Mandatários de Ho Chio Meng não tiveram confiança do processo

Um dia depois de o Tribunal de Última Instância ter dado a entender que Ho Chio Meng teve tempo para se defender, os advogados do ex-procurador da RAEM falam nas dificuldades de acesso ao processo. Há mais de 30 mil páginas para ler em muito pouco tempo

[dropcap style≠’circle’]O[/dropcap]s mandatários de Ho Chio Meng, antigo procurador da RAEM, só podem preparar o julgamento durante o horário de funcionamento do Tribunal de Última Instância (TUI). De acordo com o que apurou o HM, foi-lhes negada a confiança do processo, ou seja, os advogados não podem levar os volumes referentes ao caso para o escritório, de modo a prepararem o julgamento.

“Temos o direito de requerer a confiança do processo”, apontou a advogada Lee Kam Iut, que confirmou que o pedido foi feito na semana passada, um dia antes de ter sido tornada pública a data de início do julgamento, marcado para 5 de Dezembro. “Só podemos consultar o processo nas instalações do tribunal.”

O caso de Ho Chio Meng arrisca-se a entrar para a história judicial de Macau como sendo o maior de sempre, em termos físicos: são mais de 30 mil páginas, contando com os 36 volumes da acusação principal e os 81 volumes de apensos. Só o despacho de pronúncia tem mais de mil páginas. Ao todo, o ex-procurador responde por 1536 crimes.

Atendendo à complexidade e tamanho do processo, o tempo escasseia para os mandatários. “Para defendermos um cliente, temos de estudar bem um processo. Se não o fizermos, não temos dados suficientes”, assinala a advogada, questionada sobre a possibilidade de a defesa de Ho Chio Meng estar, desde já, comprometida.

As dificuldades sentidas pelos mandatários começaram logo na fase da instrução. Diz a lei processual de Macau que, após a notificação da acusação, o arguido tem dez dias para requerer a abertura da instrução. Durante esta fase, explica Lee Kam Iut, só foi autorizada a consulta do processo nas instalações do tribunal – mais uma vez, no horário de expediente do TUI – sem que tivesse havido a possibilidade de serem tiradas fotografias ou cópias. Ou seja, as notas que os mandatários recolheram foram escritas à mão. “Não conseguimos analisar bem o processo”, diz Lee Kam Iut. “Até ao debate instrutório, não conseguimos consultar todo o processo.”

A dimensão do caso e o facto de os volumes não saírem do edifício do TUI torna ainda mais difícil a existência de uma contestação à acusação, que teria de ser feita até ao próximo dia 29.

Outra versão

Os esclarecimentos de Lee Kam Iut surgem na sequência de uma nota à imprensa feita pelo TUI na passada segunda-feira, em resposta “a alguns órgãos de comunicação social portuguesa” que reflectiram “a preocupação de alguns advogados pelo facto de a audiência de julgamento do ex-procurador da RAEM se iniciar a 5 de Dezembro próximo”.

No comunicado, o tribunal presidido por Sam Hou Fai não só explicava que os julgamentos com arguidos presos têm prioridade em relação aos restantes, como salientava que o TUI tem em mãos apenas um julgamento em primeira instância para fazer – aquele que tem, como único arguido, Ho Chio Meng.

Foram também deixadas algumas datas sobre o processo: o arguido requereu a abertura da instrução no passado dia 29 de Agosto, tendo sido declarada a 6 de Setembro. Desde essa data que “os advogados [de Ho Chio Meng] têm tido pleno acesso ao processo” no TUI. “O processo foi consultado muitas vezes, simultaneamente, por vários advogados do arguido”, escreveu ainda o tribunal. “Aliás, até à data, nunca o arguido ou os seus advogados se queixaram de falta de acesso ao processo.”

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