Joana Freitas Entrevista MancheteGuilherme Ung Vai Meng, presidente do IC: “Trabalhamos para ter mais património na UNESCO” A UNESCO pode vir a ter mais património classificado de Macau e as ruas do território vão encher-se de músicos, com licença para tocar. São algumas das ideias de Ung Vai Meng, que se diz satisfeito com o trabalho feito pelo património e com a lei que o regula [dropcap style=’circle’]E[/dropcap]stá como presidente do Instituto Cultural (IC) há muitos anos. Como avalia o trabalho que tem sido feito até agora? Entrei aqui a trabalhar em 1983. Sou presidente há seis, ou sete anos. Sinto-me feliz a trabalhar na área da cultura. Posso dizer que sou [testemunha] e vejo como o IC cresceu. Já vi muitos funcionários reformarem-se, até fiquei com alguma inveja (risos). Cresceu muito o IC, não só ao nível da quantidade, mas de qualidade. Este ano foi muito importante, com a entrada de pessoal [e departamentos] do IACM na nossa equipa. Agora temos mais de mil funcionários, 16 bibliotecas, muitos museus e galerias. É um espaço que cresceu e onde podemos encontrar [vários] recursos, é uma base cultural. O mais importante é a qualidade dos funcionários, sinto-me feliz por estar a trabalhar com eles. Dantes não tínhamos, por exemplo, profissionais de arqueologia, tínhamos de convidar pessoal de fora. Agora convidamos para nos ajudarem, mas somos nós quem inicia o trabalho, sem andar a pedir “por favor”. Dantes não tínhamos também pessoas que soubessem restaurar o património, agora temos. Há património que Macau tenha perdido por não saber como preservar? Macau é uma cidade com uma longa história e a lista de património foi logo elaborada em 1964. Nos anos 1970, uma equipa de escavação de Hong Kong descobriu alguns vestígios em Hac Sá, a iniciativa foi deles, sim, mas depois da transferência formamos a nossa equipa, em 2006 mais ou menos. Mas mal descobrimos vestígios arqueológicos, já nessa altura, preservamos o terreno. Como não reunimos as condições para expor estes vestígios, a melhor maneira foi deixar no local, por isso em Hac Sá existe um parque onde não há construções, para que isso pudesse ser preservado. Não perdemos nada, é uma forma de preservação diferente. É como o campo de futebol na Rua dos Estaleiros em Coloane. É para preservar, para futuramente podermos construir um museu ou espaço para exposição dos vestígios. Que não vai ser para já… Não nos pertence só a nós, também à futura geração. Não podemos aproveitar tudo agora, temos de deixar alguns para o futuro, para que eles possam aproveitar, até com melhores técnicas. Acha que há mais sítios em Macau onde se poderão encontrar este tipo de vestígios? Há mais. De certeza. Imagine debaixo da vila de Coloane… há outra vila, de há três mil anos atrás. Acho romântico, vivemos uma vida em cima, mas lá em baixo tinha outra, da era do Neolítico. Até encontrámos tanques industriais, tão engraçado. Sobre o património, quantos itens classificados é que Macau acumula neste momento? O conceito de património agora é diferente de antigamente. No século passado, o nosso conceito de 1956 era apenas de imóveis. Agora inclui património arqueológico e bens intangíveis. Imóveis temos 128. Quando e quantos vão entrar mais na lista? Este ano, antes de Dezembro. Nove vão ser classificados e depois desta classificação, vamos iniciar outro grupo. O edifício da Rua da Barca, que sofreu demolição parcial, integra a lista? Não. Estamos ainda na fase final de análise da reparação, mas vamos ocupar-nos agora com o processo de classificação, deixando a reparação para mais tarde. Que nove integram esta primeira lista? As muralhas da cidade, que têm três secções, o Armazém do Boi e o Canil Municipal de Macau, por exemplo. São vários conjuntos, não só nove lugares específicos. Há muita gente que defende a inclusão da Escola Portuguesa de Macau (EPM). Devia entrar no património? Pessoalmente, acho que sim. É tão bonita. Mas está já pensada para entrar na segunda lista de imóveis? Estamos a deixar os colegas [do património] considerar. O meu colega, Wong Iat Cheong, Chefe da Divisão dos Estudos e Projectos pode falar disso. W.I.C.: Estamos sempre a considerar edifícios com potencial valor. Quando reunirmos suficientes opiniões [sobre isso] podemos iniciar o procedimento de classificação. Depois vamos ouvir o proprietário, o Conselho do Património Cultural e opiniões e decidimos se vai ou não ser classificado. Que outros edifícios é que o presidente poria na lista, se pudesse escolher? Aprendi a pintar desde muito pequeno, quando andava no liceu. E o meu professor levava-me para os locais para pintar, aí desenvolvi amor pelo património. Se me pergunta quais os imóveis que punha, não consigo enumerar todos. Macau do século XIX e XX era muito bonito. Anos 1970, muito mais bonito que é agora. (risos) Não consegue escolher? Preservava todos os edifícios dessas eras? Se fosse possível (risos). Existe um preço na preservação do património cultural. Trabalho no Museu de Arte de Macau há dez anos e, às vezes, havia cidadãos que doavam relíquias ao museu. Não podemos aceitar todos, os que têm muito valor claro, mas alguns temos de desistir. Há que investir muitos recursos para a preservação. O mesmo acontece com o património. Na nossa lista de 128 itens há mais de 400 edifícios. Numa cidade tão pequena como esta, isto requer um esforço enorme, ainda que valha a pena, porque temos de preservar as características. Se não conseguirmos, é uma cidade igual às outras. Os edifícios de uma cidade são a alma dessa cidade. Como se faz esse processo de separação? É resultado da inteligência e da sabedoria que vamos adquirindo, que já veio dos nossos antepassados e que temos de continuar a preservar. Macau é muito pequeno, só a península tem pouco mais de dez quilómetros quadrados e o Centro Histórico ocupa 1,2 desse espaço – 12% da península de Macau é património. Não existe só o Centro Histórico, existem imóveis que devem ser preservados fora dele. Temos de contribuir com muitos esforços, mas sinto-me satisfeito. É controverso escolher o que integrar na lista? É um trabalho conjunto. Como uma sociedade democrática é importante e normal a discussão. Mas o mais importante é que o processo seja aberto e público. Cabe ao IC fazer uma proposta. A decisão não é do IC. Já sentiu que deveria ter entrado um imóvel na lista que acabou por não ser aprovado? Não, fico contente por existirem tantos, porque quando entrei no IC a trabalhar foi no departamento do património e naquela altura os meus colegas portugueses abriram uma janela para esta situação. Um arquitecto que trabalhava comigo marcava no mapa o património com cor vermelha e agora esses sítios são património. Passou por muitos processos e passou do papel [à realidade]. Sinto-me mais alegre agora, que toda a população pode entrar no processo. Naquela altura, a população não percebia porque é que se tinha de preservar casas arruinadas. Agora a população está mais informada. Mas continua a ser difícil negociar com os proprietários? Sim e testemunhei essa mudança de atitude da população. Muitos dos proprietários é que apoiam esta classificação. Claro que temos que gastar algum tempo para explicar o valor das coisas, a importância. Quando percebem essa importância, concordam com a nossa sugestão. Mas também existem pessoas indiferentes à nossa ideia e temos de seguir a lei, não podemos obrigar os outros a seguir a nossa vontade. Por exemplo, existe uma sala dentro do Templo de Na Tcha, perto das Ruínas, onde havia uma associação que se reunia lá, mas cedeu o espaço ao IC, que passou agora a ser o museu de Na Tcha. Mas o IC foi muito ganancioso (risos), porque quisemos mais, quisemos fazer escavações, porque é dos locais mais antigos da cidade. Eles deixaram, fizemos e percebemos que a forma da Igreja [de São Paulo] original não era original, era em cruz, como nas igrejas da Europa. Percebemos que as pessoas do igreja e de Na Tcha conviviam e a igreja não terminava, antes, no limite que agora termina. Mas isso só foi possível com a ajuda da associação. O IC disse numa resposta a uma interpelação que o Plano de Salvaguarda e Gestão do Centro Histórico estaria pronto em 2017. Em que consiste? W.I.C.: São as medidas previstas na Lei de Salvaguarda, como a manutenção das ruas com as características [antigas], controlo do enquadramento paisagístico, a preservação do contexto da zona e exigências sobre o restauro dos imóveis à forma original. Estão a pensar cortar no número de turistas na zona, por exemplo, ou no trânsito que chega ao Centro Histórico? W.I.C.: Este tipo de medidas tem de ser resolvido através de uma equipa interdepartamental, falamos de coisas mais concretas [sobre o património]. Mas não vão estar na agenda esse tipo de sugestões? W.I.C.: Na fase actual não podemos falar de forma concreta nesse tipo de medidas. O conteúdo será publicado em regulamento administrativo e se incluirmos essas são medidas se calhar é difícil de implementar. Ung Vai Meng com Wong Iat Cheong A Lei de Salvaguarda do Património foi aprovada em 2013 e o plano chega, se tudo correr bem, em 2017. Quatro anos depois, não está atrasado? W.I.C.: O Centro Histórico tem um espaço muito grande e implementar estas medidas vai afectar a vida da população, por isso é que não podemos fazer tudo rápido, temos de pensar bem. Também estamos a aprender e a trabalhar ao mesmo tempo, aproveitando para aperfeiçoar estas medidas. Macau quer integrar mais património na UNESCO? É nosso desejo integrar mais património na UNESCO, claro. Aliás estamos a trabalhar nisto… [quote_box_left]“A preservação do património tem um preço, a ser pago pela sociedade[/quote_box_left] Há algo concreto? Não podemos revelar ainda, porque estamos em trabalhos. Mas há possibilidade disso acontecer. Mas imóveis ou outros bens? Está a acontecer com o nosso arquivo e da Torre do Tombo, em Lisboa, estamos a desenvolver um projecto para nos candidatarmos à secção da Memória da UNESCO. Já conseguimos integrar nas Memórias da Ásia. No ano passado fomos à UNESCO fazer uma apresentação. Também trocámos ideias com representantes de Portugal, que nos disseram que, no futuro, se calhar vai candidatar a calçada portuguesa como património mundial. Macau entra de certeza. Depois dos alertas da UNESCO, como é que está a situação de Macau com a organização? W.I.C.:Depois do incidente com o Farol da Guia, Macau tomou muitas medidas para [respeitar] o património, como regular alturas dos edifícios à volta. A lei também é uma resposta aos alertas da UNESCO. A UNESCO está satisfeita com o nosso trabalho. O grupo Root Planing criou uma petição para manter o Centro dos Toxicodependentes e o antigo armazém dos SS, ao lado do São Januário. Acha que aqueles edifícios têm realmente valor patrimonial? Têm um certo valor, mas perante um maior interesse público, decidimos não preservar, senão não era discutido no Conselho do Património. Por isso é que digo que a preservação do património tem um preço, a ser pago pela sociedade. Outra questão que tem sido levantada, e que levou um arquitecto a pedir a intervenção da UNESCO, é o muro feito no Quartel de São Francisco. São obras de melhoria e estou satisfeito, porque demoliram construções ilegais, que não eram originais. Antes, havia construções ilegais junto desse muro e está tudo preservado agora. A construção nova não pode ser passada como antiga, porque se não, daqui para a frente não dá para distinguir o que foi construído antes e mais tarde. Serve também para demonstrar a nossa sabedoria. A obra foi bem feita? Foi. São compatíveis e estão em harmonia, as construções. Dá para distinguir o que é antigo e novo. Não queremos imitar. Há muitas imitações no Cotai. A Lei do Património é boa? É muito boa. É um instrumento forte, porque antes não conseguíamos proibir as demolições ou obras ilegais. Agora podemos. Atribui força ao IC para proteger o património. Os antigos pareceres do IC não eram vinculativos, agora são. Estou muito contente até poder participar na elaboração e implementação desta lei. Precisa de revisão? Não. Eventos culturais para Macau. Temos algo na manga, algum especial? O Festival Internacional de Música faz 30 anos, por isso estou muito agradecido pelo esforço de terem feito isto há 30 anos. Não se pode imaginar Macau há 30 anos, só com uma ponte, mas com um festival destes. É o mais antigo ao nível da Ásia. Vai ser especial e com muitas surpresas. Depois o Festival de Artes e o de Wushu. Fringe também é organizado por nós agora. E licenças para os músicos tocarem nas ruas de Macau, vamos ter? Sim. Vamos esforçar-nos neste sentido, já temos um plano, tem que ser legal. Espero que depois Macau possa ter muitos espectáculos na rua. Já avistamos a luz ao fundo do túnel. (risos) E uma exposição sua, enquanto pintor? Não. Desde que assumi a posição de director do MAM que parei de expor, por causa do conflito de interesses. Mas vou continuar a pintar. Sou diligente na pintura, como sou um funcionário diligente (risos). Está preparado para continuar à frente do IC? Sim, até quando estiver cansado, quando for um ‘bolo velho’ (risos). Sou o segundo ‘bolo velho’ do IC.
