tenebrosas, e sobretudo surpreendentes, está hoje infelizmente um tanto esquecida. Talvez uma certa particularidade do “monstro do Id” dificulte recordá-lo: era invisível.

Pode-se especular que essa invisibilidade foi um belo truque da MGM, relutante em gastar demasiado dinheiro nos efeitos especiais. Para mais, sendo evidente a incipiência e a inverosimilhança da figuração dos monstros naqueles anos 50 – a tecnologia coeva não dava para mais – a MGM não desejava que a inaptidão dos recursos técnicos contrariasse a chancela de qualidade que imprimia em todas as obras saídas dos seus estúdios.

Do “monstro do Id” temos direito a ver por instantes tão só uma silhueta eléctrica, já perto do final de “Planeta proibido” o filme de 1954 em que ele (não) aparece. É por volta desse momento que a verdade nos é revelada. O bicho-papão descontrolado, implacável e autónomo que tinha vindo a dizimar a tripulação da nave espacial é fruto dos terrores inconscientes do Dr. Morbius, o guardião do planeta e pai da virginal Altaira por quem os garbosos astronautas ficaram pelo beiço. Incapaz de reprimir a sua involuntária e insubmissa criação Morbius acabará por entender que só morrendo o avatar será eliminado.

A ideia de um monstro criado e nutrido pelos nossos piores sentimentos, doutro modo ciosamente coibidos pelo ferrolho do sub-consciente, é um adorável achado. Mas sumamente arguto é preconizar que tarde de mais consigamos perceber sermos nós próprios a fonte de alimentação da energia maléfica, de tão iludidos que estamos pelo narcisismo da nossa consciência. Retardar esta descoberta inflige no espectador um sentimento de culpa – sem darmos conta todos calamos um “monstro do Id” à espera de algum proveito se recorta e guarda dos filmes que sirva para nos orientarmos.

Dispensada a sarja freudiana, que não passa de má literatura, que eloquente metonímia é este “monstro do Id” se o empregarmos na compreensão de certas aventesmas políticas a emergirem por todo o lado. A última delas esse desalumiado, e tudo indica que também desalmado, capitão Bolsonaro.

A democracia liberal atravessa um mau momento.

Cresce e já não se retrai o pressentimento de ser ela incapaz de corresponder aos anseios dos cidadãos, acumulando promessas falhadas, disfunções orgânicas e, sobretudo uma inquietante incapacidade para dar respostas a problemas sentidos e cada vez mais prementes. Inquietante porque os protagonistas da democracia liberal, aquelas que a governam, aparentam uma completa alienação em face deste maus augúrios.

Acomodaram-se às rotinas administrativas, aos processos e soluções do costume, por mais ineficazes e estéreis que se tenham demonstrado e afadigam-se em malabarismos eleitorais para captarem um voto crescentemente céptico e funcional (há quantos sufrágios andamos a votar “útil”?)

Se os políticos nem sequer percebem que há um problema, como poderiam resolvê-lo?

E não percebem porque estão formatados para desperceber. Paulatinamente vão divergindo as competências necessárias à querela política das competências da governação. O Estado foi governamentalizado, ou seja, foi sequestrado e instrumentalizado pelos profissionais da política que fazem carreira nos partidos para através dos governos ocuparem o aparelho estatal. Nesta circularidade – como ratos na roda – procedem como uma corporação que, conforme ao género, cuida desveladamente das suas conveniências como parte interessada.

Agora Bolsonaro, mas antes Trump, Le Pen e demais réplicas, são cabeças de uma mesma Hidra, gerada e cevada, larvar e latente no interior da democracia liberal, que irrompem como repelentes monstros do seu Id. Ansiosamente se deseja que a ela não caiba sorte igual à do Dr. Morbius que foi a de ter que morrer para os matar.

19 Out 2018

Um milhão resto zero

[dropcap]E[/dropcap]stou realmente divertido e explico-vos: foi dada ao camarada Trump uma oportunidade para se rir com a sua ignorância.

Lembram-se do famoso milhão que o pai lhe havia dado, um milhão conta redonda; afinal subtraído dos impostos? Sei de onde picou a lenda, foi do primeiro vigarista que aparece a Lemuel Pitkin, a cândida personagem de Nathanael West, no comboio para New York – da curta e delirante farsa Um Milhão Conta Redonda ou Lemuel Pitkin a desmantelar-se, que Trump há-de ter lido a pensar que versava sobre casinos. Mr. Mape, penteava os cabelos no reflexo dos seus sapatos de janota e contou a Lemuel: «O meu pai deixou-me um milhão, conta redonda, e por isso não preciso de trabalhar». Claro que endrominava Lemuel para lhe esmifrar os parcos trinta dólares que ele tinha no bolso.

Todavia, devido ao vício com que Trump pinta as suas histórias, abana com um milhão conta redonda à esquerda e à direita, entre promessas, astúcias e gracejos. Agora, morreu pela boca. Há uns meses, partira os pratos com a senadora democrata Elizabeth Warren porque a loura criatura reivindicava uma origem índia. Trump dobrou o riso e chamou-lhe Pocahontas. O que acintosamente repetiu em várias ocasiões, como quem aponta A Louca da Casa. E num comício em Julho, a infabilidade do seu feeling levou-o ao temerário desafio:”Darei um milhão de dólares, conta redonda, à sua organização de caridade favorita, se ela fizer um exame e demonstrar que é indígena. Tenho a impressão de que ela dirá que não!”, sentenciou.

Tivesse o incauto como eu uma filha absolutamente sueca parida por uma mãe indiana e teria pressentido que a genética presta boas partidas. Foi o que lhe sucedeu. A Pocahontas provou a veracidade de sua origem indígena depois de submetida a um teste de DNA que apresenta “forte evidência” de que tem ancestrais nativos. Os resultados confirmam “a existência de um ancestral nativo americano puro”, informa o jornal The Boston Globe.

Vai arder o presidente com um milhão, conta redonda.

Estou realmente deprimido com o que se passa no Brasil e são dispensáveis as explicações.

A irracionalidade e a desinformação galopam para uma calamidade que representará um retrocesso civilizacional. Não se trata unicamente da derrota de um partido ou da repulsa contra o PT, a vitória de Bolsonaro institucionalizará a violência: os comportamentos irracionais que já instalaram o medo e o ódio no país multiplicar-se-ão num “estado de excepção” protegido pelo poder do voto. É presumível que se seguirá um clima de guerra civil e uma repressão geral em nome da segurança, e só tarde demais os ingénuos que queriam sobretudo castigar o PT ao votar contra Haddad descobrirão que há portas que não se devem abrir; de antemão as que permitem que a «besta negra» e o impensado penetrem no nosso condomínio.

Vejo duas motivações erróneas para tal descalabro.

A primeira prende-se a um aspecto que as democracias se alheiam de discutir e que só uma aposta intensiva no domínio da educação poderá eventualmente atenuar. O relativo desenvolvimento das democracias e o incremento dos media como “quarto poder” foi disfarçando até ao fim do século XX o que o poder das redes sociais destapou e tornou visível: é que não vivemos todos no mesmo tempo histórico.

Aquilo que para Walter Benjamin era um sinal de esperança: a saber, que a cada momento se colocaria a hipótese de que a face do presente surpreendesse porque afinal recuperava pontos de vista “derrotados” no passado e reemergidos ao arrepio de uma concepção linear e previsível da História, desencadeando uma lógica do reverso que transmitiria aos movimentos sociais uma maior complexidade e arejava a saturada polarização das narrativas oficiais; essas “anacronias” que segundo Benjamin injectariam na actualidade do presente um factor mais humano – posto que a perspectiva do passado deixa de ser um facto objectivo para passar a ser uma cunha da memória, menos técnica e mais emocional -, essas “anacronias” mostram que podem padecer igualmente de um lado negro.

O Brasil é uma sociedade clivada por diversos e inconciliáveis níveis de consciência da realidade e sem um desígnio transpessoal que apazigue as tensões no rasgado tecido da memória histórica. O que separa um votante de Bolsonaro do de um Haddad não é uma mera diferença de opiniões: vivem isolados por antagónicas percepções do seu tempo histórico.

O que se observa, por entretenimento, nos risíveis e delirantes grupos no FB que defendem a Terra Plana, toma no plano político perspectivas sombrias e traz à tona anacronismos perigosos para uma época de “relativismo”, de perda de universais e de pensamento débil. Quando não se reforça a educação é o que acontece.

A segunda motivação ao lado prende-se com a crédula fulanização com que se associa a corrupção ao PT. O PT ficou evidentemente refém na armadilha do polvo e julgou que só podia fazer passar algumas leis contra o atavismo dos costumes alimentando o monstro, em vez de ter intentado mudar o sistema. Porém, o problema da corrupção é mais endémico do que se julga e continuará com Bolsonaro; o seu governo, que há-de ser fortemente corporativo, só aumentará o problema.

Faz anos que Alain Badiou diagnosticou de que modo a corrupção se tornou a lei íntima das sociedades actuais, a sua fissura invisível, e que é para dissimular essa corrupção sistémica que o escândalo aponta aquilo ou aquele que, no fim de contas, não passam de bodes expiatórios. Numa sociedade que tem no lucro o único motor viável para fazer funcionar a sociedade, a corrupção é um seu efeito capilar.

O problema prende-se com a orfandade dos valores e é gravíssimo mas não nasce com o PT e julgo aliás que muitos votantes do Bolsonaro não serão contra a corrupção, sentiam-se apenas excluídos da rede.

O que tornará mais violento o despertar.

18 Out 2018

Polícia federal pede o indiciamento do Presidente do Brasil em caso de corrupção

[dropcap]A[/dropcap] polícia federal pediu na terça-feira o indiciamento do Presidente do Brasil, Michel Temer, e de outras dez pessoas investigadas num inquérito sobre supostos esquemas de corrupção no sector portuário do país.

Temer e os outros investigados foram acusados de praticar os crimes de corrupção, branqueamento de capitais e organização criminosa. O pedido de indiciamento foi revelado por um despacho do juiz Roberto Barroso, que é relator do caso no Supremo Tribunal Federal (STF).

No documento, o juiz informa a Procuradoria Geral da República (PGR) que, “de acordo com o relatório [da polícia federal], foram produzidas, no âmbito do inquérito, provas de naturezas diversas que incluíram colaborações premiadas [colaboração com à Justiça em troca de redução da pena], depoimentos, informações bancárias, fiscais, telemáticas e extratos de telefone, laudos periciais, informações e pronunciamentos do Tribunal de Contas da União”.

Barroso acrescentou que foram apurados factos que envolvem subornos em espécie, subornos dissimulados em doações eleitorais, pagamentos de despesas pessoais por interpostas pessoas – físicas e jurídicas -, atuação de empresas de fachada e contratos fictícios de prestação de serviços.

Além de encaminhar os documentos produzidos pelas autoridades policiais, o juiz do STF pediu um parecer da Procuradoria-Geral da República (PGR) sobre o caso, que terá 15 dias para se pronunciar sobre uma possível denúncia contra os acusados.

O caso dos portos que envolve o Presidente brasileiro começou a ser investigado em 2017, quando gravações entregues às autoridades judiciais por executivos da empresa JBS revelaram o suposto pagamento de um suborno da companhia Rodrimar a um ex-deputado e antigo assessor de Temer, Rodrigo Santos da Rocha Loures, em troca da alteração de um decreto para beneficiar empresas que atuam no porto de Santos, o maior do país. Na época, Temer negou que tenha recebido qualquer suborno.

