Tânia dos Santos Sexanálise VozesPolíti-sexo [dropcap style=’circle’]T[/dropcap]udo é política, ou tudo pode ser política. Se vivemos o nosso dia-a-dia mergulhados numa estrutura socio-política, não somos ‘neutros’, nem tão pouco ‘despolitizados’. O sexo não é excepção. A agenda politico-sexual varia de país para país e de ideologia para ideologia. Há uma expectativa socio-cognitiva de base para quem se associa mais à direita, à esquerda ou ao centro e, de uma forma ou de outra, também existem expectativas na forma como se possa pensar o sexo, no espectro politizado. Teremos que salvaguardar que há muitas (muitas) excepções, mas o conhecimento mundano indica-nos que o sexo é mais problematizado e censurado por ideias que tendem para a direita, e desproblematizado e discutido por ideias que vão para a esquerda. Até aqui, tudo bem, refiro-me a um nível de análise que pressupõe interacções onde a política e as ideias são discutidas diariamente, aqui, ali e nos media. Estes são espaços onde a discussão e a contestação pode ser praticada. Mas o pano de fundo onde tudo isto acontece não pode ser ignorado, isto é, as políticas governamentais implementadas. Estas carregam o poder legal para o desenvolvimento de certas práticas e, por isso, a discussão (e as práticas diárias) estão limitadas por aquilo que nacionalmente se considera correcto e favorável para todos. A tendência será desenvolver políticas públicas mais inclusivas, fomentadoras da compreensão da complexidade da sexualidade humana. Pensei eu. A verdade é que nem sempre é assim, em contextos ditos desenvolvidos e democráticos vê-se muito disparate, já para não falar da regressão de práticas que contradizem o desenvolvimento para uma sociedade informada sobre sexualidade. Falo mais especificamente sobre educação sexual, esse veículo de informação nas escolas. Vim a descobrir que na Polónia, muito recentemente, a educação sexual começou a ser vista como ‘promotora de pedofília’ e que, por isso, querem passar uma lei onde os professores que ensinam educação sexual nas suas turmas podem ir de cana até dois anos. Isso mesmo, educação sexual pode passar a ser criminalizada nas escolas polacas. Ainda mais dramático será pensar que todas as pessoas que fizeram carreira a formar professores e a dar workshops a crianças e adolescentes sobre sexualidade podem, potencialmente, ir para a prisão por fazerem aquilo que sempre fizeram. A política do sexo não é um capricho, muito menos visto como desnecessário. Já é cliché pensar na negatividade que este mundo carrega e na falta de esperança pelo progresso: e quando falo em progresso, falo em, acima de tudo, abertura – transparência – informação. Não é só a educação sexual que está ser severamente atacada em contexto Polaco, a pílula do dia seguinte (que podia ser adquirida facilmente em qualquer farmácia) só pode ser adquirida com receita médica, receita essa que o médico pode moralmente recusar-se a prescrever. Mas qual é a direcção do pensamento humano? Onde está o progresso e humanismo? (sim, pensem nos ‘Trumps’ que por aí existem, no Brexit e a legitimização do discurso racista e xenófobo, nos ataques terroristas e na trivialidade da vida humana ou na violência diária, persistente e recorrente). Onde está a mudança? Talvez a desobediência civil seja o caminho. Dá vontade de entrar por escolas dentro com réplicas anatómicas de órgãos sexuais com gritos de protesto que descrevem as funcionalidades dos ditos. Oferecer contracepção a todos. Falar sobre as coisas. Qual é o perigo? Sexo? Novidade do dia: a sociedade está sexualizada de tal forma que o sexo não está de todo escondido (basta ir ver qualquer clip de música pop para perceberem do que falo). O sexo está aí, infiltrado nas nossas vidas e nas nossas práticas. Depois a agenda política contribui para o que quer: a) uma população censurada e confusa pelas representações do sexo na sociedade ou b) uma população bem informada sobre as suas escolhas sexuais mantendo práticas saudáveis? Nunca percebi porque é que a escolha é difícil.
Tânia dos Santos Sexanálise VozesAsfixia [dropcap style≠’circle’]À[/dropcap]s vezes sentimo-nos asfixiados, por várias razões. Levamos uma vida que asfixia a nossa criatividade ou o nosso prazer. Tentamos ser humanos e tentamos inserirmo-nos nas normas bem estabelecidas, nas normas que deveriam guiar o nosso pensamento e a nossa acção. Asfixiamo-nos a nós próprios e, com sorte, apercebemo-nos quando ainda não é tarde demais. Há sempre qualquer coisa a asfixiar-nos, com o trabalho chato, com o patrão que é pouco razoável, com as memórias que nos atormentam, com os traumas que não desaparecem, com os filhos que choram e não percebemos porquê. Asfixiamos a nossa sexualidade porque tentamos ser normais, ou às vezes asfixiamo-nos mesmo, literalmente. A asfixia erótica ou (autoerótica) tem os seus primeiros registos no século XVII quando se começou a reparar que homens condenados à forca tinham muitas vezes uma erecção no momento da morte. O mecanismo de supressão de sangue ao cérebro estimula sensações de prazer e facilitadoras do orgasmo e, por isso, houve quem usasse a técnica de asfixia para o tratamento de disfunções erécteis. Mas não só, os curiosos do sexo experimentavam-no sozinhos e acompanhados. Mas atenção que este fetiche (que é considerado uma parafilía) pode levar à morte acidental. Para um adepto de bondage, a ideia de ter alguém a apertar o seu pescoço é excitante o suficiente, os outros praticantes dependem da questão fisiológica: a asfixia erótica pode ser tão viciante como a cocaína. Orgasmos exaltados pela ausência de sangue no cérebro. Desconfia-se que a primeira morte acidental por asfixia erótica tenha sido de um homem que, de facto, pediu assistência profissional para levar a cabo a experiência – uma prostituta de uma Londres de alguns séculos atrás – mas que gostou tanto que decidiu continuar, mesmo depois de ela ter-se ido embora. Sozinhos somos menos capazes de travar o que é que seja que provoque a asfixia. Estima-se que acidentes desta natureza sejam frequentes, mas nem sempre são identificados. Para os adolescentes que são encontrados mortos com os órgãos genitais em mão e pornografia ao lado, a família tende a ‘limpar’ o cenário, para que a sua última imagem não seja tão sexualizada. Mas a asfixia pode culminar das mais variadas circunstâncias – talvez vinda de um campeonato europeu de futebol? São jogos futebolísticos que para além de causadores de stress, não permitem o oxigénio circular livremente no corpo. Uma tensão (e asfixia) não erótica, no verdadeiro sentido do termo, mas potencialmente sexy. Jogadores a correrem de pernas ao léu de lá para cá, de cá para lá, com o calor do verão a fazer-nos transpirar que nem porcos, mas a guinchar de excitação. Chutos e pontapés mal dados que fazem saltar um batimento cardíaco, acoplados de sorrisos que nos fazem ter esperança… A asfixia pode ser tanta coisa, na prática e no conceito. Contudo, só pode ser exercitada com cuidado (muito cuidado), e às vezes com algum entusiasmo. Nos últimos dias desta pobre alma que vos escreve, a asfixia tem sido a descrição básica diária. Mas, quem poderia adivinhar? Portugal ganha o Campeonato Europeu de Futebol e parece que nada mais importa. Na asfixia quotidiana e (ocasionalmente) sexual, o alívio de ter um orgasmo prevalece, e aquela soneca pós-coito impõem-se, como sempre, com sonhos de vitória. Depois de doze anos a suster a respiração pelos 11 (mais pelos jogadores e menos pelos milhões), já podemos respirar de alívio. Já se alcançou o objectivo, já vimos os meninos jeitosos a abanarem os bícepes sem camisa. O orgulho da diáspora Portuguesa exaltou-se! Usam-se camisas vermelhas e verdes, ou ‘verde bebés’. A expansão e a retracção de oxigénio mal explicada pelo futebol, contribuí para a popularidade do jogo, onde se usa uma bola (e não duas). Especialmente, enquanto analisava asfixia erótica ( assuntos sérios!) – algo aconteceu em Paris que deixou o pessoal contente, até a mim. Dedico, por isso, o que é que seja de sexo, ao futebol de Portugal. A asfixia fica para a próxima.
Tânia dos Santos Sexanálise VozesOrlando [dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] Orlando em Orlando vai a uma discoteca à noite para dançar. O lugar chama-se Pulse e não discrimina nem rejeita ninguém. Esta foi a primeira ida à discoteca e não foi difícil para o Orlando adorar o ambiente, a música e as pessoas. Mas o Orlando em Orlando não estava à espera de presenciar o terror tão de perto, tão pessoalmente. Ninguém entende à primeira o que se passa. Uma discoteca, por definição, é um lugar barulhento, confuso e escuro. Quanto entra um homem a disparar com uma arma de fogo, o ruído dos tiros podiam ser parte da música. Mas não eram. Foi a tragédia na qual o Orlando de Orlando saiu ileso quando muitos foram fatalmente alvejados e outros ficaram em estado muito grave. Os olhos do mundo viraram-se para Orlando e para a pequena discoteca que viu o que nunca esperaria ver: medo, violência e morte. O resto vimos nós nas notícias. Mas o Orlando de Orlando é fictício, apesar de poder descrever qualquer sobrevivente desta fatídica noite de saída nocturna, à partida inofensiva. A discoteca Pulse é uma discoteca gay, frequentada por gays, simpatizantes, exploradores, pessoas que acreditam e respeitam a liberdade sexual de cada um. O atirador que entrou ali dentro matou sem dó nem piedade por razões que ainda não são claras. Poderão ser sido razões ideológicas, psicológicas ou sociais. O comportamento social humano é assim, muito complexo, complexo demais para reduzir qualquer infeliz acto à tendência Trump-tizada que justificam comportamentos e pensamentos islamofóbicos. O atirador era, muito provavelmente, um homem com dificuldades psicológicas e emocionais que se desenvolveram ao longo dos anos, em combinação com uma ou outra pressão social por aceitação e bem-estar, e a cereja em cima do bolo, o fácil acesso a uma arma de fogo. Um criminoso carrega em si uma complexidade imensa de entendimento do mundo em que dá sentido a actos atrozes como este. Para este homem, o que é que seja que o tenha movido, o alvo seriam os homossexuais. O alvo foram as pessoas que amam livremente, fora da norma expectável homem – mulher e que muitos ainda julgam ‘imoral’ e pouco ‘natural’. Não consigo deixar de reparar que esta violência contra um grupo, é movida por um ódio incompreensível que existe e que se generaliza a todos os membros afiliados. Os ‘gay,’ os ‘muçulmanos’, os ‘judeus’, os isto, os aquilo, os, os… São discursos e actos comunicativos que espalham uma norma onde é aceitável discriminar pessoas, só porque as percebemos como parte de um grupo diferente, desconhecido e pouco compreendido. A violência ainda existe contra os homossexuais, todos os dias, de todas as formas. A mais recente tendência preconceituosa onde julgam todos muçulmanos terroristas, cresce as olhos vistos. Isto tem que parar. Ultimamente que a comunicação social traz ao nosso conhecimento o que de horrível tem acontecido, o desespero e o stress colectivo e individual aumenta. E é perfeitamente normal, envolvermo-nos em ideias ainda mais rancorosas perpetuando a violência e a incompreensão é que não. O amor, aquele sentimento mais puro e que une as pessoas, tem que ganhar. É por amor que nos juntamos, é por amor que somos homossexuais, heterossexuais ou bissexuais. O amor vencerá se amarmos esta humanidade que mais parece podre de ideias generalistas, preconceituosas e discriminatórias. O Orlando foi à discoteca para conhecer alguém, para dar uns beijinhos, para sair umas quantas vezes e para se divertir. Celebrava-se a liberdade no amor quando, inesperadamente, o cenário mostrou-se uma banheira de sangue. O Orlando só queria ser feliz. O Orlando somos todos nós, nós pessoas que saímos e nos divertimos esperando unicamente uma valente ressaca no dia a seguir. O Orlando somos nós à procura do amor e a procurá-lo nos sítios que julgamos certos, com as pessoas certas. Nós somos todos Orlando, quer queiram, quer não.
