Astronomia | Ver o que este céu não mostra

É um convite para uma viagem. A astrónoma Tânia Sales Marques está na sexta-feira no Centro de Ciência de Macau para explicar de que é feito este céu. A luz excessiva da cidade não deixa ver as estrelas, mas elas estão lá para serem vistas no planetário
Tânia Sales Marques

[dropcap]Q[/dropcap]uando Tânia Sales Marques decidiu ser astrónoma, já não era possível ver estrelas em Macau. Mas o céu era limpo em Coloane – “nas montanhas”, como dizia em miúda. O Cotai era um istmo e estava longe de se mascarar de luzes. Tânia Sales Marques interrogava-se sobre o que estaria no céu, que estrelas eram aquelas, de que seriam feitas.

É esta curiosidade que a astrónoma pretende despertar em quem for, na próxima sexta-feira, ao planetário do Centro de Ciência de Macau. De passagem pelo território, Tânia Sales Marques foi convidada para uma apresentação do céu de Macau, em moldes semelhantes aos dos shows que faz em Londres.

Trata-se de uma oportunidade única para quem se interesse por astronomia ou simplesmente para aqueles que nunca foram ao planetário de Macau. As apresentações que decorrem no Centro de Ciência são feitas em chinês; a astrónoma vai mostrar o céu de Macau em inglês. A apresentação será feita para o público em geral, sendo que as crianças são bem-vindas.

Ao HM, a astrónoma explica que vai usar o sistema digital do planetário – que “é muito bom” – para fazer uma apresentação do céu de Macau como estará na noite de 23 de Dezembro. “Começa com o céu e com o que é que se poderia ver se não houvesse poluição e as possíveis nuvens desse dia. Depois, vou levar o público a fazer uma viagem pelo espaço, em que falamos das coisas que estão lá, apesar de não as conseguirmos ver com os nossos olhos”, diz. Tânia Sales Marques vai falar das constelações e dos planetas, e da mitologia associada ao tema. A viagem termina com “conceitos mais cosmológicos”. “O que decidi fazer, para haver uma espécie de narrativa, foi ligar os objectos de que vou falar à sua história observacional. Vou fazer uma ligação às culturas e civilizações que descobriram ou observaram esses objectos”, diz.

“Não sou historiadora, nem antropóloga, mas a ideia é aproveitar o sistema digital que o planetário tem para mostrar coisas que não conseguiríamos ver num planetário mais tradicional, e relacionar esses objectos à nossa posição, de tempo e espaço, mas também ligá-lo à linha comum do Homem que é olhar para o céu, ver as estrelas e pensar no que é aquilo.”

CURIOSOS À NASCENÇA

Como é que se ensina a olhar para um céu que não se vê e querer saber-se mais sobre de que é feito? Tânia Sales Marques acredita que nasce- mos todos com vontade de perceber o que está acima de nós. Uma história bem contada pode ser o su ciente para despertar outro tipo de interesse, como aquele que a levou para uma universidade dos Estados Unidos para estudar astronomia.

“Hoje olho para o céu intuitivamente, mas a verdade é que os astrónomos amadores olham mais”, arma, fazendo referência às pessoas de Macau que, por exemplo, viajam até à China com os binóculos na mala a procura da escuridão. “Um astrónomo profissional acaba por se sentar em frente a um computador e vê números.”

“Espero que as pessoas, sobretudo as crianças, tenham vontade de explorar mais.”
TÂNIA SALES MARQUES, ASTRÓNOMA

A viver em Londres, Tânia Sales Marques conta que, “para manter a curiosidade” que a levou a escolher a profissão, começou a trabalhar no planetário da cidade. “Apresento shows para crianças e adultos. Londres acaba por ser um bocado como Macau: não tem tanta poluição de luz, mas o tempo faz com que não se consigam ver as estrelas.”

À semelhança do que vai fazer na sexta-feira, a apresentação no planetário londrino começa sempre com o céu em estado puro. “As pessoas sabem que é verdade, mas ao mesmo tempo não acreditam no que estão a ver, porque é um céu fantástico. E isto mostra que as pessoas continuam a manter a curiosidade, que é quase intuitiva, que faz parte do ser humano, de sentir uma certa ligação ao espaço mesmo que não o veja”, constata. “Saem dos espectáculos com vontade de saberem mais sobre astronomia em termos gerais.”

A experiência de Londres faz a astrónoma considerar que, na sexta-feira, terá uma boa oportunidade de “tentar tornar a ligação ao céu mais real”. “Espero que as pessoas, sobretudo as crianças, tenham vontade de explorar mais”, diz.

A apresentação de Tânia Sales Marques começa às 17 horas. A entrada é livre.

21 Dez 2016

À beira da maioridade: Trânsferência de Administração foi há 17 anos

Faz hoje 17 anos que Rocha Vieira entregou a administração de Macau a Pequim. Fê-lo abraçado a uma bandeira portuguesa, numa transição emocionada. O HM ouviu vários testemunhos que nos fizeram o balanço da vida da RAEM

[dropcap]O[/dropcap] início eram as descobertas. O espírito aventureiro dos navegadores portugueses chegou aos Mares do Sul da China, e aqui ficaram a administrar o território durante mais de quatro séculos. Até 1999, quando se deu a transferência de administração para a República Popular da China, nascendo a Região Administrativa Especial de Macau. Em dia de aniversário, ouvimos as opiniões de quem aqui vive, para um balanço destes 17 anos.

O designer Manuel Correia da Silva considera que podemos olhar para a idade da RAEM como olhamos para o crescimento de uma pessoa. Houve uma infância e, hoje em dia, estamos à beira da maioridade mas ainda a atravessar uma fase tardia da adolescência. “Espero que a maturidade chegue a todas as figuras de poder desta cidade, não só ao Governo local, mas também à sociedade civil”, comenta.

“Espero que a maturidade chegue a todas as figuras de
poder desta cidade, não só ao Governo, mas também à sociedade civil.”
MANUEL CORREIA DA SILVA, DESIGNER

A ideia de chegar à idade adulta é intimamente ligada a um sentido de autonomia, “já podemos sair sozinhos”, como comenta Correia da Silva. A ideia é uma maior capacidade de auto- gestão que permita a internacionalização, o envolvimento com a região. O designer não se refere apenas a factores comerciais. Nesse aspecto houve, realmente, maior abertura ao exterior, mas a um novo olhar político, uma nova forma de pensar o território. Nesse sentido, considera que a RAEM devia “olhar para as lusofonias como um bom canal de internacionalização”, na forma como a marca Macau se pode instituir lá fora. Para tal, será necessário projectar uma imagem mais graúda, “e isso tem que ver com responsabilidade”.

Hoje em dia, Macau é uma cidade mais cosmopolita, que oferece maior liberdade de movi- mentos aos cidadãos, mais ligada ao que se passa em seu redor. “Nós já estávamos envolvidos neste Delta, uma zona do mundo especialmente activa nestes últimos 10 anos”, algo que melhorou com “as políticas de abertura da China para o resto do mundo”. Factos políticos com impacto, e que forçaram a competitividade e inovação.

BOOM VERTIGINOSO

Portugal entregou Macau à China com os cofres em situação modesta. “Quando passou a administração tínhamos apenas um fundo de 10 biliões de patacas, o que não dava para alimentar sequer um ano de Orçamento”, lembra o economista Albano Martins. Neste momento, o Governo tem os cofres cheios. Facto que é incontornável neste balanço de aniversário, assim como os números do desemprego. Aquando da transferência, Macau tinha uma taxa de mais de sete por cento, hoje em dia está abaixo dos dois por cento, um número que representa pleno emprego.

Au Kam San, deputado à Assembleia Legislativa, aponta a óbvia “liberalização do jogo de grau limitado e a política de visto individual oferecida pelo Governo Central”, como “factores decisivos para o desenvolvimento a grande velocidade”. Estes foram os pilares que enriqueceram a administração da RAEM, e que possibilitaram o investimento numa série de infra- -estruturas que enriqueceram o nível de vida dos habitantes de Macau.