A polícia federal pediu também o indiciamento da filha do Presidente brasileiro, Maristela de Toledo Temer Lulia, de Rodrigo Santos da Rocha Loures, do coronel João Baptista Lima Filho e da sua mulher, Maria Rita Fratezi, que são amigos de longa data de Temer, bem como de ex-funcionários das empresas Rodrimar e Argeplan.

Desde que assumiu o cargo, em 2016, Temer foi alvo de várias suspeitas de corrupção que, em duas ocasiões, acabaram mesmo por resultar em denúncias formais apresentadas pela PGR.

No entanto, em ambos os casos, a Câmara dos Deputados (câmara baixa parlamentar) impediu que o caso seguisse para tribunal.

As investigações continuaram, mas as denúncias de corrupção contra Temer só poderão chegar aos tribunais do país a partir de janeiro, quando este terminar o seu mandato e entregar o poder ao vencedor da segunda volta das eleições presidenciais do Brasil, agendada para 28 de outubro.

17 Out 2018

Literatura | Inéditos de E. M. Melo e Castro expostos em Brasília

Brasília, a capital brasileira, recebe a partir de amanhã e até 16 de Dezembro, a exposição “Poesia Experimental Portuguesa”, que reúne obras datadas de 1960 até à actualidade, com inéditos do poeta E.M. Melo e Castro

[dropcap]A[/dropcap]presentada pela primeira vez ao público brasileiro, a colectânea, composta por cerca de 80 trabalhos de 18 artistas portugueses, percorre uma trajectória de seis décadas de produção poética em diferentes formatos e suportes: impressões, pinturas, caligrafias, fotografias, objetos, áudios e vídeos.

A Caixa Cultural Brasília será o local que irá acolher a exposição, que conta com curadoria de Bruna Callegari e Omar Khouri.

À agência Lusa, Bruna Callegari explicou como se deu o processo de escolha e recolha do material para dar forma a esta exibição.

“A recolha foi feita em Portugal, em duas viagens, onde percorremos as cidades do Porto, Lisboa e Coimbra, encontrando esses autores ou então os seus familiares, pois muitos deles já faleceram. (…) É um material bastante rico, bastante panorâmico dessa poética experimental, e que revela, justamente, a versatilidade de suportes e formatos a que esses poetas recorreram para realizar as suas criações”, disse a curadora da mostra.

A Poesia Experimental Portuguesa surgiu na década de 1960, desafiando métodos e convenções pré-definidas na cena artística da época. Reconhecida em outros países como concreta, visual, espacial ou ‘intersemiótica’, autodenominou-se, em Portugal, Poesia Experimental com o lançamento, em 1964, de uma revista com o mesmo nome.
Apesar da exposição estar programada, inicialmente, apenas para Brasília, Bruna Callegari assegura que existe o interesse de tornar a exibição itinerante em cidades como São Paulo e Rio de Janeiro porque, segundo a curadora brasileira, o intercâmbio cultural que deriva desta apresentação faz todo o sentido para o Brasil. “A motivação [de montar esta exposição] foi a de dar a conhecer, de fazer esse intercâmbio cultural e mostrar ao público brasileiro um pouco dessa poesia que é tão inteligente, tão engenhosa, enfim, uma poesia bastante instigante”, explicou.

Na exposição, destacam-se obras de artistas como E. M. de Melo e Castro, Ana Hatherly, António Aragão, Salette Tavares, Silvestre Pestana, António Barros, Fernando Aguiar e Emerenciano, entre outros.

Ernesto Manuel de Melo e Castro, pioneiro da poesia experimental em Portugal, é um dos artistas portugueses mais acarinhados pelo público brasileiro, e que marcará presença nesta mostra, com a exibição de trabalhos inéditos. Aos 86 anos, e a viver na cidade de São Paulo, Melo e Castro contou à Lusa o que o move dentro da poesia experimental.

“A poesia experimental não é uma escola, não é um clube de poetas, não é um grupo de geração, até porque há poetas muito mais novos do que eu (…). O que caracteriza a atitude experimental na poesia é a problematização da invenção (…). Vamos perguntar ‘porquê?’ e ‘como?’ e propor respostas também, mais do que dar respostas definitivas”, explicou o poeta português, nascido na Covilhã.

Letras de vanguarda

Para a exposição em Brasília, Ernesto de Melo e Castro trará à luz dos visitantes, trabalhos nunca antes exibidos, feitos através do computador, numa exploração da tecnologia a favor da poesia. “Para esta exposição, dei trabalhos feitos em computador com imagens fractais, originais, que nunca foram vistas e que eu imprimi de propósito. Já as tinha criado porque não tenho uma atitude pragmática, no sentido de escrever ou criar com uma finalidade. Estou num movimento sempre constante de criação e de pesquisa de novos meios, principalmente os tecnológicos” afirmou o artista, que foi também um dos pioneiros da engenharia têxtil em Portugal, nas décadas de 1950/1960. “Os fractais oferecem um campo que não tem fim, são imagens realmente extraordinárias, criadas com algoritmos matemáticos e que resultam em imagens com uma beleza estética fora do comum”, explicou Melo e Castro, acrescentando: “Tenho aqui umas 400 ou 500 imagens fractais que fiz em toda a minha vida, e escolhi entre dez ou 12 [para esta exposição]”.

Licenciado em engenharia têxtil, mas com um percurso de vida sempre ligado à Literatura – o que inclui um Doutoramento em Letras pela Universidade de São Paulo – Melo e Castro não esconde a forte ligação que tem com o Brasil, país onde vive há mais de 20 anos.

“A minha relação com os poetas concretos e experimentais brasileiros foi sempre uma relação de amor. Isso não há dúvida. Sinto-me muito bem no Brasil, sinto-me optimamente. As minhas relações não são só com o Brasil, mas o Brasil é privilegiado, é o meu melhor amigo. Posso eu dizer isso. E esta exposição, que me foi proposta por dois amigos aqui do Brasil, é um presente magnífico que é dado a todos os portugueses”, disse.

Com o Brasil a atravessar um atípico período eleitoral, Ernesto de Melo e Castro mostrou-se preocupado e entristecido pela situação que o país atravessa, mas apela à luta dos brasileiros. “Acho que o Brasil está a passar por um momento dramático e, de facto, há que lutar pela liberdade, pela inteligência, pela dignidade humana que, neste momento, está muito fragilizada. Esta é a minha opinião, mas eu não posso realmente intervir no movimento político porque eu não sou brasileiro. Eu sou português, vivo aqui, e devo muito ao Brasil. E é com grande pena que vejo o Brasil caminhar por caminhos menos sólidos, sob o ponto de vista político”, lamentou o poeta.

16 Out 2018

Espaço | Brasil celebra trinta anos de parceria com a China

A cooperação entre as duas nações já permitiu a produção de cinco satélites sino-brasileiros. O sexto lançamento deverá acontecer em 2019. Na calha está também uma parceria com Portugal

[dropcap]O[/dropcap] Brasil e China celebram este ano três décadas de cooperação bilateral na área de satélites e o director da Agência Espacial Brasileira, José Raimundo Coelho, afirmou ter também em vista projectos futuros com Portugal.

“O nosso relacionamento com Portugal, na área espacial, sempre foi muito pretendido. Portugal, há cerca de três anos, começou a pensar seriamente em desenvolver um programa espacial, envolvendo a Europa, mas procurou-nos (ao Brasil) também. Nós achamos esse projecto muito bom, uma oportunidade de retribuir o facto dos portugueses terem descoberto o nosso país”, afirmou José Raimundo Coelho, em entrevista à agência Lusa.

O director da Agência Espacial Brasileira (AEB) adiantou que a  oportunidade de parceria com Portugal já deu os primeiros passos, com a criação de um centro de desenvolvimento na área espacial nos Açores. José Raimundo Coelho disse ainda que, no momento, Portugal encontra-se a “atender uma chamada pública” que a Agência Espacial Europeia lançou, e espera que o Brasil possa ajudar nesse projeto.

“Essa seria uma forma de começarmos um projecto espacial com Portugal. Se não acontecer dessa maneira, o Brasil vai batalhar para que aconteça de outra forma”, afirmou o diretor da AEB, que confidenciou à Lusa ter ascendência portuguesa.

Laços fortes

No entanto, se as relações entre o Brasil e Portugal, na área espacial, ainda estão a começar, com a China a ligação já está bem consolidada, celebrando 30 anos de colaboração.

A parceria, conhecida como Programa Cbers (sigla em inglês para Programa Sino-Brasileiro de Recursos Terrestres), permitiu a produção de cinco satélites sino-brasileiros [pertencentes à China e ao Brasil] de recursos terrestres.

O sexto equipamento, o Cbers-4A, tem o seu lançamento previsto para o próximo ano, na cidade de Taiyuan.

Coordenado pela Agência Espacial Brasileira e pela Administração Nacional Espacial da China, o programa permitiu o desenvolvimento de um sistema completo para o fornecimento de imagens gratuitas a ambos os países e a mais de 20 nações da América do Sul, do sul de África e do sudeste asiático.

Para José Raimundo Coelho, esta parceria duradoura não podia ter melhores frutos: “Os resultados são excepcionais. Os brasileiros e os chineses já conversavam sobre a possibilidade de colaboração desde o ano de 1984, só que num outro segmento da área espacial”, disse.

No início, “os chineses já estavam um pouco avançados em relação ao Brasil, mas não muito, e isso foi óptimo, porque se estivessem muito avançados, essa união de esforços e competências não daria os resultados que acabou por dar”, afirmou o diretor da AEB.

Ao longos das últimas três décadas, foram lançados com sucesso o Cbers-1 (1999), Cbers-2 (2003) e Cbers-2B (2007). O Cbers-3 teve uma falha ocorrida no lançamento em Dezembro de 2013. O Cbers-4 foi lançado em Dezembro de 2014 e continua em operação.

O sexto satélite está em fase de testes e é desenvolvido em conjunto pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais e pela Academia Chinesa de Tecnologia Espacial.

Um dos pontos mais importantes do programa Cbers é a distribuição das imagens geradas pelos satélites, cobrindo as áreas ambientais e agrícolas. A distribuição das imagens é gratuita e, actualmente, mais de 20 mil instituições brasileiras já receberam o material.

O Cbers-4A irá garantir a continuidade do fornecimento de imagens para monitorizar o meio ambiente, a expansão da agricultura e das cidades.

“Todas as pessoas do mundo podem precisar de usar (estas imagens). Por exemplo, se precisar de melhorar alguma infraestrutura, o governo (brasileiro) exige que se apresente imagens de satélite. Para se fazer uma escritura de um terreno, eles pedem imagens de satélite”, garantiu José Raimundo Coelho, assegurando que a distribuição dessas imagens é totalmente gratuita.

Estando o Brasil a atravessar um atípico período eleitoral, o director da Agência Espacial Brasileira assumiu que espera que o novo Presidente da República brasileiro apoie o desenvolvimento espacial no país.

“Essa é uma esperança constante nossa, de que todos os governos apoiem e reconheçam a importância que essa área tem para o país. Isso não quer dizer que esse apoio já tenha ocorrido no nível que devia. Nós temos muitas queixas a esse nível”, explicou.

“Tentamos usar exemplos de países que dão a devida importância à área espacial para sensibilizar o nosso governo. Às vezes conseguimos, outras vezes não”, lamentou.

15 Out 2018

Brasil/Eleições: Fernando Haddad admite erros passados na gestão de empresas públicas

[dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] candidato de esquerda às presidenciais do Brasil, Fernando Haddad, admitiu “erros cometidos no passado” na gestão de empresas públicas.