Joana Freitas Manchete SociedadeCanídromo | Governo descarta encerramento e dá dois anos para mudança Podem vir a ver o seu contrato renovado, mas têm de decidir se querem mudar de sítio ou fechar. É a decisão do Governo sobre a pista de corridas de galgos. O cenário não é o ideal, para a ANIMA, mas é quase uma certeza que o local vai fechar. Resta é saber o que vai acontecer aos cães que lá habitam [dropcap style=’circle’]O[/dropap]Governo deu dois anos à Yat Yuen para mudar o Canídromo de sítio. A Direcção de Inspecção e Coordenação de Jogos (DICJ) optou por não obrigar a empresa a encerrar o espaço, como se previa, mas a ANIMA – Sociedade Protectora dos Animais mantém a esperança de que a decisão leve mesmo ao fecho do espaço das corridas de galgos. “O Governo notificou [a empresa] para proceder à relocalização do Canídromo, no prazo de dois anos a contar de dia 21 de Julho. Em consequência, a Yat Yuen terá de decidir no prazo de dois anos se termina a exploração da respectiva actividade ou se relocaliza a sua exploração”, explica a DICJ em comunicado. O organismo liderado por Paulo Chan afirma que, caso a empresa opte pela relocalização, terá de melhorar as condições de criação e tratamento dos galgos e respeitar o programa de corridas, diminuindo o impacto “na vida quotidiana da sociedade”. Caso opte pelo encerramento, “fica responsável pelo pagamento de todas as indemnizações e compensações devidas aos respectivos trabalhadores por cessação dos contratos de trabalho, sendo ainda da sua responsabilidade o destino final dos galgos”. E agora? O “destino final” dos galgos é o que está, neste momento, a preocupar a ANIMA, maior impulsionadora para o encerramento do local. A organização, entre outras associações de protecção animal locais, já se juntou a outros grupos internacionais para a adopção dos animais que ocupam neste momento o espaço do Canídromo. Contudo, esta situação dificulta o programa de adopção, não só porque os cães têm donos privados – prevendo-se que apenas 200 dos 700 possam arranjar uma nova família fora das corridas -, como também porque o pedido da ANIMA ia no sentido de poder gerir o Canídromo assim que este encerrasse. Pedido que já tinha sido até feito ao Governo através de cartas enviadas a Chui Sai On e a Paulo Chan. O facto da empresa ter apenas dois anos para resolver a situação é, para Albano Martins, presidente da ANIMA, um bom presságio para que o espaço feche, mas não para os animais. “É o beijo da morte para o Canídromo, mas também dos cães, que vão desaparecer todos, mês a mês. Ou mortos na pista, ou vendidos ao Vietname, China ou Paquistão”, disse ao HM, duvidando que estes possam ser entregues à ANIMA. Nos últimos tempos, tem sido levada a cabo uma campanha internacional pelo encerramento da pista considerada como “a mais mortal do mundo”, com Chui Sai On e a DICJ a receberem centenas de cartas por dia. Activistas conseguiram ainda que Macau deixasse de receber mais animais da Austrália e da Irlanda. [quote_box_left]“É o beijo da morte para o Canídromo, mas também dos cães, que vão desaparecer todos, mês a mês” -Albano Martins, presidente da ANIMA[/quote] Portas quase fechadas Os resultados das receitas do Canídromo ascenderam a quatro milhões de patacas no ano passado – o que um casino faz em horas – e testemunhas asseguram que quase não há público no local, como o HM também já teve oportunidade de testemunhar. Ainda assim, a DICJ considera que as corridas de galgos – que estão a ser banidas em quase todos os países – são um contributo “para o posicionamento da RAEM como Centro de Lazer e para diversificar a economia”. A decisão de Paulo Chan teve como base um estudo feito pela Universidade de Macau, mas o director da DICJ coloca em cima da mesa a possibilidade de renovação do contrato, quando este chegar ao fim em Dezembro – 51 anos depois de ter sido assinado exclusivamente. “O estudo baseou-se num inquérito telefónico efectuado aleatoriamente aos residentes da RAEM e na recolha de sugestões através de inquérito (1031), junto dos comerciantes e residentes da zona do Canídromo. Do resultado do estudo verifica-se que existem diferentes opiniões da sociedade sobre a renovação ou não do contrato”, explica o comunicado, que diz que se as indicações dadas à Yat Yuen na melhoria do tratamento dos galgos e na mudança para um sítio onde haja menos impacto à vida da população “vão ser tidas em conta para o pedido da renovação da exploração”. Ainda assim, a ANIMA acredita que o local vai ter de fechar. “Acho que o Canídromo vai fechar. O Governo está a dar-lhes tempo para organizarem a casa e tratarem de fazer deslocar os animais para onde entenderem”, disse o presidente. O comunicado indica que a administradora da empresa, a também deputada e número um da SJM Angela Leong, “manifestou o seu respeito e comprometeu-se tomar uma decisão e proceder ao devido tratamento antes do prazo”.
Joana Freitas Manchete SociedadeLECM | Trabalhadores pedem parquímetros no local de trabalho Não têm parque público e onde podiam estacionar antes agora já não podem. Mais de um centena de trabalhadores do LECM estão desesperados por um lugar para pôr o carro, num lugar de trabalho isolado. O pedido à DSAT é simples: a implementação de alguns parquímetros no local [dropcap style=’circle’]O[/dropcap]s trabalhadores do Laboratório de Engenharia Civil de Macau (LECM) estão a ter problemas em encontrar um lugar para estacionar o carro devido à existência de veículos abandonados na Estrada da Ponta da Cabrita. A situação tem vindo a agravar-se e, apesar de terem enviado cartas ao Governo a pedir parquímetros, ainda não foi resolvida. O caso seria algo contornável, não fosse a localização do LECM. Em frente à Universidade de Ciência e Tecnologia, o laboratório – um dos mais requisitados para serviços do Governo – tem de um lado uma bomba de gasolina e a Rotunda do ISTMO e do outro a Ponta da Cabrita, uma rua a subir que vai dar ao Parque das Merendas e aos Serviços Meteorológicos e Geofísicos. No local, como referem os trabalhadores da instituição e como o HM pôde comprovar, não há um parque de estacionamento público. Onde era dantes permitido estacionar está não só constantemente ocupado por carros abandonados, como também foi esta semana vedado pela polícia. “Nos locais onde era permitido estacionar estão agora a ser colocados sinais de proibição”, refere um dos porta-vozes dos trabalhadores. “Mudámos para aqui em 2009 e praticamente não havia carros. Como estamos isolados, não há bancos, não há sítios para comer e temos horários a cumprir, não podemos esperar por autocarros”, explica outra das porta-vozes, que adianta que as pessoas que vêm de Macau, por exemplo, precisam de mudar duas ou três vezes de autocarro. “Há até pessoal que tem crianças, vai levá-las à creche, vai pôr o carro a casa e apanha o autocarro.” Dêem-lhes parques Com as novas decisões do Governo em acabar com os parques “ilegais”, onde havia carros abandonados ou à venda, o local – que tinha até espaço livre – começou a ficar inundado. “Com o decorrer do tempo, começou a encher-se de carros, de vendas, abandonados, até pessoas que têm mais do que um carro”, frisa o porta-voz. O HM conseguiu comprovar isso mesmo. “Os carros de instrução [que passam na Estrada] começaram a reclamar à DSAT e a PSP vinha cá multar. Até os nossos, porque com os lugares onde era permitido estacionar ocupados pelos veículos abandonados, começámos a pôr em cima da linha amarela, mas era a única solução.” O parque do LECM é pequeno demais para todos e é só para carros da empresa e, se restarem lugares, para as chefias. Esta semana, a PSP decidiu bloquear toda a zona – incluindo onde era permitido estacionar -, colocando sinais de proibição e de queda de pedras. Mas os funcionários do LECM têm uma solução, que já apresentaram até à DSAT. “Chegámos a estacionar os carros dois quilómetros montanha acima, mas agora nem isso é possível. Por isso, o que pedimos é que coloquem lá parquímetros. Não têm de ser grátis, claro, não nos importamos de pagar. Deverão ser de duas em duas horas, para que as pessoas que cá abandonam os carros não mandem alguém pôr moedas, como acontece agora, que vêm cá trocar carros por outros”, frisa. A situação afecta neste momento cerca de 160 pessoas, mas os funcionários – chineses e portugueses – pedem cerca de 60 lugares de estacionamento, até porque, tendo onde estacionar, “dão boleia uns aos outros”. A PSP colocou sinais de queda de pedras em algumas zonas, mas há outras, como o lado esquerdo de quem sobe pela Estrada da Ponta da Cabrita, onde as montanhas foram tratadas e o talude está seguro, como se pode ver no local. A DSAT tem um aviso a dizer que vai construir parques de estacionamento com parquímetro perto dos Serviços Meteorológicos e do Cemitério, mas estes locais ficam “a quilómetros” do LECM. A possibilidade de terem um parque a pagar reservado ao LECM era ideal, se a DSAT assim o decidisse, mas os trabalhadores não pedem mais do que “parquímetros pagos”. O HM tentou pedir esclarecimentos à DSAT, mas não recebeu qualquer resposta até ao fecho desta edição.
Joana Freitas Manchete PolíticaAleitamento | Governo prepara lei para proteger direitos das mães O Executivo prepara-se para criar uma legislação que regule os direitos das mães que amamentam e a publicidade feita ao leite em pó. Mais ainda, Alexis Tam disse ontem que a nova Lei das Relações Laborais poderá incluir um regime que deixe as mulheres sair do trabalho para amamentar [dropcap style=’circle’]O[/dropap]Governo está a preparar-se para criar uma lei que proteja os direitos das mulheres que optam por amamentar os filhos. O anúncio foi ontem feito por Alexis Tam, que disse ainda que está a ser pensada a inclusão de um horário de aleitamento na Lei das Relações Laborais. O Secretário para os Assuntos Sociais e Cultura respondia a uma interpelação da deputada Wong Kit Cheng, que pedia mais acção do Governo face à dificuldade sentida pelas mães. Algo que a deputada já tem vindo a pedir desde 2014. “O Governo vai estudar a elaboração de uma legislação para regulamentar a criação de salas de amamentação e a intensificação de divulgação e promoção de aleitamento materno, de forma a poder assegurar o direito e os interesses das mulheres quanto ao aleitamento materno”, frisou Alexis Tam, que acrescentou ainda que a legislação vai também incluir padrões de “autorização da publicidade das fórmulas lácteas”. O aleitamento em Macau tem sido promovido pelo Executivo mais recentemente, porque não é um costume seguido normalmente pelas mulheres que foram mães e que optam pela alimentação através do leite em pó. A falta de salas de amamentação também não ajuda, mas Alexis Tam quer ver essa situação alterada e começou pela sua própria tutela. Tudo orientado “Pedi aos Serviços de Saúde (SS) a elaboração de orientações padronizadas quanto ao equipamento e à gestão da sala de amamentação e exarei também um despacho exigindo a todos os serviços públicos da Secretaria para os Assuntos Sociais e Cultura a criação de salas de amamentação, quer nos locais de trabalho quer nos estabelecimentos de actividade pública”, frisou. Orientações que deverão estar concluídas “este ano”, mas que não são suficientes para Wong Kit Cheng, que tinha ainda pedido à Direcção dos Serviços para os Assuntos Laborais (DSAL) que incluísse um regime de amamentação aquando da revisão da Lei das Relações Laborais, actualmente em curso. Alexis Tam não deu certezas, mas disse que essa situação estava a ser ponderada. “Temos a mente aberta face a isso e, sobre [a criação de] um regime de horas para amamentação destinado a trabalhadoras lactantes, a DSAL diz que vai recolher e ouvir um vasto leque de opiniões por parte do público e associações, incluindo a realização de uma consulta pública. O Governo manterá uma mente aberta sobre a alteração da lei e fará uma avaliação da situação real da sociedade.” A criação progressiva de salas de amamentação é outra das promessas de Tam, que assegura que os 15 serviços públicos a sua tutela dispõem, actualmente, de 42 salas de amamentação, prevendo-se a criação de mais 26 salas de amamentação ainda neste ano. Destas, 60 serão abertas ao público. O Secretário relembra até que a China, Taiwan e Hong Kong têm já leis ou recomendações que regulem estas situações.
Sofia Margarida Mota Manchete SociedadeAcordo | USJ e FRC lançam mestrados e doutoramentos duplamente reconhecidos Foi ontem assinado um protocolo de colaboração entre a FRC e a USJ que estabelece a cooperação entre as duas instituições na área do Direito. Com a Universidade Católica a dar a mão e a criação do novo instituto da USJ, esta aliança permite abrir caminho para a possibilidade de mestrados e doutoramentos com duplo reconhecimento [dropcap style=’circle’]O[/dropcap]novo Instituto de Estudos Sociais e Jurídicos da Universidade de São José (USJ), que conta com a cooperação da Fundação Rui Cunha (FRC), pode vir a ser um dos passos para materializar a criação de mestrados e doutoramentos com duplo reconhecimento. A informação foi dada ontem, no dia em que as duas entidades assinaram um Protocolo de Cooperação. Se os mestrados já estavam na calha, os doutoramentos são agora também uma possibilidade, já que com este acordo e com a Universidade Católica portuguesa na retaguarda, a USJ abre caminho à possibilidade de estudos reconhecidos também em Portugal. Resta agora esperar pela aprovação da Lei do Ensino Superior para poder avançar com os respectivos procedimentos administrativos. Mais investigação e publicações A cooperação entre a FRC e a USJ foi formalizada com a assinatura do protocolo que acompanha a criação do Instituto de Estudos Sociais e Jurídicos na USJ. O documento prevê a mútua colaboração em busca de “um Direito actuante e moderno enquanto disciplina dinâmica que é”, como afirma Rui Cunha, dirigente da FRC. Mais ainda, diz Peter Stilwell, reitor da USJ, o objectivo é afirmar o Direito enquanto disciplina “ao serviço da sociedade e do seu desenvolvimento”. Apesar do curso de Direito não fazer parte do plano de estudos da universidade, Peter Stilwell não deixa de referir a forte ligação do estabelecimento à disciplina, salientando não só o leccionar de cadeiras referentes ao Direito, como a integração de professores da área. Por outro lado, Stilwell vinca a colaboração que a instituição tem com a Universidade Católica Portuguesa onde o Direito é curso de referência. O Instituto em fase de criação pretende ser um núcleo de convergência do estudo e investigação na área do Direito e conta agora com a cooperação do Centro de Reflexão, Estudo e Difusão do Direito de Macau CRED-DM da FRC. Das actividades previstas, Rui Cunha salienta a co-organização de cursos de formação jurídica, colóquios e seminários. A investigação e publicação é ainda ponto forte desta aliança. Ano novo, vida velha Ainda não é desta que a Universidade de São José abre o ano lectivo com casa renovada. As novas instalações do estabelecimento de ensino já andam com um ano e três meses de atraso, como adianta o reitor Peter Stilwell. “Estamos na fase final do novo campus e continuamos em negociações”, afirma, enquanto garante que apesar das novas instalações não abrirem portas para receber o ano lectivo, estarão efectivamente em funcionamento Questionado acerca de possíveis indemnizações, Peter Stilwell refere que estão previstas em contrato sendo que é necessário averiguar as responsabilidades.