“As comunidades portuguesa e macaense continuam dinâmicas, são partes fortes do sistema, e merecem o reconhecimento devido pelos Governos Central e local.”
CARLOS MARREIROS, ARQUITECTO

Albano Martins acrescenta que “os grandes desenvolvimentos se deram durante a administração de Edmund Ho que foi, de facto, a grande dinamizadora”. O economista considera que durante esse período houve coragem para tomar decisões mas, infelizmente, o segundo mandato ficou manchado pelo escândalo Ao Man Long. “Nesta última administração pouca coisa se fez, tirando uma ligeira acção neste último mandato, embora sempre com um atraso que não era expectável dadas as capacidades financeiras que a administração de Macau hoje tem”, comenta o economista, que vive há quase 40 anos no território.

O arquitecto Carlos Marreiros reforça este ponto, acrescentando que “a administração não soube acompanhar a dinâmica do investimento, a uma escala gigantesca, à qual não estávamos acostumados”. Também no panorama regional, a inacção governativa levou à perda de competitividade. A inércia administrativa é algo palpável, a que a população reage. “A população tem um relacionamento muito crispado com a administração. O que a administração faz é sempre mau, o que não é verdade, também há coisas muito positivas”, acrescenta. Nesse aspecto, salienta a classificação pela UNESCO do centro histórico de Macau como património mundial e o investimento recente na educação. “O acesso ao ensino melhorou bastante, é gratuito e estendido a todas as idades com um apoio pecuniário para quem queira continuar a estudar.”

Apesar destas melhorias, a apatia generalizada do poder local é sentida pelo povo, levando a “um processo de pré-divórcio, como uma comunicação impossível, alicerçada no conflito que não resulta em consenso, mas numa sociedade fracturante”. “Isso não é bom numa terra pequena, é mau para a criação de soluções e para o diálogo”, acrescenta o arquitecto nascido em Macau.

Para a deputada Melinda Chan, “uma das vantagens que vieram com a transição foi a melhoria na segurança”. Chan elenca ainda nos aspectos positivos o reconhecimento da RAEM ao nível internacional, “que se sentiu com a entrada de grandes empresas e investimento, e com o aumento de turistas”.

NEM TUDO SÃO ROSAS

A prosperidade trouxe por arrasto alguns problemas, particularmente no que diz respeito à poluição, ao crescimento desordenado, ao trânsito e à habitação. Este último capítulo é destacado por Lam U Tou que considera que, anterior- mente, “a população mais pobre conseguia com algumas poupanças ter as suas próprias casas”, algo que o boom no mercado do imobiliário veio dificultar. Para o membro do Conselho Consultivo dos Serviços Comunitários da Zona Central, esta é a maior falha do Executivo e o factor de maior desagrado da população.

Já o deputado Au Kam San vê na corrupção o pior efeito secundário do boom económico, com consequências muito nefastas para a sociedade. “Durante a administração portuguesa havia problemas de corrupção, mas eram de menor dimensão. Hoje, o problema cresceu à medida que o Governo ficou mais rico, como exemplificou o caso Ao Man Long”. O pró-democrata acha que a promiscuidade entre o ciais da administração e grupos empresariais atinge maiores proporções. Uma das razões apontadas por Au Kam San prende-se com o défice de democracia, com os quadros governativos a ocupar muito tempo o poder. Este é um problema que “sacrifica o interesse dos pequenos cidadãos”, acrescenta.

“Durante a administração portuguesa havia problemas de corrupção, mas eram de menor dimensão. Hoje, o problema cresceu à medida que o Governo ficou mais rico, como exemplificou o caso Ao Man Long.”
AU KAM SAN, DEPUTADO

No rol de aspectos negativos, Albano Martins destaca a ausência de “um sistema de reformas digno desse nome, adequado aos rendimentos do Governo”, não esquecendo as problemáticas questões do trânsito, cultura e a poluição. Para o economista, é como se a administração da RAEM não soubesse lidar com o crescimento exponencial. “A solução encontrada parece ser parar esse crescimento.”

Carlos Marreiros olha para este quadro socioeconómico com alguma preocupação, num panorama em que “as pequenas e médias empresas têm dificuldade em se imporem”. Para tal, tem contribuído um desenvolvimento mal distribuído, “nem sempre para benefício do povo”. Mas o arquitecto também vê o copo meio cheio, e faz “um balanço globalmente positivo”. “As comunidades portuguesa e macaense continuam dinâmicas, são partes fortes do sistema, e merecem o reconhecimento devido pelos Governos Central e local. Nestes 17 anos não deixámos de participar, fomos fazedores do passado de Macau, um passado com mais de quatro séculos, estamos a fazer o presente e a projectar o futuro de todos nós”, comenta o arquitecto. Neste aspecto, o sabor diferente que a portugalidade oferece à região torna Macau num local diferente do resto da China, sendo que “uma das principais razões é a existência desta universalidade que é a cultura portuguesa, miscigenada localmente a vários níveis, e que cria originalidade na ponta desta enorme China”.

Foi há 17 anos que o Governador Vasco Rocha Vieira levou a bandeira ao peito e partiu para Portugal

Não obstante os 17 anos da transferência de administração de Macau para a China, a alma lusitana ainda se faz sentir na universalidade de que Carlos Marreiros fala. Um bom exemplo desse aspecto fluido culturalmente é a própria vida de Manuel Correia da Silva. Há três anos, o designer viu-se na iminência de ter de mudar de cidade, empurra- do pelo desconforto que sentia, pela deterioração da qualidade de vida e a subida vertiginosa da in ação. As circunstâncias empurraram-no para lá das Portas do Cerco e a procurar outra vida em Zhuhai. “Para mim isto também já é Macau, apesar de existir aqui uma fronteira administrativa que é preciso ultrapassar. Macau vem comigo para este lado da fronteira e o mesmo acontece no sentido inverso. É uma fronteira um bocado orgânica, ela vai e volta comigo”, explica. Uma fluidez que parece ser a metáfora perfeita para simbolizar Macau.

20 Dez 2016

Os 1001 contratos de Ho Chio Meng

Em mais uma sessão do julgamento do antigo procurador da RAEM, o arguido continuou a alegar a inocência dos crimes que lhe são imputados. O tribunal tentou obter respostas gerais sobre os contratos em que terá havido crime, mas Ho Chio Meng foi aos pormenores

Não, tudo tintim por tintim

[dropcap]D[/dropcap]a acusação fazem parte mais de mil contratos celebrados pelo Ministério Público (MP) durante os anos em que Ho Chio Meng esteve à frente da estrutura. Ontem, de acordo com o relato feito pela Rádio Macau, foram analisados mais de 300. Dizem todos respeito ao funcionamento do MP e a lista é vasta: da compra de fotocopiadoras a aluguer de bonsais, passando pela limpeza de tapetes, manutenção de extintores e fornecimento de água e luz.

Segundo a emissora, o antigo procurador fez questão de responder por cada um dos contratos em que a acusação encontra indícios de crime. O colectivo de juízes do Tribunal de Última Instância, onde Ho Chio Meng está a ser julgado, ainda perguntou ao arguido se negava, de forma geral, os crimes de burla e associação criminosa associados a estes contratos, mas o ex-procura- dor fez questão de refutar os factos um a um.

A acusação entende que os 1300 contratos em questão terão dado, a Ho Chio Meng, 50 milhões de patacas, um valor acumulado ao m de dez anos. O arguido recuperou um argumento que tinha usado já na sessão anterior: é absurdo pensar que um procurador iria criar uma associação criminosa para obter vantagens tão reduzidas. Nalguns destes contratos, os benefícios detectados pela acusação não chegam a 500 patacas.

O ex-procurador garantiu que não recebeu um avo e reiterou a inocência. Ho Chio Meng assegurou que não violou qualquer princípio, não indicou fornecedores, não participou de forma alguma nos alegados falsos concursos e não retirou qualquer vantagem.

OLHEM OS LAPSOS

De acordo com a acusação, as empresas que beneficiaram deste esquema – dez no total – eram controladas por um irmão e um cunhado de Ho Chio Meng através de dois testas de ferro, todos eles arguidos no processo. Segundo a rádio, Ho Chio Meng disse que não assinou a maioria dos contratos, nem teve conhecimento dos factos.