Numa visita a um bairro de habitação social nos arredores de São Paulo, o candidato do Partido dos Trabalhadores (PT) disse que, se for eleito, pretende aplicar um sistema de controlo à gestão de empresas públicas para evitar “erros cometidos no passado”.

Fernando Haddad afirmou que, quando era ministro da Educação, entre 2005 e 2012, havia um “serviço de controlo interno muito forte”.

“Não tivemos nenhum problema com a corrupção quando houve um dos maiores orçamentos no Governo”, alegou o candidato, ‘contaminado’, no entanto, por numerosos escândalos de corrupção que ocorreram sob o governo do Partido dos Trabalhadores liderado pelo ex-Presidente Lula da Silva.

O PT governou o Brasil durante 13 anos, de 2003 a 2016, um período que começou com os dois mandatos de Lula da Silva (2003-2010) e terminou com a demissão de Dilma Rousseff (2011-2016). Desde 2014 a operação “Lava-Jato”, considerada a maior investigação contra a corrupção no Brasil, revelou um esquema de lavagem de dinheiro envolvendo empresas públicas como a petrolífera Petrobras.

O ex-Presidente Lula da Silva é acusado de ter recebido um apartamento à beira-mar de uma construtora em troca de favores na concessão de contratos públicos relacionados com a Petrobras, mas nega qualquer irregularidade. Condenado em 2017 por corrupção e lavagem de dinheiro, cumpre uma pena de 12 anos e um mês de prisão desde Abril.

Na primeira volta das eleições presidenciais, que decorreu no passado domingo, Fernando Haddad obteve 29 por cento dos votos, contra 46 por cento do candidato de extrema-direita Jair Bolsonaro, o principal favorito A segunda volta realiza-se em 28 de outubro.

Bolsonaro “fomenta a violência, incluindo a cultura de violação”

Fernando Haddad, afirmou que o seu oponente de extrema-direita, Jair Bolsonaro, “fomenta a violência, incluindo a cultura de violação”, a duas semanas da segunda volta.

Numa entrevista exclusiva à agência France-Presse (AFP), o candidato do Partido dos Trabalhadores (PT) defendeu que “armar a população não irá resolver nada”, referindo-se às polémicas proposta de Bolsonaro.

Bolsonaro tem defendido os valores tradicionais da família cristã, o porte de armas e ‘prega’ que o combate à violência no Brasil, país que atingiu a marca de 63.800 homicídios em 2017, deve ser feito de forma violenta pelas autoridades.

Na primeira volta das eleições presidenciais, que decorreu no passado domingo, Fernando Haddad obteve 29 por cento dos votos, contra 46 por cento do candidato de extrema-direita Jair Bolsonaro, o principal favorito. A segunda volta realiza-se em 28 de outubro.

14 Out 2018

Brasil/Eleições | Congresso de José Saramago fez apelo à defesa da democracia

[dropcap style≠’circle’]A[/dropcap]pelos para salvar a democracia no Brasil marcaram esta quarta-feira, em Coimbra, o encerramento do congresso internacional sobre José Saramago, em que a viúva do escritor assinou um documento contra a ascensão da extrema-direita no maior país lusófono.

“Há que salvar a democracia no Brasil. Não se pode chegar a uma ditadura fascista votando”, na segunda volta das eleições presidenciais brasileiras, no dia 28, entre Jair Bolsonaro (Partido Social Liberal, extrema-direita) e Fernando Haddad (Partido dos Trabalhadores, esquerda), disse Pilar del Río à agência Lusa, no final dos trabalhos.

A presidente da Fundação José Saramago assinou um texto que circulou entre os congressistas, muitos deles oriundos do Brasil, intitulado “Em defesa da democracia”, após ter proferido um discurso de encerramento em que questionou a atual situação política na pátria do escritor Jorge Amado e do cantor Chico Buarque, com uma referência política que mereceu o aplauso dos presentes.

“Temos uma experiência terrível com Hitler”, que nos anos 30 do século XX chegou ao poder na Alemanha através de eleições, alertou depois, em declarações à Lusa.

Para Pilar del Río, “não se trata de votar em A ou B”, mas antes de prevenir as consequências futuras de um eventual sufrágio popular, nas urnas, de políticas de intolerância que negam a democracia e discriminam as minorias.

“Antes de nos arrependermos no futuro, sejamos ativos agora, não o permitamos”, preconizou a viúva do autor de “Levantado do Chão”, que há 20 anos foi distinguido pela Academia Sueca com o Prémio Nobel da Literatura.

No documento sobre as eleições no Brasil, os congressistas manifestam-se “profundamente preocupados com o que está acontecendo no Brasil” em torno do processo eleitoral.

“Estão em jogo valores e conquistas de uma civilização ocidental que o Brasil abraçou ao longo de séculos. Democracia, tolerância, direitos humanos, cultura da paz, sempre!”, proclamam.

José Saramago, recordou Pilar del Río, “tinha raiva de que neste momento há meios para evitar a desgraça, as agruras, a pobreza e não estamos a usar os mecanismos que temos para o bem comum” – um pouco por todo o mundo – “e isso indignava-o profundamente”.

“Trata-se de levantar a cabeça, dizer que somos humanos, que não somos seres descartáveis, e eleger o nosso futuro democraticamente”, defendeu.

Na segunda volta das eleições no Brasil, no dia 28, “há que votar bem, há que votar contra isso”, tendo em conta que na sociedade “há pobres, mulheres, diferentes e emigrantes” que precisam de solidariedade e da proteção dos poderes públicos.

Pilar del Río destacou, por outro lado, a presença das personagens femininas na obra literária de Saramago.

As mulheres “são as personagens fundamentais e fortes da obra saramaguiana”, as quais “não se acomodam às circunstâncias”, acrescentou.

Elas “têm valores e com esses valores vão para a vida, independentemente do que está na moda”, afirmou a antiga jornalista.

A primeira volta das eleições no Brasil foi vencida por Jair Bolsonaro, com 46% dos votos, enquanto o seu opositor Fernando Haddad ficou em segundo lugar, com 29,3%.

Organizado pela Universidade de Coimbra, em colaboração com a Fundação José Saramago e outras entidades, o congresso “José Saramago: 20 anos com o Prémio Nobel” decorreu em Coimbra, entre segunda-feira e hoje, tendo a abertura dos trabalhos contado com a presença do Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, e do ministro da Cultura, Luís Filipe Castro Mendes.

12 Out 2018

Brasil/Eleições | Sondagem dá maioria a Bolsonaro na segunda volta

[dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] candidato às eleições presidenciais brasileiras Jair Bolsonaro, do Partido Social Liberal (PSL), recolhe 58% das intenções de voto, enquanto Fernando Haddad, do Partido dos Trabalhadores (PT), tem 42%, segundo uma sondagem ontem divulgada.

Este é o resultado da pesquisa realizada pelo Instituto Datafolha, a primeira relativa à segunda volta das eleições presidenciais, que utiliza o critério dos votos válidos, ou seja, exclui votos brancos nulos e indecisos.

Na primeira volta das presidenciais brasileiras, Bolsonaro obteve 46% dos votos válidos e Haddad 29%. Quando se leva em conta a intenção de voto total, contando votos brancos e nulos e indecisos, Bolsonaro conquista 49% das intenções de voto e Haddad regista 36%, nesta sondagem hoje realizada.

Brancos e nulos somam agora, segundo o Datafolha, 8%. Outros 6% dos entrevistados declaram-se indecisos. A sondagem auscultou 3.235 pessoas em 227 municípios do Brasil. A margem de erro é de dois pontos.

Cinco partidos declaram-se neutros

Mais cinco partidos políticos anunciaram ontem que permanecerão neutros na segunda volta das presidenciais brasileiras de 28 de outubro, numa disputa entre o candidato da extrema-direita Jair Bolsonaro e o socialista Fernando Haddad.

As formações políticas que anunciaram a decisão de não apoiar qualquer um dos dois candidatos foram o Partido da República (PR), o Democratas, o Partido Republicano Brasileiro (PRB), o Partido Popular Socialista (PPS) e o Podemos.

A maioria destes partidos fazia parte da coligação de apoio ao candidato presidencial Geraldo Alckmin, do Partido da Social Democracia Brasileira (PSDB), que, na primeira volta do sufrágio, no passado domingo, ficou em quarto lugar, com 4,6% dos votos, apesar de ter contado com o apoio de vários partidos de centro.

O próprio PSDB, um dos partidos mais tradicionais do Brasil e que governou o país entre 1995 e 2002, com Fernando Henrique Cardoso, anunciou nesta terça-feira a sua decisão de permanecer neutro na segunda volta, por não ter intenções de apoiar nenhum dos candidatos na corrida presidencial.

No mesmo dia, o Partido Novo, do candidato presidencial João Amoêdo, anunciou a sua neutralidade na segunda volta das eleições, tendo declarado que não apoiará Jair Bolsonaro(PSL) e ser “absolutamente contra o PT”, cujo candidato é Fernando Haddad.

De acordo com um comunicado, o Novo manifestou-se descontente com o cenário presidencial na segunda volta. “Não é aquele que desejávamos”, informou o partido.

O comunicado justificou os motivos do posicionamento contra o Partido dos Trabalhadores (PT), sendo as “ideias e práticas opostas”, mas não explicou os motivos contra o apoio a Bolsonaro.

A maioria dos partidos que se declarou neutro esclareceu que não apoia as propostas do candidato da extrema-direita, Jair Bolsonaro, polémico por ser um defensor da ditadura militar que vigorou no país entre 1964 e 1985 e pelas suas declarações de teor machista, racista e homofóbico.

No entanto, também não expressam apoio ao candidato do Partido dos Trabalhadores, Fernando Haddad, o sucessor do ex-Presidente brasileiro que se encontra preso por corrupção, Luiz Inácio Lula da Silva.

11 Out 2018

Brasil | “Prefiro uma prisão cheia de bandidos a um cemitério cheio de inocentes”, diz Jair Bolsonaro 

[dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] candidato da extrema-direita Jair Bolsonaro, vencedor da primeira volta das presidenciais brasileiras, disse ontem que prefere uma “prisão cheia de bandidos a um cemitério cheio de inocentes”.

“Vamos encher a prisão de bandidos. Isso é errado? Basta não fazerem a coisa errada. Eu prefiro a prisão cheia de bandidos do que um cemitério cheio de pessoas inocentes”, disse Bolsonaro, numa entrevista à rádio Jovem Pan.

O candidato do Partido Social Liberal (PSL) alcançou 46% dos votos válidos na primeira volta das eleições deste domingo e enfrentará no próximo dia 28 de outubro o candidato do Partido dos Trabalhadores (PT) Fernando Haddad, que conquistou 29% da preferência dos brasileiros.

Bolsonaro, um polémico capitão na reserva, ganhou vantagem na corrida presidencial, apesar das manifestações contra si, que levaram milhares de brasileiros às ruas em protesto, principalmente mulheres e representantes das minorias, na véspera das eleições.

Nos protestos “havia um terrível cheiro a canábis, as mulheres iam com as axilas peludas. Eles são ativistas de minorias, não estou a generalizar”, disse o candidato da extrema-direita, acrescentando que, caso seja eleito presidente, “não haverá dinheiro público para alimentar esse tipo de pessoas, eles terão que trabalhar”.

Nesse sentido, Bolsonaro afirmou que “acabará com esse ativismo xiita (segundo maior ramo de crentes do Islão)”, que, na sua opinião, vive “em grande parte com o dinheiro das ONG”.