Tânia dos Santos Sexanálise VozesQueres beber café comigo? Não? [dropcap style=’circle’]H[/dropcap]ão-de ter reparado na inundação na imprensa internacional do caso da ‘mulher inconsciente’ e do seu agressor, Brock Turner, e do caso da menor brasileira que ‘engravidou de mais de 30’, pelas palavras dos estupradores. O consentimento sexual não parece estar no vocabulário destas pessoas. No Brasil começa-se a falar da cultura do estupro. Uma cultura que não condena o abuso sexual. Um grupo de 33 homens violou uma menor de 16 anos no Rio de Janeiro e o caso veio a ser descoberto porque alguns desses homens gravaram cenas e postaram-nas nas redes sociais. Sem medo de represálias. Num grupo de 33 homens ninguém achou anormal ou estranho o que se estava ali a passar. Os vídeos gravados mostram o corpo semi-nu de uma jovem inconsciente, enquanto que eles se punham em posição de selfies e faziam comentários jocosos. A reacção pública foi diversa, mas muitos sugeriam que certamente que a jovem fez alguma coisa para merecer aquilo. Quem manda usar mini-saia? Quem manda ser sensual? Quem manda ser mulher? O entendimento vigente do que pode ser considerado uma violação ou uma relação sexual consentida perde-se em difusas interpretações onde as mulheres continuam a ser desconsideradas. A culpabilização da vítima continua a ser a estratégia mais utilizada para proteger e perpetuar a hegemonia masculina. Os casos são tantos que já irrita. Como é que duas raparigas são assassinadas no Equador por resistirem uma violação e ainda assim foram culpabilizadas, por, talvez, terem usado calções curtos? Como é que um puto de 19 anos foi apanhado no acto de abusar uma mulher inconsciente e não foi automaticamente de cana? Como é que 30 homens julgam uma violação colectiva perfeitamente aceitável? Como é que só muito recentemente se percebeu que uma violação é uma violação, mesmo em contexto matrimonial? Como é que uma juíza pode ignorar uma queixa de violação porque ‘a vítima é uma mãe adolescente, por isso claramente tem tendência para o acto’? O que é se passa com as pessoas? Como é que no século XXI, o século do futuro, da inovação e do progresso, tudo isto ainda aconteça? O instinto sexual não é uma micção urinária, não é inevitável. Não se descontrola ao ponto de mijo escorrer pelas pernas abaixo. Sexo não é um direito pessoal, uma afirmação categórica nem uma obrigação. O estímulo, o impulso e o acto não têm uma ligação directa, imediata e inevitável. Não há vestido sexy no mundo que sugira uma violação, nem álcool (demais ou de menos) que preveja um abuso. Mas mesmo assim o corpo da mulher é percebido como um objecto, e para essa concepção contribuímos todos. Não se trata de um homem isolado de mente disruptiva e comportamento desviante. Os media, os tribunais, os juízes e a população em geral perpetuam princípios onde só os homens brancos estão no topo da cadeia (cadeia hierárquica, god forbid se fosse a prisão). Todas as fotos publicadas do Brock Turner, o agressor sexual de um caso na universidade de Stanford que tem corrido muita tinta, mostram-no de carinha laroca, de cara inocente, sorridente e angelical. Foi julgado com seis meses de prisão porque ‘não tem antecedentes de actos agressivos’, como se todos os agressores sexuais não tivessem começado com um primeiro acto, sem antecedentes. Até o pai do agressor escreve ao juiz a pedir-lhe que uma carreira tão promissora (sim, porque o menino estava numa universidade da liga ivy com uma bolsa de desporto) não fosse destruída por ‘20 minutos de acção’. Acção essa que não foi consentida, com uma mulher inconsciente atrás de contentores. Mas o que é que isso interessa? Como é que interessa a forma como este rapaz destruiu a vida desta rapariga? Como a fez sentir-se humilhada, como a obrigou a ter que se defender em tribunal dos ataques de um advogado de defesa que insinuava um ‘historial potencialmente promíscuo’? Porque a defesa é assim, a escrutinar o possível consentimento que ela poderá ter dito quando inconsciente, mas que nunca existiu. O consentimento sexual não deveria ser um conceito complicado de entender. Queres beber café comigo? Não. Talvez. Silêncio absoluto. Estas são as opções que sugerem não consentimento. O consentimento implica iniciativa absoluta, até ao final. Se vocês já estão na cafeteria e já pediram o café, ambas as partes ainda estão no direito de o recusar. Imaginem o estranho que seria forçar alguém a beber um café por um tubo enfiado pelo esófago. Simples de entender, não é?
Tânia dos Santos Sexanálise VozesAcidentes com sexo [dropcap style=’circle’]O[/dropcap] sexo é muito, mas mesmo muito, bom. É o melhor para relaxar o corpo e a mente, é o melhor para a nossa auto-estima, é o melhor para espalhar o nosso amor. Mas o sexo tem perigos, uns mais comuns que outros. Não há nada como nos precavermos daquelas coisas que já conhecemos e termos alguma consciência dos inesperados que poderão surgir. Inesperado será sempre inesperado, potencialmente doloroso, mas muito provavelmente engraçado. Faz-me lembrar aquele episódio da série Seinfeld quando um proctologista faz contínuas anedotas sobre a panóplia de objectos que o pessoal mete nos seus rabinhos e que ficam lá presos. No calor do momento ninguém pensa muito detalhadamente nos riscos que um momento íntimo de prazer poderá trazer. O que nos prepara para a vergonha quando somos obrigados a partilhá-lo com médicos, enfermeiros ou ambulâncias? Nada. De qualquer forma, a probabilidade de ter um acidente sério é muito pequena, mas em casos raros pode ser fatal. 1.Brinquedos sexuais são caros, por isso as pessoas tentam improvisar como podem. O improviso, porém, pode não ser simpático com o nosso corpinho, massacrando-o de formas inimagináveis. É preciso ter cuidado com aquilo que se mete na vagina ou no rabinho, podem ser pequenos demais ao ponto de se ‘perderem’ ou grandes demais para magoarem à séria. É que depois só num hospital há material especializado para explorar as caves interiores e retirar os objectos estranhos. Não os deixem lá dentro durante muito tempo. Evitem lâmpadas LED ou termómetros de aquário (tudo o que se possa estilhaçar é expressamente proibido, por mais fálicos que sejam) e evitem superfícies rugosas que possam arranhar ou ferir (houve alguém que se lembrou de enfiar uma flor pela uretra e arrependeu-se). Em relação à vagina em particular, esta tem um ambiente delicado com um pH específico indispensável à sua saúde. Se se meterem objectos estranhos que segreguem algum líquido, ou deixem ‘restos’, estou a pensar por exemplo, numa banana, a vagina pode ficar infeliz com a sujidade. 2.Não há nada como espontaneidade sexual em todos os recantos do quarto, da casa, da cidade e do planeta. Mas cuidado onde o fazem. Há quem tenha feito contra uma janela e caído, ou numa mata e caído num poço, ou a conduzir e ter tido um acidente (imaginem um broche enquanto conduzem e baterem contra alguém… acho que não preciso ser muito gráfica), ou no chuveiro e escorregarem e verem-se num cenário ensanguentado. Quer-se espontaneidade com segurança. 3.Às vezes o sexo dá para umas pancadinhas de amor, umas palmadinhas aqui e ali, nada de muito exagerado para quem não é um adepto de BDSM. Mas tanto movimento traz algumas pancadas acidentais. Contra a parede, quedas da cama, cabeçadas, palmadas com mais força do que esperado, posições que dobram o pénis em dolorosas acrobacias (o pénis não precisa de ter ossos para se partir quando erecto…), joelhadas inesperadas (ou cotoveladas) e arranhadelas. Uma dentada de amor, por exemplo, pode ser perigosa também. Na Nova Zelândia uma senhora começou a ter sintomas de um AVC sem causa aparente, quando os médicos repararam no valente chupão que tinha no pescoço, que fez bloquear uma importante artéria. Dramático. 4.Penis captivus é uma condição rara onde a vagina se comprime ao ponto do pénis não ser capaz de sair. É necessária atenção médica para relaxar os músculos da vagina e desfazer o coito. Aconteceu a um casal italiano que estava a praticar o sexo no mar mediterrâneo. Nem quero imaginar como conseguiram pedir ajuda, ou chegar ao hospital. Suponho que, assim que saíram daquela, deram uma pausa na sua vida sexual, bem necessária. Não quero de modo algum assustar ninguém com estas histórias levadas da breca, são coisas que acontecem que, bem tratadas, não deixam mais do que uma história engraçada para contar. Há perigos mais reais do que uma cabeçada contra a cabeceira da cama. Há infecções e doenças sexualmente transmissíveis que são bem comuns e muito mais fáceis de prevenir. Preservativo SEMPRE. Os outros acidentes, esperam-se pouco disruptivos. Aproveitem que está cada vez mais calor, vão lá divertir-se, em segurança.
Tânia dos Santos Sexanálise VozesVermelho de Sangue [dropcap style=’circle’]’O[/dropcap]Benfica joga em casa’, mas não literalmente. Muitas são as expressões que pretendem camuflar a frontalidade que seria confessar ao mundo que uma mulher está a sangrar entre as pernas. Aquela altura do mês. No dia 28 de Maio celebrou-se o dia internacional da higiene menstrual com o intuito de quebrar mitos e tabus que a menstruação ainda carrega, em alguns pontos do planeta mais do que outros. Certamente ainda recebemos conselhos das nossas avós de que não se deve tomar banho, lavar a cabeça ou pentear durante a menstruação. Os nossos avôs não nos deixam entrar nas adegas da terrinha porque o vinho azeda. É melhor nem pensar em fazer bolos nestas alturas, porque os bolos vão ficar uma valente porcaria. E isto é só em Portugal. Uma organização não governamental no Nepal realizou um projecto fotográfico com jovens raparigas para perceber como é viver durante a menstruação. Por lá os mitos são ainda maiores, uma mulher menstruada é tratada como se tivesse uma doença contagiosa. Não pode cozinhar, não pode tocar em picles, não pode atravessar o rio, não pode ter contacto com elementos do sexo masculino. Não podem tocar em fruta porque a apodrece, nem em árvores de fruto porque as enfraquece, nem em sementes porque as tornam inférteis. Na primeira menstruação não se podem olhar ao espelho, porque atrai azar. A piorar, não têm condições sanitárias para se lavarem ou lavarem os seus pensos de pano. Pensos descartáveis são de um luxo tal que, em alguns países, as raparigas vendem favores sexuais para os poderem comprar. Poderia ser só ridículo, mas é tudo muito verdade. Parece-me compreensível que um sangramento cíclico mensal, de mais de três dias, possa ter parecido estranho às mentes de há dois mil anos atrás. Os registos da antiguidade clássica falam com medo e desdém desta coisa universal a todas as mulheres. Referem-se à menstruação como nefasta e perigosa a todos, estragando colheitas e jardins e até matando abelhas e enlouquecendo cães. Por isso, agora, a sabedoria popular continua a fazer da menstruação um bicho de sete cabeças, porque existe, é chato e embaraçoso, e relembra as capacidades reprodutivas das mulheres. O desconhecimento sobre o que a menstruação realmente é, e de que forma se lida com ela, faz com que caia numa espiral de tabu de consequências nada positivas. Li algures uma história de um homem na Etiópia que ao perceber que a sua filha estava menstruada, pensou que fosse o sinal de que ela tivesse iniciado a sua vida sexual, que em comunidades tradicionais, a pôs numa situação de humilhação e desdém. Há locais onde a menstruação é um obstáculo à educação também, sendo as raparigas privadas de ir à escola ‘na altura do mês’ ou até definitivamente. Os programas de educação e divulgação pretendem oferecer informação e melhorar condições sanitárias, para que a menstruação seja vivida com naturalidade. Sangue, cheiro, dores e mau-estar. Agora que o transtorno pré-menstrual (TPM) está cada vez mais em voga as mulheres também estão mais sintonizadas com as suas mudanças de humor uma a duas semanas antes, porque vêm irritabilidade e afins. Apesar de nos protegermos com o chavão ‘da altura do mês’, não deixa de ser tabu, nem nos contextos ditos mais ‘desenvolvidos’. Em 2015 a baterista Kiran Gandhi correu uma maratona sem tampão, onde orgulhosamente exibiu as suas manchas de sangue nas suas calças de licra de corrida. Outros tentam inovar ao criar arte com o sangue que o nosso corpo rejeita. Outros simplesmente falam sobre o período, abertamente, relembrando que é um processo normal e natural. Em contraste muitas mulheres por aí não têm acesso a produtos e a condições para uma menstruação digna. Tampões, pensos higiénicos, pensos de pano, copos menstruais, há de tudo, mas não em todo o lado. Já pensaram naquelas situações lixadas de vida que muitos vivem neste momento, e nas mulheres que mensalmente se sentem vulneráveis e incapazes de lidar com a sua menstruação? Porque a menstruação interessa, muito mais do que se pensa.