Os valores dos contratos em análise são muito variados. Entre 2011 e 2014, o MP gastou 300 mil patacas com fotocopiadoras. Estes contratos terão resultado numa contrapartida de 36 mil patacas atribuídas a Ho Chio Meng e a mais sete pessoas ao longo de três anos. Já com os aparelhos de ar condicionado, a alegada associação criminosa terá obtido três milhões de patacas em vantagens.

Ho Chio Meng diz que é absurdo pensar que um procurador iria criar uma associação criminosa para obter vantagens tão reduzidas

A acusação explica que estas contrapartidas eram conseguidas através de um esquema de subempreitadas: as empresas contratadas pelo MP subcontratavam outras empresas mais baratas para executar o serviço.

Durante a sessão de ontem, Ho Chio Meng aproveitou para corrigir alguns pontos da acusação, como cálculos de percentagens e nomes trocados. O tribunal admitiu haver lapsos.

O julgamento é retomado depois das férias judiciais, a 4 de Janeiro do próximo ano. Ho Chio Meng vai acusado de mais de 1500 crimes.

20 Dez 2016

Táxis | Agressão de motoristas leva cliente ao hospital

Um residente de Macau foi agredido no passado fim-de-semana por vários motoristas no Cotai, junto ao Galaxy. O caso foi parar à esquadra e ao hospital. É mais uma história em que o sector não fica bem na fotografia

Era para as urgências, por favor

[dropcap]U[/dropcap]m residente de Macau foi agredido no passado m-de-semana por vários motoristas no Cotai, junto ao Galaxy. O caso foi parar à esquadra e ao hospital. É mais uma história em que o sector não fica bem na fotografa a cara, atiraram-me ao chão e deram-me pontapés.” A vítima acredita que a agressão ficou registada no sistema de video-vigilância.

O residente, de nacionalidade polaca, garante que não teve capacidade de resposta, até “porque ficou em choque” e os agressores eram muitos. A polícia acabou por intervir rapidamente e foram todos transportados para a esquadra. “Levaram-me para o hospital, recolheram os depoimentos dos motoristas e dos meus colegas.” Só às seis da manhã é que puderam ir, finalmente, para casa.

QUEM É QUEM?

Ainda de acordo com o relato de Lam, o agredido conseguiu identificar o primeiro taxista agressor, sendo que a polícia perguntou se queria apresentar queixa – a resposta foi afirmativa. Ao HM, Simon Lam diz que, apesar de terem chegado ao local com rapidez, não se sentiu tratado como vítima pela polícia. “Mantiveram-me durante muito tempo, pediram-me para pagar a conta do hospital, pediram a minha identificação e tentaram desencorajar-me de apresentar queixa várias vezes”, explica.

“Foi então que pelo menos três motoristas me tiraram do táxi, agrediram-me na cara, atiraram-me ao chão e deram-me pontapés”
SIMON LAM, CLIENTE AGREDIDO

À semelhança de muitos residentes e turistas de Macau, o gestor já tinha tido experiências desagradáveis com taxistas, mas “nunca ao ponto de envolverem violência”. Para já, ainda não decidiu o que vai fazer. “Ainda estou abalado com tudo isto. Quero focar-me no ginásio e ficar mais forte para uma futura situação do género”, ironiza. “Sair à noite pode ser perigoso.” Quanto ao recurso a meios legais, Lam tem dúvidas acerca dos resultados. “Não tenho qualquer informação acerca de quem são, não foram detidos, a polícia apenas lhes pediu a identificação e os transportou para o hospital”, remata.

20 Dez 2016

China | Natalidade aumentou 5,7 por cento depois do fim da política de filho único

Depois de mais de três décadas com uma política de planeamento familiar muito restritiva, a China acabou com a política de filho único há um ano. A natalidade subiu e muitas pessoas que não se puderam registar constam agora dos assentos de nascimento. Mas existe um enorme problema para resolver: há 13 milhões de vidas que não sabem como recuperar o tempo perdido

[dropcap style≠’circle’]A[/dropcap] China termina este ano – o primeiro em que todas as famílias estiveram autorizadas a terem dois filhos depois de mais de três décadas de política de filho único –, com 17,5 milhões de nascimentos, o que representa um crescimento anual de 5,7 por cento. O número de nascimentos é o maior registado pelo país este século.

O número, revelado pelo diário oficial Global Times, compara com os 16,55 milhões de nascimentos registados no ano passado, e demonstra um “crescimento estável” da natalidade após a flexibilização das políticas demográficas. Além disso, está de acordo com as expectativas, segundo responsáveis da Comissão de Planeamento Familiar e Saúde que, na semana passada, se reuniram para analisar os primeiros efeitos destas reformas.

Os segundos filhos que nasceram em 2016 têm, à partida, um destino bem diferente daqueles que, de 1978 para cá, foram tidos por casais que já tinham uma criança. O fim da política de filho único veio acabar com um problema para muitas famílias e permitir o registo de pessoas que, até agora, não existiam para as autoridades, mas há um problema que atravessa já duas gerações que parece ser difícil de resolver: as pessoas que, por terem vivido na sombra, perderam a possibilidade de estudar, de arranjar um emprego, de terem um vida normal.

A residir em Pequim há 23 anos, Li Xue nunca frequentou uma escola, nem sequer durante um dia. A China tem um sistema de educação que prevê nove anos de ensino gratuito, mas Li ficou de fora do esquema. Também nunca teve, em 23 anos, qualquer apoio da segurança social. Não tinha autorização para casar, encontrar um emprego ou abrir uma conta bancária. Li Xue é a segunda filha dos seus pais. Por causa da política de filho único, em vigor entre 1978 e 2015, a jovem não fazia parte dos números oficiais da população chinesa.

Li contou à Reuters que os pais tentaram registá-la quando nasceu na esquadra da polícia, mas os funcionários recusaram o pedido e pediram uma carta de autorização da comissão de planeamento familiar local, um requisito essencial para se ter um segundo filho.

Sem carta para mostrarem às autoridades, os progenitores da jovem tinham de pagar uma avultada multa para poderem registar a filha. Sem possibilidades para tal, Li Xue não entrou nos registos de nascimento chineses.

Ao longo dos anos, a família fez vários esforços para legalizar a situação da jovem. Com o anúncio do fim da política de filho único e a autorização para um segundo descendente, Li conseguiu finalmente obter um documento que prova a sua existência.

A mudança de política do controlo da natalidade fez com que pessoas na situação desta jovem tentem agora recuperar os anos perdidos, ainda que com a sensação de que o reconhecimento oficial do direito à existência chegou demasiado tarde e sem a certeza de que as autoridades as vão ajudar a recuperar o que ainda for possível reaver.

Li Xue não pôde ter uma educação formal e lutou para aprender sozinha, recorrendo aos livros da biblioteca que eram requisitados em nome da irmã mais velha, uma vez que a família não tinha condições financeiras para contratar um professor particular.

“A minha mãe foi despedida do trabalho porque eu nasci”, conta a jovem, numa entrevista na casa onde a família vive em Pequim, uma habitação sem casa de banho e com um duche improvisado. “Tínhamos de viver, os quatro, com o salário muito baixo do meu pai.”

A mãe de Li, Bai Xiuling, recorda que a filha costumava chorar quando via as outras crianças a caminho da escola. “Ela queria estudar, mas não podia. A minha filha perdeu nove anos de ensino gratuito. Não há dinheiro que possa comprar o tempo que perdeu e que já não volta”, afirma a antiga operária fabril.

São 13 milhões no escuro

De acordo com os censos mais recentes, conduzidos em 2010, a China tem 13 milhões de cidadãos na situação de Li Xue, sem estarem registados – é quase um por cento da população do país.

A política do filho único foi uma implantada pelo governo da República Popular da China nos finais da década de 1970 com o objectivo de reduzir o crescimento populacional e facilitar o acesso da população do país a um sistema de saúde e educação de qualidade.