“Eu acho que você tem que defender a sua posição, mas sem ir ao radicalismo tal como eles fazem, isso tem que acabar, o ativismo não é benéfico e nós temos que acabar com isso”, disse o candidato do PSL.

Durante a entrevista, Bolsonaro acusou também alguns meios de comunicação social de fazerem uma “campanha descomunal” contra si e classificou novamente o seu rival, Fernando Haddad, como um “mentiroso”.

Bolsonaro, defensor da liberalização do mercado de armas no Brasil e apoiante da ditadura militar que atravessou o país de 1964 até 1985, reiterou que os atos de tortura no período autoritário foram casos “isolados”.

“Se houvesse tanta tortura quanto eles dizem, você não estaria aqui”, afirmou o candidato dirigindo-se ao jornalista.

Os candidatos Jair Bolsonaro (PSL) e Fernando Haddad (PT) irão defrontar-se na segunda volta das eleições presidenciais brasileiras no dia 28 deste mês, após terem obtido 46% e 29% dos votos, respectivamente.

10 Out 2018

Brasil/Eleições: Analista alerta para aproximação de Bolsonaro a Taiwan

[dropcap style≠’circle’]U[/dropcap]m analista político brasileiro radicado na China avisou que a proximidade do candidato de extrema-direita Jair Bolsonaro a Taiwan pode afetar as relações entre o Brasil e Pequim.
Uma visita a Taipé em fevereiro passado de Bolsonaro, favorito na segunda volta presidencial, resultou num protesto formal da diplomacia chinesa e o seu programa de governo refere Taiwan como um país por quatro vezes.

“É importante que Bolsonaro tenha consciência de que o princípio ‘Uma só China’ é soberano e inegociável para Pequim”, afirma José Medeiros da Silva, doutorado em Ciência Política pela Universidade de São Paulo e professor na Universidade de Estudos Internacionais de Zhejiang, na costa leste da China.

Pequim considera Taiwan uma província chinesa e defende a “reunificação pacífica”, mas ameaça “usar a força” caso a ilha declare independência. Já Taiwan, a ilha onde se refugiou o antigo governo nacionalista chinês depois de os comunistas tomarem o poder no continente, em 1949, assume-se como República da China.

O princípio ‘Uma só China’ [visto por Pequim como garantia de que Taiwan é parte do seu território] é considerado pelas autoridades chinesas como um pré-requisito e base política para manter relações diplomáticas com outros países.

“Se Bolsonaro decidir tratar Taiwan como um país, não há dúvida que haverá um rompimento, não apenas diplomático, mas também comercial, em todas as dimensões”, afirma Medeiros da Silva. “A China não negoceia esse princípio”, realça.

O ex-prefeito do Rio de Janeiro, César Maia, revelou, em março passado, uma carta de protesto enviada pela embaixada chinesa em Brasília à Executiva Nacional dos Democratas, na qual as autoridades chinesas afirmam encarar a visita de Bolsonaro a Taipé com “profunda preocupação e indignação”.

Na mesma nota, a embaixada chinesa considerou a viagem uma “afronta à soberania e integridade territorial da China”, que “causa eventuais turbulências na Parceria Estratégica Global China-Brasil, na qual o intercâmbio partidário exerce um papel imprescindível”. Durante a visita a Taiwan, Bolsonaro reuniu com membros do governo taiwanês.

José Medeiros da Silva considera, no entanto, que Bolsonaro não reconhecerá Taiwan como um país caso for eleito, apontando a importância do mercado chinês para a economia brasileira.

“Parte da base de apoio que deverá conduzir à sua eleição está ligada ao agronegócio, que é o grande exportador para a China, e ao setor mineiro”, refere.

“Num momento de crise económica, puxar para si uma crise diplomática dessas proporções, não faria muito sentido”, defende.

Desde da ascensão ao poder em Taiwan, em maio de 2016, da presidente Tsai Ing-wen, do Partido Democrata Progressista, pró-independência, um total de cinco países romperam relações com Taipé, incluindo São Tomé e Príncipe, passando a reconhecer Pequim como o único governo de toda a China.

A ilha tem atualmente relações diplomáticas com apenas 17 países em todo o mundo.

Os países da União Europeia mantêm relações não oficiais a nível governamental com Taiwan. Em Portugal, funciona um Centro Cultural e Económico de Taipé.

A China é o maior parceiro comercial do Brasil e o principal investidor externo no país sul-americano.

Em 2017, o comércio entre o Brasil e a China atingiu 87,53 mil milhões de dólares, uma subida homóloga de 29,55%. A China vendeu bens no valor de 29,23 mil milhões de dólares e importou mercadorias no montante de 58,30 mil milhões de dólares, segundo dados oficiais chineses divulgados pelo Fórum de Macau.

As exportações brasileiras para o país asiático são compostas, sobretudo, por petróleo, soja e minério de ferro.

Jair Bolsonaro venceu as eleições presidenciais brasileiras deste domingo, com 46,7% dos votos, seguido de Fernando Haddad (PT), com 28,37%, resultado que ditou a necessidade de uma segunda volta entre os dois candidatos, já que nenhum obteve mais de 50%.

A decisão sobre o sucessor de Michel Temer como 38.º Presidente da República Federativa do Brasil fica assim adiada para 28 de outubro.

9 Out 2018

Brasil/Eleições: Resultado final dá 46% dos votos a Bolsonaro e 29% para Haddad

[dropcap style≠’circle’]O[/dropcap]s candidatos Jair Bolsonaro (PSL) e Fernando Haddad (PT) irão defrontar-se na segunda volta das eleições presidenciais brasileiras no dia 28 deste mês, tendo cada um obtido 46% e 29% dos votos, respectivamente.

Com 99% das secções de voto apuradas, Jair Bolsonaro conquistou o voto de cerca de 49 milhões de brasileiros, seguido por Haddad que chegou perto dos 30 milhões, segundo os dados do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), que começaram a ser divulgados às 19h00.

Ainda de acordo com os dados praticamente finais do TSE, em terceiro lugar ficou o candidato Ciro Gomes (PDT) com 12% dos votos válidos do eleitorado, o que correspondeu a cerca de 13 milhões de votos.

Como nenhum candidato atingiu na votação deste domingo a marca de 50% dos votos válidos, o próximo Presidente da República do Brasil será eleito na segunda volta, a decorrer dentro de três semanas, a 28 de outubro.

Os últimos números foram divulgados perto das 22:15 (02:15 em Lisboa) e confirmaram a disputa final entre Jair Bolsonaro, o candidato da extrema-direita brasileira, e Fernando Haddad, que substituiu Lula da Silva na liderança da candidatura do PT (esquerda).

Neste domingo, 147 milhões de brasileiros foram às urnas para escolher um novo Presidente, membros do Parlamento (Câmara dos Deputados e Senado), além de governadores e legisladores regionais em todo o país.

Bolsonaro apela aos eleitores para não darem um “passo à esquerda” perante o “caos”

Jair Bolsonaro afirmou que o Brasil está à beira do caos, apelando aos eleitores para não darem um “passo à esquerda”, numa referência a Fernando Haddad, seu opositor na segunda volta da corrida presidencial.

“O nosso país está à beira do caos, não podemos dar mais um passo à esquerda, o nosso passo agora é de centro-direita”, afirmou Jair Bolsonaro, numa mensagem na rede social Facebook, discurso menos agressivo do que o habitual, com referências às minorias sexuais, mulheres e moradores do país que costumam votar PT, como é o caso do Nordeste do país.

Agora, para a segunda volta, a 28 de outubro, “temos que unir os cacos que nos fez o governo da esquerda no passado, botando de um lado negros e brancos, jogando nordestinos contra sulistas, pais contra filhos, até mesmo quem tem opção sexual homo contra heteros”, acrescentou o candidato, que venceu a primeira volta da corrida eleitoral, disputada este domingo.

“Vamos colocar um ponto final nos activismos” e “desregulamentar muita coisa, desonerar a folha de pagamento” dos salários, afirmou Bolsonaro, num discurso de 15 minutos, em que elencou o poder económico do PT, que diz ter “bilhões para gastar” e o “controlo social” dos ‘media’ brasileiros.

“O que está em jogo é a nossa liberdade, é a manutenção da operação ‘Lava Jato’”, numa referência ao processo judicial que colocou na prisão Lula da Silva, antigo Presidente brasileiro, dirigente histórico do PT e primeira escolha do partido para estas eleições presidenciais.

“O nosso juiz Sérgio Moro não vai ser jogado na lata do lixo”, afirmou, acrescentando, sobre a corrupção no Brasil: “Vamos reduzi-la o máximo possível”.

Haddad diz que pacto constitucional está em causa na segunda volta

O candidato do Partido dos Trabalhadores (PT, esquerda), Fernando Haddad, afirmou que na segunda volta das presidenciais brasileiras está em causa o pacto constitucional de 1988, que assinalou a normalização democrática do país.

Dentro de três semanas, na segunda volta, em que irá enfrentar o candidato populista de extrema-direita Jair Bolsonaro, Haddad considera que “há muita coisa em jogo, o próprio pacto da constituinte de 88 está hoje em jogo”.

“Vamos ser vitoriosos no segundo turno”, afirmou Fernando Haddad, admitindo que esta é uma “eleição muito diferente de todas” as anteriores.

Agora, “muito respeitosamente nós vamos para o campo democrático com uma única arma: o argumento”, disse Haddad, esperando que o seu opositor esteja disponível para debater, numa referência ao facto de Bolsonaro ter recusado participar no último debate televisivo.

“Não vou abrir mão dos meus valores” e o “segundo turno é uma oportunidade de ouro para discutir frente a frente”, afirmou.

Marina Silva e Geraldo Alckmin avaliam apoios para segunda volta

Os candidatos da Rede, Marina Silva, e do Partido da Social Democracia Brasileira (PSDB), Geraldo Alckmin, à primeira volta das presidenciais brasileiras anunciam em breve as suas posições face à segunda volta, marcada para 28 de outubro.

Marina Silva, que partiu como uma das principais candidatas e acabou em nono lugar na primeira volta das presidenciais, disse no seu discurso após a divulgação dos resultados que ainda irá conversar com membros da Rede sobre qual a posição a adotar na segunda volta.

Já o candidato do PSDB (centro-direita) Geraldo Alckmin, que ficou em quarto lugar na primeira volta das presidenciais brasileiras, realizadas estes domingo, remeteu hoje para terça-feira uma decisão de apoio na segunda volta, que será disputada entre Jair Bolsonaro (PSL) e Fernando Haddad (PT).

“A executiva nacional em Brasília” do PSDB já foi agendada para terça-feira, onde será feita uma “avaliação do processo eleitoral e tomada uma posição quanto ao segundo turno”, afirmou.

A nossa convicção na essência do regime democrática não tem poder que não seja legitimado pelo voto e pela expressão popular”, acrescentou, mostrando ter uma “fé inquebrantável no Braisl, esse país maravilhoso”.

A candidata da Rede, Marina Silva (Rede) afirmou ainda que estará na oposição independentemente de quem seja o vencedor.

“Independentemente de quem seja o vencedor, nós estaremos na oposição. O Brasil vai precisar de uma oposição democrática. Podemos assegurar: estaremos na oposição porque é a única forma de quebrar o ciclo vicioso”, declarou.

Surpresas para governadores em São Paulo, Rio e Minas Gerais

Mudanças de última hora marcaram as eleições para os governos dos estados mais populosos do Brasil – São Paulo, Minas Gerais e Rio de Janeiro – que terão na segunda volta candidatos que não eram considerados favoritos.