Tânia dos Santos Sexanálise VozesBananas [dropcap style=’circle’]O[/dropcap]governo chinês proibiu o acto de ‘eroticamente’ comer bananas em videos de live-stream. Como se definirá o erotismo, ou ausência dele, quando se come banana para o mundo online, ficará ao critério dos oficiais chineses. A especificidade legal vai à banana e não ao pepino, batata doce ou courgette, onde o desespero sexual talvez fosse mais óbvio. Comer bananas até soa mais inocente se compararmos com a simulação de falacio num pepino. Mas para além da regulamentação nas frutas que se podem comer, há restrições indumentárias. Não se podem usar mini-saias, decotes, ligas nem nada que possa revelar pele a mais. Tudo para manter uma conduta social (online) exemplar, para não destruir a ciber-ecologia chinesa que já é censurada ao tutano, e que agora o será ainda mais. Pessoal será necessário para controlar o conteúdo dos vídeos que são publicados pelas milhares de jovens chinesas que são seguidas por outros milhares de homens chineses. Esta tendência de acompanhar a vida online de jovens pelo seu dia-a-dia é justificada pela antiga política do filho único, que deixou jovens chineses na solidão por não encontrar companhia mais ‘real’. A indústria dos vídeos live-stream tem agradado as carteiras dos seus criadores e a das ‘entertainers’ (que já não podem comer bananas) que trabalham para eles. A procura por uma companhia, real ou virtual, é tanta, que a satisfação de acompanhar alguém a caminhar na rua, ou a beber um café através de um ecrã, é facilmente atingida. Os usuários deste tipo de serviço têm o hábito de gastar entre 500 a 800 yuan por semana a presentear as raparigas que os entretêm. Ramos de flores, bebidas e outras coisas, todas virtuais. As raparigas, que vêm a possibilidade de ganhar uns trocos fáceis ao exibirem-se numa webcam, ou a jogar uns jogos com os seus seguidores, têm agora que seguir as orientações do partido vermelho para promover a melhor comportamento. O facto de que a maioria das raparigas são menores de 18 anos e que expõem as suas vidas para todo o mundo (masculino e chinês) ver, parece que faz menos confusão ao pessoal que dita as regras. A dependência virtual para satisfazer necessidades pessoais e sociais faz menos impressão ainda. Porque as redes sociais são o futuro e a China está sem dúvida na vanguarda de todo o desenvolvimento tecnológico e social de como nos relacionamos com o mundo e com os outros. Com ou sem bananas. No entanto, fica no ar como é que as necessidades de afecto e de sexo poderão ser colmatadas quando ainda são vistas como falta de decoro. Posso não ser 100% a favor de se comerem bananas, mas também não sei se a restrição ao fruto trará educação. Educação gera educação, e a punição? Acaba-se por implicar com o sexo da forma mais bizarra, como se as bananas e as ligas fossem o perigo a ultrapassar por uma expressão saudável. Está-se a reprimir o quê, exactamente? Se o sexo é uma indústria multi-milionária e já se sabe disso, discursos sobre bananas soam a tentativas de mostrar que se está a fazer alguma coisa, mas só de fachada, para agradar os mais indignados. Mas pode só ser impressão minha. Como a imaginação alimenta a humanidade, certamente que outros objectos fálicos serão usados para substituir o tão temido fruto rico em potássio. E assim entre frutas, lingerie e censuras faz-se uma sexualidade, que se espera criativa, e muito virtual. A China que se prepare, porque o sexo está por aí e muitas mais restrições serão necessárias para limitar a sua naturalidade. O que foi feito: um activista manifestou-se à porta da Embaixada Chinesa no Reino Unido a comer uma banana, da forma mais sedutora possível, para reforçar a inocência da mesma. Certamente que foi uma manifestação vã, mas no mínimo caricata. Nunca uma banana será comida como dantes.
Tânia dos Santos Sexanálise VozesRelacionamentos [dropcap style=’circle’]H[/dropcap]á solteiros, apaixonados, namorados fechados e abertos, amigos coloridos, casados e parceiros. Há definições e redefinições sociais, pessoais e históricas. Pressões judaico-cristãs, crenças milenares e forças biológicas. Há uma panóplia de relacionamentos e de como eles se criam e desenvolvem. Há narrativas de todos os tipos com os mais distintos desfechos, acompanhadas de alegria, tristeza ou frustração. Há conversas de café e de cerveja que abrem ou fecham os olhos, esclarecem e enaltecem as coisinhas mundanas que muito têm de profundidade (relacional). Não há um relacionamento igual ao outro, muito menos sexo. Se há espaço de contestação pela solteirice que chateia alguns e que conforta outros, há espaço para definir novas relações e os novos tipos de relacionamento. Começa-se pelo sexo que depois desenvolve-se num sentido de intimidade único, ou ao contrário, começa-se pelo companheirismo de ir a jantares e ao cinema que quando as borboletas estiverem prontas a explodir, fazem-nas explodir na cama. Não há um caminho real para chegarmos a uma relação. Há honestidade, que nunca foi muito bem praticada, nem com os outros, nem connosco próprios. ‘O que é que realmente queremos?’ Ninguém o sabe ainda. Se o amor cega, o sexo turva a visão. Queremos aquele conforto do sexo ou a atenção romântica sem saber muito bem o que é que isso implica, ou exige. Deixamo-nos levar por moldes cinematográficos sem grande sentido crítico (ou outros moldes quaisquer) e esperamos coisas que podem nem fazer sentido. O desafio das relações inter-pessoais são a consequência de uma forma de desenvolvimento egoísta, individualista. Os gostos, as manias, os desejos, as crenças, as frustrações de cada um encontram-se com as dos outros. Ainda mais se mostra com a pessoa com quem nos deitamos numa cama, sem roupa, sem protecção, vulneráveis e simples. Mostramo-nos na beleza e podridão e esperamos que o vínculo se formalize, que se torne real, exactamente como o imaginamos. Os corpos dançam da mesma forma que a nossa imaginação cria e o nosso coração acredita. Se aceitamos a diversidade, em vez de uma história de amor prototípica, sabemos que podemos escolher entre outras opções. Há um certo nível de liberdade para concretizar alguns dos nossos desejos. Por exemplo, investe-se num relacionamento com o número de participantes que quisermos. O poliamor, o nome oficial, é praticado com toda a dedicação possível por aqueles que querem ter um manancial de pessoas com quem lidar, satisfazer e amar. Há quem ainda esteja no extremo oposto, com um parceiro, e que não acredita no sexo, nem o sente. São os novos relacionamentos assexuados que têm ganho adeptos. Espalha-se amor (e sexo se se desejar) por quem queremos espalhar, mas depois falta o relacionamento. O dia-a-dia que se torna aborrecido mas que se reinventa quando os envolvidos trabalham para isso. São níveis de intimidade distintos à medida que se caminha para à frente no relacionamento. Simplesmente assumir que a definição garante o desenvolvimento é errado. Nesta situação de maior vulnerabilidade (i.e. em relacionamento) luta-se contra o hiato de um dualismo que Descartes previu. A lógica racional e a loucura emocional explicam-se e discutem bastante pelo que acham que deveriam ser e aquilo que estão a sentir. Afinal, quem não tem medo de relacionamentos?
Tânia dos Santos Sexanálise VozesAté que a morte os separe [dropcap style=’circle’]A[/dropcap]os vinte e quatro anos vivi num daqueles países ultra-conservadores que, assim que descobriam que eu não tinha um namorado, muito menos um noivo, não se acanhavam em perguntar: ‘o que há de errado contigo?’. A falácia envolvia premissas à partida falaciosas: é solteira, ainda para mais mulher, e, por isso, deve ser insuportável. Tive a possibilidade de crescer num ambiente onde o casamento não é encarado como o passo mais importante da vida de uma pessoa e deixo-me sempre surpreender quando o é. Diz-se que é preciso arranjar um companheiro ou um namorado, mas melhor será um cônjuge. O que será das nossas vidas sem um papel que diga que estamos legalmente ligados a alguém, ou sem a formalização que (talvez) estamos prestes a criar uma família e garantir a continuação da espécie? Tradições judaico-cristãs que o incentivaram, sem dúvida, mas que podem traduzir-se na contemporaneidade por… romântismo. O que há de mais romântico do que a possibilidade de amar o outro até que a morte os separe? Muito pouco. Provas de amor verdadeiro, diz a cultura mainstream, envolve um anel e um pedido. Porque tu es especial, tu és o melhor que há, tu és a pessoa da minha vida. O sexo, por sua vez, tem uns certos momentos de susto quando pensa na exclusividade sexual até à campa. O sexo gosta de novidade, mas também gosta do à vontade e da familiaridade do mesmo parceiro. O sexo gosta de viver no paradoxo, enquanto que o amor tem uma opinião matrimonial muito clara. Este não é um tratado anti-casamento. Este é um tratado que defende a liberdade de escolha ao pedir a libertação de pressões, bocas e comentários de tudo e todos. Deixem as pessoas solteiras em paz. Por melhor que esteja comprovado que a solidão aumenta a mortalidade em 26%, não é muito claro se a mortalidade vem do stress que é ser solteiro e ter pessoas a chatear-nos a cabeça, ou se é porque podemos cair na banheira e morrer de traumatismo craniano porque ninguém nos levou ao hospital mais cedo. A ironia está que produzimos sociedades que incitam muito menos sentido de comunidade e cooperação, mas somos extremamente cruéis com os que foram ‘deixados para trás’. A alcunha usada na China para as mulheres que têm quase trinta e não são casadas ainda. Posso inventar razões possíveis, mas talvez, simplesmente, não se querem casar. Ponto. Para os lados mais europeus, a crise não tem dado muito apoio ao matrimónio. Se na China os homens precisam de um bom dote (i.e. uma casa totalmente paga), na Europa nem juntando os trapinhos e as esmolas se consegue comprar casa e começar uma vida. Já para não falar na festa de casamento, que não é barata. Ou mesmo na preocupação profissional extrema, que leva homens e mulheres a dar muito mais importância à satisfação profissional do que à necessidade dos votos. O casamento não é um mar de rosas, malmequeres ou orquídeas. Não se esqueçam que há desafios diários para o casal, os desafios emocionais e relacionais pagam as contas aos terapeutas conjugais. Hipoteticamente falando, o sexo fica aborrecido, as pessoas ficam chatas ou a rotina desgasta. Por alguma razão a taxa de divórcio está nos 70% em Portugal. Os outro 30% ainda vão dando o exemplo de boas práticas. O pessoal ama-se, quer-se e satisfaz-se na dança que regenera anos e anos de relacionamento. Porque o companheirismo alimenta o amor e vice-versa, pelas experiências românticas e pela possibilidade e compatibilidade de resolver qualquer obstáculo que apareça à sua frente. Um relacionamento a longo-prazo, sólido, vem naturalmente até certo ponto. Há trabalho por desenvolver, há investimento, compromisso e criatividade. Se as pessoas julgam que o casamento é o caminho certo porque é a escolha natural, desenganem-se. Estar solteiro pode ser um caminho natural também, solteiro com gatos e cães, solteiro com uma amante de vez em quando, solteiro com a namorada a longo-prazo: tudo pode ser natural. Porque a felicidade é o maior cliché de todos os tempos, sem estado civil associado.