“A maior parte destas pessoas são crianças que nasceram enquanto a política de filho único esteve em vigor”, explica Jiantang Ma, o homem que liderava o Gabinete Nacional de Estatísticas da China aquando da realização dos censos.

Um estudo feito no ano passado pela Academia de Pesquisa Macroeconómica, sob a alçada da Comissão para a Reforma e o Desenvolvimento Nacional, permitiu concluir que quase metade dos cidadãos chineses que não estão registados são analfabetos ou não têm qualquer tipo de educação formal.

Durante os anos de vigência da política de filho único, os segundos filhos não podiam ser registados no sistema de residência do país, a não ser que fosse paga uma pesada multa, uma regra que foi seguida com raras excepções.

Também os filhos nascidos fora do casamento são considerados uma violação das regras apertadas de planeamento familiar, pelo que os casais que não contraíram matrimónio são obrigados a pagar uma multa para registar os filhos, dinheiro que nem sempre têm.

A China é dos poucos países do mundo com um sistema de registo de residência – o “hukou” – que contém informação como nascimentos e casamentos. Uma pessoa sem um “hukou” não tem acesso a serviços públicos (como educação e sistema de saúde) e está impedida de casar, de encontrar um emprego e até de abrir uma conta bancária.

A ligação entre a “política de filho único” e o “hukou” é controversa, com as autoridades governamentais chinesas a dizerem que o sistema de registo de residência é aberto a todos os cidadãos, sem quaisquer pré-requisitos. Mas as famílias afectadas argumentam que há uma ligação clara.

“Apesar de o ‘haikou’ e a política de filho único não deverem estar juntos, as autoridades locais têm relacionado estes dois aspectos durante anos porque descobriam que é uma forma de obrigar as famílias a obedecerem à lei de planeamento familiar”, comentou à Reuters Youshui Wu, responsável por um escritório de advogados em Zhejiang.

Youshui Wu, que ajudou muitos casais chineses a registarem os segundos filhos, acrescenta que existe ainda em torno desta questão um lado económico: as multas pesadas a que estavam obrigados os casais prevaricadores eram uma fonte lucrativa de receitas para as autoridades locais.

Casa de portas fechadas

Dados recolhidos pelo advogado em 24 governos ao nível provincial, disponibilizados pelas autoridades, mostram que, só em 2012, a China arrecadou mais de 20 mil milhões de yuan em multas pagas por casais que tiveram um segundo filho sem autorização prévia. “Nenhum destes governos foi capaz de fornecer informações sobre o modo como estas verbas foram aplicadas”, explicou Wu.

Wenzhuang Yang, um alto responsável da Comissão Nacional de Planeamento Familiar e Saúde, nega que a “política de filho único” e as punições que lhe estão associadas tenham contribuído para impedir o registo a milhões de cidadãos.

Numa conferência de imprensa este ano, o responsável disse que a comissão fez o que podia para remover os obstáculos criados pelas autoridades locais no registo de residência e que muitos cidadãos sem assento de nascimento foram agora incluídos no sistema ‘hukou’.

Chunyan Liu, uma professora de Inglês solteira, conta que não teve capacidade financeira para suportar a multa que teria de pagar pelo nascimento da filha, que esteve sete anos sem ser registada. Em Abril deste ano, a criança passou a constar dos registos nacionais. “A multa em Pequim era muito elevada. Pensei muitas vezes nisso, mas era impossível deixar as autoridades saberem que tive uma filha sem permissão”, diz.

Por não ter um ‘hukou’, a filha da professora não teve acesso a cuidados de saúde pagos pelo Governo. Também não podia comprar um bilhete de comboio ou sair do país. “Quando outros pais levavam as crianças à Disneylândia de Hong Kong, nós não nos atrevíamos sequer a pensar nisso.”

“A minha filha tem agora sete anos e nunca pôs os pés fora de Pequim”, relata ainda, confessando que continua preocupada com a possibilidade de as autoridades lhe exigirem o pagamento da multa.

Apesar de toda a história pessoal que carrega, Liu considera ter “sorte”. No ano passado, tentou encontrar uma escola para a filha estudar, mas não conseguiu, por causa da falta de um registo de residência. “Agora, ela tem tudo aquilo que precisa para poder frequentar uma escola pública”, diz.

A filha de Liu ainda vai a tempo de não ficar excluída de educação. Mas o destino de muitos foi bem diferente: os investigadores da Academia de Pesquisa Macroeconómica dizem que mais de metade dos chineses sem registo já fizeram 18 anos.

Muitos destes adultos não só viram vedados o acesso à escola, como tiveram dificuldades adicionais na procura de emprego, uma vez que não dispõem de documentação legal para serem contratados. O trabalho de investigação dá o exemplo de Liu Wei, da província de Henan, que não teve escolha: foi trabalhar para uma mina de carvão. Depois de a exploração ter fechado portas, ficou desempregado, uma vez que não conseguia arranjar um novo posto. Acabou a dormir na rua durante cinco anos.

Em 2012, a China arrecadou mais de 20 mil milhões de yuan em multas pagas por casais que tiveram um segundo filho sem autorização prévia.

Os filhos de quem não existe

O isolamento social é um problema que não pertence a uma só geração, com os investigadores a mostrarem dúvidas sobre os efeitos do fim da política de filho único para esta fatia da população. “Muitas pessoas sem registo cresceram e começaram as suas próprias famílias, dando assim início à segunda geração de crianças sem documentação”, escrevem os autores do relatório da Academia de Pesquisa Macroeconómica.

Wenzheng Huang, especialista em demografia e antigo professor assistente em Harvard, explica que Pequim tentou encontrar formas de resolver o problema depois de os censos de 2010 terem colocado em destaque o facto de existirem 13 milhões de cidadãos chineses sem registo.

“Tanto quanto sei, muitos desses segundos filhos ou filhos fora do casamento têm agora um ‘haikou’. O Governo Central começou a tratar do registo de residência de forma séria”, afirma o académico. “As autoridades reconheceram que a existência de tantas pessoas sem registo é um problema muito sério. Não só representa um preço muito elevado no desenvolvimento social, como tem causado uma enorme dor a muitas famílias.”

19 Dez 2016

Lei eleitoral | Juramento de fidelidade preocupa pró-democratas

Os deputados da Assembleia Legislativa aprovaram, na passada sexta-feira, a lei eleitoral. Sem ser consensual, o diploma obteve elogios da maioria dos tribunos e as reservas foram manifestadas pela ala pró-democrata

[dropcap style≠’circle’]E[/dropcap]stão aprovadas na especialidade as alterações à lei eleitoral. O diploma, apesar de reunir o consenso da maioria dos deputados, acrescenta um novo juramento de fidelidade à pátria que foi mote do debate entre pró-democratas e restantes membros da Assembleia Legislativa.

Para Ng Kuok Cheong, as mudanças não contribuem para a democratização do sistema político porque não se prevê a possibilidade de sufrágio directo universal. Por outro lado, para o deputado, as novas disposições sobre o juramento de fidelidade acontecem como “consequência das posições independentistas vizinhas, o que não faz sentido em Macau”. Para o tribuno pró-democrata, “não há necessidade de apertar mais o cerco”. “Não devemos aplicar do mesmo modo o que se está a fazer no outro lado: se há disputas lá não devíamos transferi-las para Macau”, sublinhou.

Au Kam Sam concordou com o colega de bancada. “Não é preciso definir por escrito o cumprimento da Lei Básica e a fidelidade à RAEM.” O deputado, que considera que este é um juramento já está previsto na Lei Básica, frisa o carácter desnecessário da medida. “Estamos a estragar o princípio ‘um país, dois sistemas’. É uma situação redundante. Não é preciso colocar isto na nossa lei eleitoral”, afirmou. Au Kam San questiona ainda o Executivo se “este não será um trabalho desnecessário e porque é que se tem de interpretar, à força, a Lei Básica”.

O novo juramento de fidelidade surgiu na sequência da polémica em torno da tomada de posse de dois deputados eleitos pró-independentistas de Hong Kong e prevê que a fidelidade dos futuros deputados de Macau seja avaliada pela Comissão dos Assuntos Eleitorais.