Joana Freitas Manchete PolíticaErro Médico | Nova lei continua a demonstrar falta de equilíbrio, diz sector Protege maioritariamente os doentes e não traz qualquer mudança apesar da muita discussão que causou. Está aí a nova versão da Lei do Erro Médico e especialistas da área alertam para a necessidade de ser cuidadoso na interpretação de uma lei muito “discutível” [dropcap style=’circle’]E[/dropcap]stá finalmente entregue a proposta de Lei do Erro Médico, que estava a ser alterada pelo Governo depois da discussão na especialidade. A nova proposta prevê maioritariamente a defesa do utente na perspectiva de alguns membros do sector, que dizem que nada muda face ao que tem vindo a ser discutido. “Se me pergunta se estou satisfeito, claro que não estou. Dos 43 artigos não há basicamente nenhum que proteja os médicos”, começa logo por dizer ao HM Cheung Iek Lap, deputado e médico. A falta de um equilíbrio entre a protecção do doente e do profissional de saúde foi, desde o início da avaliação desta proposta, um pedido premente do hemiciclo e do sector. Algo que voltou a ser defendido em 2013, aquando da aprovação da lei na generalidade. E que deverá levantar celeuma de novo. A Associação de Médicos de Língua Portuguesa de Macau considerava, em 2014, que a proposta de Lei do Erro Médico “não era necessária” nem iria introduzir “melhorias” na prestação dos cuidados de saúde. Num parecer enviado à AL na altura, quando presidida por Rui Furtado, a Associação criticava o diploma e antevia uma “medicina defensiva”. Dois anos e uma nova cara na presidência da Associação depois, não mudou muito o sentimento. “Esta lei é sem dúvida discutível”, indica ao HM Jorge Sales Marques, actual presidente da Associação. “Em qualquer parte do mundo esta é uma lei discutível, em Portugal também houve discussão sobre o tema. Enfim, temos de aceitar a lei, ela existe e foi aceite pelos deputados, mas temos de saber interpretá-la muito bem”. O alerta de Sales Marques chega na mesma linha de pensamento de Cheung Iek Lap e Rui Furtado. “A lei é fundamentalmente para proteger o doente”, ressalva o profissional. “Temos de pensar quem é que defende o médico? Qualquer pessoa pode acusar outra e os médicos, por sua vez, poderão fazer uma medicina mais defensiva devido a esta lei. Não ouço falar de discussão de erros noutras áreas e também há engenheiros que fazem prédios que caem e juízes que trabalham mal. Ok, é uma área sensível, mas só se fala dos erros médicos, o que leva a que a lei seja discutível.” Para o deputado Cheung Iek Lap, essa é precisamente a falha desta lei. “A proposta diz no início que é para proteger os direitos de ambas as partes, mas não encontro nada que esteja a proteger os médicos.” “Este é um assunto que deveria ser tratado por especialistas”, considera ainda Rui Furtado. Comissão perita A nova proposta mantém a criação de uma Comissão de Perícia do Erro Médico, cujo objectivo é avaliar se houve de facto falha do profissional. É composta por sete pessoas – cinco da Saúde e três do Direito – sendo todas elas nomeadas pelo Chefe do Executivo. Algo com que Rui Furtado, na altura da aprovação da lei presidente da Associação dos Médicos de Língua Portuguesa de Macau, discordou plenamente. “Não é aceitável que seja administrativamente nomeada e muito menos que seja constituída por elementos da Direcção dos Serviços de Saúde. A Associação não tem conhecimento da existência em países ou regiões com uma Medicina de elevada qualidade, de comissões como a referida na proposta de lei”, dizia o médico em 2014, acrescentando que esta Comissão parece “uma tentativa de substituir uma inexistente associação profissional dos médicos de Macau”. A Associação chegou a pedir que a Comissão não fosse criada. Já o novo responsável da entidade, Sales Marques, pede um cuidado extremo. “Os médicos devem ser de especialidades diferentes porque podem estar a discutir eventuais erros de outras especialidades. A avaliação [em cada uma] é diferente e poderá haver uma conclusão mais correcta.” Também face aos juristas que vão incluir a Comissão, o presidente da Associação diz que “é importante que estejam mais ligados a esta área específica” da Saúde. “Temos de pensar que é preciso prudência e é muito importante escolher pessoas com [aptidões] científicas e curriculares, para que se possa tirar conclusões sobre actos médicos. Que implicam sempre risco.” Também Cheung Iek Lap se divide face às funções e composição deste órgão, que terá recursos para fazer investigações próprias e pode contratar pessoal do exterior. Jorge Sales Marques “A Comissão também só apoia os doentes, para recolher provas [por eles]. Não há problema em contratar pessoal do exterior, acho é estúpido que se [diga] que não se confia nos [nossos] médicos e depois se lhes vá pedir esse serviço. Há quem não concorde com médicos locais [na Comissão], mas não nos podemos esquecer que também há juízes que podem estar a passar sentenças a pessoas que conhecem, porque Macau é pequeno. Então para isso, também se teria de contratar juízes de fora. Dizem que é preciso pessoal do exterior para a investigação [para evitar familiaridade], mas o Governo depois vai gastar imenso com este recrutamento”, defendeu ao HM, assegurando, contudo, que até concorda com este método. Wong Kit Cheng, enfermeira e deputada, contrapõe que a ideia da Comissão integrar especialistas do exterior é mais viável. Primeiro, aponta, porque “há poucos médicos de especialidade” em Macau, depois porque “a Comissão pode, desta forma, ser mais profissional e abrangente e ter mais credibilidade”. [quote_box_left]“Se me pergunta se estou satisfeito, claro que não estou. Dos 43 artigos não há basicamente nenhum que proteja os médicos” -Cheung Iek Lap, deputado e médico[/quote] Seguro obrigatório Para Wong Kit Cheng, com a Comissão e a possibilidade de se pedir um relatório de investigação poderá haver provas que ajudem a perceber de quem é a culpa, mas a deputada, ao contrário dos colegas, considera que há garantias para os médicos. Garantias essas que passam pelo facto da lei obrigar à compra de um seguro de responsabilidade civil para os profissionais. Mas também a compra do seguro faz os profissionais ficar de pé atrás. Rui Furtado, quando ainda era presidente da Associação, propunha a constituição de um fundo de garantia médica, da responsabilidade do Governo, devido aos “altos valores dos prémios dos seguros”. Wong Kit Cheng admite que essa é uma preocupação, mas relembra que é o Chefe do Executivo quem vai regular os preços destes seguros. A ausência de um regime de seguro de responsabilidade médica no diploma foi notada pelos deputados, o que levou o Governo a inclui-lo agora na nova proposta. Responsabilidade dividida? A lei indica que todos os “prestadores de cuidados de saúde” podem ser responsabilizados de acordo com o Código Civil e indica que “caso haja pluralidade de responsáveis a sua responsabilidade é solidária”. Mais ainda, a lei prevê que o “comitente que encarregar o médico da prática que resultar em erro médico responde pelos danos também”. Sales Marques, que confessa que este é um ponto que pode ter passado na análise profunda que fez à proposta, mostra-se duvidoso sobre o assunto. “Se é uma lei do erro médico, é só para médicos, na minha perspectiva”, disse, ressalvando contudo que é uma questão a analisar. Cheung Iek Lap diz que, a ser dividida por todos, concorda. “Se o médico cometer erro, o hospital ou clínica também têm responsabilidades. Quanto a isso, eu concordo. Porque isso ajuda a partilhar [o stress] sentido pelos médicos. Pelo menos o médico não precisa de pagar tudo e o hospital pode ajudar a pagar, se calhar 30%. Não há problema nisso.” [quote_box_right]“Esta lei é sem dúvida discutível” – Jorge Sales Marques, presidente da Associação de Médicos de Língua Portuguesa de Macau[/quote] E agora? Rui Furtado não tem dúvidas. A lei manteve-se igual, apesar de todos os pareceres e opiniões. “Mantenho tudo o que disse até agora. O que esta proposta mostra é que não há nenhuma diferença de conteúdo e que só muda na forma como é apresentado”, disse ontem o médico ao HM. Ao contrário de Rui Furtado, Cheung Iek Lap faz algumas ressalvas. “É um facto que existe uma lacuna legal em relação aos médicos e esta lei pode preenchê-la. Como membro do sector, e embora a proposta quase não nos proteja, ainda considero que deve existir. Mas é bom frisar que todas as sanções são para nos punir a nós”, alerta, quase sem esperança em eventuais mudanças que a discussão no plenário possa trazer. “Basicamente esta já é a proposta final e não será possível mudanças futuras. O Governo também está com uma atitude muito firme e a proposta vai ser aprovada”, frisou. A AL aprovou a lei em 2013, depois de uma década a discutir o assunto. Só agora, três anos depois, o diploma volta ao hemiciclo, não estando ainda marcado qualquer plenário para o discutir. (com Angela Ka e Sofia Mota) Números Não há dados recentes sobre casos de erro médico, mas desde 2002 até 2012 o Centro de Avaliação de Queixas recebeu 470 situações. Em 2012, deram entrada 34 queixas: 12 envolvendo entidades médicas públicas e 22 privadas. Desde 1999, seguiram para tribunal 29 casos: os Serviços de Saúde ganharam 13, perderam seis, um foi resolvido através do mecanismo de mediação e os restantes correm nas instâncias judiciais. O montante global envolvido nos seis casos que os Serviços de Saúde perderam foi de 7,31 milhões de patacas. O que dita a lei – Obrigatório seguro de responsabilidade civil para profissionais com valor a ser decidido pelo Chefe do Executivo – Profissionais que suspeitaram de erro medico são obrigados a notificar os Serviços de Saúde em 24 horas – Criação de Comissão de Perícia independente que tem acesso a meios de investigação própria, composta por dez pessoas (sete da área da Saúde e três do Direito) nomeadas pelo Chefe do Executivo e com mínimo de dez anos de experiência. Podem ser da RAEM ou do exterior – Comissão de Perícia pode convidar profissionais ou entidades do exterior e tem 90 dias para fazer relatório sobre erro médico – Acusados de erro médico podem recorrer da decisão da Comissão de Perícia – Responsabilidade solidária. A lei permite a existência de vários responsáveis pelo erro médico – Comitente que encarregar o médico da prática que resultar em erro médico responde pelos danos também, de acordo com o Código Civil (493º) – Criado Centro de Mediação de Litígios Médicos, que pode resolver os conflitos e tratar da indemnização desde que os interessados aceitem. Mediador é nomeado por Chui Sai On – Multas de quatro mil a 40 mil patacas caso pessoa singular viole o dever de notificação de erro médico e de dez mil até cem mil patacas para as entidades colectivas que o fizerem – Serviços de Saúde são quem instaura processo de erro médico e sancionam, excepto nos casos em que são seus trabalhadores e é o Chefe do Executivo quem o faz – Multas adquiridas vão para os cofres dos Serviços de Saúde, excepto se foram erros cometidos pelos seus profissionais, cujo valor das multas vai para o orçamento da RAEM
Joana Freitas Manchete PolíticaIec Long | Prédios da Shun Tak a salvo. Prometida mais investigação [dropcap style=’circle’]O[/dropcap]s proprietários de fracções no Kinglight Garden e no One Central não precisam de ficar preocupados: apesar da falta de legalidade no acordo para a troca de terrenos que cedeu aqueles lotes à Shun Tak, os direitos e interesses não vão ser afectados. É o que garante Chui Sai On, Chefe do Executivo, que indica ainda que vão continuar as investigações sobre o caso. Ao falar à comunicação social antes de partir para Pequim, o Chefe do Executivo falou do caso da Fábrica de Panchões Iec Long, onde o Comissariado contra a Corrupção (CCAC) disse existirem diversas ilegalidades, incluindo troca de terrenos que não eram permitidas, nem favoráveis à RAEM. Chui Sai On relembrou que a secretaria para os Transportes e Obras Públicas está responsável pelo acompanhamento da anulação do termo de responsabilidade sobre a permuta de terrenos e também pelos desenvolvimentos dessa anulação. O CCAC vai continuar a investigar o caso. Um dos problemas levantados era sobre o destino de prédios como o One Central, construídos nos terrenos pelos quais a Shun Tak pagou 500 milhões de patacas à Sociedade Baía Nossa Senhora da Esperança, que não tinha poder para os ceder. “A Direcção dos Serviços de Solos, Obras Públicas e Transportes (DSSOPT) seguirá nos termos legais as questões inerentes ao montante do prémio que o Edifício Kinglight Garden necessita de suprir e à permuta do terreno do Edifício One Central”, frisou Chui Sai On, que disse ainda que o registo da propriedade horizontal e o registo predial das fracções destes dois edifícios já se encontram concluídos segundo a legislação. “Por essa razão, segundo o entendimento das autoridades e opiniões do Ministério Público (MP) ao CCAC, o tratamento da anulação do termo da permuta do terreno não afectará os direitos e interesses dos proprietários dos mesmos edifícios, não havendo necessidade de preocupações”, frisou. E responsabilidades? Questionado sobre a responsabilidade de Li Canfeng no caso, já à altura dos facto este era o vice-director das Obras Públicas, Chui Sai On defendeu que o Secretário nomeou o actual director com a sua concordância e que os trabalhos de investigação “vão visar todos os acontecimentos”. “A investigação dos actos de corrupção ou irregularidades cabe ao CCAC, que procederá, de acordo com as competências previstas na sua Lei Orgânica, aos trabalhos de investigação, cujos pormenores não precisam de ser comunicados ao Chefe do Executivo.” Em todas as fases, promete o líder do Governo, o MP vai ser ouvido. MP que desempenhou um papel também na troca de terrenos, tendo dado sugestões na altura, através de Ho Chio Meng, ex-procurador da RAEM agora detido por suspeitas de corrupção. Sobre a proposta apresentada pelo deputado Gabriel Tong, que pede a reinterpretação da Lei de Terras, o Chefe do Executivo não quis comentar.
Tomás Chio Manchete SociedadeAuto-Silos | Empresário admite suborno a ex-funcionário da DSAT Um dos empresários envolvidos no caso de corrupção com auto-silos admitiu ontem ter pago um suborno a um ex-funcionário da DSAT [dropcap style=’circle’]U[/dropcap]m empresário admitiu ontem ter pago um milhão de patacas a Pun Ngai, ex-funcionário da Direcção dos Serviços para os Assuntos de Tráfego (DSAT). O caso de alegada corrupção que envolveu o funcionário e um ex-Chefe de Divisão do organismo – acusado de ter recebido subornos para atribuir a gestão de parques públicos a empresas – continuou ontem no Tribunal Judicial de Base. Segundo o canal chinês da Rádio Macau, Leong Ion Fai, quinto arguido e ex-gerente da Companhia de Gestão de Estacionamento de Lun Hap, disse que foi o dono por “trás da cortina” , o empresário Chan Chi Biu, e também o terceiro arguido do caso, quem lhe disse para assinar alguns cheques com valores que ascendem a mais de três milhões. A ideia era este levantar os cheques e devolvê-los a Chan. Para os deuses Chan Chi Biu, que inicialmente escolheu não responder às perguntas em tribunal, quebrou o silêncio para negar a versão de Leong. Mas questionado pela juíza, o empresário admitiu que tinha pago um milhão de patacas a Pun Ngai como “símbolo de uma oração para os deuses” porque queria que não só a Lun Hap, mas também a sua companhia de Serviços de Limpeza e Administração de Propriedades San Wai Son pudesse ser escolhida para a gestão dos parques de estacionamentos públicos. Para a juíza Kan Cheng Ha o acto foi pura corrupção. Chan afirmou contudo que nunca comunicou com Lou Ngai Wa, o ex-chefe da Divisão de Gestão de Transportes da DSAT, acusado também de abuso de poder e corrupção. O empresário diz saber que Pun Ngai não tem autorização para aprovar os contratos, mas foi a ele que deu um milhão de patacas. Os dois homens estão acusados de terem ajudado três empresas de auto-silos a obter a gestão de parques de estacionamento, estando envolvidas a Companhia de Serviços de Limpeza e Administração de Propriedades San Wai Son, a Empresa de Gestão Predial de Lam Fung e a Companhia de Gestão de Estacionamento de Lun Hap, que conseguiram obter 54 contratos com a DSAT entre 2012 e 2015, sem necessidade de concurso público. O caso vai continuar no dia 1 do próximo ano.