Tânia dos Santos Sexanálise VozesCorpo e Corpos [dropcap style=’circle’]O[/dropcap]corpo, o veículo sexual, composto por partes e órgãos com o potencial nervoso para proporcionar dor e prazer, nunca terá sido tão contestado ou discutido como é agora. O corpo que erroneamente objectifica o que somos, apesar de redutor em perspectiva, não deixa de ser o nosso cartão de visita. Por isso, as aparências, por mais superficiais que sejam, continuam a pesar na forma como julgamos e agimos. Envolvemo-nos com quem achamos simpáticos, divertidos ou amorosos, ao mesmo tempo que os achamos atraentes, bem parecidos ou sexy. E porque estamos cientes dos vectores que levam à atracção e quiçá ao sexo, preocupamo-nos com nós próprios de formas mais ou menos obsessivas. Temos que nos sentir bonitos, temos que perceber o nosso corpo como atraente. O conceito de imagem corporal e as suas dinâmicas são recorrentemente referidos nos vários veículos de discurso público porque, vivem-se tempos onde existem problemáticas sérias na forma como vemos, sentimos e pensamos o nosso corpo. As doenças como anorexia nervosa ou bulimia poderão ser consequências graves para quem tem uma imagem corporal negativa. Estas são as condições extremas que merecem a atenção de especialistas, mas num grande espectro de gravidade menor, onde a imagem corporal negativa continua a trazer problemas, vivem-se os dramas do desfasamento daquilo que somos, aquilo que achamos ser e aquilo que queremos ser. Vivem-se tempos onde somos bombardeados por imagens de magreza extrema e exagerada de uma minoria populacional, quando ao mesmo tempo se luta contra a epidemia da má alimentação e obesidade. Vivem-se tempos onde ter rugas é pouco natural e ter pêlos nos sovacos sinal de pouca higiene. Vivem-se tempos de uma expectativa de beleza demasiado rígida e transversal a toda a população, quando no mundo pós-moderno nos definimos pela diversidade. Vivem-se tempos onde nos podemos fotografar e publicar para todos verem e, assim, receber os elogios que precisamos (que a nossa auto-estima precisa) e esperar que ninguém (na necessidade de melhorar a sua) nos ofenda, ou que gozem sem dó nem piedade, pela ‘imperfeição’ percebida. Vivem-se tempos onde há desafios públicos para provar a nossa magreza ou abundância de peito. Nas redes sociais chinesas, mulheres têm-se fotografado com uma folha de papel à frente para provarem que a sua cintura é mais estreita que a largura de um A4, antes disso, propunham-se a fotografar com uma caneta por baixo da mama, porque só quem possuía peitos generosos poderia aguentar a caneta assim mesmo – sem qualquer outra ajuda. Vivem-se tempos onde a imagem das mulheres (e suponho que dos homens também) são digitalmente alteradas para parecerem alguém, tão perfeitinho, que não existe. Vivem-se tempos onde os homens não estão livres de pressões de beleza e que ainda não estão à vontade para falarem sobre isso. Vivem-se tempos onde somos influenciados por um sistema que incentiva e perpetua todas estas percepções e padrões de comportamento. Vivem-se tempos onde existe uma pressão absurda de beleza sobre todos nós, os comuns mortais, que lutam contra (por vezes inevitáveis) lavagens cerebrais. Não é preciso ser um génio para rapidamente perceber que uma imagem corporal negativa traz consequências ao bem-estar físico e emocional. Esta percepção negativa de nós próprios traz desconforto e estranheza, olhar-se ao espelho torna-se uma tortura e estar socialmente com as outras pessoas será como exercitar meta-meta-cognição em loop ao constantemente reflectir: ‘será que estou/sou atraente?’. A ansiedade será controlada com actos ritualizados de constantes idas à balança, contagem de calorias diárias, planear começo de dietas quase todas as segundas-feiras (dietas absurdas sem hidratos de carbono ou gordura). A dificuldade será saber como parar estas dinâmicas, as forças sociais que controlam a nossa ligeira obsessão pelo irreal físico. Para que não nos rotulem de vítimas de um sistema, como podemos, afinal, travar o culto exagerado do copo?
Tânia dos Santos Sexanálise VozesGo China! [dropcap style=’circle’]S[/dropcap]em dúvida que esta foi uma semana especialmente e homossexualmente animada na China. Casos judiciais, hashtags no Weibo, e muitas vozes expressando-se pelo direito à igualdade foram proclamados pela comunidade LGBT chinesa, e não só. No Verão passado, Sun Wenlin e o seu companheiro Hu Mingliang, fizeram um ano de namoro e decidiram casar-se. A homossexualidade não é criminalizada na China desde 1997, nem é oficialmente considerada uma doença desde 2001. Se o preconceito ainda existe, e se ainda existem psiquiatras a administrar terapias de choque a homossexuais – porque pensam conseguir “curá-los” – garante-se que sim, é uma tendência opinativa que, infelizmente, ainda anda por aí. Este casal, contudo, fez história ao tentar oficializar a sua união: a proposta de matrimónio foi recusada e ainda foram bombardeados com sugestões tradicionalistas de que uma família pressupõe um homem, uma mulher e a possibilidade de ter filhos. Eles não fizeram mais nada e levaram o caso a tribunal, alegando que a legislação chinesa não proíbe o casamento homossexual nem explicitamente sugere que o casamento só pode acontecer entre um homem e uma mulher. A audiência aconteceu na cidade de Changsha, onde muitos membros da comunidade LGBT chinesa viajaram para apoiar a causa. Trezentas pessoas rodearam o tribunal e outras cem estiveram na assistência. Sem grandes surpresas, ao fim de poucas horas de audiência, o pedido de matrimónio foi recusado ao casal. Mas, Sun Wenli garante que vai recorrer as vezes que forem necessárias, porque, casar-se com a pessoa de quem gosta, é o que ele quer. É o que todos queremos. Todos reconhecem que isto de derrota teve muito pouco porque deu azo a um mediatismo e a uma mobilização estupenda, o que possibilitou a discussão entre todos. Foi o primeiro caso de tentativa de casamento homossexual na China, e, certamente, não será o último. O facto de ter sido discutido em contexto judicial, já é razão para alguma esperança. Afinal, foi com alguma surpresa que o casal e o advogado receberam a notícia que o estado de Hunan estava disposto a ouvi-los e aos argumentos a favor da sua união. A partir daqui as vozes multiplicaram-se pelas redes sociais e nasceu um hashtag que apela ao fim dos casamentos de fachada. Neste momento, imensas pessoas estão a dar a cara a esta trend e garantem que não irão cair em pressões societais ditas ‘normativas’. São homossexuais que não irão casar-se com heterossexuais para manter as expectativas familiares porque, afinal de contas, ninguém na parelha vai ficar muito feliz. Até os pais de filhos homossexuais têm deixado mensagens no Weibo a garantir que incentivarão os seus filhos a casarem com quem eles quiserem. Também muito recentemente, um trabalhador transgénero processou a companhia onde trabalhava por despedimento sem justa causa, ao revelar a sua preferência sexual e de género. O trabalhador em questão nasceu mulher, mas sente-se homem. Por isso, assim que começou a mostrar a sua verdadeira identidade masculina, foi acusado de não respeitar as regras do empregador. Foi despedido e agora espera um veredicto do processo em 45 dias, com a esperança de que o caso possa de alguma forma contribuir para o fim da discriminação dos transgénero no contexto laboral. Não podia estar mais orgulhosa, a China fez-me muito feliz esta semana. Se no ano passado a opinião geral era que só daqui a 20 anos poderia ver-se o reconhecimento dos direitos da comunidade LGBT na China, à luz destes micro-passos, parece que já não é uma realidade assim tão longínqua. Pode estar mesmo ao virar da esquina! Apesar de tudo, o sistema não está a desmotivá-los. Há legitimidade na luta que ainda mal começou. Desenganem-se se acham que as opiniões e acções discriminatórias são subtis. Têm havido outros casos de queixas relativas ao constante estigma, até em manuais escolares, ou censura, na televisão e na internet, que façam referência à homossexualidade. Ao que parece há 16 milhões de mulheres na China casadas com homens homossexuais. Não será altura de permitir a liberdade, e a felicidade, para quem a quiser aceitar?
Tânia dos Santos Sexanálise VozesEmbaraço [dropcap style=’circle’]A[/dropcap]s conversas de café podem ter níveis de profundidade diversos. Há conversas mais metafísicas, mais banais ou aborrecidas. Há conversas sobre o tempo e, dependendo do grupo de amigos que se decidiu encontrar numa esplanada, poderá haver uma ou outra conversa sobre sexo. O que se passou a seguir poderia fazer parte de um episódio de uma qualquer série de romance e/ou comédia. Falava-se sobre sexo descontraidamente e desprendidamente. Falava-se de imagem corporal e possíveis encontros amorosos. Caiu-se no cliché de até ter uma troca de dicas de maquilhagem e de revelar preocupações maioritariamente femininas. Uma delas sentiu-se na necessidade de partilhar um momento de embaraço que lhe tinha acontecido recentemente. Um visitante masculino faz-lhe uma visita surpresa no seu domicílio. Alguns entenderão que é chato ter uma visita relâmpago quando uma pessoa não tem tempo de se preparar para a chegada de outrém. O erro cometido, neste caso, foi o de deixar o estendal cheio de roupa interior a secar. Há olhares e constrangimento, pelo menos de uma das partes. O visitante semi-indesejado está à vontade de, contudo, fazer comentários. Aquilo que eram cuecas de conforto e dia-a-dia da nossa protagonista, são erradamente interpretadas como ‘os boxers do amante sortudo’. Não há sortudos, muito menos amantes, são as cuecas feias, grandes e de algodão que todas nós temos nas gavetas. Resultado: embaraço. Embaraço somente para ela, porque ela não foi capaz de lhe retribuir o desconforto ao confessar de quem eram as cuecas na realidade. Depois de uma confissão embaraçosa, outras deveriam vir atrás. Possuir este tipo de informação sobre alguém, momentos de concentração sanguínea nas bochechas, momentos de claro desconforto e reforço da fragilidade, é muitas vezes percebida como uma vantagem sobre os outros. A norma era agora que todos partilhassem momentos de embaraço e, surpreendentemente ou não, ao rodar a mesa de esplanada, tinham que ver com relações, paixões ou sexo. Divagações sobre o embaraço não serão especialmente desenvolvidas aqui, mas se não há uma psicologia do corar muito bem estabelecida, é porque é um tópico que dá pano para mangas. Das teorias psicanalíticas clássicas sobre o tema (cerca anos 30), temos a habitual (e estranha) explicação que o corar vem em reposta do medo e vergonha de castração nos homens, e a ausência de pénis nas mulheres: potencialmente legítimo. Da evolução temos mecanismos de comunicação não-verbal onde se mostra desconforto e a confirmação que muito provavelmente se fez porcaria: mais interessante. Os objectos, tópicos ou situações que nos fazem corar, esses é que são construções individuais daquilo que achamos ser certo e errado, em relação às expectativas da população em geral. Tópicos favoritos de embaraço em meios ditos ocidentais são sexo, movimentos intestinais e/ou menstruação. Das mulheres sei ainda que há embaraço quando não atingimos os padrões de estética exigidos. Os exemplos incluem pêlos indesejáveis, maquilhagem inexistente ou borratada até mulheres com o mesmo vestido numa gala (!!!). A lista é interminável. Facto: As mulheres têm um sofisticado mecanismo de limpeza e lubrificação vaginal. Facto: A vagina segrega o que tem que segregar. Facto: As mulheres andam com as cuecas sujas de corrimento. E há alguém que saiba de tudo isto? Embaraço. Vergonha. Esconde-se de tudo e de todos. Escondem-se as cuecas depois de despi-las. Num mundo ideal todas as histórias de embaraço fariam parte de um repertório de comédia, mas, às vezes, constituem um dramatismo tal que poderiam complementar enredos de filmes de terror. Talvez se não houvesse tanto embaraço, tivéssemos menos tanto tabu. E, se houver menos tabu haverá menos embaraço! Coisa curiosa, a condição humana, que de tanta consciencialização se inibe de expressão.