Aprender com os vizinhos

Kwan Tsui Hang integra o grupo de tribunos que concorda com a medida. “Manifesto a minha concordância total”, disse a deputada. “Estamos a absorver os ensinamentos do que se passa em Hong Kong, devemos aprender com eles e é ainda importante mostrar que Macau não os pretende repetir”, referiu.

“Prevenir uma doença contagiosa” foram as palavras do deputado Mak Soi Kun para mostrar a sua concordância com o aditamento à lei eleitoral aprovada. “É bom saber o que se passa nas regiões vizinhas para nos podermos precaver: se houver nos vizinhos uma doença contagiosa, temos de nos prevenir aqui também”, afirmou.

Tommy Lau, por seu lado, frisou que Macau é um território inalienável da China e o mais importante é ser fiel ao país. Para o deputado, “este aditamento reflecte o princípio ‘um país, dois sistemas’”.

A seriedade com que deve ser visto o juramento de fidelidade foi também sublinhada por Chui Sai Peng. “Podemos evitar que isto se torne uma brincadeira. Claro que a democracia e a liberdade têm os seus limites, não são direitos absolutos, temos de ter uma atitude muito séria em relação a esta questão”, disse.

A secretária para a Administração e Justiça, Sónia Chan, justificou o juramento tratando-se de uma medida para evitar que aconteça em Macau o que se passou em Hong Kong. “Trata-se de evitar que se verifique uma situação caótica da sociedade na eventualidade da ocorrência de casos semelhantes a Hong Kong”. Desta forma, “Macau tem enquadramento jurídico para lidar com a situação”, sublinhou.

Candidatos com depósito

Outra das questões levantadas por alguns deputados foi a obrigatoriedade de um depósito de 25 mil patacas para os candidatos à AL. O montante é devolvido caso consigam um mínimo de 300 assinaturas que apoiem a sua candidatura.

Para Au Kam San, a medida pode ser um obstáculo à candidatura dos interessados “com menos posses”. “Ao estipular esse requisito de depósito, claro que estamos a colocar um entrave ao acesso das pessoas interessadas em participar na eleição. Contesto veementemente esta posição”, disse.

O deputado José Pereira Coutinho também manifestou reservas quando ao depósito monetário obrigatório. “A fixação deste montante deixa-me com muitas reservas. Se todos os residentes podem ser candidatos, esta é uma restrição”, sublinhou, não deixando de dizer que “25 mil patacas é uma quantia exagerada”.

O Executivo explicou que o depósito serve de confirmação de credibilidade da própria candidatura e previne que “candidaturas menos sérias avancem”. “Isto visa evitar brincadeiras na participação nas eleições. Se as candidaturas tiverem menos de 300 assinaturas é uma eleição a sério? É um montante simbólico. O conceito é elevar a consciências das pessoas”, justificou o Governo.

Foi também aprovada, na especialidade, a proposta de orçamento de 2017, que prevê receitas de 102,944 mil milhões de patacas, menos 0,3 por cento face ao Orçamento previsto para este ano, e despesas de 95,725 mil milhões de patacas, que representam mais 12,6 por cento na comparação anual.

19 Dez 2016

Caso Ho Chio Meng | Sónia Chan diz que “não há nada de ilegal” nos telefonemas que realizou

[dropcap style≠’circle’]A[/dropcap] secretária para a Administração e Justiça de Macau, Sónia Chan, negou ter existido qualquer “troca de interesses” ou ilegalidade por ter recomendado, em 2008, um familiar seu para trabalhar no Ministério Público (MP).

“Tenho um familiar que trabalha no MP. Na altura tive uma oportunidade, disse ao ex-procurador que havia essa pessoa. Eu não tinha poder de decisão na altura, sendo coordenadora do Gabinete para a Protecção de Dados Pessoais (GPDP). Não era possível fazer pressão alguma. Não há troca de interesses, não há nada ilegal”, disse na sexta-feira Sónia Chan, que convocou os jornalistas, que assistiam a um plenário na Assembleia Legislativa, para esta declaração no exterior da sala, depois de, um dia antes, ter evitado as perguntas da comunicação social.

A secretária reage assim a declarações feitas em tribunal por Ho Chio Meng. O ex-procurador reconheceu que, sendo Macau pequeno, havia no seio do MP funcionários com relações familiares entre si e recordou que houve currículos que lhe passaram pelas mãos para potenciais recrutamentos. “As duas secretárias de apelido Chan [em referência a Florinda Chan e a Sónia Chan, respectivamente antiga e actual secretária para a Administração e Justiça] chegaram a telefonar-me”, afirmou.

O gabinete de Sónia Chan tinha já confirmado aos jornais Tribuna de Macau e Ponto Final que, em 2008, quando era coordenadora do GPDP, recomendou um familiar para trabalhar no MP, que acabou por ser contratado. A secretária negou, no entanto, quaisquer pressões e refutou a possibilidade de troca de interesses.

Na sexta-feira, Sónia Chan admitiu que agora que desempenha um cargo elevado “a exigência da sociedade é maior” e prometeu, “a partir de agora e no futuro”, ser “mais cautelosa” e ter um “desempenho que corresponda à expectativa do público”.

Quando questionada sobre que função exerce hoje no MP o seu familiar, a secretária disse não ter “mais informações para providenciar” e sublinhou que o poder de decisão era do MP. “Se ele precisa ou não de recrutar e se a pessoa correspondia às condições, isso foi decisão do MP. Eu não influenciei, apenas recomendei”.

Fica mal na acta

Na quinta-feira passada, o deputado Leong Veng Chai pediu uma investigação disciplinar à secretária devido a este caso, mas sem referir explicitamente o seu nome. Na sexta-feira, o jornal Ponto Final publicou declarações de Leong Veng Chai em que este diz que foi aconselhado pelo Gabinete do Presidente da Assembleia Legislativa a retirar do discurso as referências a Sónia Chan e Ho Chio Meng.

“Foi a primeira vez que isto aconteceu comigo. Foi-me dito que era melhor não colocar estas informações [referências a Florinda Chan, Sónia Chan e Ho Chio Meng]. Como o caso ainda está a ser julgado nos tribunais disseram-me que não é conveniente evocar o nome de Sónia Chan, nem do antigo procurador”, disse Leong Veng Chai ao jornal. “As recomendações foram feitas por parte do Gabinete do Presidente da Assembleia Legislativa”, indicou.

19 Dez 2016

Patriotismo | Visita à China de grupo liderado por Angela Leong alvo de polémica

Um grupo de 60 trabalhadores de casinos de Macau, liderado pela deputada Angela Leong, esteve este mês em Jinggangshan, na província de Jiangxi, para um curso patriótico de uma semana. A presença de gente ligada ao jogo no berço do comunismo chinês não caiu bem

[dropcap style≠’circle’]A[/dropcap] história é contada pelo jornal oficial do Partido Comunista Chinês (PCC), o Global Times. A visita a Jinggangshan de um grupo de 60 funcionários de casinos de Macau foi alvo de duras críticas nas redes sociais chinesas, com uma discussão acesa sobre o significado deste tipo de peregrinação.

Todos os anos, milhões de visitantes deslocam-se aos locais que, no passado, serviram de palco a momentos decisivos para o aparecimento do PCC para prestarem homenagem aos líderes comunistas e aprenderem mais sobre a estrutura partidária. Mas a visita do grupo de Macau – liderado por Angela Leong, identificada pelo jornal como sendo “a quarta mulher” do magnata de Stanley Ho – foi sobretudo ridicularizada na blogosfera.

Os organizadores argumentam que o curso de educação patriótica em Jinggangshan – “o berço da revolução chinesa” – serviu para transmitir aos participantes a noção de espírito de sacrifício. A justificação não bastou para apaziguar os ânimos daqueles que não concordam com operadores de casinos a prestarem homenagem aos revolucionários do PCC, que encaravam o jogo como um “pecado capitalista”, razão pela qual foi (e continua a ser) proibido no Continente.