Hoje Macau Manchete SociedadeCáritas | Paul Pun sem enfermeiros locais. Pedido auxílio ao Governo A falta de enfermeiros habilitados já ocupa 80% dos lugares vagos da Cáritas. Contratações de fora são uma possibilidade mas são difíceis e demoram tempo. O Governo poderia dar uma ajuda, considera o responsável da instituição [dropcap style=’circle’]O[/dropcap]desenvolvimento dos novos serviços da Cáritas em Macau encontram nos seus principais obstáculos a escassez de funcionários. O problema não se circunscreve às dificuldades na contratação de não residentes, mas tem também por base a demora na formação de quadros. A informação é dada por Paul Pun, secretário-geral da instituição. O responsável adianta que, com a nova ronda de recrutamento de enfermeiros realizada pelo Governo, a Cáritas perdeu grande parte do pessoal de enfermagem, contando com uma baixa em 80%. Se a diminuição se continuar a constatar, a instituição considera recorrer a mão-de-obra estrangeira para conseguir preencher as vagas que ficam em aberto. No entanto, segundo Paul Pun, o tempo de formação para um não residente é muito maior do que para os locais. Mais necessidades, menos pessoal Contactado pelo HM, Paul Pun revelou que, no ano passado previa a perda de 60% do pessoal mas tal chegou efectivamente aos 80%. O responsável refere que esta situação não é nova e que já há quatro anos a Cáritas passou por uma fase idêntica. No entanto, frisa, os últimos dois anos vão de mal a pior. Uma das razões apontadas é ainda o envelhecimento da população. “O Governo está a contratar cada vez mais pessoas, mas a necessidade da sociedade também tem aumentado. Não temos pessoas suficientes para preencher as vagas nem responder à procura”, afirma. “Para formar um enfermeiro a partir de um trabalhador estrangeiro o processo tem início com o desempenho de funções enquanto assistente clínico.” Outra dificuldade é a língua, não sendo falada nem entendida por muitos dos estrangeiros no território. Querem o Governo Este ano teve início um novo processo de formação para a instituição, mas as esperanças são poucas. Paul Pun sabe que os formandos não irão permanecer muito tempo na Cáritas e darão prioridade a uma oportunidade de trabalho no Governo, onde os altos salários são um chamariz muito forte e fonte de expectativa para muitos pais que querem ver os filhos na Função Pública. O responsável deixa a sugestão ao Executivo de considerar enviar alguns dos seus quadros de enfermeiros experientes em auxílio de instituições como a Cáritas. * por Angela Ka
Sofia Margarida Mota Eventos MancheteiAOHiN | Exposição com obras a preço de saldo O próximo domingo é dia de saldos nas artes. A proposta vem da Galeria iAOHiN, que vai pôr ao dispor do público várias obras de artistas que por ali têm passado a preços mais reduzidos [dropcap style=’circle’]A[/dropcap]o longo da sua existência a Galeria iAOHiN tem feito uma séria de obras seu património, pondo agora à venda algumas delas, juntamente com peças de autores. A iniciativa tem início no próximo domingo e prolonga-se até Setembro, avança Simon Lam ao HM. Para abrir as hostes, o sócio da galeria propõe uma tarde de domingo recheada com um cocktail a partir das 14h00. “É um momento em que as pessoas também podem discutir e observar as obras que teremos expostas”, afirma. Os artistas autores das obras fazem parte de uma panóplia de nomes internacionais. De entre obras mais antigas que fazem parte da colecção, há também chegadas recentes de artistas. Para Simon Lam destacam-se alguns nomes pelas suas características específicas. Em primeiro lugar o proprietário dá relevo à artista local Hong Wai. Um “nome que a galeria já representa há algum tempo”, afirma. A iAOHiN é ainda detentora de cerca de “30 obras da sua autoria” e a “sua pintura a tinta é única”, avanças Simon Lam. “É uma artista chinesa tradicional que utiliza a tinta mas aborda os seus temas de uma forma única”, diz acerca da autora que actualmente vive em Paris. Outro foco vai para a artista americana Siana A. Ponds. “Ela tem um dom, ela consegue pintar sons.” A artista é portadora de sinestesia – que, se para muitos é um distúrbio neurológico que faz com que o estímulo de um sentido cause reacções noutro, para Siana é um dom. “Ela vê os sons que posteriormente pinta, o que lhe confere também características únicas no seu trabalho.” A Coreia do Norte estará também representada com algumas pinturas de paisagens. “Uma oportunidade de ver pintados lugares do país misterioso”, avança o curador. De paisagens rurais a apontamentos visuais da capital, Jason Lam considera que constituem no seu conjunto um grupo de obras “que estão muito bonitas”. Artigos de colecção Da Ucrânia estarão pinturas já antigas, com pelo menos 15 anos e de autores que já não trabalham. Este facto transforma a oportunidade numa possibilidade rara para as apreciar ou adquirir. “São obras mais caras, de autores que já não pintam e já podem ser considerados artigos de colecção para os apreciadores”, avança Simon Lam. “Queremos dar estes trabalho a conhecer porque consideramos que até agora nunca as apresentámos devidamente. Aproveitamos assim esta oportunidade para o fazer também.” De Portugal estarão algumas obras de Carlos Farinha, que já esteve com uma exposição individual na galeria em 2014. Da mostra fazem parte alguns trabalhos que o artista criou com inspiração de Macau. “É um artista que pinta o que vê. E pintou Macau como o viu”, o que faz com que resultem “composições com carácter humorístico também”. Desta iniciativa constam seis obras de Carlos Farinha já expostas anteriormente e duas que chegaram recentemente e que fazem parte da colecção particular da iAOHiN. Também algumas das obras de Tashi Orbu recentemente expostas voltam às paredes. O artista de origem tibetana e sediado na Holanda mostra um mundo entre o oriente e o ocidente e a galeria repete a oportunidade de o apreciar. Os descontos vão dos 20% aos 50% e no domingo as portas da iAOHiN abrem às 14h00. A entrada é livre.
Hoje Macau Manchete SociedadeCentro Histórico | Plano de protecção concluído em 2017 O tão aguardado plano de gestão do Centro Histórico vai estar concluído no próximo ano, garante o IC, que diz estar apenas à espera do fim da segunda consulta pública [dropcap style=’circle’]D[/drocap]aqui a um ano, o Instituto Cultural (IC) tem concluído o Plano de Salvaguarda e Gestão do Centro Histórico, que vai passar a ser um regulamento administrativo. A promessa foi feita numa resposta a uma interpelação do deputado Chan Meng Kam. O IC garantiu ainda que vai esforçar-se na supervisão, verificação e manutenção do património. Na sua interpelação escrita, Chan Meng Kam criticava a falha na protecção do património pelo Governo e apontava o dedo ao facto de ainda não haver qualquer plano de protecção. “A Lei de Salvaguarda do Património Cultural já foi aprovada em 2013, mas o decreto-lei [sobre a protecção do Centro Histórico], que [está incluída no diploma] só vai ser publicada em 2020, segundo o Plano Quinquenal do Governo. Quais são as dificuldades na elaboração [deste plano]?”, perguntava. Na resposta, o IC assegurou que o Governo considera “muito importantes” as opiniões da sociedade e quer garantir conhecimento e compreensão plenas sobre o projecto, “assim como ter consenso da sociedade sobre a sua elaboração”. Por isso o atraso, que agora, diz o instituto, termina. “Já se acabou com a primeira fase da consulta pública do Plano de Salvaguarda e Gestão do Centro Histórico e vamos acabar a segunda fase este ano. Em 2017, vamos acabar a elaboração inteira do plano”, afirma. A UNESCO recebeu um relatório sobre os trabalhos deste plano em Janeiro do ano passado, a poucos dias antes do prazo de 1 de Fevereiro, depois do Comité do Património Mundial da UNESCO dar conta de factores que afectavam o património. Chan Meng Kam falava ainda da queda de partes de monumentos protegidos, como o do telhado da Igreja de Santo Agostinho, e os frequentes danos que aconteceram noutros imóveis. O IC assegura estar atento. “O IC já reconheceu a severidade dos casos e vamos esforçar-nos na supervisão, verificação, manutenção e protecção. No futuro, vamos também introduzir equipamento e técnicas de ponta e reforçar a formação dos especialistas”, garantiu. * por Angela Ka
Joana Freitas Manchete PolíticaSubsídio de Invalidez | Governo altera lei para passar de provisório a regular O Governo tem mesmo intenção de avançar com a regularização do actual subsídio de invalidez provisório. Com uma revisão à lei, quer que se torne uma medida permanente [dropcap style=’circle’]O[/drocap]Executivo está a ponderar alterar o Regime de Segurança Social para que o subsídio provisório de invalidez possa ser uma medida regular. É o que confirma o Fundo de Segurança Social (FSS) ao HM, depois de ter dito a um deputado que o caso estava a ser estudado. O FSS disse em Fevereiro deste ano à deputada Chan Hong ter uma proposta para tornar o subsídio de invalidez uma medida regular. Este apoio foi implementando em Julho de 2014 e é atribuído a residentes permanentes de Macau que tenham contribuído para o FSS pelo menos 36 meses e que perderam a capacidade de trabalho, temporária ou permanentemente. O subsídio, contudo, é provisório e os deputados têm vindo a pedir que se torne efectivo. Chan Hong questionou o Governo em Janeiro sobre o assunto: a deputada queria saber se o apoio ganharia estatuto de sistema de segurança social ou de política de regalias e defendia que uma parte dos portadores de deficiência não tem capacidade de trabalho, nem contribui suficientemente para o FSS, características que não lhes permite candidatarem-se ao subsídio em causa. “Até fim de 2014, entre dez mil portadores de cartão de deficiência, 1100 ainda não se registaram no FSS e 950 portadores ainda não contribuíram para o FSS pelo menos durante 36 meses”, apontou na altura. Passo em frente Questionado pelo HM, o FSS assegura que o passo será no sentido de tornar a medida efectiva. “As pessoas com deficiência têm direito de igualdade à participação e ao gozo de protecção social. Depois implementado o subsídio provisório de invalidez foi procedido imediatamente um estudo e análise sobre uma proposta de solução a longo prazo”, começa por indicar o organismo. “Após a realização de várias reuniões interdepartamentais, tomando em consideração em vários aspectos que demonstram a igualdade e protecção do regime, bem como a viabilidade de operação real, em princípio, será aplicada uma alteração ao Regime da Segurança Social que serve como uma proposta de solução.” Nesta fase, frisa ainda o FSS, estão a ser ouvidos diferentes sectores relativamente à proposta e às questões técnicas que esta levanta. Na resposta à deputada, o organismo frisava que teve em conta experiências de outros países. Ao HM, o FSS diz ainda que o subsídio provisório de invalidez foi prolongado até 31 de Dezembro deste ano, sendo que desde 2014, data que se começou a aceitar o requerimento deste subsídio, até Junho de 2016 registam-se 458 casos de pessoas que são aptas para o receber.
Tomás Chio Manchete PolíticaAliança da Juventude pede limite de dois anos para ocupação de cargos superiores por TNR O grupo político Aliança da Juventude pediu ao Executivo que limite o período de tempo que os TNR podem ocupar cargos superiores. Mais medidas para ajudar os jovens de Macau, que estão a ser prejudicados segundo o colectivo, também foram requisitadas [dropcap style=’circle’]O[/drocap]grupo Aliança da Juventude pediu ontem a Wong Chi Hong, director dos Serviços para os Assuntos Laborais (DSAL), mais medidas para que os licenciados de Macau possam encontrar trabalho e mais fiscalização aos trabalhadores não-residentes (TNR), que consideram estar a tirar-lhes as vagas. Os jovens dizem haver dificuldades para que os finalistas entrem no mercado de trabalho e dizem que os de fora estão a “ocupar vários cargos de gestão”, o que influencia “negativamente” a promoção dos locais, e pedem mesmo que os TNR que ocupem cargos superiores só possam fazê-lo por dois anos. “Uma das razões sobre as dificuldades encontradas pelos finalistas é que o mercado laboral do território está cheio de TNR que ocupam principalmente os cargos de gestão, os cargos superiores. Isto influencia negativamente a promoção dos locais”, queixa-se o grupo. A Aliança da Juventude quer, por isso, que o Governo crie um “limite de dois anos” para que os de fora possam estar num cargo superior. Depois desse período, dizem, os TNR têm de sair, de forma a que “se possa garantir a promoção dos locais”. Mistérios locais Ng Mao Lam, presidente do grupo, disse ao HM que a Aliança criticou ainda uma situação que considera como “um fenómeno estranho”: ainda que haja muita publicidade de emprego, continuam a existir dificuldades em procurar vagas, o que leva o grupo a suspeitar que “as publicidades servem apenas para enganar” o Governo, para dizer que os locais ou não respondem, ou não aceitam o trabalho, tendo as empresas justificação para encontrar TNR. O grupo diz ainda que há falta de fiscalização da parte do Governo: “Já garantiu que não vai permitir aos TNR serem motoristas, mas muitas empresas recrutam esses trabalhadores para levarem bens a clientes, pelo que esses trabalhadores conduzem viaturas também, ou seja trabalham como motoristas”. A promessa do Governo, recorde-se, diz apenas respeito aos motoristas de autocarros, sendo que já foi admitido pelo sector que há dificuldades em encontrar estes profissionais em Macau. Num comunicado, o grupo político defende que a queda da economia e do número de turistas está a criar dificuldades aos jovens que acabam os cursos, especialmente no que toca a encontrar vagas e especialmente para os que saem dos institutos de ensino superior locais. A Aliança diz que o Governo não está a dar apoio suficiente e pede uma revisão das políticas ao Executivo. De acordo com o responsável do grupo, a DSAL apenas disse estar a acompanhar o assunto dos TNR, ainda que o director do organismo tenha explicado que o trabalho de combate não é suficiente porque os recursos humanos são limitados. Wong Chi Hong terá ainda garantido que iria oferecer formação aos licenciados, com uma duração de dois meses, para os que terminarem poderem directamente trabalhar ou estagiar nas empresas de Jogo. Ng Mao Lam frisa, contudo, sentir-se “satisfeito” com a resposta da DSAL sobre as questões. AL? Não é para já A Aliança da Juventude tem-se mostrado activo na apresentação de pedidos sociais ao Governo, mas quando questionados se têm intenções de candidatar-se às eleições da Assembleia Legislativa (AL) no próximo ano, o presidente afirma ao HM que ainda nem pensou sobre isto. “Nem pensamos, porque o grupo preocupa-se agora mais com os pedidos dos residentes.”