Tânia dos Santos Sexanálise VozesFuturista [dropcap style=’circle’]O[/dropcap]futuro que, envolvido em desconhecimento tenta despir-se de mistério através da nossa imaginação, é desvendado pelos tarólogos, videntes, autores de ficção científica e futuristas. Uns com maior margem de erro que outros, prevêem o futuro com as ferramentas que lhes estão disponíveis. Com alguma certeza se afirma que os futuristas são os mais sensatos nas suas previsões porque passam a maior parte do seu tempo em torno da reflexão do desenvolvimento tecnocrático em relação ao comportamento humano: e são pagos para isso. Se se podem esperar avanços tecnológicos na mundanidade do dia-a-dia, certamente presenciaremos inovações sexuais ‘digitais’ e ‘robóticas’, para além de todas as outras inovações que certamente terão impacto na forma como as pessoas se relacionam umas com as outras e, por consequência, na forma como o sexo será pensado e vivido. Se esta tendência de desenvolvimento trará máquinas de prazer imediato à lá orgamastron do Woody Allen: é provável que sim. Num futuro não muito longínquo, o sexo não será necessário para fins reprodutivos e por isso toda a função recreativa será enaltecida ao máximo. O sexo vai continuar a ser prazeroso porque o é, se será melhor ou pior, não fazemos a mais pequena ideia. Na qualidade de futurista sexual não-qualificada, diria que a tendência para uma sexualidade muito individualizada (para não dizer solitária) será generalizada. Em 20 anos conta-se com avanços tecnológicos suficientemente relevantes para, se assim desejarmos, adquirir robots de habilidades sexuais/românticas. Prevê-se que se desenvolvam formas de inteligência artifical capazes de proporcionar momentos de intimidade para não só oferecer orgasmos de qualidade, mas também palavras de conforto durante mimos pós-coito. Finalmente podemos criar o parceiro sexual à nossa medida. Na minha condição de futurista amadora, é-me difícil imaginar todo esse possível avanço como favorável à condição humana. O pessimismo corre-me nas veias e com isso vem a projecção de um futuro onde as relações humanas, que já são desafiantes em condições mais ‘normais’, possam ser descartadas por relações artificiais, que são muito mais fáceis de serem estabelecidas. Se queres um giraço com a voz do Paul Newman, que te diga coisas bonitas antes de adormeceres enquanto te abraça carinhosamente, podes tê-lo por uma generosa quantia e daqui a uns belos anos. Será que vamos passar mais tempo à procura do sistema artificial ideal do que do parceiro ideal? Se podemos talhar tudo o que queremos à nossa medida, haverá algum desejo de nos envolvermos com outros humanos, que são tão complicados, implicativos, mas, acima de tudo, reais como nós próprios? Se a tecnologia se estabeleceu para facilitar as nossas vidas, poderá chegar a um ponto demasiado facilitador que nos impossibilita de sequer bater com a cabeça em frustração? E se isso acontecer, será que vamos conseguir valorizar o bom sexo, o bom amante ou a boa intimidade? Mas até que o ‘robot encantado’ seja uma realidade, tem havido desenvolvimentos que até dão jeito. Há uma maior preocupação em educar e esclarecer, que tem incentivado a criação de apps e sites de auto/hetero-descoberta. Ou até o auxílio masturbatório tem sido alvo de grande criatividade. O Autoblow 2 é um exemplo de avanço tecno-sexual, onde um fellatio pode ser simulado, não por um tubo de borracha sem graça, mas por um complicado mecanismo de sucção e movimento que pode proporcionar o melhor fellatio das nossas vidas (parece uma explicação simplória, mas a geringonça é de uma sofisticação nunca antes vista). Outro avanço que me tem fascinado mais ainda, veio preencher a vida dos casais em relacionamentos à distância. Os ‘teledildonics’ são brinquedos sexuais que podem ser controlados remotamente, permitindo, assim, o proporcionar de momentos sexy entre o casal, mesmo que geograficamente separados. A esperança é que esta revolução silenciosa se estabeleça a seu tempo, e que a adaptação seja igualmente gradual. Porque ninguém sabe qual é o verdadeiro futuro do sexo.
Tânia dos Santos Sexanálise VozesQuem foi, foi [dropcap style=’circle’]Q[/dropcap]uem foi outrora um amante e o deixou de o ser, junta-se à colecção daqueles que deixámos para trás, mas que, ainda assim, preenchem histórias e as memórias românticas/sexuais de uma vida. As separações e os divórcios vão acumulando um manancial de pessoas popularmente conhecidas por ‘ex’. Pessoas com quem partilhámos grandes momentos de intimidade, sem roupa, com gemidos, outros sorrisos e às vezes choros. E agora já não se partilha: é a morte do conjunto, da sinergia. O fim de relacionamentos românticos traz a dor de perda e a necessidade de um processo de luto, com a excepção que ninguém morreu, só o relacionamento. Morrem relacionamentos, partem-se corações, fala-se de dor e chora-se (bastante) por ela, perdemo-nos em ataques de ansiedade e em negativismo. A vida nunca será a mesma. E com corações partidos criam-se mundos de vidas, de músicas, literatura e arte. Não só pela necessidade de ventilação pelo criador, mas pela partilha que poderá levar a tantos outros corações a se sentirem entendidos. Há sempre corações a precisarem de cura. Independentemente da duração do relacionamento, cada um de nós desenvolve-se e cresce em função desta ligação que apareceu com a mais bela história de amor e de sexo e que, por várias razões, pode torna-se num thriller de ansiedade e tristeza. Acabar com um relacionamento traz dificuldades emocionais, por mais psicologicamente apto que uma pessoa se possa sentir. A nossa identidade é moldada e incorporada na coisa que se cria. A coisa que se cria é uma vida a dois que, ao terminar, obriga a um renascimento individual. Torna-se num período de negociação de identidade, e o luto não é só do desaparecimento do outro, mas do desaparecimento de si próprio com o outro. Não admira, portanto, que mesmo com relacionamentos que estejam com os pés para a cova e a morte esteja mais do que anunciada, que a tristeza persista. Para os não-pessimistas a cisão permite mudança e oferece-nos liberdade para fazermos aquilo que nos dá na gana. Mas o desconhecido não deixa de ser o desconhecido, nem deixa de ser assustador para muitos. O que deixámos no passado são pessoas que muito provavelmente nos tocaram nus e com quem fodemos continuamente. Por isso, para além de um coração partido temos um sexo destroçado. Os órgãos nunca mais se tocarão, os corpos nunca mais se enrolarão nos lençóis que trocaram em conjunto. Porque se há um coração em sofrimento e uma cabeça num constante diálogo interno de raiva, insatisfação e de auto-comiseração, o sexo demorará a encontrar uma nova via de expressão. Depois de um hábito sexual, por mais excitante que seja diferença, o sexo sente-se arrancado do conforto que é estar com alguém de quem se gosta e de quem se conhece as manhas (sexuais). Os popularmente conhecidos como ‘rebound’ são aqueles engates de pouca ligação emocional: uma ligação estritamente sexual na esperança que o acto faça esquecer o anterior amante e amor. O problema, e muitos esquecem-se disso, é que não se trata de uma forma de resolução eficaz, bom sexo não vai cuidar uma ferida emocional da mesma forma que um sentimento de satisfação pessoal vai em muito influenciar sexo potencialmente espectacular, ou seja, alta auto-estima resulta em sexo fantástico, mas sexo fantástico não vai necessariamente contribuir para um aumento de auto-estima, especialmente quando nos sentimos emocionalmente debilitados por uma separação. Se há dicas para emocionalmente ultrapassar separações, com alguma certeza afirmo que não há dicas para o luto sexual por aí. O pénis e a vagina precisam de ser ouvidos e entendidos, de alguma forma. No remoinho maniaco-depressivo onde o coração e o cérebro se encontram em permanente conflito, quanto espaço o sexo precisa?
Tânia dos Santos Sexanálise VozesAlguns factos (no feminino) [dropcap style=’circle’]E[/dropcap]stes não são os segredos do sexo no feminino, esses deixo ao critério de cada um descobri-los a seu tempo. E quando eu digo descobrir, refiro-me à contínua exploração que, na individualidade e em conjunto, deve ser exercitada e promovida. Há, contudo, informações sobre bem-estar sexual que merecem alguma atenção. Aqui vai uma pequena nomeação de factos no feminino, para a mulher emancipada e para o homem que a acompanha. Menstruação Dizem os estudos, e até a cultura popular, que os homens não têm grande interesse em envolver-se no acto sexual quando o ‘Benfica joga em casa’. Não há grande mistério nisso. O que os estudos também mostram é que as mulheres estão muito mais propensas a atingir o orgasmo em dias mais sangrentos. Para além de que, para curar dores menstruais incomodativas, não há eficácia que iguale os orgasmos, uma forma não-medicamentosa para ajudar ao bem-estar. Ademais, e tentando não ser muito gráfica, este é um período especialmente lubrificado. Mas, é claro, percebe-se a aversão. O cenário pós-sexo em menstruação mais facilmente se assemelhará a um cenário de chacina. Recomenda-se o evitamento de lençóis brancos e talvez vislumbrar a possibilidade de gozar o tempo em conjunto na banheira, com superfícies muito mais fáceis de serem limpas. Compreendo que pondo assim as coisas, o sentimento gore e sangrento continue a ser impossibilitador. Contudo, a menstruação é normalíssima. Vivam com isso, os dois. Vibradores Os vibradores foram criados como terapêutica para a histeria. Para quem não sabe, a histeria caracterizava-se como uma popular condição psicológica exclusivamente feminina durante o séc. XIX, de sintomas somáticos fortes. A razão seria uma má resolução sexual e por isso teria que ser compensada com artefactos. Actualmente, vibrador é o brinquedo sexual por excelência e o bestseller de qualquer sex shop pelo mundo. Os inquéritos sugerem que as mulheres começam a considerá-lo como um objecto doméstico essencial, para as solteiras e as casadas. O aspecto ‘sketchy’ das sex shops é que ainda impedem uma frequência mais normalizada. Espera-se que sempre que mulheres (ou casais) comecem a exigir um serviço de vibradores especializado e de qualidade, o estigma associado a usuários de lojas de sexo decairá. Quanto mais comum, mais normal se tornará. Porque as possibilidades para um vibrador na vida amorosa do casal são quantas as que queremos ter. Duas palavras em interrogação: Penetração dupla? A careca lá em baixo Os pêlos púbicos são agora, mais do que nunca, alvo de grande desdém. O que começou por uma prática feminina espalhou-se para uma prática masculina também. Em certos círculos sociais, quanto menos peludos na zona genital, melhor. A preferência começa a ser cada vez melhor disseminada graças à pornografia e à disponibilidade de casas de depilação que prometem um serviço pêlos free. Há quem se sinta mais limpa(o) ou higiénica(o) com os seus genitais descobertos do arbusto que a puberdade fez crescer. Mas qualquer que seja a preferência é sempre bom insistir que os incomodativos pêlos existem como uma barreira protectora de infecções e inflamações, e que por isso a sua ausência expõe alguma vulnerabilidade. Agora que os cavalheiros ficam contentes com uma careca quando o trabalho é oral, isso, sem dúvida. Diz-se muito mais confortável. Clitóris Essa discreta pontinha alimentada por sensivelmente 8000 nervos é causadora de muito prazer e não pára de crescer. Sim, quando se chega aos 80 anos o nosso tão especial orgão sexual estará 2.5 vezes maior do que na purbedade. Diferenças pouco visíveis mas que poderão justificar o sexo fantástico das senhoras octogenárias. Não esquecer que é o único órgão no corpo da mulher dedicado exclusivamente ao prazer e ao orgasmo (o ponto G é um candidato ao mito urbano) e por isso há que tratá-lo bem, e o parceiro que se encarregue dos cuidados também. Para a semana há mais.