Eles não sabem de história

Durante o curso, o grupo de funcionários – de todas as operadoras de Macau – usaram os antigos uniformes do Exército Vermelho, foram a “locais revolucionários”, cantaram canções comunistas e prestaram homenagem aos mártires da revolução. Em suma, fizeram as actividades que, por norma, são disponibilizadas nos pacotes de “turismo vermelho”, explica o Global Times.

“Para mim, a actividade que não esquecerei foi quando cantámos canções todos juntos. Aprendemos várias”, contou ao jornal Johnny Long, um gestor de 35 anos a trabalhar na SJM. “Não parece ter uma influência directa naquilo que fazemos mas, através destas actividades, aprendemos a sentir o espírito Jinggangshan: trabalhar de forma árdua, apesar das adversidades, e atrevermo-nos a inovar. Isto é muito relevante para a nossa vida”, acrescentou.

Também a trabalhar na Sociedade de Jogos de Macau, Amanda Lee destaca da semana de curso uma visita em que passou pelos principais locais onde estiveram os líderes revolucionários. “Estivermos num trilho que foi feito pelos soldados do Exército Vermelho. Cozinhámos ao ar livre com recursos muito limitados.”

Angela Leong – que liderou o grupo e esteve acompanhada por elementos do Gabinete de Ligação do Governo Central na RAEM –, escreveu ao Global Times a explicar a razão da visita de estudo. “Desde o regresso de Macau à China, o território tem conhecido um crescimento económico assinalável com o grande apoio da nossa mãe pátria. Sentimo-nos gratos por isso, mas também consideramos que as pessoas mais jovens, especialmente os trabalhadores dos casinos, sabem pouco da história da China”, afirmou a também deputada à Assembleia Legislativa.

Leong disse ainda que é o quarto ano consecutivo que organiza visitas a Jinggangshan para os seus funcionários, mas esta foi a primeira vez que convidou representantes de outras concessionárias. A Galaxy, a MGM, a Melco Crown, a Sands China e a Wynn Macau aceitaram o repto.

Da proibição ao moralismo

Apesar de quem trabalha nos casinos considerar necessário prestar homenagem aos revolucionários da China, escreve o jornal oficial, a China nem sempre foi tolerante em relação a jogadores e operadores da actividade.

O jogo, como se sabe, é ilegal no Continente e frequentes vezes acusado de causar distúrbios e problemas sociais. Em 1949, com o aparecimento da República Popular, passou a ser proibido. Durante muitos anos, o jogo era considerado um dos “seis vícios”, ao lado da prostituição, a pornografia, o consumo de drogas, a superstição e o tráfico humano.

Entre 1949 e 1979, contextualiza o Global Times, as pessoas que eram apanhadas a cometerem crimes relacionados com apostas iam parar a campos de reeducação como forma de punição.

Apesar da proibição interna, é conhecida a apetência dos chineses pelo jogo: há estimativas que apontam para que, em 2014, os apostadores do país tenham perdido 95,4 mil milhões de dólares em casinos fora da China Continental ou em salas de jogo clandestinas no país.

O jornal explica que a grande procura pelo jogo beneficiou Macau ao longo dos últimos anos, mas escreve também que a luta contra a corrupção desencadeada em 2012 pode fazer com que “os dias bons tenham chegado ao fim”, havendo uma grande incerteza em relação ao futuro do sector.

Nas críticas que o diário recolheu para escrever o artigo, nota-se uma postura de grande censura em relação aos casinos. “Muitos cibernautas do Continente consideram que a deslocação a locais revolucionários por representantes de casinos é tão inapropriada que chega a ser quase  irónica.”

“Os revolucionários ficariam zangados se soubessem quem lhes prestou homenagem”, escreveu um utilizador do Weibo. “Quem vem a seguir, as tríades de Hong Kong?”, lançou outro cibernauta.

“Para os chineses do Continente, os casinos não fazem um trabalho honesto, é injustificável do ponto de vista moral. Por isso, quando se aproximam de algo sagrado, isso é particularmente desarmonioso”, lê-se num comentário do Beijing News. “Apesar de os casinos serem legais em Macau, os operadores devem respeitar a lei e a cultura da China Continental quando realizam actividades no Continente. Deixem de ir a Jinggangshan no futuro.”

19 Dez 2016

AL | Aprovada lei da droga que prevê aumento de penas e testes à urina

Os deputados aprovaram alterações à lei da droga que contemplam um aumento de penas para o consumo e tráfico de estupefacientes, bem como a realização de testes à urina em locais públicos, caso haja suspeitas de consumo. Houve quem tivesse pedido a autonomização do tráfico de droga transfronteiriço, mas o Governo diz que não é possível

[dropcap style≠’circle’]D[/dropcap]emorou vários anos a ser revista e levantou muita polémica, mas foram finalmente aprovadas as alterações à lei da proibição da produção, tráfico e consumo ilícito de estupefacientes e substâncias psicotrópicas. A nova versão do diploma irá, assim, decretar um aumento do limite mínimo das penas de prisão para o tráfico, de três para cinco anos, com o limite máximo a manter-se nos 15 anos. Já o limite mínimo do consumo sobe de três meses até um ano, sendo que a mesma moldura penal se aplica a quem detiver utensílios ou equipamentos para o consumo de estupefacientes.

Gabriel Tong, deputado nomeado, alertou para o facto de a tendência internacional ser a diminuição das penas para o consumo, e não o seu aumento. Os próprios deputados, no seu parecer, alertaram para o “enorme retrocesso” que a sociedade local iria enfrentar com a nova lei. “Creio que não devemos actualizar ou elevar constantemente as penas. Vejo esta tendência de introduzir o agravamento da moldura penal em muitas propostas de lei.”

Os deputados questionaram as razões que levaram o Governo a não autonomizar o crime de tráfico de droga transfronteiriço, por forma a constitui-lo uma agravante da pena. “O Governo referiu que o crime transfronteiriço é grave, e constatou-se que muitos casos internacionais passaram por Macau”, começou por dizer a deputada Ella Lei. “Temos uma moldura penal relativamente baixa em relação às regiões vizinhas, e isso vai desfavorecer-nos. Com esta actualização do limite mínimo o tribunal pode optar por uma pena mais grave, mas [a ausência de autonomização do crime] merece a nossa penalização”, acrescentou a deputada.

O Governo explicou a incompatibilidade dessa autonomização com o actual regime jurídico. “Quanto ao tráfico transfronteiriço, desta vez esta iniciativa legislativa visa aumentar o limite mínimo de produção ilícita de substâncias psicotrópicas, e as nossas penas não são leves. Não queremos que Macau seja um ponto de passagem de droga e queremos afastar o consumo. Se autonomizarmos este crime não será compatível com esta lei. Alguns países autonomizam o crime e a punição é grave, como é o caso do Panamá ou Cuba, que são chamados reinos de droga. A situação é diferente em Macau”, explicou Sónia Chan, secretária para a Administração e Justiça.

Testes à urina questionados

Os deputados questionaram ainda a realização de testes à urina pelas autoridades policiais em locais públicos, caso haja suspeita de consumo de droga. O artigo acabou por ser aprovado por todos os tribunos.

Ainda assim, Chau Wai Kuong, director da PJ, garantiu que as autoridades não vão cometer quaisquer abusos. “Às vezes fazemos operações e verificamos frequentemente que, num karaoke, existem utensílios de droga em cima da mesa. Perguntamos a quem pertencem, neste caso não podemos apanhar todos e deparamo-nos com dificuldades na prática. Se não recolhermos esta prova pode resultar numa perda de provas.”

O deputado José Pereira Coutinho lembrou que pode haver acusação de pessoas inocentes, por terem consumido droga colocada por alguém num copo. “Não sei se existem directrizes para que as pessoas não sejam acusadas de forma caluniosa. Há pessoas que depois bebem bebidas com droga sem saberem e ficam inconscientes.”

O director da PJ prometeu que ninguém sairá lesado. “Temos de ouvir a explicação da pessoa em causa e os amigos, a lei consagra os direitos dos detidos. Não vamos apanhar pessoas à toa e temos de seguir as informações de que dispomos”, concluiu.