Sofia Margarida Mota Manchete SociedadeUCM | Novo mestrado. Inclusão de Direito Ambiental agrada à AAM Foi aprovado um novo mestrado em Direito de norma chinesa para a Universidade Cidade de Macau (UCM). O plano de estudos não parece trazer nada de novo à excepção de uma disciplina de Direito Ambiental, diz Paulino Comandante, ressalvando que esta deveria ser por si só uma área de especialização [dropcap style=’circle’]O[/dropcap]secretário-geral da Associação de Advogados de Macau, Paulino Comandante, considera que a abrir mais um plano de estudos para mestrado na área do Direito, a prioridade deveria ser dada ao ambiente. As afirmações feitas ao HM surgem na sequência da recente aprovação pelo Executivo do curso de mestrado em Direito na Universidade Cidade de Macau (UCM). O novo curso, que cumpre com a norma chinesa, parece não trazer grandes novidades aos já existentes no território, adianta Paulino Comandante. O advogado ressalva que ainda não conhece em profundidade o objectivo ou o conteúdo das disciplinas, mas da análise que efectuou é a inclusão da disciplina de Direito do Ambiente que mais salta à vista. “É uma área que deve ser explorada dada a necessidade que a região tem de profissionais”, afirma. Devido às transformações e desenvolvimento da RAEM, Comandante considera que há falta de mais advogados e profissionais na área da legislação que tenham como objectivo garantir boas políticas ambientais e de aproveitamento de recursos naturais. Mais do mesmo O despacho que permite a abertura do mestrado na UCM foi publicado na segunda-feira em Boletim Oficial, tendo sido assinado por Alexis Tam, Secretário para os Assuntos Sociais e Cultura. Paulino Comandante compara o plano de estudos com os de outras entidades como a Universidade de Macau (UM) e apesar de “algumas diferenças, não encontra nenhuma de carácter substancial, à primeira vista”. Por outro lado, diz, há disciplinas que se confundem. Dando como exemplo o Direito da Lei Básica e o Direito Administrativo, o responsável da AAM diz ser “redundante” a inclusão de ambas num plano de especialização, sem que se perceba o objectivo. Inglês que não se entende A existência das cadeiras opcionais referentes a tradução jurídica de Inglês ou Português não é também clara para o secretário-geral da Associação. Enquanto que na UM o objectivo deste tipo de disciplinas é claro, o de formar quadros de especialidade na área, neste plano “não se entende muito bem”. Paulino Comandante não percebe ainda se este curso é “criado para satisfazer a necessidade de elaboração legislativa ou de tradução jurídica”. Se se concluir que a tradução também faz parte da especialização, a dúvida que levanta é relativa à língua inglesa. Ficam ainda por esclarecer, para o advogado, os conteúdos e os professores, mas “é um novo curso que pode facultar mais uma especialização aos interessados”, remata.
Joana Freitas Eventos MancheteFIMM | Ray Hargrove e Valery Gergiev chegam em Outubro O programa só é oficialmente conhecido no final da próxima semana, mas o HM deu uma espreitadela ao que o IC promete para esta edição do Festival Internacional de Música [dropcap style=’circle’]J[/drocap]á tem data marcada, para Outubro, e só se saberá a programação completa na quinta-feira da próxima semana. Mas o HM apurou que Macau vai receber obras e artistas de renome no Festival Internacional de Música (FIMM) 2016, que marca a 30ª edição do evento. Uma espreitadela ao site do Instituto Cultural (IC), permite levantar a ponta do véu. Dos Estados Unidos da América chega Roy Hargrove, trompetista de renome na cena musical internacional, que tocou ao lado de artistas como Herbie Hancock, que já subiu ao palco do Centro Cultural de Macau. Com 46 anos, Roy Hargrove é compositor e músico, tendo liderado várias bandas, como a RH Factor, que incluía elementos do Jazz com Hip Hop e Gospel. Jazz Latino, Soul e Hard Bop são alguns dos géneros em que o artista se insere. Vencedor de dois Grammy, o trompetista iniciou-se em sessões de ‘jam’ em Nova Iorque. Gravou a sua primeira música com o saxofonista Bobby Watson. Em 1990, lançou o seu primeiro álbum, “Diamond in The Rough”. Em 1993, incumbido pelo Lincoln Center Jazz Orchestra, escreve “The Love Suite: In Mahogany”. Joe Henderson, Stanley Turrentine, Johnny Griffin, Joshua Redman e Brandfor Marsalis são outros dos grandes nomes do Jazz com quem Hargrove subiu ao palco. Mas foi com a banda Crisol, formada por si, que venceu o seu primeiro Grammy, em 1998, com “Habana”. D’Angelo, Macy Gray, Nile Rodgers e Erikah Badu também contaram com a sua colaboração. Roy Hargrove tem tocado em vários festivais à volta do mundo, com o Roy Hargrove Quintet e Roy Hargrove Big Band. Ainda não se sabe se chega a Macau sozinho ou com outros músicos. Da Rússia e da China O FIMM vai ainda contar com o russo Valery Gergiev. Maestro e pianista, é o principal líder da Orquestra Sinfónica de Londres e do Metropolitan Opera. É ainda o director artístico do Festival Noites Brancas em São Petersburgo. Nascido em Moscovo, teve como professor aquele que é considerado um dos maiores maestros da Rússia, Ilya Musin. Gergiev estreou-se no comando da Ópera de Mariinsky com “Guerra e Paz”, de Prokofiev. Foi ainda chefe da Orquestra Filarmónica da Arménia de 1981 a 1985. Além de tributos a Charlie Chaplin e musicais chineses, como “O Sonho de Um Aroma”, a 30ª edição do evento vai ainda contar com uma apresentação da ópera “Turandot”, a última de Giacomo Puccini. Dividida em três actos, conta a história de uma princesa que prometeu amaldiçoar o povo se não encontrasse o príncipe até de manhã. A obra, que inclui temas musicais de origem chinesa e de Verdi, ficou inacabada por causa da morte de Puccini, tendo sido completada por Franco Alfano. Não é possível perceber quem vai ser a companhia responsável pela apresentação, mas o IC garante que no dia 28 de Julho sai o programa completo. O FIMM acontece durante todo o mês de Outubro e os bilhetes vão estar à venda em Agosto, com descontos de 30% para quem comprar entradas de 7 a 14 deste mês.
Joana Freitas Manchete PolíticaEleições AL | Chan Meng Kam nega candidatura a duas listas Uma notícia avançada na semana passada dava conta da candidatura de Chan Meng Kam à AL a duas listas, com o deputado a “ponderar” ser nomeado pelo Chefe do Executivo. Todos os envolvidos dizem que isso não vai acontecer [dropcap style=’circle’]N[/dropcap]ão. “Não há qualquer intenção de candidatura a duas listas” de Chan Meng Kam às eleições da Assembleia Legislativa (AL). É o que garante o deputado, que diz que tal notícia é falsa. Os restantes membros da lista assinam por baixo e Ung Choi Kun, que alegadamente iria encabeçar uma das listas, diz-se “chocado”. Na sexta-feira, o semanário O Clarim anunciava a candidatura de Chan Meng Kam com duas listas para as eleições do hemiciclo de 2017. Uma delas, segundo o jornal, seria encabeçada por Si Ka Lon, número três de Chan Meng Kam actualmente, e Ung Choi Kun, ex-deputado, que foi número dois até 2013. Os dois negam a notícia. “Fiquei chocado com a pergunta e depois fui confirmar”, começa por dizer Si Ka Lon ao HM, depois de uma segunda chamada. “É um rumor. De facto, ainda nem tivemos sequer qualquer reunião ou discussão aberta sobre as eleições. E isto é tudo o que posso revelar, porque não sei mais nada”, disse, acrescentando que agora quer “continuar a concentrar-se no actual trabalho de deputado”. Já Ung Choi Kun acusa o órgão de comunicação social “de ter fabricado” a notícia. “Não existe tal coisa”, frisou. Questionado sobre gostaria de regressar ao trabalho de deputado, o ex-legislador garante que não. “Depois de acabar o meu último trabalho de deputado, já não mostrei vontade de continuar a participar nas eleições à Assembleia Legislativa. Claro que acho que, mesmo não sendo deputado, ainda posso continuar a contribuir para a sociedade, ajudar à formação dos jovens de Macau, apoiar o Governo a fazer os trabalhos de melhor forma. Estou sempre a acompanhar essa situação”, mas não pretende voltar ao hemiciclo. Chan Meng Kam, que respondeu às questões do HM pela secretária, mostrou-se incomodado com o que diz serem “rumores”. O deputado, que segundo O Clarim “ponderava assumir o cargo de deputado nomeado caso recebesse convite de Chui Sai On”, não descortinou mais pormenores. “Só podemos dizer pelo deputado que essa notícia é totalmente feita de rumores e é falsa. O deputado não quer responder agora às vossas perguntas sobre as eleições da AL, neste momento, porque ainda está a decidir o que vai fazer. Depois, quando a lista for entregue, sabe-se tudo”, frisou. Chan Meng Kam sempre foi um candidato eleito directamente pela população, tendo na corrida passada, conseguido ocupar três assentos no hemiciclo. Além de Si Ka Lon, Song Pek Kei é uma das outras deputadas na lista de Chan Meng Kam. O semanário O Clarim, que não citava fontes para a notícia, dava conta que a deputada iria ser a número dois de Ung Choi Kun. O HM tentou também chegar à fala com a deputada, mas não foi possível. * com Angela Ka
Tomás Chio Manchete SociedadeFilhos Maiores | Líder da Associação nega acusações em tribunal O Tribunal Judicial de Base recebeu ontem Lei Yok Lam, do grupo Pais dos Filhos Maiores. Acusada de desobediência qualificada, a idosa nega ter convocado uma manifestação para a AL sem autorização [dropcap style=’circle’]C[/dropcap]omeçou ontem a ser julgada Lei Yok Lam, secretária-geral da Associação Pais dos Filhos Maiores, acusada de desobediência qualificada. A acusação diz que a responsável estava a bloquear as portas da Assembleia Legislativa (AL) juntamente com vários outros membros da Associação, mas esta nega. O caso remonta a Agosto de 2015, quando se realizava na AL uma reunião plenária com Chui Sai On, Chefe do Executivo. Centenas de idosos encontravam-se em frente ao edifício da AL: a Associação diz que era para assistirem à reunião, mas que lhes foi barrada a entrada; o Ministério Público (MP) assegura que os idosos estavam a manifestar-se. O problema gerou conflitos entre a PSP e a Associação, tendo Lei Yok Lam sido detida. Ontem, a acusação voltou a dizer que os idosos estavam a fazer um protesto sem autorização do Instituto para os Assuntos Cívicos e Municipais (IACM) e que até empunhavam um cartaz. Na sessão de audiência, a responsável explicou que chegou à AL para assistir ao plenário, porque gostaria de saber se o Chefe do Executivo iria falar sobre os pedidos da Associação, que há anos pede ao Governo a autorização de residência em Macau para os filhos maiores de 18 anos que se encontram no continente, de forma a que o agregado familiar possa estar junto. Troca de acusações Lei Yok Lam diz que foi impedida de entrar pela polícia que, na altura, lhe disse “que tinham deixado entrar 50 idosos no plenário”. A responsável diz que é mentira e afirma que o caos se instalou quando um idoso desmaiou por se sentir mal. A idosa ameaçou então a PSP de que entraria à força às 15h00, hora do plenário começar, se os agentes não a deixassem entrar antes. Uma das testemunhas ontem ouvidas, um chefe da PSP, assegurou ontem no Tribunal Judicial de Base que tinha alertado os idosos “duas vezes” para que saíssem do local, mas que estes “nunca aceitaram”. O agente diz que os idosos forçaram a entrada, quebrando a barreira da polícia, incitados por Lei Yok Lam, pelo que foi esta responsável que foi detida. Lei Yok Lam nega que o tenha feito, tal como nega que tenha convocado os idosos. Diz que só soube da presença do Chefe do Executivo através dos telejornais e outros três idosos, testemunhas, também disseram que chegaram à AL com o mesmo intuito da colega: ver se o líder do Governo iria falar sobre o seu caso. O caso continua hoje, sendo que vai ser disponibilizada uma gravação sobre o momento.
Sofia Margarida Mota Manchete PolíticaNovo Macau | Direcção deverá manter-se igual nas eleições internas Não se prevê mudanças no que respeita à direcção da Associação Novo Macau. Ainda não há uma lista, mas Scott Chiang afirma que deverá manter-se na presidência, ao lado de Jason Chao e de Ng Kuok Cheong [dropcap style=’circle’]A[/dropcap]próxima semana é de eleições na Associação Novo Macau e a entidade pró-democrata presidida por Scott Chiang continuará com a mesma direcção. Ao HM, o actual líder afirma que se tiver oportunidade de ocupar a mesma posição “vai continuar a fazê-lo” e nem Chiang, nem Jason Chao falam de qualquer nome diferente para a apresentação de listas à eleição. Ouvido pelo HM, Scott Chiang diz que a vontade e intenção de permanência resultam do “bom trabalho que a ANM tem vindo a fazer”. Questionado quanto a possíveis mudanças, a uma semana das eleições, Scott Chiang afirma que não se registarão alterações significativas. O líder associativo prevê a continuidade de Jason Chao como vice-presidente e da maioria dos membros que fazem actualmente parte da direcção. O deputado Ng Kuok Cheong é outro dos nomes que permanecerá porque “faz parte do painel e não há razão porque não continuar”, afirma Scott Chiang. Por seu lado, Au Kam San continuará ausente. “Tendo decidido pela demissão recentemente, não estará presente agora”, justifica Scott Chiang, considerando que, apesar de ser “uma situação triste, é a realidade”. Contactado pelo HM na semana passada, Jason Chao também disse não existirem ainda nomes ou listas para a direcção. O vice-presidente, que já ocupou o cargo principal do grupo, assegurou, contudo, apoiar Scott Chiang se este decidir recandidatar-se. A acontecerem no dia 27, as eleições da Novo Macau realizam-se depois de, em Agosto do ano passado, Jason Chao ter subido ao comando. Na mesma linha A posição da Associação não muda: o sufrágio universal para a eleição do Chefe do Executivo continua a ser grande desejo. “É uma meta muito difícil de atingir na RAEM”, mas é importante que se fale dessa possibilidade para consciencializar a população da sua existência, frisa. À semelhança do que tem defendido Scott Chiang, a Associação mantém como campo de combate de mudanças na RAEM a luta por um melhor sistema de transportes e habitação, bem como a avaliação das medidas implementadas pelo Governo e as suas acções. Em espera Scott Chiang continua a aguardar desenvolvimentos do caso avançado pela Polícia de Segurança Pública (PSP) em que o pró-democrata é suspeito de desobediência na manifestação de 15 de Maio, que pedia a demissão de Chui Sai On, Chefe do Executivo, na sequência da doação de cem milhões de patacas da Fundação Macau à Universidade de Jinan.