Tânia dos Santos Sexanálise VozesInfidelidade [dropcap style=’circle’]O[/dropcap]que é a infidelidade e de que forma é tolerada, ultrapassada ou pura e simplesmente recusada no âmbito de um relacionamento romântico e sexual? A psicologia evolutiva preconiza que os homens e as mulheres perceberão como problemática a infidelidade de forma distinta, caindo, por isso, noutro cliché de género. Os homens ficarão mais magoados por saberem que o seu parceiro(a) se envolveu sexualmente com alguém, enquanto que as mulheres ficarão mais magoadas por saberem que o seu parceiro(a) nutre sentimentos românticos por outra pessoa. Ademais, diz a disciplina que há razões evolutivas para os homens procurarem relacionamentos extra-conjugais, enquanto que as mulheres terão mais vantagens em permanecer em relações monogâmicas. Uma matemática simples, mas complicada de concretizar, se os homens e as mulheres procuram na natureza da relação coisas completamente diferentes, algum dia encontrarão compatibilidade? Se há casais felizes por esse mundo fora é porque muito provavelmente encontraram um consenso em relação a muitas coisas, em especial, de como a relação extra-conjugal é entendida. Como defensora de explicações não-redutoras de qualquer fenómeno, parece-me vantajoso dissecar ao tutano este diálogo relacional, no âmbito pessoal e científico, da significação do sentimento de traição por quem vê o seu amado envolvido numa outra relação íntima. A infidelidade, a traição ou adultério envolve-se de complexidade cognitiva, relacional e social. O relacionamento ‘extra’, como é encarado de forma polémica, mas não obstante, de uma forma muito sensual, preenche a imaginação dos criadores consumidores de literatura, cinema e… de telenovelas. A combinação de sensualidade, rebeldia e dramatismo transforma qualquer história aborrecida em qualquer coisa mais aliciante – escandalosa! E são estas as histórias e outras práticas que invadem a modelação de atitudes e de práticas (extra) relacionais. Com a imperativa diversidade que para aí anda, diria que a construção ideológica do sexo e do amor (e as suas dissonâncias) que cada um de nós carrega resultará em assumpções não-universais da infidelidade. A habitual assumpção de que a causa da procura do outro para além da díade provém de um descontentamento relacional, pode ser contestada. Muitas vezes, não se vai à procura de outra pessoa porque o relacionamento sente falta de qualquer coisa (sexo?). O descontentamento não está no outro, mas em si mesmo. O descontentamento em relação ao que somos e fazemos é o maior propulsor pela procura exterior de novidade. O desconhecido incentiva a nossa reinvenção e inovação. A consequência, sim, pode ser um relacionamento quebrado e desentendido, que poderá ser reinterpretado, arranjado ou esquecido. O melhor que as pessoas envolvidas podem fazer por isso. Há por aí uma senhora, uma terapeuta conjugal, que é muitas vezes convidada a falar em palestras sobre a questão da infidelidade: Esther Perel. Na sua descrição de ‘porque é que casais felizes traem?’ chegamos à conclusão que a infidelidade não tem anda que ver com as nossas ideias pré-concebidas. Da sua experiência com casais que sofrem com a descoberta que existe uma terceira pessoa, o relacionamento passa por uma transformação que até pode ser bastante positiva para o casal que quer salvar o seu relacionamento. Ou pode ser positiva também para o casal que decide terminar e seguir com as suas vidas. Afinal, a infidelidade, por pior que seja para diferentes pessoas, até pode ser uma abertura para discutir o relacionamento, se assim o quiserem, constituindo a rotura necessária para o novo começo. De relembrar, contudo, que os relacionamentos extra-relacionais podem ser não dramáticos quando fazem parte do acordo entre casal. Amante(s) podem ser a norma e não a disrupção: tudo por casais felizes.
Tânia dos Santos Sexanálise VozesVício [dropcap style=’circle’]I[/dropcap]maginem aqueles momentos mágicos. Momentos de um romantismo desproporcional à vida real. Coisas que só se vêm em filmes, mas que acontecem, todos nós já ouvimos histórias destas. O destino fez com que se encontrassem de novo, depois de uma breve troca de palavras no metro. Ela não tinha dinheiro trocado para pagar o bilhete, ele dá-lhe o que ela precisa, tudo será melhor do que ser apanhada sem bilhete por revisores. Exactamente uma semana depois ela vê-o a passear pela baixa da cidade. A consciência fez com que ela pagasse o dinheiro de volta, e, aí, falaram. A partir desse momento o mais semelhante será pensar no enredo do filme Before Sunrise. Ele ia-se embora em breve e ela também, aquela foi a cidade de encontro como poderia ter sido outra qualquer. Falaram imenso e rapidamente perceberam que tinham tudo que ver um com o outro. Há quem chame destino. Um ano depois ela está na mesma cidade exactamente no mesmo período e decide contactá-lo. Porque esta era uma cidade que ele regularmente visitava, ele estava lá. Tudo que fazia esperar um reencontro carinhoso mostrou-se surpreendentemente desconfortável. Não foi romântico, não foi excitante, não foi nada do que ela estava a espera. Foi aborrecido de uma atracção forçada, por ele. Ela já não aguentava mais. Só queria sair dali, a desilusão era demasiado grande. Um ano de fantasias românticas onde objecto de desejo fora sempre ele, e, agora, cara-a-cara, a incompatibilidade era demasiado óbvia. O romantismo foi com os porcos. – Sou viciado em sexo. – Ok… – Não podemos sair daqui sem ir para a cama. Ela pensou que este era um exagero de um argumento. Como já seria de esperar, ele perdeu qualquer hipótese de envolvimento sexual, porque, no fim de contas, a excitação dela vinha de todo romantismo que o encontro tinha despertado. A intriga para um encontro racional tão estúpido como aquele fê-la ficar para falar sobre isso, em vez de lhe dar um estalo e sair dali. Um hipersexual ou um viciado em sexo é alguém que tem uma vida sexual exageradamente activa. Define-se, por isso, pela prática excessiva de qualquer actividade que envolva excitação sexual: pornografia, masturbação ou sexo (muito frequente e com muitos parceiros diferentes). Como se tratam de actividades normais por si só, tabelar uma frequência patológica não é fácil. Contudo, quando o sexo é utilizado como um regulador emocional e, acima de tudo, pela sua constante prática, torna-se num obstáculo à vida normal, torna-se num problema. Ninfomania nas mulheres e satiríase nos homens. Porque é que a criatura masculina nesta história quis sugerir uma patologia para convencer a rapariga a ter o que queria, parece absurdo. Será que estava à espera que a piedade funcionasse como excitador sexual? ‘És doente do sexo, coitadinho, deixa-me compensar-te com… mais sexo’. Ou talvez ele estivesse à espera de um cenário ‘enfermeira sexy’ pronto para o ajudar. Ou talvez procurasse justificar-se, esta poderia ser a explicação do forçar de química inter-pessoal e a causa para o desastre do segundo encontro. A sensibilidade para casos de hipersexualidade ainda é mais necessária se considerarmos quão difícil é definir normalidade sexual. E foi isso que moveu a rapariga a explorar aquele discurso sem sentido, especialmente porque ela viu o seu conto de fadas ser destruído por completo. Mas ele mentiu. Ele só queria despertar a atenção de alguma forma. Se o vício era real ou não, ele definitivamente não pensava em outra coisa.
Tânia dos Santos Sexanálise VozesSexo Musical [dropcap style=’circle’]D[/dropcap]epois da literatura há três semanas atrás, pareceu-me oportuno explorar o sexo na música. Porque, curiosamente, é uma forma artística de contornos sexuais pouco claros, ou seja, não há características óbvias sobre o que é música sensual/erótica/pornográfica. Formas artísticas visuais são mais fáceis de ser entendidas como tal. Exemplo: pénis ou vulva à vista mais facilmente se encaixam na categoria. Só me vem à cabeça excepções relacionadas com aulas de anatomia, e isso, para a maioria das pessoas, not sexy at all. Parece-me que não há um mundo a descobrir de música potencialmente auxiliadora de actividades masturbatórias ou sexuais. E se ninguém anda à procura, não haverá oferta. O que poderia ser considerado como música pornográfica? Sons sexualmente excitados (à lá música do Serge Gainsbourg: Je t’aime, ohhhhhh, oui, je t’aime… moi non plus) E gemidos, muitos gemidos e, quiçá, um orgasmo. Talvez a calma sensual de um saxofone ou a brutalidade de uma percursão de sensação latejante, equiparada com aqueles momentos em que uma pessoa só quer ser encostada a uma parede e deixar-se levar por muito, mas muito, tesão. Pensei que a minha melhor hipótese fosse na procura de pornografia para invisuais: mas só encontrei descrições audio de filmes já existentes, nada de muito musical. Por isso, se não há um género claro, o pessoal possui imaginação suficiente para tornar música, até a menos óbvia, parte da sua sexualidade. Os mais arrojados consideram as suas listas de uma sensualidade indiscutível! E por isso publicam listas de músicas sensuais por aí. Ou… ‘a lista das melhores músicas para fazer striptease’, ‘lista das melhores músicas para aquecer corações’, ‘lista das melhores músicas para lubrificar o sexo’ e muitas mais. Eu que me julgo uma esquisita musical, de universal estas listas têm muito pouco. Mas uma coisa é certa, a música vive do sexo e da sensualidade para se tornar popular e rentável. Basta ligar aquele site com uma invejável colecção de vídeos de música e clicar em qualquer actual canção pop para nos depararmos com maminhas a saltar de decotes, troncos nus de muito músculo, rabos semi à mostra, graciosamente, a fazer o twerk (movimentos de anca ultra rápidos) e os constantes eufemismos para sexo. Existem ainda os projectos musicais que se dedicam exclusivamente ao tema, nas suas letras de pormenorizada descrição sexual. Talvez não necessariamente sexualmente excitante mas sem dúvida classificada como ‘sexo na música’. O termo técnico é pornogrind que acompanha outros géneros bastante pesados usando uma linguagem bastante explícita. Para os que desejam algo menos óbvio, mas ainda bastante relacionado com sexo, existe o porn groove, um estilo de música bem estabelecido nos anos 70 durante o boom da indústria pornográfica, que precisava de uma banda sonora característica. Uma guitarra minimalista, mas com um bom feeling, acompanhada por um pedal wah-wah. É interessante pensar que há sons ou músicas que despertam uma sensualidade sem igual. Acredito que todos nós tenhamos ‘aquela’ música que cria uma sensação de friozinho na barriga e um lamentar por não ter um namorado ou namorada. Pode ser vista como construção muito personalizada de sexualidade, tipo, condicionamento clássico do cãozinho do Pavlov. O perigo é que estas nossas preferências podem chocar com os gostos musicais do parceiro ou de outras pessoas em geral. Quando o Rui Veloso canta ‘não se ama alguém que não ouve a mesma canção’, ganha todo um outro sentido se pensarmos que a incompatibilidade musical possa ser exposta em momentos de intimidade. Pensem nas vossas listas, peçam outra ao parceira/o, comparem-nas, ouçam-nas e desfrutem. E claro, quando acharem necessário, façam a vossa própria música.
Tânia dos Santos Sexanálise VozesContracepção O grito de liberdade sexual veio com os desejados métodos contraceptivos. Finalmente decisões poderiam ser tomadas relativamente à prática sexual e à gravidez indesejável. Assim chegou-se à era do gozo sexual não necessariamente procriativo que em muito contribuiu à revolução sexual do último século. Mas os métodos contraceptivos não são sexy per se (e escrever sobre eles também não será). Fazem parte de uma sexualidade saudável, sem dúvida, mas por alguma razão ainda falham. Falham porque ainda há gravidez adolescente e porque as doenças e infecções sexualmente transmissíveis continuam a ser espalhadas por aí. A variedade de métodos é extensa: preservativo masculino e feminino, DIU, diafragma, esponja vaginal, terapêuticas hormonais (pílula, anel vaginal, implantes, patches), vasectomia ou laqueação de trompas. Escolhas que deverão ser personalizadas de acordo com idade, actividade sexual, estado de saúde geral, etc. Todos estes métodos têm uma percentagem de eficácia diferente, portanto, alguns são mais falíveis que outros, mas só o preservativo é capaz de travar infecções indesejáveis. Aliás, o preservativo foi inventado exactamente na prevenção da Sífilis durante o séc. XV. Assemelhava-se a uma meia de vidro desbotada e era feito com paredes do intestino grosso de diferentes animais. Depois vieram os produtos sintéticos que trouxeram o preservativo de latex que conhecemos hoje, no início do séc. XX. Todas as campanhas que divulgam o uso do preservativo, tentam apelar pela utilidade do dito cujo. Quase não se sente, protege-nos de STD’s, impede a gravidez indesejável: perfeito. O preservativo deve ser usado s-e-m-p-r-e, não há dúvidas disso. O que se esquecem de dizer é que às vezes pode ser desconfortável ou pode desfazer o tesão, i.e., o brochar o orgão sexual masculino. Há os que se recusam, os que não conseguem, os que não gostam e os que desenvolvem profundas crenças que incentivam o seu não uso. Como contornar a questão? Não é fácil. Em relacionamentos que se prevêem de longa-duração, poder-se-á optar por uma vida sexual sem preservativo depois dos devidos testes de sangue serem feitos. Em qualquer outra situação o uso deverá ser obrigatório, e o pessoal que não se arme em esquisito. As tentativas de tornarem o preservativo um pouco mais atraente levou a que as marcas conhecidas do mercado fizessem variações do produto, ora com sabores, ora com texturas, ora com cores. Não há grandes desculpas para justificar a sua ausência, mas a verdade é que o sexo é significativamente melhor sem. Há uma maior proximidade ao vosso apaixonado/a porque não há barreiras absolutamente nenhumas entre a intimidade de um e de outro. Por isso para os que podem, e já mostraram não ter nenhuma doença nefasta a transmitir, ultrapassa-se o uso do preservativo para métodos exclusivos a prevenção da gravidez. O normal é para a mulher começar a usar a pílula, ideal para quem é organizado e pouco esquecido, e basta tomar um comprimido por dia (exceptuando durante a menstruação) e não incomodar a normatividade do acto sexual em si. Até aqui, parece tudo bem. Acontece que outros efeitos secundários podem advir, afamados desiquilíbrios emocionais, e até conheço pessoas que desenvolveram ataques de pânico. Isto na pior das hipóteses, porque depois há problemas de cariz menor, tipo celulite e retenção de líquidos. A contracepção não é um mar de rosas, mas o que tem de ser, tem muita força. Contudo (e felizmente) começaram a ser testadas formas de ‘pílula’ masculina não hormonais, e, por isso, sem alterar os ciclos naturais. As opções são diversas e os projectos ainda se encontram numa fase embrionária, salientam-se: 1.injecção para bloqueio dos canais de transporte de esperma, uma quasi-vasectomia menos invasiva e reversível; 2. Medicação para não permitir os espermatozóides de fertilizar o óvulo; 3. Medicação para alterar a capacidade de locomoção do esperma. A vantagem é que com uma maior possibilidade de contraceptivos masculinos, a responsabilidade e preocupação contraceptiva não ficará totalmente nas mãos da mulher. Espera-se que seja um tema que possa ser discutido pelo casal e em cooperação, percebendo as vantagens e desvantagens de cada método. Visto que a maioria dos produtos de contracepção são para mulheres, há uma tendência natural para julgar que as precauções contraceptivas são maiores para quem de facto carrega uma barrigona por 9 meses. Mas visto que ‘takes two to tango’ a responsabilização pela outra parte também é necessária. O investimento em novas formas de contracepção trazem a esperança de formas mais eficazes de prevenção e uma muito desejada consciencialização social.