Em São Paulo, a disputa será entre o candidato João Dória do Partido da Social Democracia Brasileira (PSDB) que teve 31,7% dos votos válidos e o candidato Márcio França do Partido Socialista Brasileiro, que obteve 21,53%.

França venceu uma das corridas mais apertadas destas eleições, superando o candidato Paulo Skaff do Movimento Democrático Brasileiro (MDB), derrotado com 21,09% dos votos que apareceu em segundo lugar em todas as sondagens de intenção de voto antes das eleições.

No Rio de Janeiro o juiz Wilson Witzel do Partido Social Cristão (PSC) foi a grande surpresa da eleição regional.

Com uma campanha voltada para a crítica dos problemas de segurança pública do Rio de Janeiro e o apoio do presidenciável Jair Bolsonaro, Wilson Witzel chegou em primeiro lugar com 41,2% dos votos e superou o candidato que liderava as sondagens, o ex-prefeito da capital ‘carioca’ Eduardo Paes, do Democratas, que chegou à segunda volta com apenas 19,5% dos votos.

Em Minas Gerais, o PT foi afastado da liderança do governo estadual. O empresário Romeu Zema, do Partido Novo, que se candidatou pela primeira vez, liderou a votação com 42% dos votos contra Antonio Anastasia do PSDB, que aparecia na dianteira de todas as sondagens, obtendo 29% dos votos.

Também haverá uma segunda volta nos estados brasileiros do Rio Grande do Sul, Rondônia, Roraima, Sergipe, Amazonas, Distrito Federal, Mato Grosso do Sul, Pará, Rio Grande do Norte, Santa Catarina e Sergipe.

Nas eleições de domingo, treze governadores regionais dos 27 estados brasileiros foram eleitos na primeira volta.

No estado do Acre foi eleito governador Gladson Cameli (Partido Progressista, PP), em Alagoas Renan Filho (MDB), no Paraná Ratinho Junior (Partido Social Democrático, PSD) e no Espírito Santo Renan Casagrande (PSB).

O novo governador de Goiás será Ronaldo Caiado do Democratas, em Mato Grosso está eleito Mauro Mendes também do Democratas, na Paraíba João Azevedo do PSB e no Tocantins Mauro Carlesse do Partido Humanista da Solidariedade (PHS).

Rui Costa do Partido dos Trabalhadores (PT) irá governar por mais quatro anos o estado da Bahia, Camilo Santana do PT foi reeleito no Ceará, Flavio Dino do Partido Comunista do Brasil (PCdoB) foi reeleito no Maranhão, o governador do Piauí Wellington Dias (PT) acabou por ser reeleito, assim como o governador de Pernambuco, Paulo Câmara (PSB).

8 Out 2018

Eleições/Brasil: Total de 147 milhões de eleitores decidem hoje futuro do Brasil

[dropcap style≠’circle’]U[/dropcap]m total de 147,3 milhões de brasileiros são chamados este domingo a votar nas eleições em que estarão em disputa o cargo de Presidente mas também representantes no parlamento (Câmara dos Deputados e Senado) e nos governos regionais.

As urnas serão abertas pelas 08h00 (12h00 em Lisboa) e têm o seu encerramento previsto para as 17h00 de cada fuso horário. As últimas urnas electrónicas a fechar serão no Estado do Acre, 21h00 em Lisboa.

Se houver uma falha na urna eletrónica e na impossibilidade de substituição por outra do mesmo tipo, será utilizado o sistema tradicional de voto de boletim em urna.

Jair Bolsonaro, candidato do Partido Social Liberal (PSL) é quem lidera, de acordo com as últimas sondagens, a corrida às presidenciais, com 35% das intenções de voto dos brasileiros, contra 22% do segundo colocado, Fernando Haddad, que encabeça o Partido dos Trabalhadores (PT).

Esta é já considerada uma das eleições mais atípicas das últimas décadas, com uma forte polarização política entre a extrema-direita e a esquerda.

Caso nenhum candidato atinja este domingo a marca de 50% dos votos válidos, haverá uma segunda volta com os dois primeiros colocados, que está marcada para o dia 28 deste mês.

Centenas de manifestantes contra Bolsonaro em São Paulo

No sábado centenas de pessoas manifestaram-se contra o candidato Jair Bolsonaro, na cidade de São Paulo. Organizado por grupos de mulheres nas redes sociais, este é o segundo protesto contra o candidato de extrema-direita, que lidera as sondagens para as presidenciais de domingo.

Bolsonaro suscitou inúmeras polémicas por declarações machistas, racistas e homofóbicas e tem sido contestado por mulheres que lançaram em setembro a campanha “Ele não”.

No protesto, os gritos de “Ele não” eram acompanhados por cantos de guerra como “fascistas, machistas não passarão” e “vem para rua, vem contra o fascista”.

Vitória Tavares, de 18 anos, disse á Lusa que compareceu no protesto por discordar das ideias defendidas por Bolsonaro. “Não concordo com nada que o Bolsonaro diz ou prega. Ele é contra as mulheres e as minorias.”, declarou.

A estudante disse acreditar que Bolsonaro não vencerá a eleição na primeira volta, mesmo reconhecendo que ele esta aumentando sua popularidades com os ataques que faz contra o Partido dos Trabalhadores (PT).

“O voto contra o PT favorece o Bolsonaro, mas ele não tem capacidade de mudar o Brasil”, afirmou. Carolina Spinoza, 33 anos, também disse que aderiu ao protesto das mulheres porque não acredita nas promessas do candidato de extrema-direita.

“Infelizmente tem muita gente votando em um candidato que é contra e tem muitos aliados que desejam tirar os direitos das minorias”, avaliou.

“O sentimento de ‘antipetismo’ [como é chamado o movimento contra o PT] tem influenciado muito. Essas pessoas querem mudança e não estão pensando nas consequências que está mudança trará depois”, concluiu.

Marcelo Rebelo de Sousa deixou apelo ao voto

O Presidente da República apelou ao voto nas eleições presidenciais no Brasil, dirigindo-se aos portugueses com dupla nacionalidade e aos brasileiros que vivem em Portugal.

“Espero que os portugueses, muitos, que vivem no Brasil e que têm a dupla nacionalidade não deixem de exercer o direito de voto, é o mesmo apelo que faço cá dentro ao voto e até já fiz ontem, à participação no voto no ano que vem”, afirmou Marcelo Rebelo de Sousa, que falava, em Vila Real, à margem da cerimómia de entrega do Prémio D.Diniz ao escritor Helder Macedo.

O Presidente disse ainda, por outro lado, que espera também que os “muitos brasileiros que vivem em Portugal participem no exercício do direito de voto”.

“Porque isso é bom, nós formamos uma comunidade que é a comunidade de língua portuguesa, que é uma comunidade que não é só de cultura ou de economia ou de finanças, é uma comunidade de pessoas e será tanto mais forte quanto maior for a participação das pessoas, todas elas, em termos políticos, dentro da comunidade”, salientou.

7 Out 2018

Sondagens dão vitória a Bolsonaro na segunda volta das presidenciais

Este domingo os brasileiros vão às urnas escolher o próximo Presidente da República. A principal esgrima política é entre Haddad, e um Partido Trabalhista ferido por vários escândalos, e o candidato da extrema-direita Jair Bolsonaro, que lidera nas sondagens. O HM falou com eleitores e auscultou as suas expectativas para um dos mais importantes actos eleitorais da curta história da democracia brasileira

[dropcap style≠‘circle’]A[/dropcap] ebulição política no Brasil não é de agora, mas pode estar prestes a atingir o clímax. Desde a destituição de Dilma Rousseff, e mesmo durante o curto mandato de Michel Temer, o fantasma da extrema-direita tem pairado por cima do panorama político brasileiro, criando terreno fértil para a ascensão política de Jair Bolsonaro.

De acordo com uma sondagem da Datafolha, que tentou levantar o véu sobre uma provável segunda volta, Jair Bolsonaro recolhe 44 por cento dos votos, contra 42 por cento de Fernando Haddad, uma diferença que está dentro da margem de erro e que constitui empate técnico. Os restantes 14 por cento dos inquiridos mostraram-se indecisos ou inclinados a votar em branco ou nulo, uma vez que o voto é obrigatório.

Uma sondagem do Instituto Ibope revela que na primeira volta Bolsonaro reúne 31 por cento das intenções de voto, dez pontos percentuais à frente de Haddad. Em terceiro lugar surge Ciro Gomes, do Partido Democrático Trabalhista, com 11 por cento. Mais abaixo surge Geraldo Alckmin, do Partido da Social-Democracia Brasileira (PSDB), com 8 por cento, e Marina Silva, da Rede Sustentabilidade, com 4 por cento. A confiar nesta projecção, a segunda volta, ou turno como se diz com sotaque brasileiro, acontecerá no dia 28 de Outubro. No entanto, é de referir que Bolsonaro tem vindo a subir nas sondagens. Nesta matemática de intenções, importa recordar que em 2014 quase 25 por cento do eleitorado decidiu a direcção do voto no próprio dia da eleição. Outro dos dados a reter é a subida dos eleitores que afirmam que jamais vão votar em Jair Bolsonaro (45 por cento), o antigo capitão do exército que tem proferido inúmeras declarações racistas e misóginas. Como sinal da crescente polarização política que o Brasil atravessa, também a rejeição total de Haddad se cifra nos 42 por cento.

Primeiro será necessário ir a votos este fim-de-semana. Por cá, Roberval Teixeira e Silva já marcou o domingo para exercer o seu direito. “Vou a Hong Kong votar no consulado brasileiro. É um momento bastante especial no mundo e no Brasil com uma luta radical contra o conservadorismo que tem aparecido em todo o lado”, revela o director do Centro de Pesquisa para os Estudos Luso-Asiáticos da UM.

O académico, que vive em Macau há 13 anos, encara esta eleição como um momento decisivo na história do país. “Luto contra a extrema-direita que está a tentar chegar perto do poder através da presidência e do voto. Vou exercer o meu direito de evitar que isso aconteça, esse é o meu objectivo”, explica Roberval Teixeira e Silva.
Cácio Borges Inhaia está no polo oposto. Apesar de não poder votar, o gerente empresarial adianta que, se pudesse, o seu voto iria para Jair Bolsonaro. “Ele não tem qualquer escândalo. Estou confiante que ele ganhe já no primeiro turno. Vejo pelos meus amigos que o Brasil quer mudança.”

Apelo do abismo

Quanto às características de Bolsonaro que mais seduzem Cácio Borges Inhaia, a ideia de integridade surge no topo, nomeadamente quanto às políticas de família. “Ele preza muito a família, algo que no Brasil está muito perdido”, refere o brasileiro residente em Macau. Quando confrontado com algumas propostas do candidato da extrema-direita, como o corte nas licenças de maternidade, o residente de Macau refere que não leu sobre isso e descreve a forma como os meios de comunicação social escrevem mentiras sobre o seu candidato de eleição. É de referir que Bolsonaro proferiu algumas declarações polémicas quanto à natalidade de famílias pobres. “Devemos adoptar uma rígida política de controle da natalidade. Não podemos mais fazer discursos demagógicos, apenas cobrando recursos e meios do governo para atender a esses miseráveis que proliferam cada vez mais por toda esta nação.” As palavras são de Jair Bolsonaro, que se declarou a favor da pena de morte e de políticas de restrição da natalidade entre os pobres como forma de controlar a criminalidade e baixar o custo dos apoios sociais.