Joana Freitas China / Ásia MancheteChina | Um ano depois, advogados e activistas continuam com paradeiro desconhecido Passaram mais de 365 dias. Mais de um ano e nada, ou pouco, se sabe sobre alguns dos mais de 200 advogados e activistas dos Direitos Humanos presos o ano passado na China [dropcap style=’circle’]A[/dropcap]9 de Julho de 2015, as autoridades do continente começaram a caça ao homem: advogados e activistas defensores dos Direitos Humanos foram marcados como membros de um “perigoso gangue criminoso” e a limpeza foi feita em todas as províncias, numa campanha que ficou conhecida como “709”. Segundo a Amnistia Internacional (AI), que relembra o acontecimento num relatório recente, 248 pessoas foram interrogadas pela polícia, detidas ou acusadas de subversão. Uma acção “sem precedentes”, como identificou o Comité contra a Tortura da ONU. São 22 páginas de nomes, profissões e estado actual. O relatório da AI aponta detenções, raptos, acusações formais ou simplesmente desaparecimentos desde Julho do ano passado – um ano depois, muitos deles mantêm-se presos em locais secretos. É com Wang Yu que começa a repressão. Nas primeiras horas de dia 9 de Julho, a advogada desaparece, “depois de enviar mensagens de pânico aos amigos a dizer que alguém estava a tentar entrar em sua casa”. O marido e o filho de 16 anos também desaparecem do mapa. O dia seguinte abre com interrogatórios ao que viriam a ser centenas de advogados e activistas, para, a 11 de Julho, Sui Muqing ser detido na sua casa aqui ao lado, em Guangdong. Foi preso e levado para um local desconhecido por “incitar à subversão ao Estado”, relembra a AI. De Pequim, 48 advogados são considerados alvo. Dez são formalmente presos e apenas três conseguem, muito mais tarde, sair em liberdade sob fiança. Guangdong é a província seguinte a abater: 39 são considerados perigosos, apenas um é formalmente preso, mas alguns dos outros desaparecem. Repetições É quase um mês depois – a 7 de Agosto – que os advogados de Wang Yu são notificados da detenção da sua cliente pelas autoridades. Está presa “numa localização desconhecida”, suspeita de violação à segurança do Estado. Mas esta não é a primeira vez que a advogada tem de lidar com o que a família e amigos chamam de “injustiça”. Wang Yu dedicou-se à protecção dos Direitos Humanos graças a uma experiência pessoal. A mulher, descrita pelos amigos como “corajosa e destemida”, sofreu agressões em 2008, quando exigiu que a deixassem embarcar num comboio para o qual tinha uma bilhete válido. De acordo com AI, a advogada fez queixa à polícia – mas foi ela quem foi detida por dois anos e meio. “Enquanto esteve presa, testemunhou maus tratos e tortura a outros reclusos. Foram estes acontecimentos que a levaram a dedicar uma carreira à protecção de pessoas cujos casos eram considerados sensíveis pelo Governo Central.” Wang Yu defendeu o académico uigur Ilham Tohti e o activista Cao Shunli. O primeiro, economista, está a cumprir uma sentença perpétua, acusado de separatismo. O segundo, também advogado, morreu na cadeia por falta de cuidados adequados. Os dois foram nomeados para prémios de defesa dos Direitos Humanos. Também o marido de Wang Yu se envolveu na defesa de activistas e figuras dos Direitos Humanos da China por causa da detenção da esposa. Um ano depois, os dois continuam detidos, sem direito a advogados ou sequer a ver a família. O filho, Bao Zhuoxuan, de 16 anos, é detido meses mais tarde quando tentava sair da China para estudar fora. É apanhado por agentes “à paisana”, juntamente com mais dois activistas, na fronteira do Mianmar. De renome Julho é ainda o mês em que Li Heping, Xie Yanyi e Wang Quanzhang são levados pelas autoridades. Os nomes dos três advogados são mais conhecidos pela tentativa constante das suas esposas em encontrá-los. As mulheres fizeram até vídeos para pedir aos outros países para pressionar Pequim a respeitar os Direitos dos seus maridos. “Depois de terem prendido os nossos maridos disseram-nos para seguirmos as regras”, desafiava, na altura, Wang Qialing, esposa de Li Heping. As “regras”, diz a CCN, incluíam não contratar advogados, não comunicar com os maridos ou outros detidos, não falar aos média e não usar a internet para falar do assunto. Li Heping tem dois filhos. Cristão, defendeu activistas pró-ambiente e dissidentes como o advogado cego Chen Guangcheng. Está detido por subversão, um crime que pode originar pena perpétua, ao lado de Wang Quanzhang. Um dos clientes de Quanzhang era um jornalista que expôs casos de corrupção no Governo Central. Já Xie Yanyi, que perdeu o nascimento do seu terceiro filho por estar detido, defendia membros do movimento Falun Gong (banido na China) e foi colocado na mira das autoridades por pedir ao Governo informações sobre vigilância dos internautas. A sua esposa lançou recentemente um documentário onde fala sobre a sua história. A mulher diz que, desde que Xie foi preso, “os membros da família estão constantemente a ser pressionados para aceitar advogados do Governo e para gravar vídeos a apelar a Xie para se declarar culpado”. Todos recusaram e o advogado de Guangong mantém-se dentro de quatro paredes acusado de incitar à subversão. O ano passado, em Setembro, foi a vez dos activistas Wang Fang e Yin Xu’an. Os dois vestiram camisolas de apoio ao activista Wu Gan – que se dedicava a desmascarar oficiais corruptos – e colocaram-nas online, juntamente com outros activistas, alguns cujo paradeiro é desconhecido. Wu Gan continua detido por “provocar distúrbios”, depois de se ter manifestado em frente do tribunal em apoio a um grupo de advogados que terão sido vítimas de denegação de justiça. Os casos continuam, até que a 8 e 9 de Janeiro deste ano, 13 advogados, alguns deles anteriormente detidos, são formalmente presos por questões de segurança de Estado. É também neste ano, em Maio, que Yin Xuan tem, pela primeira vez, autorização para pedir um advogado – nove meses depois de ter sido preso pelas autoridades. Nessa altura, confessa ao advogado estar a ser torturado por “guardas e reclusos”. Com 41 anos, segundo notícias veiculadas na altura, tem cicatrizes e perda de memória, entre outras quezílias mentais. Continua detido, desta vez numa prisão oficial e depois de ter estado nas chamadas “black jails” (prisões ilegais) e num campo de trabalhos forçados, porque em 2009 pediu autorização para se manifestar durante uma visita do presidente Barack Obama à China. Onde estão? Apesar das diversas tentativas da AI e de outras organizações de Direitos Humanos – 12 países membros da ONU chegaram a juntar-se a pedir à China para respeitar os direitos dos detidos -, até hoje estima-se que mais de duas dezenas de advogados e activistas ainda tenham paradeiro desconhecido. Em Janeiro deste ano, Sui Muqing foi o primeiro a quem foi garantida saída da prisão sob fiança. O advogado tinha sido acusado de “provocar distúrbios”. Em Fevereiro é a vez de saírem Gao Yue, assistente de Li Heping, e Li Shuyun, advogado. Até 11 de Julho deste ano, os advogados e activistas que foram questionados e detidos ascenderam aos 248. De todos, 17 foram já oficialmente presos, estando a maioria num centro de detenção em Tianjin. A China, contudo, tem uma legislação que permite a detenção de uma pessoa num local secreto para esta ser interrogada, sem que haja qualquer detenção formal ou sentença, informa a AI. Este deverá ser o caso de mais de 20 advogados e activistas que estão ainda desaparecidos. Assistente de Li Heping “solta”. Advogado preso Zhao Wei foi uma das assistentes legais detidas na campanha “709”. Zhao era também das mais novas: com apenas 24 anos ficou presa desde Julho do ano passado até a passada sexta-feira. Nem o marido, nem os advogados da jovem sabiam a razão por que Zhao foi solta, nem sequer quando iria ser. Há um ano sem estarem autorizados a vê-la, foi através da rede social Weibo que o marido recebeu mensagens a dizer que Zhao estava fora da cadeia. Zhao Wei era assistente de Li Heping A polícia em Tianjin disse que foi solta por ter admitido os seus crimes, mas Zhao tem um ano de liberdade condicional. Ainda não se sabia, até ontem, onde está a assistente legal. Mas o seu advogado de defesa foi detido imediatamente depois da suposta libertação de Zhao. Está acusado de “espalhar rumores” depois de ter feito uma queixa de que Zhao Wei sofreu abusos sexuais na cadeia. Protestos continuam No sábado, grupos de advogados e activistas, bem como a ONU, voltaram a tecer duras críticas às detenções de há um ano. Cartas abertas a Xi Jinping chegaram de várias partes do globo, exigindo datas para que os advogados fossem libertados. Em Hong Kong, os protestos têm feito sentir-se mais acerrimamente.
Joana Freitas Manchete PolíticaATFPM pede sistema legal de actualização de salários na Função Pública [dropcap style=’circle’]A[/dropcap]Associação dos Trabalhadores da Função Pública de Macau (ATFPM) pediu ontem as Serviços de Administração e Função Pública (SAFP) a sistematização do aumento dos salários para os trabalhadores através de uma lei. Os membros da ATFPM encontraram-se com Kou Peng Kuan, director dos SAFP, a quem pediram também mais responsabilização dos altos cargos. “Queremos sistematizar por via legal a actualização salarial dos trabalhadores da Função Pública a partir do dia 1 de Janeiro”, frisa a Associação liderada por José Pereira Coutinho, que avança já com um pedido de 4% de aumento para o próximo ano. A atribuição de um subsídio especial aos trabalhadores da camada de base e a substituição do Regime de Previdência pelo Regime de Aposentação e Sobrevivência são outros dos pedidos, que se baseiam no facto dos funcionários públicos não conseguirem fazer face à subida do custo de vida. Mas do encontro surgiram ainda mais propostas. “Cancelar o limite de 300 horas extraordinárias para os motoristas, exigir que a contagem da antiguidade seja a partir do primeiro dia da entrada nos serviços públicos e rever a lei sobre as carreiras para precisar a função dos trabalhadores e evitar a exploração dos seus direitos” foram outros dos pedidos, com a ATFPM a dizer ainda que deveria ser aumentada a pensão de sobrevivência. “No decurso da reunião, José Pereira Coutinho e o vice-presidente da direcção, Leong Veng Chai, [propuseram] que os funcionários públicos que completam 20 anos de trabalho e recebem pensões possam reformar-se e que os dirigentes e chefes da Função Pública que se aposentaram antes do ano 2007 devem ter os mesmos direitos que os que se aposentaram entre 2007 e 2009”, pode ler-se num comunicado da Associação. Ovelhas negras Kou Peng Kuan, director dos SAFP, ouviu ainda outras sugestões dos membros da ATFPM, que passam pelo apuramento de responsabilidades. Implementar um sistema de declaração de incompatibilidades dos titulares dos principais cargos públicos foi uma das propostas deixadas, bem como fiscalizar e aplicar o regime de responsabilização dos titulares dos principais cargos já que, para a ATFPM, os estatutos e normas que regem a Função Pública “nunca foram cumpridos rigorosamente”. Na lista de Pereira Coutinho estava ainda a reserva de terrenos para a construção de moradias para os trabalhadores e a atribuição de um subsídio aos trabalhadores que precisam de utilizar as línguas chinesas, portuguesa e inglesa no trabalho. Segundo a ATFPM, Kou Peng Kuan afirmou já conhecer os pedidos e ir considerá-los.