Tânia dos Santos Sexanálise VozesLiterariamente pelo sexo [dropcap style=’circle’]N[/dropcap]o seguimento dos incentivos à masturbação, vêm os facilitadores de erotização que hoje em dia são de muito fácil acesso – nomeadamente a pornografia. Mas porque incentivos visuais não podiam ser mais óbvios, sugerem-se alternativas. Os movimentos pró-leitura são infindavelmente úteis, e não vi razão porque não devesse pregar o uso literário para satisfazer não só a nossa sede de conhecimento, mas também o nosso desejo. A tese é de que usar literatura para fins masturbatórios ou simplesmente para exercícios de imaginação erótica será muito mais saudável, porque pelo menos é complementada pelo desenvolvimento de capacidades linguísticas. Há leituras sexuais para todos os gostos, não há necessidade de serem categorizadas como brejeiras, rascas, ou sem gosto. Há alguma memória de ver em quiosques portugueses uns livros de capa cor-de-rosa e de pessoas bem aparecidas (demais), de qualidade literária duvidosa, mas de expressão sexual suficientemente potente. O estereótipo tem tendência a colar-se às donas de casa desesperadas que vêm as suas fantasias satisfeitas com suas secretas leituras. Mas juntando o útil ao agradável, porque não envolvermo-nos na arte das letras (melhor desenvolvida) com excitantes descrições de sexo? Por uma experiência intelectual e sexualmente estimulante. A lista de autores de escrita erótica é extensa, o meu conhecimento em relação aos ditos autores talvez seja mais limitada. Todos os géneros literários encontram-se erotizados, temos manuais de sexo (e.g. Kama Sutra), romances, poesia, biografias, autobiografias. Desde já garanto uma diversidade na explícita sexualidade, por isso, certamente existem autores adequados a cada um de nós. Muito provavelmente uma boa procura seja imperiosa. Deixo aqui poucas (mas boas) sugestões: D. H. Lawrence – Um pioneiro no eroticismo literário, a quem fora outrora acusado de ter desperdiçado a sua carreira em pornografia barata. Nonsense. D. H. Lawrence quis explorar emoção e comportamento humano à sua última consequência, e por isso, não deveria ser o acto anti-obscenidade a pará-lo. O mundo foi-lhe tão cruel que até nos obituários a ele dedicados mostraram antipatia e hostilidade. Mas a ele agradecemos a coragem e convicção. Quem agora o lê, dificilmente se chocará com o seu conteúdo, mas uma boa referência para quem gosta do setting de há dois séculos atrás. Henry Miller – Um grande fã de D. H. Lawrence, quis deixar um legado erótico-literário, mas zangado. Entre várias obras eróticas, o ‘Trópico de Câncer’ passa-se em Paris, onde o autor viveu momentos especialmente boémios. Uma reflexão sobre a condição humana de uma brutal sexualidade, sem freio, nem filtro. Para quem tem interesse em pesquisar as diferentes formas de nomear e descrever o órgão sexual feminino. Anaïs Nin – Amante de Henry Miller (muito conveniente, muita prática inspirativa) deixou literatura erótica, porque, apesar de uma curiosa pelo sexo, havia uma coleccionador que pessoalmente lhe encomendava estórias (bem pagas). O ‘Delta de Vénus’ é um conjunto dessas mesmas estórias, com descrições femininas em conteúdo e em perspectiva. Depois de só homens explorarem (e arreliarem meio mundo com) a considerada ‘vulgaridade’, Nin torna-se na pioneira do sexo oposto, na procura erótica das palavras. As vantagens de nos debruçarmos na leitura para exercício imaginativo sexual traz várias vantagens, mas há uma que me vem à cabeça assim de repente: é silencioso! O ideal para quem partilha casa e não quer pôr headphones para ouvir arfejos exagerados. E depois, claro, o produto final imaginativo torna-se numa co-produção entre o escritor e o leitor. Há espaço para tornar a experiência nossa, adicionando aqui e ali pormenores reflectores da nossa individualidade, por exemplo: ajustar tamanhos de mamas, pôr mais ou menos pêlos no peito do rapaz, imaginar-se um vouyer ‘real’ do encontro ou, mesmo, imaginar-se um elemento extra. O problema é que se a leitura tem como consequência a masturbação, ocorre-me alguma dificuldade com a posição das mãos, pegar no livro e/ou virar a página e carícias genitais. Problema logístico. Talvez ultrapassável se se usar uma estante? Deixo ao critério criativo de cada um. Acima de tudo, votos de motivação literária. Leia-se mais.
Tânia dos Santos Sexanálise VozesCorn Flakes e Masturbação [dropcap style=’circle’]P[/dropcap]arece que o senhor Kellogg era uma activista pela cruzada anti-masturbação e foi isso que o motivou a criar os favoritos cereais de pequeno-almoço. Corn flakes são uma tentativa de criar uma alimentação nutritiva, mas isenta de luxúria. Porque a luxúria nos alimentos, ou seja, comida saborosa, aumentaria a energia sexual dos jovens, levando-os a tentar o prazer sexual, se não com os outros, com eles próprios. A guerra contra a masturbação sempre foi feroz. Com os mitos que gerações mais antigas tiveram que levar: masturbação faz crescer pêlos nas mãos (assim saberemos quem anda a gozar-se nos seus tempos livres) ou pode cegar. Se o acto sexual continua envolto em tabu, a masturbação parece que está em piores condições. A masturbação masculina parece que é um lugar mais comum, uma conversa mais frequente, e a feminina menos disseminada. Sim, sim, as mulheres masturbam-se. Aliás, a ideia de que os genitais trazem prazer pode ser entendida em muito tenra idade, e é muito normal. Contudo, mesmo que já não haja uma força tão grande a reforçar mitos sem sentido sobre a masturbação, ainda há um sentimento de condenação. Uma força de tradição judaico-cristã que não aceita a individual legitimidade para o prazer – o prazer sexual ainda menos. Mas a masturbação é importante. Os programas de educação sexual ou qualquer discussão sexual ainda não conseguem incluir a masturbação e as suas vantagens de uma forma mais integrativa ou abrangente. Os depoimentos e registos de terapeutas conjugais no mundo ocidental apontam para a relação entre as dificuldades sexuais do casal e a forma como a masturbação é vivida. Porque encontrar o parceiro das nossas vidas não garante o sexo das nossas vidas – se não soubermos comunicar sexualmente de uma forma eficaz. Praticar masturbação é perceber o mapa sexual e orgásmico do nosso corpo e assim, saber o que é preciso para ter prazer com o outro. Comunicar com o outro. E quando eu digo comunicar, não quero tirar todo o tesão da coisa ao sentar o casal em frente de uma mesa de centro a beber um chá enquanto verbal e mecanicamente se discute os caminhos para o orgasmo (pode resultar para alguns). Mas fica a sugestão de masturbarem-se à frente um do outro. À vez. Não? A anatomia masculina tem a vantagem de que está ali pendurada, à boa vista e de muito fácil exploração. A feminina está menos acessível, só uma mulher com uma flexibilidade extraordinária é que poderia olhar a sua vulva ‘nos olhos’, mas ao tocar-se, ao olhar-se ao espelho perceberá qual o seu aspecto – e ajudará a perceber as suas anomalias, em caso de doença. As vantagens da masturbação vão ainda para além de uma sexualidade saudável, está provado que ajuda relaxar, cura dores de cabeça, pode ajudar a descongestionar uma sinusite e ajudar mulheres a terem menos dores menstruais. Ademais, o uso de vibradores e das bolas Ben Wa ajudam no exercício das paredes da vagina que previnem problemáticas como incontinência. Masturbação é tudo de bom. O momento de descoberta sexual começa com a estimulação dos genitais, que continua com o exercício imaginativo daquilo que nos excita, agrada e entusiasma. Muitas vezes este processo é acompanhado por materiais mais visuais do que a simples imaginação (mas já escrevi que baste sobre a pornografia). Não há perigos reais de uma masturbação excessiva (para além de pele irritada, talvez). Mas se usados (constantemente) os mesmos padrões de fantasias para a excitação, podem levar a uma dependência psicológica que, quando se está finalmente com outra pessoa, podem ver as suas fantasias não correspondidas. O problema nunca será pela masturbação em si, mas pelas formas de excitação associadas. Mas se alguém se masturba sempre a pensar em pés, quando se apresenta para sexar e o parceiro não acha graça nenhuma que lhe toquem nessa zona do corpo, pode sentir-se alguma incompatibilidade/insatisfação de ambas as partes. A masturbação é vista como um acto individual, mas que na sua privacidade permite uma abertura bastante frutífera para a sexualidade no geral. A analogia que me foi descrita é de um atleta a praticar para uma competição desportiva. A masturbação é uma forma de prática para o derradeiro momento, portanto deverá ser ajustada entre a sexualidade individual e a sexualidade com o outro. A masturbação permite um tempo valioso de descoberta pessoal, mas também de descoberta do que gostamos no(s) outro(s), aquele admirável mundo novo do sexo que ainda por aí. Há quem ainda sugira momentos de masturbação ‘mindful’ onde deverá ser criado um momento de total intimidade connosco próprios. Se for preciso pôr velinhas, que se ponham velinhas e incenso e música romântica! A relação dos corn flakes com a masturbação é nula, com a excepção de que há por aí muitos comedores de corn flakes que provavelmente se masturbam. O senhor Kellogg que nunca o descubra.