16 Dez 2016

Luís Sá Cunha, investigador: “[Luís Gonzaga Gomes] trouxe o mundo para Macau”

Luís Gonzaga Gomes é uma figura ainda por reconhecer, que deveria servir de inspiração para a cidade de hoje. Mais tolerante, mais transversal, mais pensada. Esta semana, Luís Sá Cunha recuperou o cenáculo que, no início da década de 90, criou para que o último grande sinólogo de Macau não fosse esquecido

[dropcap]D[/dropcap] e onde vem o interesse por Luís Gonzaga Gomes?
É uma coisa estranha, mágica, uma empatia. Vem desde miúdo: chegava a um sítio e, como o Papa João Paulo II, ajoelhava-me, beijava o chão, aquela era a minha terra. O facto de ser a minha terra significava que eu lhe pertencia e tinha de conhecer tudo. Quando cheguei a Macau, tive uma empatia com Luís Gonzaga Gomes. Comecei a ler. Em 1991, resolvi fundar o Cenáculo Luís Gonzaga Gomes, porque achava que era uma pessoa que encarnava no pensamento, nas obras, no comportamento, o mais essencial do espírito de Macau. É um lugar-comum, mas tem de se dizer: Macau foi um lugar de intercâmbios e sínteses culturais, de biótipos de todos os valores culturais. Luís Gonzaga Gomes é o último sinólogo de uma grande escola e de uma grande geração de sinólogos. Foi professor. Logo na escola, e depois onde esteve, começou a dizer que era preciso ensinar chinês nas escolas dos miúdos portugueses.

Mas o que é que Luís Gonzaga Gomes teve de tão diferente de outros estudiosos e sinólogos daquela geração?
A primeira diferença é que ele foi militante disto. Quando aqui cheguei, para compreender Macau e a cultura do Sul da China, e a China, lia os livros de Gonzaga Gomes – daí a minha empatia. Ele traduziu os clássicos, traduziu livros importantes para português. Também fez a tradução de livros portugueses para chinês. Sobretudo no ensino, procurou sempre impor nas escolas o ensino do chinês para os portugueses e vice-versa. Por onde ele passou, nos Correios e em outros lados, fez manuais para que se aprendesse cantonense. Foi uma vida inteira a escrever e a traduzir. O que é que tem de diferente? Tem de diferente que fez isso e os outros não fizeram. Tem 100 livros publicados, uma coisa enorme, esteve em todo o lado, fez parte de tudo. Também foi desportista, jogou ténis, tocava violino, na música era uma figura espectacular. Naquela altura, trouxe cá músicos famosos no mundo, pessoas que andavam no circuito internacional. Conhecia profundamente a música. Diz-se que tinha em casa um quarto inteiro forrado a corticite com uma discoteca enorme e o melhor que havia de aparelhagem. Era uma pessoa silenciosa, que andava como um gato, e que fugia dos sítios onde tinha de participar. Julgo que ia não só investigar, mas sobretudo ouvir muita música. Foi director da biblioteca, do arquivo histórico de Macau. Fez tudo. Abriu muito o conhecimento e a perspectiva sobre a China. Lia livros estrangeiros, tinha contacto com academias estrangeiras. Tirava cursos por correspondência, o que era muito normal naquela altura para gente que queria ter saber universitário, mas não tinha universidades. De certa maneira, procurou viver um próprio ideal universitário e de formação aqui. Ele respirou o mundo, ele trouxe o mundo para Macau.

É uma figura que está longe de ter o reconhecimento público que devia.
Acho inacreditável como é que Luís Gonzaga Gomes – considerado por toda a gente, e pelo Padre Manuel Teixeira o maior historiador de Macau de todos os tempos, com todo o trabalho que fez e publicou – não teve o devido reconhecimento e homenagem. Foi também uma das razões do Cenáculo, sobretudo por aquilo que ele representa e que eu desejava que se mantivesse nas gerações actuais, e nas gerações futuras. Há um pequeno reconhecimento na escola luso-chinesa. Há uma rua, mas isso, para mim, não é reconhecimento. É uma falha. Como é que é possível que se tenham editado obras completas de vários autores e não de Gonzaga Gomes – e não vou discutir o mérito deles. Como dizia o Padre Teixeira, “o pobre do Luís trabalhava até às duas da manhã”. Recolheu todos os artigos do Silva Mendes e publicou-os em quatro volumes.

Mas ninguém fez o mesmo com a obra dele.
Uma das coisas que o Cenáculo vai fazer, e que eu estou a fazer com o apoio nesta parte do Instituto Internacional de Macau (IIM), é juntar tudo o que escreveu nos jornais aqui. Depois tenho de ir a Portugal mas, agora, o mais importante está aqui, para haver um plano de edição das obras dele. Não digo a obra completa porque pode demorar muito tempo. Ele próprio organizou edições dos trabalhos dele. Depois, foram feitas edições sobre a obra, com selecções de artigos que são mais discutíveis, arbitrárias. Não são más, não é isso, mas não é aquilo a obra dele, há muita coisa para publicar, com rigor científico. Tem de se ir buscar prefácios, tem de se ver especialistas de antropologia, de etnografia de Macau, tem de ser feito um enquadramento histórico.

Não é uma tarefa simples para um homem só.
Já ando há dois anos a fazer isto, também a investigar, tenho toneladas de documentos para escrever a biografia dele para o Albergue da Santa Casa. Não tem uma biografia e acho que merece uma. Isto quanto a mim é a primeira base de um programa no plano cultural, que falta a Macau, e que é muito importante.

E a importância de Luís Gonzaga Gomes para o que é hoje Macau?
Ao ler esta semana uma newsletter no IIM encontrei uma nota para a revista em 2007 a dizer assim: Macau está-se a descaracterizar nas volumetrias da cidade. Na chegada massiva de turistas, na falta de conhecimento dos turistas que chegam aqui e disparam fotografias perante fachadas. Aquilo para eles é plástico, não existe, acham muita graça… Não há cá, no meu entendimento, um turismo cultural, mais profundo. Devia haver, porque Macau é uma coisa riquíssima nesse aspecto, e podiam-se chamar cá mais nacionalidades, se houvesse esses programas e se se fizessem esses itinerários. Dantes, quando vinha cá um Presidente da República, chamava-se o Padre Teixeira para ir explicar, porque ele sabia tudo. Hoje se vieram cá várias pessoas quem é que se vai chamar? O arquitecto Marreiros pode falar da cidade, também pode ser. Devia haver essa formação.

Mas hoje não há visita guiada para que haja explicação. 
Mas há aí muitas coisas. Eu podia fazer um itinerário romântico de Macau, era interessante. É a mesma coisa que o Schliemann fez, quando andou a buscar a história da Guerra de Tróia, investigou o mito de Helena de Tróia. Mas encontrou pouco. Supõe tu que estava lá uma pedra e que havia uma prova qualquer que era ali o trono dela. Era o suficiente para atrair uma multidão de turistas, porque a lenda e a história à frente daquela pedra têm outra solicitação. E aqui há pequenas coisas, casas que davam para isso. Coisas muito interessantes, muito bonitas.

Luís Sá Cunha

Diz que Gonzaga Gomes incorpora uma essência de Macau que se está a perder.
Há uma integração de 150 mil, 200 mil novos habitantes de Macau de repente, que não sabem nada disto. Estão aqui a viver, vão para os casinos e não sabem. Devia haver um museu. Os americanos têm de saber que Macau os ajudou, numa fase crucial para eles, para o desenvolvimento do comércio e de uma certa identidade cultural, porque as elites americanas vieram para aqui, para o comércio do Oriente. Foi com o auxílio de Macau que destruíram a Companhia Inglesa das Índias Orientais. Essas coisas não se sabem. Macau podia dizer assim ‘vocês agora estão com os casinos, vão outra vez ganhar dinheiro’, deviam fazer algum mecenato para obras culturais, revistas… Falta uma revista em Macau para certas áreas. E isso significa a descaracterização de Macau. As novas gerações não sabem nada, só de negócios. São cidadãos do mundo – não sei bem o que isso significa, para mim um cidadão do mundo é uma pessoa que pode andar em vários lugares, radica lá, mas ajoelha para beijar a terra. Tem de a conhecer, e tem de se dedicar também a ela quando está lá. Não podemos permitir essa descaracterização. Há gente nova que está aqui como se estivesse na Jugoslávia, no Sri Lanka ou noutro sítio qualquer.