Um pouco à imagem da eleição que conduziu Donald Trump à Casa Branca, os campos partidários no Brasil estão extremamente polarizados, reduzindo a troca de argumentos e ideias a insultos, desinformação e propaganda.
Cristina Sant’Anna, empresária e activa opositora da ditadura militar, refere precisamente a falta de qualidade da discussão política. “Qualquer debate sobre candidatos é conversa de surdo. Ninguém ouve ninguém. Cada um já tem seu candidato e será refractário a qualquer informação, notícia, evidência contra ele. E é só ódio daqui pra frente. Minha preocupação é que essas eleições romperam o lacre da cultura de ódio às minorias, que faz parte da cultura brasileira desde sempre”.

A residente de São Paulo é da opinião de que Bolsonaro trouxe à tona e legitimou o ódio aos negros, gays, pobres, mulheres e a “ideia de que uma elite branca, masculina, preconceituosa e discriminatória tem o direito de subjugar os demais sectores da sociedade aos seus mandos e desmandos”.

História a repetir-se

Com um passado de defesa da democracia, que lhe valeu uma curta estadia na prisão durante a ditadura militar, Cristina Sant’Anna encara a actual situação política do Brasil com apreensão. No entanto, não baixa os braços. “Não tivemos escolha no golpe promovido pelo exército, que resultou na ditadura. Mas agora temos”.

A candidatura de Bolsonaro, que repetidas vezes manifestou desdém quanto ao processo democrático, assusta a empresária e alguns dos seus amigos. Em particular, uma amiga cujos pais foram perseguidos durante o fascismo ao ponto de terem de se exilar. Curiosamente, o pai da sua amiga chegou a cônsul do Brasil, mesmo no exílio. A actual campanha ressuscitou fantasmas de tempos de forte repressão política. “Se o desgraçado for eleito o que faremos? Teremos de fugir? Vai haver perseguição, porque afinal estamos todos expondo nossas ideias nas redes sociais? A mãe da minha amiga nem dorme mais. Tem sequelas até hoje, stress pós-traumático”, confessa a empresária.

A violência também assusta Cristina Sant’Anna, além das palavras de Jair Bolsonaro até à realidade nas ruas. “Os grupos de direita, skinheads aí incluídos, estão atacando quem se manifesta nas ruas. Espancaram a criadora de um grupo chamado Mulheres contra Bolsonaro, que já tem mais de 3 milhões e meio de mulheres.”

A tirar um doutoramento em História, com particular incidência na ditadura militar, Gisele Lobato entende que o fascismo não se desvaneceu totalmente em 1985. “Nunca acabou simbolicamente. Houve uma abertura política, redemocratização feita lenta e gradualmente pelos próprios militares, uma amnistia que impediu qualquer julgamento dos crimes que cometeram… faltou a ruptura”, teoriza a também jornalista que divide casa entre São Paulo e Lisboa.

Quando fala de ditadura, Gisele Lobato não o faz no sentido literal, até porque o controlo das altas patentes militares não se sente na sociedade brasileira como no passado. “Falo das estruturas sociais, da violência estatal (vide nossas polícias, que têm apoio para matar diante do desespero da população com a violência urbana)… E a falta de ruptura impediu a revisão dessas estruturas, e ficou o mito de que a ditadura era boa, de que os comunistas estão por aí e são maus.”

Sem preferência

Também à imagem da eleição que tornou Donald Trump Presidente dos Estados Unidos, o sufrágio de domingo também deixa grande parte do eleitorado face à decisão de qual o mal menor, além da fadiga resultante da falta de identificação com qualquer candidato. Roberval Teixeira e Silva destaca esta particularidade nos eleitores que vivem em Macau. “Há quem diga que é melhor deixar para lá, votar em branco, não ir, existe essa postura de desistência. Especialmente entre as pessoas que têm uma relação menos próxima com o Brasil.”

O restante eleitorado brasileiro que reside à beira do delta do Rio das Pérolas divide-se entre Bolsonaro, ou anti-PT e os anti-bolsonaristas. Entre as pessoas que convivem com o académico, a maior tendência é para votar contra o candidato da extrema-direita, sem qualquer expectativa de eleger um candidato com quem se identifiquem em absoluto. “Nenhum partido é puro, não existe essa ilusão, todos entram em jogos e esquemas de todos os tipos que nem imaginamos. De maneira geral, as pessoas parecem não ter um candidato ideal. muitas vezes, os votos vão mais contra alguém do que a favor de alguém. A minha posição é contra o fascismo.”

5 Out 2018

Brasil/Eleições: No centro do poder, eleitores querem mudança

[dropcap style≠’circle’]A[/dropcap] menos de uma semana das eleições presidenciais, considerada uma das mais atípicas das últimas décadas, em Brasília, centro do poder brasileiro, “mudança” é a palavra de ordem que ecoa por toda a cidade.

Num momento de polarização política entre a esquerda com Fernando Haddad e a extrema-direita representada por Jair Bolsonaro, são muitos os brasileiros que esperam encontrar nas eleições de 07 de outubro o regresso à “Ordem e Progresso”, lema nacional do Brasil.

Michella Medeiros mora em Brasília há cerca de 20 anos, é professora de ensino especial e sofre de duas doenças degenerativas. Em entrevista à agência Lusa, disse sentir-se “desacreditada” com a classe política brasileira.

“Formei-me na área na educação pensando em mudar o Brasil, porém, estou desacreditada”. Hoje, “olho para o Planalto central, olho para o poder, para a Câmara legislativa, para o poder judiciário, para o Senado e não vejo nenhuma mudança”, lamentou Michella.

Quando confrontada com as sondagens que mostram o candidato da extrema-direita na liderança da corrida presidencial, a professora de ensino especial classifica o resultado de “vergonhoso”, admitindo que não irá exercer o seu voto.

“É vergonhoso. Não acredito e por isso não votarei em ninguém. Sinto-me envergonhada”, porque “todos são corruptos. Aliás, acredito em poucos candidatos, que são aqueles que estão com zero pontos”, afirmou Michella Medeiros.

Jerson Spinola, contador de profissão e apoiante da candidata Marina Silva, partilha da mesma opinião de Michella acerca de Jair Bolsonaro.

“Preocupação geral é o que sentimos. Temos uma probabilidade muito grande de voltarmos a uma ditadura, na pior das hipóteses”, afirmou Jerson.

Porém, muitos dos entrevistados dizem acreditar em Jair Bolsonaro como o candidato capaz de fazer a diferença pelo país, como é o caso de Luís Carlos, um terapeuta que confia no candidato do Partido Social Liberal (PSL).

“Realmente o Bolsonaro está na frente e o Brasil está cansado da antiga política do PT (Partido dos Trabalhadores) que não teve um bom resultado e queremos mudança através de Jair Bolsonaro”. Hoje, “nós acreditamos que Bolsonaro vai ganhar as eleições na primeira volta”, disse Luís Carlos.

As propostas conservadoras do candidato do PSL fizeram a diferença no momento de escolher o próximo Presidente da República, segundo o terapeuta.

“Bolsonaro é a favor da família, da educação, é contra o aborto, contra a ideologia de género, é contra o kit gay escolas”, o programa proposto para debater a homossexualidade no ambiente escolar. “Jair Messias Bolsonaro tem uma proposta conservadora para dirigir o país e colocar as coisas no trilho”, afirmou o apoiante do candidato da extrema-direita.

Para João Santos, um publicitário que também apoia Bolsonaro, a ascensão do candidato da extrema-direita deve-se ao descontentamento que o povo brasileiro sente em relação aos vários anos de governo do PT.

“Durante estes 13 anos da esquerda no poder, do PT, nós criamos uma resistência do bloco internacional lá fora. O nosso país vive de investimentos externos e nós temos esse problema externo, fora os problemas internos que também temos”, disse o publicitário.

João Santos acrescentou ainda que “Bolsonaro é o representante que tende a acabar com todo ranço de aglomerado de partidos”. O candidato é “novo no sentido de romper com a política velha” que existe e “levou o país a tornar-se quase numa Venezuela”.

O projetista mecânico Felipe Rossi concorda com a visão de que foi o próprio PT a colocar Bolsonaro na frente da corrida às presidenciais.

Apesar de o seu voto pertencer ao candidato populista, o projetista mecânico acredita que Bolsonaro “não é um Deus que irá mudar o Brasil a 100%” mas pensa que é o único candidato capaz de colocar o país “nos eixos”.

Já José Júnior, um jovem vendedor de 24 anos, contou à agência Lusa que vai votar em Jair Bolsonaro, por não estar ligado à corrupção.

“Ele é ficha limpa. Eu acho que o Brasil precisa de pessoas sérias, de pessoas que entrem para fazer a diferença”, afirmou o jovem brasileiro.

Acerca das acusações que o candidato do PSL tem recebido de ser racista e homofóbico, José Júnior fez saber que concorda com a ideologia de Bolsonaro e que não quer que a sua filha cresça a pensar “que é certo um homem casar com outro homem, ou uma mulher casar com outra mulher”, disse.

Jair Bolsonaro é mesmo o candidato que reúne a maior percentagem de intenções de voto em Brasília. A primeira volta das eleições Presidenciais está marcada para dia 7 de outubro, enquanto que a segunda volta decorrerá a 28 deste mês.

3 Out 2018

Brasil | Lula renuncia e apresenta Haddad como candidato às presidenciais 

[dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] ex-ministro da Educação Fernando Haddad vai ser o candidato do Partido dos Trabalhadores (PT) às eleições presidenciais do Brasil, na sequência da exclusão pelo Tribunal Superior Eleitoral da candidatura de Lula da Silva.

Impedido pelo Tribunal Superior Eleitoral de se candidatar ao sufrágio de 07 de outubro, o ex-Presidente brasileiro renunciou à candidatura, que entregou a Haddad, precisamente na data limite determinada pela justiça eleitoral para apresentação de candidatos.

O anúncio foi feito pelo PT junto à sede da Polícia Federal, em Curitiba, onde o antigo chefe de Estado se encontra preso a cumprir uma pena de 12 anos e um mês de prisão.

Além da aprovação de Fernando Haddad como novo candidato do PT, também a deputada Manuela D’Ávila, do Partido Comunista do Brasil (PCdoB), foi admitida como vice-presidente pelo partido, segundo a plataforma de notícias UOL.

Luiz Inácio Lula da Silva reiterou que está a ser vítima de injustiças e que foi impedido de disputar a eleição de outubro, mas realçou a importância da continuidade de seu projeto político com Haddad como candidato, de acordo com o jornal Folha de São Paulo.

A candidatura do ex-presidente do Brasil, que cumpre na prisão uma pena de 12 anos e um mês por corrupção, foi registada pelo PT e depois vetada pelo Tribunal Superior Eleitoral, com base na lei que proíbe alguém condenado em duas instâncias de concorrer a qualquer cargo eleitoral.

Lula da Silva foi condenado em duas instâncias judiciais, num processo em que foi acusado de ter recebido um apartamento de luxo na cidade do Guarujá da construtora OAS, em troca de favorecer contratos da empresa com a estatal petrolífera Petrobras.


Perfil | Fernando Haddad, o intelectual que sucede a Lula da Silva

[dropcap]O[/dropcap] ex-ministro da Educação e antigo-prefeito de São Paulo Fernando Haddad, anunciado na terça-feira candidato do Partido dos Trabalhadores (PT) às eleições do Brasil, é um intelectual que tem a difícil tarefa de ganhar a presidência do país. Haddad nasceu em São Paulo há 55 anos. Em 1983, filiou-se ao PT.

Licenciado em Direito na Universidade de São Paulo, fez depois um mestrado em Economia e um doutoramento em Filosofia, tendo ficado a dar aulas como professor de Ciência Política nesta instituição de ensino superior.