Tânia dos Santos Sexanálise VozesO Paradoxo da Intimidade [dropcap style=’circle’]A[/dropcap] intimidade é daqueles pilares relacionais que não pode ser dispensado. É a parede mestre dos relacionamentos românticos. Intimidade, eufemisticamente, refere-se a sexo, ao mesmo tempo que se refere a proximidade, familiaridade e muito à vontade com o outro. A isto se deve à nudez, às caras de sexo, aos orgasmos, a histórias de infância, a traumas, a choros, a sorrisos e às confissões nunca antes partilhadas. Esta é a porta que permite a entrada do outro aos recantos mais sombrios do nosso ser. O Sr. e Sra Perfeitos deixam de fazer sentido à medida que a intimidade cresce. Porque estas zonas mais negras, mais sujas e vergonhosas, são normalmente partilhadas e expostas no desenvolver da relação. As nossas imperfeições e dificuldades tornar-se-ão (idealmente) objectos de amor. Todos nós queremos ser reconhecidos e adorados exactamente como somos, podres incluídos. E o que somos nós? Somos aquele equilíbrio de que nos orgulhamos e nos envergonhamos (se de uma forma saudável, em quantias que se nivelam). O que muitos se questionam é que se deveria existir uma barreira intransponível? Um limite para a abertura íntima, ou seja, o que é que é demais ou de menos? Devemos mostrar tudo? Ou um pouco menos que tudo? Não há fórmulas, claro. Apesar da cultura popular gostar bastante de as impor, às vezes, com alguma graça. Tomemos o exemplo do cocó. A merda. Dizem uns e outros que há um protocolo para o número dois. Quem viu o Sexo e a Cidade saberá que as quatro amigas regulamentaram que não se caga na casa do namorado. Ponto. É das primeiras preocupações que se tem quando passamos pela primeira vez mais de 24 horas com a pessoa amada ou com a pessoa com quem se anda a ter uma amizade colorida. É muito pouco sexy quando pensamos que sai algo de nós tão nojento e malcheiroso. Por isso tenta-se esconder o facto que as nossas funções biológicas existem, aliás, nunca existiram. O quê? Fazer cocó? Dar um peido? Só na escuridão de uma casa-de-banho, quando ninguém está a ver ou a cheirar. Escusado será dizer que há quem se sinta mais confortável em partilhar os seus movimentos intestinais do que outros. Dependendo da forma como vemos o acto de evacuar. Li algures por uma bloggeira, que se debruça por várias questões matrimoniais, que acredita que muitos casais podem considerar o à vontade em partilhar movimentos intestinais, um desleixo. Que provavelmente reflectirá as expectativas que o mundo cria das relações amorosas. Porque há quem as tome de uma forma cinematográfica tão literalmente (e.g. cabelos ao vento, risos soltos, jantares românticos, olhares profundos) que provavelmente terão dificuldade em lidar com o ‘desleixo’. Muito menos com um peido. Que, diga-se, até pode ser um daqueles momentos de intimidade de graça adolescente. Quem fala de puns, pode falar de outra coisa qualquer, que por alguma razão recai bastante em expectativas femininas. Mulheres que se ‘desleixam’ com a maquilhagem, com a roupa interior sexy, com os pêlos que teimam (que surpresa!) em nascer de novo. E o que é que é suposto fazer em relação a isso? Conheço quem viva sob esta doutrina da perfeição, ao ponto de dormir com maquilhagem para conseguir acordar e apresentar uma cara fresca, e não com uma terrível cara de sono (nunca percebi como é que esta técnica funciona, não me sai da cabeça a imagem do Joker todo esborratado – combinação de maquilhagem com uma almofada). Também já a vi quem se preocupe obcessivamente em tirar todos os pêlos do corpo, para que o seu mais que tudo nunca perceba que eles de facto existem. Cada um faz o que quer, e é aconselhado a fazer aquilo que o deixa mais confortável e lhe dê mais prazer. Óbvio. Mas tem me feito espécie que o tão temido ‘desleixo’ seja carregado pelas mulheres, como se houvesse a obrigação de sermos as únicas a manter uma intimidade interessante, sexy e bem apresentada. Que não é o caso. Acautelem-se homens: vêm aí as doutrinas anti-barrigas de cerveja e as queixas de falta de gestos românticos. O que eu percebo como o paradoxo da intimidade é o seguinte: tenta-se incutir a ideia de que a intimidade é necessária para o desenvolvimento do casal, mas carrega a possibilidade de ser encarada como um desleixo. Porque se a ideia é sermos nós mesmos com o outro, e permitir que a atracção circule e seja entendida nos moldes que nos definem, podemos cair nas temidas coisas mundanas que por si só não são muito atraentes e em casos mais graves, poderão pôr relacionamentos em causa. Por isso, seguindo o conselho de tantos terapeutas matrimoniais por esse mundo fora: comunicação. Se vos agrada ou se vos incomoda, comuniquem um com o outro (de forma diplomática, acusações têm pouco de produtividade). Porque os gestos de intimidade e de desleixo, o romantismo exacerbado, as actividades rotineiras e um ou outro pum, são o que fazem uma relação.
Tânia dos Santos Sexanálise VozesBalanço [dropcap style=’circle’]A[/dropcap]Olha-se para um 2016 cheio de potencialidade sexual, mas merecemos rever o 2015 que trouxe uns quantos triunfos ao sexo e ao género pelo mundo. Triunfos que trazem ao entendimento de que sexo é muito mais do que aquilo que se faz na escuridão do quarto e que se abrange pelas malhas macro-sociais da vivência humana. 1. Casamento Homossexual – 2015 viu a possibilidade legislativa do casamento homossexual tornar-se uma realidade para alguns países do mundo (onde outros ainda se encontram a lutar pela despenalização da homossexualidade). O grande exemplo foi os EUA que, quer queiramos ou não, se rege na sua influência cultural, por vezes bastante hegemónica, de internacionalização. Não que queira dar uma super credibilidade aos meandros cuturais do país (e assim muito por geral refiro-me à figura que o Donald Trump anda a fazer), mas constitui um passo importante para a visibilidade e a normatividade que casais homossexuais merecem. 2. Adopção por casais Homossexuais – Para adicionar à generalização de novas formas de família, a adopção por casais homoparentais já é uma possibilidade em muitos países por esse mundo fora – e ainda bem. Agora seria bom que outros países olhassem para Portugal e Colômbia que em 2015 trouxeram esta felicidade aos casais que tentam ter filhos e que querem ser reconhecidos pelo estado. 3. Penalização da mutilação genital feminina – Uma prática atroz que começa a ser legalmente penalizada, e que tem lutado contra formas culturais e crenças enraizadas por grupos de pessoas que acredita que é um rito de passagem necessário, e que assim as mulheres podem adquirir um bom dote e não serão socialmente excluídas. O argumento que tem tentado dissiminar-se por várias instituições nacionais e internacionais: o dote, que, normalmente, é uma vaca, pode dar leite e alguma carne mas morre, mais rápido do que se imagina – uma rapariga/mulher que tem a possibilidade de estudar e trabalhar nesse sentido poderá trazer dinheiro para a família toda a vida. Isto para alertar que a penalização é um grande passo, mas o cuidado tem de existir nas crenças que ainda são comunicadas entre as pessoas. A Gâmbia foi um dos países que viu a MGF ser penalizada em 2015. 4. 50 Sombras de Grey – 2015 foi também o ano que viu adaptado para o cinema o romance que ganhou em popularidade pelo grafismo sexual e pela grande curiosidade e procura que incitou de produtos sexuais de tendências sado-maso. Diz a indústria que, este ano, algemas, chicotes, pinças para mamilos, fatos de latex pretos ou mordaças foram muito mais procurados. Pela experimentação sexual tivemos esta referência cinematográfico-literária. E que venham mais. 5. A criação de uma casa-de-banho na Casa Branca – Esta não é uma casa-de-banho qualquer, é uma casa de banho neutra. Sem género. Isto para que a Casa Branca seja mais inclusiva aos trabalhadores e visitantes transgénero. Pena que não tenha sido publicitado mais fortemente. Este mundo precisa de casas-de-banho sem género associado, porque o binarismo complica-se, cada vez mais. E não tem havido estruturas que o têm acompanhado. 6. Miley Cyrus e a fluidez de género – Este foi o ano que muitos artistas pop vincaram a fluidez de género como uma necessidade de afirmação individual. Os exemplos são Miley Cyrus, Angel Haze entre outros, que vêm como necessária à sua definição pessoal e artística. Apesar de muitos considerarem-no como uma ‘fase’ ou uma ‘moda’ adolescente, mais útil será considerá-lo num debate que urge em ser desenvolvido pelas várias camadas sociais. 2015 não trouxe a moda de fluidez de género, mas a necessidade do reconhecimento da fluidez de género. No geral, o ano teve realizações sexuais bastante positivas. O ano de 2016 trará muitas mais, certamente. Com alguma esperança, na escuridão do quarto também, que é um pouco mais difícil de aceder através de estatísticas, questionários ou artigos de jornal. Que o ano de 2016 traga realizações sexuais individuais e colectivas. Que se experimente novas formas de sexo, diferentes posições e diferentes expectativas. Que se puxe pela sexualidade dentro do limite do confortável. A todos, um 2016 muito sexy.
Tânia dos Santos Sexanálise VozesSexy 2016 – Nunca gostei das festas. – Festas? – Sim, as festas natalícias. O tempo em que se festeja a possibilidade de procriação assexuada. Uma mitose espontânea, que nem a biologia sabe explicar muito bem. – Pois. O Antisexo. – Somos obrigados a ver a família e a fazer revisões anuais. – Claro… e as recordações de 2015? – Sexo a mais e sexo a menos, dependendo do mês. Cinema e umas leituras. Ainda tive umas viagens por aí. Momentos de genialidade alcóolica, mas raros, porque a regularidade levar-me-ia ao alcoolismo. O teu? – O meu ano foi aborrecido. Pessoas aborrecidas, trabalhos aborrecidos, encontros aborrecidos. Não sei que te diga para além de que 2015 foi uma merda. – De que signo és? Posso ver o que te reserva para o próximo ano. A astrologia não foi afectada pelo meu cepticismo. – Eu só quero saber de sexo. Não quero saber de amor, quero saber de sexo. Não sei se é uma opção. – Queres um 2016 exclusivamente sexual? – Nem sei o que isso quer dizer, mas talvez. – Queres foder todos os dias? Com pessoas diferentes? Ter a excitação de corpos novos contanstantemente ou ter o conforto de um a quem já lhe conheces os cantos. – Talvez. Quero que 2016 traga a revolução no sexo ou… a re-significação do sexo. Justifico-me com a minha constante depressão, mas quero daquelas epifanias sexuais que tornam a metafísica do mundo reduzida ao glorioso acto de foder. – Não sei se isso te faz um tarado ou intelectualmente interessante. – Gosto de acreditar que faz de mim um e outro, em simultâneo. – E vais chegar à restruturação do significado do sexo como, exactamente? – Espero que com muito sexo e muita introspecção. – Não percebo como é que chegaste a esta necessidade de filosofar sexualmente. Não que o sexo e a filosofia se oponham, mas tão pouco são compatíveis, talvez complementares. Parece que te obrigas ao dualismo razão/emoção com a desculpa que queres foder bastante. – Se calhar deverias pensar o que queres que 2016 te traga, sexualmente. Talvez assim me compreendas melhor. – Nem é preciso pensar muito: um menáge à trois. Sou muito mais prática a operacionalizar os meus desejos sexuais. Um menáge à trois ainda não está na lista de experiências sexuais vividas. – Pois, ok. Tens algum amante regular agora? Quem seriam os participantes? – Não, não tenho. Estou a pensar ser o elemento extra de um qualquer casal. – E pronto? – Pois. – Vais o quê? Pôr um anúncio? ‘Disponibilidade para noite louca de sexo com casal que procure expandir a sua lista de experiências’. – Epá… não faço ideia. Tu é que me pediste a resolução sexual para o próximo ano, ainda não ruminei a ideia. Não sei como se faz, ou como se começa, só sei que gostaria. – Bem, se entretanto arranjar uma amante e ela estiver para isso, informar-te-ei com todo o gosto desta possibilidade. – Achas que pode contribuir de alguma forma para a transcendência sexual que procuras para o próximo ano? – Tenho a absoluta certeza de que sim. – Depois como seria? Eu, tu e esta hipotética outra. – Não sei. Imagino que jantariamos os três juntos, alguma conversa e intimidade não magoaria e depois… minha casa. – Mas marcávamos um dia? Ou sairíamos várias vezes os três a ver no que dava? Se haveria química. – Boa pergunta. – Para além do mais, precisariamos de um encontro de discussão de logística. Definir o que é ou não permitido. – Estás a destruir toda a minha fantasia pornográfica. – Não percebo porque é que o meu pragmatismo o magoaria. Mas preciso de saber as regras, nós três precisamos de perceber as regras. Há risco de cairmos em constrangimento. Tipo, sexo vaginal depois de anal é expressamente proibido. Ainda pior inter-participantes. – Tu… Já estiveste com uma mulher? Sabes como se faz? – Como se faz o quê? – Enfim, estar com uma mulher. – Fazer-lhe um minete? – Sim… – Essa é mesmo uma preocupação real? – Não, só curiosidade. – Sabes tu? – Acho que sim. Nunca se queixaram. – Se de facto estás a propor-te como um participante para a minha experiência de 2016, porque não um homem? – Hein? – Eu, tu e um hipotético outro. – Estás a destruir a minha fantasia pornográfica de novo. – E dupla penetração? Não estou a ver o que seja mais pornográfico que isso. – Pois, está bem. Mas não sei se conseguiria estar na presença de um pênis erecto, para além do meu. – Ok. Entendi. E nós? – Nós? – Claro. Sei lá eu se o nosso tesão vale a pena. – Isso é um convite para experimentar? – Talvez.