Tomás Chio Manchete SociedadeIec Long | Pedida acusação de Edmund Ho, Ao Man Long e Carion ao MP Duas associações concordam que Edmund Ho, Ao Man Long e Jaime Carion deveriam ser investigados e trazidos à justiça por causa da troca de terrenos da Iec Long. Uma das associações entregou mesmo uma carta de acusação ao Procurador. O relatório do IC sobre o caso chega daqui a dois meses e o proprietário só restitui parte do dinheiro gasto nas obras de preservação [dropcap style=’circle’]O[/dropcap]grupo Iniciativa para o Desenvolvimento Comunitário de Macau entregou uma carta de acusação ao Ministério Público (MP) sobre o caso da permuta dos terrenos da Fábrica de Panchões Iec Long. A carta acusa o ex-Chefe do Executivo, Edmund Ho, o ex-Secretário para os Transportes e Obras Públicas Ao Man Long e o ex-director das Obras Públicas, Jaime Carion, de prevaricação e abuso do poder. A Associação Novo Macau pediu também na sexta-feira que sejam apurados e trazidos à justiça os responsáveis envolvidos no caso. A Associação também considera que o MP deve investigar os mesmos responsáveis que o grupo da Iniciativa acusa. Na carta divulgada pela Iniciativa considera-se que o relatório de investigação do Comissariado contra a Corrupção não meramente reflectiu que “a gestão dos terrenos pelo Governo no início do estabelecimento da RAEM era estranha e desordenada”, mas também que o caso aconteceu “devido à enorme transferência de lucros entre as figuras envolvidas”. Foi Jaime Carion quem assinou a ordem de permuta, mas o relatório aponta reuniões com o Secretário e até o ex-procurador da RAEM, Ho Chio Meng. Lucros e manipulações A Associação considera que o caso só “aconteceu com manipulação humana a fim de obter lucros”. Portanto, salientando os artigos do Código Penal, acusa Edmundo Ho, Ao Man Long e Jaime Carion, mas também os membros administradores da Sociedade de Desenvolvimento Predial Nossa Senhora da Baía da Esperança por burla. A carta já foi entregue pela Associação na sexta-feira, dia em que a Novo Macau levou a cabo uma conferência. Caracterizou o caso da Iec Long como “uma extorsão” e pediu que se recuperem os recursos públicos gastos. A Novo Macau fala em injustiças nas trocas de terrenos, mas também abuso de poder, corrupção e erros administrativos. Crimes que, defende, só podiam ter sido cometidos pelos dirigentes da altura, onde se inclui o ex-Chefe do Executivo, Edmund Ho. Sou Ka Hou, da Novo Macau, disse ao Jornal do Cidadão que o relatório do CCAC é um verdadeiro chumbo à Lei de Terras, que tem causado polémica na sociedade, e que só prova que o poder discricionário de um Chefe do Executivo dá origem a negócios “feitos por debaixo da mesa”. A Novo Macau diz ainda que o caso demonstra apenas uma parte pequena das ilegalidades que aconteceram dentro do Governo e de conluio entre empresários e Executivo no passado. Ng Kuok Cheong, deputado eleito pela Novo Macau mas agora separado do grupo, também assina por baixo das declarações feitas. Numa interpelação, questiona se o Governo tem intenção de prosseguir com acusações de fraude no MP e como é que vai fazer para receber o dinheiro dos terrenos. * com Angela Ka [drocap style=’circle’]O[/dropcap]Instituto Cultural (IC) tem de entregar um relatório sobre a preservação feita na Fábrica de Panchões Iec Long daqui a dois meses. A ordem é do Secretário para os Assuntos Sociais e Cultura, que o disse numa reunião do Conselho do Património Cultural, onde ficou ainda a saber-se que o proprietário da Fábrica terá de restituir apenas parte do dinheiro gasto na conservação. “O IC vai ter de apresentar um plano de actividades sobre [as obras] e o relatório do Comissariado contra a Corrupção (CCAC). O relatório vai ser entregue por Ung Vai Meng e temos de encontrar o proprietário para recuperar o dinheiro”, frisou Alexis Tam. A forma como foi feita a preservação da Fábrica incomodou o CCAC, que indicou que o IC deveria ter falado com o proprietário para que este fizesse a preservação da fábrica antes de gastar dinheiro do erário público. Na sexta-feira, Guilherme Ung Vai Meng, presidente do IC, explicou que a entrada do instituto na fábrica mesmo sem interesse do proprietário se deveu a situações que punham a população em risco. “Podia ficar comprometida a vida da população. O IC teve de actuar. Havia mosquitos, ácido sulfúrico e carvão para o fabrico de explosivos. Tendo em consideração a ordem pública, o IC e a PJ entraram no local”, disse. Os líquidos inflamáveis foram, depois, levados para Seac Pai Van em contentores e para “um local sem moradores”, onde foram queimados. O responsável admitiu que o IC não fez um trabalho “muito preciso” na procura do proprietário da fábrica, mas relembra também que quase todas as casas recuperadas são propriedade do Governo. “Tomámos a iniciativa de reparar porque as casas estavam em ruína e porque o espaço estava a ser utilizado para ‘war games’. Mas também, das 16 casas que arranjamos, só uma não é propriedade do Estado. Daí que só tenhamos que pedir o dinheiro por uma”, frisou Ung Vai Meng, não sabendo, para já, indicar qual a percentagem dos cinco milhões que tem de ser devolvida. Museu no horizonte A conclusão da investigação do CCAC face à troca de terrenos da Iec Long com o Governo, que mete o ex-Procurador, o Secretário Ao Man Long, e o ex-director Jaime Carion, indica que o acordo para a permuta de terrenos feito em 2001 está errado em vários princípios, que vão desde violações “graves à lei”, a falta de competência do director dos Serviços de Solos, Obras Públicas e Transportes (DSSOPT) e a um cálculo de valores de terrenos prejudicial à RAEM. Agora, a ideia é preservar o local até ao mínimo detalhe, sendo que o IC já manifestou querer integrar a Iec Long no segundo grupo de bens imóveis a ser classificados “em breve”. Desde 2013 que “o IC tem feito imensas obras de reparação dentro da Iec Long” e foi nesse ano que teve “conhecimento do problema e tentou corrigir a questão [da degradação], mas não havia lei” do Património e o local, diz Ung Vai Meng, “estava em circunstâncias caóticas”. O presidente do IC mostrou-se satisfeito por ter levado a cabo os trabalhos, porque “se não os tivesse feito tudo teria sido demolido”. O instituto quer tornar o local um museu que mostre exactamente como se fabricavam os panchões: para isso baseou-se em livros sobre a história da fábrica, dialogou com os moradores da zona e recolheu utensílios e móveis para o espólio do património. De tutela em tutela O caso da permuta de terrenos da Iec Long envolveu a Shun Tak Holdings, que trocou um terreno de 99 mil metros quadrados com a Sociedade da Baía da Nossa Senhora da Esperança, que se dizia dona dos lotes da Fábrica. Sem autorização para tal, resta saber se os edifícios Mandarim Oriental e One Central estão em risco por estarem a ocupar um local cujo proprietário não era a Sociedade. Advogados dizem que não, mas numa resposta dada ao HM, o CCAC diz que “a Direcção dos Serviços de Solos, Obras Públicas e Transportes está a realizar a análise e o estudo aprofundado do caso” e vai acompanhá-lo “e resolver o assunto em conformidade com a legislação em vigor”. Já Alexis Tam, questionado na sexta-feira sobre a eventual existência de fraude, disse apenas que essa situação não cabia à sua tutela. “Compete a outros serviços públicos proceder a processos de acção judicial”, rematou.
Joana Freitas Manchete PolíticaTurquia | Erdogan retoma controlo e aproveita para “limpar” Exército Talvez tenha sido a tentativa de golpe de estado mais curta que alguma vez aconteceu: de sexta-feira para sábado, e em menos de 14 horas, militares do Exército turco anunciaram a tomada do poder na Turquia, para na manhã seguinte se renderem. Mas, a tentativa de golpe de Estado não foi uma brincadeira: deixou centenas de mortos e feridos, a suspeita de ter sido um ataque orquestrado e o agradecimento de um presidente a Alá [dropcap style=’circle’]E[/dropcap]ra noite quando forças do Exército turco entraram por estações de televisão e rádio adentro. Através dos canais nacionais, o “Conselho para a Paz na Nação” – como se auto-intitulavam – anunciava a tomada do poder na Turquia. Bombardeamentos e tiroteios ao lado dos edifícios do parlamento e do palácio presidencial em Ancara faziam ouvir-se. Ancara e Istambul ardiam aparentemente rendidas às investidas de soldados que se revoltaram contra o governo. Mas, na manhã seguinte, a história tinha dado uma reviravolta. Aquilo que foi uma tentativa de golpe de Estado na sexta-feira passou a ser a perseguição a militares e juízes no dia de sábado. A revolta durou menos de 24 horas, mas deixou 265 mortos (161 civis) e 1500 feridos, permitindo a Recep Tayyip Erdogan, Presidente do país, iniciar uma campanha anti-opositores. Erdogan estava de férias, quando, na sexta-feira ao final da tarde, os militares do seu Exército anunciavam ter controlado o país com o objectivo de “reinstalar a ordem constitucional, a democracia, os direitos humanos e a liberdade, de forma a assegurar que a lei e a ordem pudessem ser restauradas”. Imagens da CNN turca mostram dezenas de soldados a entrar pela sede da estação dentro. No céu, jactos do Exército sobrevoavam o parlamento, local onde um helicóptero militar deixou muitos estragos com tiros que se podem ver e ouvir em gravações vídeo. Os soldados percorriam as ruas de tanque, tendo até bloqueado duas das principais pontes e vias que davam acesso ao aeroporto de Istambul. Missão: Vingança A Turquia parecia, de facto, rendida aos militares. Mas Erdogan estava atento, apesar de se encontrar de férias. O presidente turco conseguiu voar até ao aeroporto de Atartuk, o principal de Istambul e que, curiosamente, os soldados não tomaram. E foi aqui, de telemóvel em punho, que o governante fez um apelo surpreendente ao país: pediu aos cidadãos que saíssem à rua e defendessem o governo. E muitos, de bandeira às costas, fizeram-no. Os manifestantes passaram a cercar tanques, de onde arrancavam à força soldados. Os protestos saíram à rua contra o golpe de Estado. Na manhã de sábado, os militares acabam por se render: de mãos no ar, sem armas, caminham na direcção da oposição, na Ponte de Bosphorus. Imagens mostram civis contra militares – os primeiros a bater nos segundos, acobardados no chão, com bastões e pontapés. Os símbolos que podiam relembrar o país de mais uma tentativa frustrada de golpe de Estado tinham desaparecido sábado de manhã. As forças fiéis ao regime tinham conseguido pôr fim à ocupação. Libertaram o chefe militar turco, sequestrado pelos revoltosos, enquanto o Primeiro-Ministro Binaldi Yildirim anunciava o fracasso da tentativa. Yildirim falava numa “acção que manchou a democracia” e, a par de Erdogan, propõe a restauração da pena de morte para os golpistas. É aqui que começa a caça ao homem: cerca de três mil militares são presos, entre eles dois generais e o comandante da Força Aérea, 2745 juízes e procuradores também se viram perseguidos até agora. E o presidente turco não é meigo nas declarações que faz. “Vão pagar por isto. Esta rebelião foi um presente de Alá, porque dá-nos uma razão para limpar o nosso Exército”, disse, logo após a rendição. Traidores e “uma minoria” foi como o responsável apelidou os envolvidos na revolta. [quote_box_left]“Vão pagar por isto. Esta rebelião foi um presente de Alá, porque dá-nos uma razão para limpar o nosso Exército” Recep Tayyip Erdogan, Presidente turco[/quote_box—left] Gulen, o inimigo Para Erdogan, o golpe militar tem um líder por trás: Fethullah Gulen, seu antigo aliado, agora exilado nos EUA. O Primeiro-Ministro do país, que já pediu a entrega de Gulen pelos norte-americanos, disse mesmo que quem apoiasse Gulen estaria a declarar guerra à Turquia. O clérigo, muçulmano, assegurou que nada teve a ver com o golpe e condenou o ataque. O mesmo fizeram os quatro principais partidos políticos da Turquia numa cena rara, quando se uniram para condenar o golpe numa sessão de emergência do Parlamento. Gulen é há anos acusado por Erdogan de estar a tentar um golpe de Estado para o deitar abaixo. Mas com militares. Era sabido que Gulen teria apoiantes nas autoridades policiais da Turquia, mas não no Exército. Outros dos seus apoiantes são, precisamente, juízes e magistrados. “Sendo alguém que já sofreu múltiplas tentativas de golpes de estado nos últimos cinco anos, é especialmente insultuoso ser acusado de estar ligado ao ataque”, disse Gulen, citado pela CNN. Com Erdogan, pequenos empresários, comerciantes e uma burguesia moderna subiram de estrato social. Foram esses, juntamente com os cidadãos turcos que não querem o regresso ao tempo dos golpes militares, que ajudaram o presidente a repor a ordem. Mas, se para uns Erdogan ajuda à manutenção da democracia, para outros é apenas um ditador que viu, agora, o seu poder reforçado. Gulen foi um dos que se juntou aos muitos analistas turcos que consideram que o golpe foi “orquestrado” por Erdogan. Macau com um pedido de ajuda Também o Gabinete de Gestão de Crises do Turismo de Macau emitiu um comunicado onde apelam aos cidadãos para se manterem em segurança. “A situação da Turquia tem-se agitado nos últimos tempos. O Ministério dos Negócios Estrangeiros e a Embaixada da China na Turquia avisam aos cidadãos chineses para não se deslocarem neste período à Turquia. Os cidadãos chineses e instituições que se encontram na Turquia devem manter em alerta máxima, ter em conta as devidas precauções de segurança, estar preparados para emergências, bem como evitar a saída das suas residências e deslocações a locais de grande concentração de pessoas”, pode ler-se no comunicado, onde admite ter recebido dois pedidos de informação e um pedido de assistência de cidadãos de Macau. O pedido de assistência refere-se a uma residente de Macau que se encontrava a aguardar em segurança na área restrita do aeroporto de Istambul para o voo de regresso a Hong Kong. Foi-lhe fornecida alimentação pela companhia aérea e a mulher deveria regressar assim que possível. Património em suspenso A UNESCO suspendeu a reunião do Comité do Património Mundial em Istambul, na sequência da tentativa de golpe militar na Turquia. “A 40ª sessão do Comité do Património Mundial está suspensa até novo aviso”, disse o organismo, com sede em Paris, num comunicado divulgado no seu site. A reunião arrancou no passado domingo e deveria terminar na quarta-feira. Pedida extradição de oito militares Entretanto, a Turquia já pediu à Grécia a extradição dos oito militares revoltosos que fugiram num helicóptero para o país. “Pedimos à Grécia para extraditar os oito traidores o mais rápido possível”, disse o Ministro dos Negícios Estrangeiros, Mevlut Cavusoglu, à estação televisiva HaberTurk. Os oito homens aterraram num helicóptero militar turco na Grécia, pedindo asilo, segundo já tinha revelado a polícia grega anteriormente. O helicóptero Black Hawk pousou depois de enviar um sinal de socorro às autoridades no aeroporto de Alexandroupolis, no norte da Grécia. Sete das pessoas a bordo estavam vestidas com uniforme militar e todos são suspeitos de envolvimento na tentativa de golpe de Estado. Portugueses a salvo O Ministro dos Negócios Estrangeiros português, Augusto Santos Silva, afirmou ontem que não existem pedidos de ajuda urgentes de portugueses na Turquia. “Não temos notícias preocupantes no que diz respeito a portugueses”, disse o chefe da diplomacia portuguesa à agência Lusa, numa declaração ao telefone a partir de Ulan Bator, capital da Mongólia, onde participou na Cimeira do Encontro Ásia-Europa (ASEM). “Estamos a acompanhar o mais de perto possível” a situação na Turquia”, afirmou Augusto Santos Silva, indicando que a embaixada de Portugal em Ancara “está a trabalhar activamente” e que houve “contactos” por parte de portugueses com a representação diplomática na capital turca, “o que é natural”. Augusto Santos Silva condenou o ataque. “Em primeiro lugar, condenamos a violência contra as instituições democráticas na Turquia e, portanto, apoiamos as instituições democráticas, isto quer dizer, a presidência, o parlamento e o governo turcos; em segundo, apelamos contra qualquer escalada de violência para evitar que os acontecimentos evoluíssem no sentido absolutamente indesejável e, em terceiro, apelamos a que fosse evitada qualquer tipo de violência contra civis”, disse Augusto Santos Silva. EUA | Kerry reage a alegações de envolvimento O secretário de Estado norte-americano, John Kerry, disse ao ministro dos Negócios Estrangeiros da Turquia, Mevlut Cavusoglu, que as acusações públicas sugerindo que oficiais americanos teriam planeado a tentativa de golpe militar na Turquia eram categoricamente falsas e prejudiciais às relações entre os países. Kerry pediu cautela à Turquia após a tentativa de golpe e sugeriu que o país respeitasse a lei na sua investigação sobre a conspiração, disse o porta-voz do Departamento de Estado, John Kirby. “Ele deixou claro que os EUA estariam dispostos a dar assistência às autoridades turcas conduzindo essa investigação, mas que insinuações públicas ou alegações sobre qualquer papel americano no golpe que falhou são inteiramente falsas e prejudiciais às nossas relações bilaterais”, disse Kirby, de acordo com Reuters. Foi o Ministro do Trabalho da Turquia, Suleyman Soylu, que afirmou que Washington estaria por trás da tentativa de golpe militar na Turquia. “Os EUA estão por trás da tentativa de golpe. Alguns jornais publicados [nos EUA] vêm conduzindo actividades por vários meses. Há muitos meses enviamos pedidos aos EUA sobre Fethullah Gulen. Os EUA precisam de extraditá-lo”, disse Soylu. O governo turco também acusou os soldados da base aérea de Incirlik de estarem envolvidos no golpe frustrado. A base é usada pelos Estados Unidos em ataques contra o Estado Islâmico na Síria e no Iraque. Sabia que… A Turquia já teve, pelo menos, quatro tentativas de golpes de Estado? A primeira aconteceu em 1960, seguindo-se uma em 1971. A terceira tem lugar em 1980 e a outra 13 anos depois.