Em 2001, Fernando Haddad foi nomeado subsecretário das Finanças e Desenvolvimento Económico da cidade de São Paulo, sob chefia de Marta Suplicy, cargo que ocupou até 2003. Neste ano foi chamado para trabalhar em Brasília como assessor especial do Ministério do Planeamento e Finanças.

Um ano depois começou a ganhar protagonismo político quando, sob o governo de Lula da Silva, aceitou o convite do então ministro da Educação, Tarso Genro, e assumiu o cargo de secretário-executivo da pasta.

Em 2005 Haddad assumiu o Ministério da Educação, ficando neste cargo até 2012, já no governo de Dilma Rousseff. Então, deixou o lugar para disputar as eleições municipais de São Paulo, que ganhou. Quatro anos depois não conseguiu o mesmo feito, perdendo, na primeira volta, para João Doria, que se candidatou pelo Partido da Social Democracia Brasileira.

Filho de libaneses que emigraram para o Brasil, Haddad assume como ter como grande influência o avô, Cury Habib Haddad, que morreu dois anos antes do seu nascimento. Cury Habib ficou famoso na luta no Líbano contra o domínio francês, após a I Guerra Mundial, segundo relata o jornal Estado de São Paulo.

Intelectual, pensador e académico, o candidato presidencial do PT foi descrito por Juan Arias, escritor e correspondente do El País no Rio de Janeiro, como muito diferente de Lula da Silva.

“Haddad não poderia ser mais diferente de Lula, seja no seu caráter e peculiaridades, quanto na sua biografia. Enquanto Lula se consolidou no sindicalismo, que condicionaria fortemente o partido dele nascido, tornando-se um líder carismático e popular sem outra formação senão a da vida, Haddad é um académico, com vários diplomas, doutorado em Filosofia, especialista em Marxismo e com uma visão mais europeia do que tropical da política”, afirmou o escritor.

O nome de Haddad já vinha a ser avançado há meses como possível substituto de Lula da Silva como candidato do PT às eleições presidenciais de 7 de Outubro. E, como Lula da Silva, também Fernando Haddad não escapou à nuvem de corrupção.

No início deste mês, o ex-governante foi denunciado pelo Ministério Público pelos crimes de corrupção, branqueamento de capitais e associação criminosa a propósito de uma investigação que envolve a UTC Engenharia, empresa de construção envolvida na Operação Lava Jato.

Segundo a procuradoria, Ricardo Pessoa, dono da construtora, teria transferido em 2012, sem declarar, 2,6 milhões de reais (cerca de 560 mil euros), para a campanha do então candidato a prefeito de São Paulo.

Impedido pelo Tribunal Superior Eleitoral de se candidatar ao sufrágio de 07 de outubro, o ex-Presidente brasileiro Lula da Silva renunciou à candidatura, que entregou a Haddad.

A candidatura do ex-presidente do Brasil, que cumpre na prisão uma pena de 12 anos e um mês por corrupção, foi registada pelo PT e depois vetada pelo Tribunal Superior Eleitoral, com base na lei que proíbe alguém condenado em duas instâncias de concorrer a qualquer cargo eleitoral.

Lula da Silva foi condenado em duas instâncias judiciais, num processo em que foi acusado de ter recebido um apartamento de luxo na cidade do Guarujá da construtora OAS, em troca de favorecer contratos da empresa com a estatal petrolífera Petrobras.

12 Set 2018

Corrupção e violência dominam terceiro debate de candidatos à presidência do Brasil

[dropcap style≠’circle’]A[/dropcap] violência e a corrupção, bem como um apelo unânime ao fim do ódio político, marcaram o terceiro debate televisivo entre seis dos candidatos à presidência do Brasil, no domingo à noite.

Álvaro Dias (Podemos), Ciro Gomes (Partido Democrático Trabalhista, PDT), Geraldo Alckmin (Partido da Social Democracia Brasileira, PSDB), Guilherme Boulos (Partido Socialismo e Liberdade, PSOL), Henrique Meirelles (Movimento Democrático Brasileiro, MDB) e Marina Silva (Rede) foram os candidatos presentes neste debate, que não contou com um representante do Partido dos Trabalhadores (PT).

O PT ainda não indicou um candidato à Presidência da República, depois do Tribunal Superior Eleitoral ter barrado a candidatura do ex-Presidente Luís Inácio Lula da Silva às eleições presidenciais, marcadas para 07 de outubro, com a segunda volta a realizar-se três semanas depois, no dia 28.

Também Jair Bolsonaro, do Partido Social Liberal (PSL), manteve-se ausente por estar hospitalizado desde quinta-feira, depois de ter sido esfaqueado numa ação de campanha em Juiz de Fora, no estado de Minas Gerais.

Todos os candidatos presentes lamentaram o ataque ao político e pediram a pacificação da sociedade brasileira no primeira parte do debate, divido em blocos compostos por perguntas, respostas e comentários dos participantes.

No primeiro bloco, quase todos os candidatos abordaram propostas dos adversários, indicou o jornal Estadão, à exceção de Guilherme Boulos, que enfrentou diretamente Meirelles, ex-ministro da Economia. “O compromisso da minha candidatura é enfrentar privilégios. O senhor vai enfrentar privilégios da sua turma?”, questionou Boulos.

No segundo bloco, os temas em destaque foram a corrupção que abala o país, a Operação Lava Jato e a condenação do ex-Presidente Lula. O terceiro bloco trouxe ao debate o aumento dos salários no sistema judicial e os problemas de saneamento básico do país.

Já no quarto bloco, os candidatos responderam a perguntas de internautas, onde as desigualdades salariais entre homens e mulheres e a crise no sistema dos Correios estiveram em destaque.

Marina Silva lembrou o ataque a Bolsonaro e apostou numa campanha de paz, em que defendeu a união do Brasil e a necessidade de preservar a cultura indígena no país. A candidata sublinhou ainda importância da educação, chamando a “atenção principalmente do eleitorado feminino”, de acordo com uma análise do Estadão.

Já Álvaro Dias destacou a corrupção e as falhas do sistema. “Hoje, é o ano novo da comunidade judaica e lembro que esse é o País das crenças e das religiosidades. Somos muitos Brasis dentro de um grande Brasil e devemos nos respeitar. O ódio cega a inteligência. A raiva e a inteligência alimentam a violência (…) O Brasil precisa abrir o olho”, afirmou.

Alckmin sublinhou a necessidade de pacificação e união, que relacionou com as questões da educação e da segurança. “Os brasileiros já têm problemas demais. Não podemos ter um próximo Presidente para ter mais problemas. O Brasil já errou. Já erramos e vimos as consequências. Estamos preparados para fazer um grande esforço em torno da reforma tributária, da mudança política, da reforma do Estado para que o País se encontre”, declarou.

Ciro Gomes apresentou-se como a mudança, e destacou o desemprego e a violência contra a mulher. “O Brasil não pode se manter com 13 milhões de desempregados” disse o candidato do PDT. Gomes acrescentou que os eleitores “devem observar mais para decidir o voto”.

Meirelles disse concorrer à presidência pelo desejo de melhorar a vida dos brasileiros, e defendeu que tirou o país da maior recessão da história, enquanto ministro da Economia de Temer. “É só me chamar que trarei as respostas”, sublinhou.

Já Boulos frisou a “invisibilidade dos pobres”, ao mesmo tempo que afirmou ser o único candidato capaz de restaurar a solidariedade, por não ter “o rabo preso”.

O debate, já considerado “morno” pelos partidos, teve um grande destaque na rede social Twitter, na qual os internautas foram questionados sobre o impacto da ausência de Jair Bolsonaro. De acordo com uma sondagem da plataforma Ideia Big Data, a maioria das respostas indicou que a ausência do candidato não teve nenhum impacto. O debate foi promovido pela TV Gazeta, jornal O Estado de São Paulo e rádio Jovem Pan.

10 Set 2018

Reportagem | Samuel, o voluntário que mata a fome dos venezuelanos nas ruas do Brasil

Por Carolina de Ré, da agência Lusa 

[dropcap style≠’circle’]A[/dropcap]ssim que a noite cai, Samuel parte na sua carrinha branca para começar a tarefa de distribuir comida aos imigrantes venezuelanos que vivem nas ruas da cidade brasileira de Boa Vista, perto da fronteira com a Venezuela.

Com caixas de leite, chocolate em pó, arroz, feijão, açúcar, café e roupas na carrinha, começa a sua jornada como voluntário nas imediações dos abrigos de acolhimento e da cidade, onde milhares de venezuelanos passam fome.

“Tenho que sair na hora certa, na hora em que as pessoas estão a cozinhar para ter certeza que elas vão comer e não vender os alimentos. Elas têm que ter ‘fogón’ [uma lata de metal cheia de madeira usada pelos venezuelanos para cozinhar]”, explica à reportagem da Lusa, que o acompanhou durante uma noite.

Antes de cada paragem, Samuel, que pediu para não ser identificado pelo seu nome completo, decide a quem irá distribuir os alimentos. Famílias com crianças têm prioridade, no entanto, também se solidariza com homens, na maioria jovens, quando percebe que estão nas ruas, caídos, exaustos porque passaram o dia inteiro sem comida.

“Ei vagabundo, como está? Tem ‘fogón’?”, diz antes de parar perto dos abrigos onde ele e o seu carro são reconhecidos de longe.

O voluntário faz perguntas sobre o dia-a-dia das famílias dos venezuelanos que vivem em barracas armadas nas ruas e são chamados por ele de “vagabundos”, palavra usada com uma conotação carinhosa e aceite com humor pelos imigrantes com os quais conversa.

“Vagabundo, se você não se comportar vou devolvê-lo para o [Presidente venezuelano, Nicolás] Maduro. Quer voltar para o Maduro?”, brinca com um homem à frente de um abrigo.

“‘Non’, estou tranquilo. Tem um cigarro?”, ouve em resposta.

Perto da rodoviária, uma área perigosa da cidade de Boa Vista, uma pausa para tomar um café e instruções sobre o procedimento: distribuir a comida rápido e preparar-se para correr.

Enquanto Samuel separa arroz, leite, café e açúcar para cerca de 15 homens que dormiam na calçada, o carro torna-se no foco de interesse de um outro grupo de venezuelanos, obrigando-o a abandonar o local apressadamente.

Entre paragens, Samuel conta que nem seus colegas de trabalho em Boa Vista nem os seus filhos que vivem no Rio de Janeiro sabem sobre a distribuição de alimentos que faz.

Samuel afirma ser um homem que não gostava de política, mas garante não ignorar o impacto negativo causado pela vinda de cerca de 30 mil venezuelanos para Boa Vista e a revolta de boa parte da população local.

“A verdade é que da Venezuela para o Brasil vieram as prostitutas, os bandidos e os miseráveis. Eles estão a causar problemas, mas não consigo dar as costas aos miseráveis”, disse.

Sobre a precariedade da vida dos imigrantes que estão na região da fronteira mais ao norte do Brasil, localizada a mais de 3.400 quilómetros da cidade do Rio de Janeiro, confessa que, embora prefira permanecer anónimo, agrada-lhe saber que é lembrado por quem socorre.

“Eu ajudei uma venezuelana que é cega. Uma vez ela deu-me um abraço tão forte, tão verdadeiro, que até hoje me emociono. Ela nunca me viu, mas sabe ao longe quando estou por perto”, lembra.

“Se eu tivesse que escolher entre ser imortal e ser eterno escolheria ser eterno. Não sei, mais acho que estas pessoas vão se lembrar de mim para sempre. Então, posso ser eterno na vida delas”, acrescenta.