Sofia Margarida Mota Entrevista MancheteJosé Luís Peixoto, escritor: “A literatura tem que dialogar com a sua história” José Luís Peixoto era professor de Inglês. O prémio José Saramago trouxe-lhe o nome para a ribalta e os livros passaram a ser a sua vida. Da poesia à prosa, já conta com títulos publicados em várias línguas e está em Macau para apresentar hoje o seu último romance. “No Teu Ventre” é um livro que vai às aparições de Fátima sem as contar e que reflecte um Portugal ainda rural e de fé. É apresentado hoje, às 18h30 na Livraria Portuguesa Começou por estudar Literatura Moderna. Como foi o caminho até ser escritor? Os estudos que fiz foram sempre um pretexto para me aproximar da escrita que sempre foi a área em que me senti bem. A partir de meados da adolescência tornou-se uma vocação muito evidente para mim. Nunca imaginei quando estava a estudar que poderia vir a viver da escrita. Os estudos eram o que me iria permitir ter uma vida profissional. A escrita seria de outro âmbito, algo que faria enquanto hobby, que é o que acontece com muitos escritores em Portugal e noutros lugares. Como é que se deu a passagem para escritor a tempo inteiro? Aconteceu tudo muito rapidamente. Publiquei o meu primeiro livro numa edição de autor em Maio de 2000, mas poucos meses depois publiquei o meu primeiro romance, que no ano seguinte ganhou o Prémio Saramago. Na altura teve um impacto enorme na minha vida. Fez com que as pessoas procurassem o meu nome. Poesia e prosa. O que é que nasceu primeiro? A poesia foi o género que comecei a escrever ainda na adolescência e que teve uma grande importância. Penso que tem a haver com o facto de ser uma poesia, em muitos aspectos, confessional. Quando a prosa surgiu, incorporou essa experiência e desenvolveu-se a partir dela. Ainda hoje, apesar da poesia ser um género que não publico com tanta frequência, olho para muito daquilo que escrevo na prosa e reconheço alguns critérios que me chegam directamente da poesia: no que diz respeito à linguagem, à concepção e estrutura do texto, à forma como vejo o todo. Em Portugal, a poesia é muito presente na literatura. Há autores que são incontornáveis. Escrever em Português sem os tomar em consideração é impensável. É impossível, por exemplo, não pensar em Fernando Pessoa e os seus heterónimos. Por outro lado, agrada-me muito um lado mais experimentalista da poesia, que cria novas maneiras de dizer. A prosa, em última análise, aspira sempre a essa inovação. Mas, confesso, ao longo do tempo tenho tentado encontrar outras maneiras de escrever e, nalguns casos, também me afastei da linguagem poética. Estou-me a lembrar do livro que fiz depois de uma viagem à Coreia do Norte, que se aproxima mais da crónica jornalística ou do texto documental. Também é conhecido pelos projectos multidisciplinares em que se envolve. Quais as mais valias que daí advêm? Penso que uma das grandes vantagens é o contacto com o outro e a vida que se gera a partir daí. Criam-se amizades que são muito importantes e que são presenças que mantenho na vida e que têm um valor difícil de avaliar. Enquanto se está a fazer um trabalho, o contacto tem uma certa profundidade e permite uma partilha especial. Por outro lado trata-se também de aprender com os outros, porque tenho-me apercebido que a grande maioria das questões que são colocadas em outras áreas de trabalho, por mais que tenham contornos específicos, quando mais aprofundadas, são realmente as mesmas questões. Isso passa a ser muito interessante enquanto debate para quem também anda à procura de soluções. Ao mesmo tempo, também é interessante assistir à forma como diferentes artes, em diferentes trabalhos, se complementam. Outros aspectos que me são agradáveis também dizem respeito à partilha das diversas dimensões na construção de um objecto artístico. Há, com as colaborações, um acompanhamento, alguém para dar um outro olhar. Quando isso é harmonioso, é muito bom. Ultimamente também é conhecido no mundo das viagens. Como é que surgiu? Quando olho para a minha experiência identifico o interesse pelas viagens logo pela minha infância. Nasci num lugar pequeno e com um certo nível de isolamento. Mas, ao mesmo tempo, sempre com um incentivo por parte dos meus pais, pela descoberta. As viagens que fazia na infância com os meus pais eram mais próximas do que as que tenho feito ultimamente, mas foi aí que esse gosto começou a ser alimentado. A partir do momento em que comecei a ser adulto aproveitei todas as oportunidades que tinha para viajar e, quando não surgiam, inventava-as. A primeira vez que viajei de avião foi por ter ganho um concurso televisivo. A primeira viagem a Cabo Verde – onde vim a dar aulas – foi num Hércules C130 que é um avião de carga. Quando comecei a escrever livros, um aspecto que também me deu um prazer muito especial foi ver os livros a viajar e, quando isso aconteceu, também comecei a ter oportunidade de viajar com eles. E entre livros e viagens foi à Coreia do Norte, de onde saiu mais uma obra… As viagens geram viagens e depois da primeira ida à Coreia do Norte para escrever o livro surgiram mais três convites. Já lá fui quatro vezes e essas idas têm transformado a minha relação com aquele lugar e com aquelas pessoas. Ainda assim, ir ali é sempre uma emoção. Mais do que qualquer outro lugar, por muito excêntricas que sejam as características, a Coreia do Norte é muito própria. É um lugar que quanto mais conheço mais dúvidas tenho e é sempre um grande mistério. Quais são as suas convicções acerca dessa realidade? É muito difícil. É um país com circunstâncias que para nós são inaceitáveis. Mesmo assim, o ser humano acaba sempre por encontrar formas de sobreviver e de alcançar as suas necessidades básicas que não são só comer, dormir e beber, mas também alguma necessidade de liberdade e realização dos afectos ou algumas formas de expressão. Mesmo ali, as pessoas também vão encontrando as suas formas de viver estes aspectos. Coisas que para nós, com o nosso olhar e os nosso hábitos, são coisas muito curtas visto a liberdade ser muito restrita. Mas para quem lá vive com todos aqueles condicionalismos enquanto única alternativa, torna-se uma questão de sobrevivência. Os seres humanos nunca deixam de ser e ter as suas características enquanto tal, mesmo numa sociedade daquelas. Em contraste com a nossa, há muitos aspectos que nos chocam. Mas se nos despirmos de preconceito também encontramos alguns que deveríamos ter na nossa realidade. Outra coisa, e se calhar o mais importante, é o impacto que as pessoas têm em nós. Estabelecemos alguma relação com algumas e deixa de ser uma abstracção. Por muito que a comunidade internacional se queixe da Coreia [do Norte], quem realmente sofre com aquele regime é o seu povo. Enquanto que em outros lados muita gente é vítima de ameaças, ali as pessoas são vítimas de uma prática permanente de opressão. Da Coreia a Fátima. Como surgiu a ideia para abordar o milagre de Fátima num romance? É curioso que, tanto no caso do livro “Dentro do segredo”, que fala da Coreia do Norte, e deste “Em teu ventre”, sinto que quando anunciei estes trabalhos houve uma surpresa por parte das pessoas que se assemelhava. No caso da Coreia eu compreendo, mas no caso de Fátima foi mais surpreendente para mim porque este livro até faz um certo sentido dentro de outros temas que escrevi. Fátima realmente é um tema em relação ao qual, em Portugal, não existe um consenso. É um tema que tem determinadas formas de ser tratado e em que cada uma delas caracteriza rapidamente quem se está a pronunciar sobre isso. Mas sinto que nenhuma das duas formas são algo redutoras. Sinto que são também fruto de um certo tabu que existe à volta do tema, o que no fundo tem a haver com o medo social que o próprio assunto provoca. Porque é que isso acontece? Acho que o motivo essencial para que isso aconteça tem a ver com a importância deste acontecimento e da forma com tem sido vivenciado na sociedade portuguesa. É algo que, a meu ver, sintetiza pontos importantes daquilo que é a religiosidade em Portugal e isso faz com que seja um tema muito sensível. As pessoas evocam Fátima em situações muito sensíveis na sua vida, o que faz com que exista uma relação muito pessoal com este fenómeno que para muitos é intocável. Por outro lado, existe uma outra dimensão social e política que, ao longo das décadas, tem tido diversos significados e que em muitos aspectos simboliza um certo Portugal do passado e que é rejeitado pela modernidade. Há ainda um outro aspecto que tem a haver com a dimensão popular do fenómeno que, em muitas circunstâncias e desde o seu início, provoca uma certa resistência para circuitos mais elitistas. Todas estas dificuldades foram muito relevantes para a escolha desse tema. Como o queria tratar? Queria tratá-lo de uma forma que fosse exterior às formas anteriormente tratadas. A literatura tem que estar em diálogo com a sua própria história. Olhando para a história recente da literatura portuguesa nós vemos um caso muito marcante de relação entre a literatura e a igreja católica, por exemplo nalguns textos do José Saramago. Nesse caso tratava-se de uma postura de confronto. Também não era essa a minha intenção. Seria muito fácil chocar as pessoas com um tema como este. Bastava uma frase para conseguir ditar esse tom. O meu grande desafio era justamente criar uma terceira narrativa. De qualquer forma, quando anuncio às pessoas que o livro trata desse tema vejo que elas começam logo a tentar identificar se se trata de uma posição contra ou a favor. E do resultado do livro? Conseguiu isentar-se? Estou muito contente com o resultado porque efectivamente o livro acaba por se centrar em aspectos que são aceites por todos, porque são históricos e têm a ver com aquelas pessoas que existiram. Não é um livro que entra em descrições das aparições porque descrevê-las já seria tomar uma posição. No livro há um apagão nesses momentos, em que a narrativa se interrompe e se volta a retomar logo a seguir. Mas também acaba por se falar de outras coisas que já tinha falado noutros livros e que se calhar são aspectos que mais me atraíram para este tema. Quais? Falo da questão da ruralidade e desse Portugal ligado à terra. Foi um dos aspectos que simbolicamente mais me interessou. A devoção de Fátima sintetiza muito aquilo que acredito como sendo traços próprios da espiritualidade em Portugal, com características particulares como a da promessa ou do sacrifício, ou mesmo da mãe. É a terceira vez em Macau. Como vê a região? Até cá vir tinha uma perspectiva como os outros portugueses. A de um lugar misterioso. Acho que por mais que se explique é difícil realmente compreender como existe um lugar assim nesta região, com esta ligação a Portugal. Depois de cá vir pela primeira vez, e na altura já tinha ido a Pequim e Xangai, senti que para um português é realmente um lugar especial. Acaba por ser mais confortável para nós. Há alguma identificação, é isso? Sim. Come-se comida portuguesa, ouve-se a nossa língua. É um lugar que me traz uma certa admiração por aqueles que contribuíram para que essa marca ainda seja de cá e que inclusivamente seja entendida como algo de positivo.
Joana Freitas Manchete SociedadeColoane | Achados arqueológicos mostram actividade humana há 4000 anos Pedaços do Bronze, do Neolítico e de dinastias anteriores ao período em que se pensava que Macau começou a existir. Achados arqueológicos em Coloane abrem a porta a um território onde a actividade humana e industrial começou há milhares de anos [dropcap style=’circle’]M[/dropcap]acau descende de uma indústria diversa de panchões, fósforos e tinturia. A hipótese já era conhecida, mas agora as escavações arqueológicas que estão a ser feitas na Rua dos Estaleiros, em Coloane, podem prová-lo. O Conselho do Património Cultural apresentou resultados dos achados arqueológicos, que indicam actividade humana e até industrial em Macau desde há quatro mil anos. E uma presença que passa por várias dinastias. “Encontrámos em Macau quatro períodos históricos. [Isto] é único, foi só agora. Vestígios de há quatro mil anos e diferentes camadas culturais e períodos históricos”, começou por dizer Cheng, técnica superior do Instituto Cultural (IC). “Encontrámos tanques para guardar água e uma substância química, que não sabíamos o que era. Enviámos para a Universidade de Zhongshan para determinarem. Havia uma substância 30% acima da água natural, o que mostra actividade humana e até industrial e que pode ajudar a desvendar o desenvolvimento [fabril]”, explicou, dizendo que ter como referência as regiões vizinhas ajudou a entender os achados. Além de fragmentos do Neolítico (3000/4000 anos) e do Bronze (2500/3000 anos), também se encontraram objectos da Dinastia Qing e de outras. Rica herança “Os arqueólogos encontraram quartzo, que data de três a quatro mil anos, que deve ser do período em que o homem começou a utilizar e fabricar acessórios. Encontraram potes e fragmentos da idade do Bronze. Lareiras da dinastia Tang e Song. Macau começou em meados da dinastia Ming, mas isto mostra que já antes havia actividades humanas, o que é uma descoberta de grande relevância.” Foram dois anos de escavações, investigações e estratégias de preservação em 680 metros quadrados de terreno que não está totalmente escavado. Divididas em três fases, as escavações passaram a pente fino o campo de futebol, basquetebol e o parque de estacionamento da Rua dos Estaleiros. Especialistas dizem que “não se pode fazer as escavações todas de uma vez”, frisou o IC, e a protecção vai ser feita em “local adequado”, mas também no próprio sítio. “Não vamos agora fazer profundas escavações, porque acreditamos na mesma zona ainda há artefactos”, frisou Cheng. Os achados que foram encontrados e puderam ser movidos, foram-no, mas tanques e lareiras, por exemplo, vão ficar tapados com um “enchimento leve” e, por isso, não vão estar expostos ao público. Alexis Tam, Secretário para os Assuntos Sociais e Cultura e presidente do Conselho do Património, frisou que a ideia é que as próximas gerações possam fazer um trabalho melhor de preservação. “É uma descoberta muito importante para o Governo, ter uma civilização muito antiga [aqui] e uma herança cultural muito rica”, frisou Alexis Tam, acrescentando que vieram especialistas portugueses e da Holanda ajudar nas investigações. “Mostra que havia actividade humana em Macau e a preservação é o foco. Temos de saber como preservar e, por isso, não vamos recomendar qualquer actividade comercial nesta zona.”