No final da jornada, com o carro e a feição mais leve, Samuel reconhece que encontrar soluções para mitigar o impacto da crise migratória em Roraima, o estado menos populoso e um dos mais pobres do Brasil, será uma missão difícil.

“Não há solução mágica, mas seria bom que houvessem mais voluntários e que as organizações não-governamentais e os políticos deixassem de aproveitar este sofrimento dos venezuelanos para promoverem os seus interesses”, conclui.

A morte de um brasileiro e de um venezuelano após um furto num comércio local na quinta-feira agravou a tensão causada pelo fluxo migratório em Boa Vista.

Alguns venezuelanos que vivem num acampamento visitado pela reportagem da Lusa, perto do abrigo Jardim Floresta, disseram à Lusa que tinham medo de serem atacados por brasileiros.

No sábado, um protesto organizado por moradores de Boa Vista pediu a expulsão dos venezuelanos que estão nas ruas da cidade e os ânimos tiveram que ser controlados pelo Exército brasileiro, que evitou um novo conflito.

O incidente aconteceu dez dias depois que o Presidente do Brasil, Michel Temer, ter anunciado a mobilização de 3.200 soldados para reforçar a segurança na região.

Há cerca de um mês, na cidade de Pacaraima, que fica na fronteira do Brasil com a Venezuela, um conflito acabou com a expulsão de 1.200 venezuelanos que estavam na cidade, após um assalto a um comerciante brasileiro.

De acordo com dados oficiais, desde 2017 entraram no Brasil 154.920 venezuelanos por via terrestre na cidade de Pacaraima, mas cerca de 79.402 deles regressaram para seu país.

Dos que decidiram permanecer no Brasil, cerca de 5.200 estão a viver em abrigos construídos em Boa Vista e dependem da ajuda humanitária do Governo brasileiro e da Alto Comissariado das Nações Unidas para Refugiados.

Outros milhares permanecem acampados nas ruas em busca de abrigo e trabalho.

9 Set 2018

Brasil | Lula da Silva recorreu ao Supremo Tribunal para disputar eleições

O ex-Presidente brasileiro Lula da Silva, preso desde Abril, apresentou um recurso na terça-feira ao Supremo Tribunal Federal, depois do Supremo Tribunal Eleitoral ter negado a sua inscrição como candidato às presidenciais de Outubro

[dropcap style=’circle’]A[/dropcap]equipa de advogados do ex-chefe de Estado anunciou que interpôs o recurso na sequência do Tribunal Superior Eleitoral ter decidido que a lei conhecida como “Ficha Limpa”, que foi aprovada pelo próprio ex-Presidente em 2010, impede que Lula concorra ao cargo, uma vez que foi condenado em segunda instância. A Justiça proibiu também o antigo chefe de Estado de aparecer na campanha eleitoral como candidato, mas autorizou a presença da sua figura na campanha desde que não se apresente como tal.

Os advogados argumentam que o tribunal eleitoral se recusou a atender um pedido do Comité de Direitos Humanos da Organização das Nações Unidas (ONU) para que se respeitem os direitos políticos do ex-Presidente, incluindo o direito de contestar as eleições, conceder entrevistas à imprensa e manter contacto com os membros do Partido Trabalhista (PT).

Por esta razão, os advogados de Lula já apresentaram um recurso à ONU para que a organização se pronuncie sobre a recusa das autoridades brasileiras em acatarem a determinação do Comité dos Direitos Humanos, que pediu ao Brasil que permita ao ex-Presidente Luiz Inácio Lula da Silva de exercer todos os seus direitos políticos como candidato enquanto estiver na prisão.

De acordo com a defesa, a decisão do Comité da ONU deve vincular a Justiça brasileira, que é signatária de tratados internacionais que reconhecem a competência deste Comité das Nações Unidas.

Substituto de Lula

Caso os novos recursos sejam rejeitados, o PT só tem até 11 de Setembro para apresentar um novo candidato que, segundo dirigentes do partido, seria Fernando Haddad, que foi na terça-feira indiciado pelo Ministério Público por suposta corrupção relacionada com a sua campanha nas eleições municipais de 2012.

Haddad, apontado como provável substituto de Lula como candidato do PT à presidência do Brasil, é acusado de receber 2,6 milhões de reais (quase um milhão de euros à taxa de câmbio de então) de uma construtora “para pagar uma dívida na campanha eleitoral de 2012”, o que lhe permitiu garantir o lugar de prefeito de São Paulo, segundo um documento do MP publicado na terça-feira.

Se não anunciar um novo candidato no prazo estipulado, o partido fica fora da disputa eleitoral, cuja primeira volta está marcada para 7 de Outubro

6 Set 2018

Incêndio no Museu Nacional do Rio de Janeiro destruiu 20 milhões de peças

[dropcap style=’circle’]O[/dropcap]acervo do Museu Nacional do Rio de Janeiro, que foi consumido por um incêndio na noite de domingo, tinha um dos maiores acervos histórico e científico do país, com cerca de 20 milhões de peças. A instituição, criada há 200 anos, foi fundada por D. João VI, rei de Portugal, e era o mais antigo e um dos mais importantes museus do Brasil.

Entre as peças do acervo estavam a colecção egípcia, que começou a ser adquirida pelo imperador D.Pedro I, e o mais antigo fóssil humano encontrado no Brasil, baptizado de “Luzia”, com cerca de 11.000 anos.

O Museu Nacional do Rio de Janeiro era o maior museu de História Natural e Antropologia da América Latina e o edifício tinha sido residência da família Real e Imperial brasileira. Entre os milhões de peças que retratavam os 200 anos de história brasileira estavam igualmente um diário da Imperatriz Leopoldina e um trono do Reino de Daomé, dado em 1811 ao príncipe regente D. João VI.

Nas colecções de Etnologia estavam expostos objectos que mostravam a riqueza da cultura indígena, cultura afro-brasileira, culturas do Pacífico. Segundo a edição brasileira do El País, o acervo tinha ainda o maior e mais importante acervo indígena e uma das bibliotecas de antropologia mais ricas do Brasil.

A instituição, ligada à Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), era alvo de cortes orçamentários há pelo menos três anos. Os alunos do Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social da universidade chegaram mesmo a criar ‘memes’ (imagens ou vídeos que se espalham de forma viral) em que mostravam fósseis à espera de verba, ironizando os cortes.

Em 2015, o museu chegou a ficar fechado por dez dias após uma greve de funcionários da limpeza, que reclamavam salários atrasados. Nas redes sociais, investigadores, alunos e professores brasileiros partilham depoimentos, lamentando o ocorrido e atribuindo a tragédia aos cortes orçamentais dos últimos anos.

O vice-director do Museu Nacional considerou o incêndio uma “catástrofe insuportável”. “O arquivo de 200 anos virou pó. (…) São 200 anos de memória, ciência, cultura e educação, tudo transformado em fumo por falta de suporte e consciência da classe política brasileira”, afirmou o responsável, sublinhando: “O meu sentimento é de imensa raiva por tudo o que lutamos e que foi perdido na vala comum”.

Segundo disse, no aniversário de 200 anos da instituição nenhum ministro de Estado aceitou participar da comemoração: “É uma pequena mostra do descaso”, sublinhou. O responsável adiantou ainda que a instituição estava prestes a fechar uma negociação com o Banco Nacional de Desenvolvimento Económico e Social (BNDES) que incluía um projecto de prevenção de incêndios.

Antes destas declarações, o Ministério da Educação brasileiro já tinha lamentado as consequências do incêndio no Museu Nacional, sublinhando que serão feitos todos os esforços para auxiliar a Universidade Federal do Rio de Janeiro, que geria o museu, a recuperar o património histórico. O presidente do Brasil, Michel Temer, reagiu, em comunicado, considerando a perda “incalculável”.

4 Set 2018

Artistas António Dias, Mário Cravo e Eleanora Koch morreram no mesmo dia no Brasil

[dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] mundo das artes brasileiro está de luto depois de ter perdido no mesmo dia, na quarta-feira, três conceituados artistas: António Dias, Mário Cravo e Eleonora Koch.

António Dias, famoso pelas suas obras em papel ‘kraft’, morreu durante a tarde de quarta-feira no Rio de Janeiro aos 74 anos, após anos a lutar contra um cancro.

Dias nasceu em 1944 na cidade de Campina Grande, no estado da Paraíba (nordeste) e mudou-se para o Rio de Janeiro aos 14 anos. Em 1965, viajou para a Europa com uma bolsa de estudos de pintura que havia recebido na Bienal Francesa e, aos 21 anos, ganhou o prémio da Bienal de Paris.

Em 1972 recebeu uma bolsa da Fundação Simon Guggenheim para trabalhar em Nova Iorque e, cinco anos depois, viajou para a Índia e Nepal, onde estudou técnicas de produção de papel.

Já Mário Cravo, de 95 anos, morreu na cidade de Salvador, no estado da Bahia, vítima de doença prolongada.

O artista baiano começou a sua carreira como pintor, mas ficou notabilizado pela escultura.

Estudou primeiro no Rio de Janeiro e depois nos Estados Unidos e, quando voltou ao Brasil, fez parte da primeira geração de artistas modernistas baianos, tornando-se especialista em monumentos.

Em mais de 70 anos de atividade profissional, Cravo foi um dos artistas que mais estimulou e valorizou os elementos da cultura popular para produzir arte.

Eleonore Koch foi a última dos três artistas que o Brasil viu partir na quarta-feira. A pintora de origem alemã morreu de insuficiência cardiorrespiratória aos 92 anos de idade num hospital em São Paulo.

A artista foi a única aluna do pintor Alfredo Volpi – considerado pela crítica como um dos mais importantes artistas da segunda geração do modernismo.

Lore, como era conhecida entre as amigas, há muitos anos que estava doente e não pintava desde então devido a problemas de visão.

Eleonora Koch participou em duas edições da Bienal de São Paulo (1959 e 1967) antes de se instalar em Londres em 1968.

2 Ago 2018

Brasil renova com selecionador Tite até ao Mundial do Qatar 2022

[dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] treinador Tite vai ser selecionador do Brasil até ao Mundial 2022 do Qatar, anunciou ontem a Confederação Brasileira de Futebol (CBF), que garantiu também a continuidade do coordenador de seleções, Edu Gaspar, pelo mesmo período.

“A experiência deste primeiro ciclo estabeleceu uma relação de confiança entre todos, que vai refletir-se no próximo passo. Entendo que a CBF nos deu as condições para construir um ambiente de união e de profissionalismo extremo e assim continuaremos. É um grande desafio e estamos felizes em enfrentá-lo, já com o foco voltado aos próximos jogos e competições”, disse Tite.

O técnico de 56 anos soma 26 partidas à frente da seleção brasileira, conquistando 20 vitórias, cedendo quatro empates e sofrendo apenas duas derrotas.

“A CBF está a investir num projeto de longo prazo ao garantir à equipa técnica seis anos e meio à frente da seleção. Acreditamos que um planeamento cuidadoso e execução criteriosa conduzirão o futebol brasileiro aos resultados que esperamos”, justificou o diretor executivo de gestão, Rogério Caboclo.

Para o dirigente, que foi o chefe da delegação brasileira no Mundial 2018 da Rússia, no qual a ‘canarinha’ caiu nos quartos de final frente à Bélgica (2-1), estas renovações constituem uma “decisão natural”.

“Ao longo desta primeira fase na CBF eles demonstraram alinhamento a valores que acreditamos muito, como talento, competência e dedicação”, completou.

O caminho de Tite prossegue em 07 de setembro com particular nos Estados Unidos frente à seleção norte-americana.

26 Jul 2018