Refere-se a uma comunidade em particular?
Estou a falar de todos. O novo Cenáculo vai ser diferente dos anteriores, porque o Cenáculo teve uma fundação em 1991 e foi interrompido em 1992, depois foi reanimado em 2007, e agora é reanimado outra vez. Vai ser diferente porque já foi convidada gente da nova geração de Macau, com uma grande participação de chineses bilingues. Isto é que é rigorosamente o espírito de Gonzaga Gomes.

O bilinguismo, a multiculturalidade.
Exacto. A edição, a tradução, a sinologia. Não só na língua, é também na gastronomia, na pintura e na música. Está aí o Simão Barreto que sabia todos os instrumentos, faz parte do conselho honorífico. Chamei mais de 30 pessoas [para o Cenáculo] e vou chamar mais.

16 Dez 2016

Caso Ho Chio Meng | Pereira Coutinho exige investigação a Sónia Chan

José Pereira Coutinho pediu no hemiciclo que seja levada a cabo uma investigação disciplinar à secretária para a Administração e Justiça, após ter sido tornado público que Sónia Chan telefonou a Ho Chio Meng a recomendar familiares para trabalharem no Ministério Público

[dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] deputado José Pereira Coutinho exigiu ontem na Assembleia Legislativa (AL) uma investigação disciplinar à secretária para a Administração e Justiça, Sónia Chan, depois de o ex-procurador da RAEM, Ho Chio Meng, ter dito em sede de julgamento que a secretária lhe recomendou familiares para trabalharem no Ministério Público (MP).

A história foi contada esta semana em tribunal por Ho Chio Meng, que está a ser julgado por mais de 1500 crimes, incluindo burla, abuso de poder, branqueamento de capitais e promoção ou fundação de associação criminosa, em autoria ou co-autoria com outros nove arguidos (que serão julgados num processo conexo).

Ho Chio Meng reconheceu que, sendo Macau pequeno, havia no seio do MP funcionários com relações familiares entre si e recordou que houve currículos que lhe passaram pelas mãos para potenciais recrutamentos. “As duas secretárias de apelido Chan [em referência a Florinda Chan e a Sónia Chan, respectivamente antiga e actual secretárias para a Administração e Justiça] chegaram a telefonar-me”, afirmou.

No plenário de ontem, Coutinho referiu-se “ao escândalo da secretária Chan”. “Após quase 17 anos do estabelecimento de Macau, a questão da ética na administração pública continua a ser um tema muito importante na sociedade civil. Uma grande maioria dos cidadãos entende como estar relacionado com corrupção, extorsão, ineficiência administrativa, e de que nem ‘todos são iguais perante a lei’ porque alguns, abusando dos poderes públicos inerentes aos cargos que ocupam podem obter benefícios e privilégios para si, familiares e amigos que o simples cidadão nunca imaginaria conseguir”, afirmou.

Para Pereira Coutinho, “a questão essencial e que, até hoje, não tem resposta é que existindo tantos organismos públicos como o Comissariado contra a Corrupção e o Comissariado da Auditoria (…), ninguém tenha detectado sinais de abusos de poder e corrupção deixando as coisas ‘ao sabor dos ventos’”.

O gabinete de Sónia Chan confirmou aos jornais Tribuna de Macau e Ponto Final que, em 2008, quando era coordenadora do Gabinete para a Protecção de Dados Pessoais, recomendou um familiar para trabalhar no Ministério Público, que acabou por ser contratado. Sónia Chan negou, no entanto, quaisquer pressões e refutou a possibilidade de troca de interesses.

O número dois de Coutinho, Leong Veng Chai, disse ainda que o Governo “deve, em cumprimento da vigente legislação da Função Pública, proceder de imediato à constituição de uma equipa independente de investigação disciplinar, para apurar a verdade dos factos e exigir responsabilidades”. Este referiu ainda que “houve titulares de principais cargos que aproveitaram os seus cargos para abusar do poder em proveito próprio, ajudando os seus familiares a acederem a emprego no Governo”, concluiu.

16 Dez 2016

Urbanismo | Macau terá “quarto espaço” em Coloane ou na Ilha da Montanha

Além dos novos aterros, Macau deverá ter uma nova zona reclamada ao mar, que foi ontem intitulada de “quarto espaço”, construída a sul de Coloane ou perto do actual campus da Universidade de Macau. A ideia surge no estudo da Universidade de Tsinghua e do Gabinete de Estudo de Políticas, ontem apresentado no Conselho do Planeamento Urbanístico

[dropcap style≠’circle’]D[/dropcap]aqui a alguns anos, Coloane poderá não ter mais um mar a perder de vista, ou a zona do campus da Universidade de Macau poderá dar acesso a um novo pedaço da cidade com casas e jardins. Segundo o documento “Estratégia de Desenvolvimento Urbanístico da RAEM 2016-2030”, elaborado pelo Gabinete de Estudo de Políticas (GEP) e pela Universidade de Tsinghua, está prevista a construção de um “quarto espaço” além dos futuros novos aterros.

“Vamos ter um quarto espaço, um novo conceito que desenvolvemos”, disse ontem o consultor principal do GEP, Mi Jian, na apresentação do documento na reunião de ontem do Conselho do Planeamento Urbanístico (CPU). “Esperamos que, além das três zonas existentes, e através da criação de um quarto espaço, se possam coordenar e aproveitar melhor os recursos de solos. O desenvolvimento de Macau é limitado e poderão ser necessários mais aterros e terrenos. Temos algumas ideias sobre o quarto espaço e já apresentámos esta ideia ao Governo Central.”

A localização ainda não está decidida, mas foram debatidas algumas ideias. “Poderemos ver se nos próximos 20 anos este quarto espaço terá ou não viabilidade, tendo como ponto de partida a zona sul de Coloane. Não quer dizer que iremos fazer um aterro mesmo em frente à praia de Hac-Sá, iremos fazer um pouco mais longe para não trazer impacto à paisagem.”

Mi Jian falou ainda da possibilidade de construir o “quarto espaço” na zona da Ilha da Montanha, até porque “um aterro perto da zona A pode influenciar os voos e os custos são mais elevados. O ideal para fazer o aterro é uma zona um pouco distante de Coloane, mais a sul. Junto à zona A há também várias rotas marítimas.”

A ideia de construir junto à zona A partiu de Leong Chong, também membro do CPU, que defendeu que o “quarto espaço” deveria ser construído junto ao aeroporto”. “Fala-se que poderia ser construído em frente à praia de Hac-Sá, mas será que queremos ver o mar à nossa frente ou construções? Isso vai ser determinante para o futuro de Macau, e acho que esse não seria o local apropriado. Podemos pensar em construir junto ao aeroporto ou à zona A. Qual vai ser o desenvolvimento futuro?”, questionou.

A esperança no horizonte

Jorge Neto Valente, membro do CPU e presidente da Associação dos Advogados de Macau, elogiou a ideia da construção de um “quarto espaço”. “Tenho esperança no quarto espaço, mas tenho dúvidas se vou ficar bem tratado a olhar para mais uns aterros em Coloane. No quarto espaço podemos começar do princípio, tal como se fez em Hengqin, com o campus da UM. Quanto ao resto da cidade, já não podemos começar do início.”

“Na Taipa, o que há mais para desenvolver além do Cotai? Está tudo comprometido. A minha esperança fica no quarto espaço, penso que é muito importante e pode ser alguma coisa para um futuro mais risonho. Eu mudo-me para lá”, prometeu Neto Valente.

O advogado e membro do CPU alertou ainda para a elevada destruição da ilha de Coloane. “O ideal era não se ter destruído Coloane como já se destruiu, e Seac Pai Van é uma desilusão. Há compromissos assumidos, direitos das pessoas, e não podemos limpar isso como se não existisse. Coloane ainda tem muito para preservar, mas não apenas na orla marítima, onde houve destruição e compromissos. Na montanha foram feitas muitas barbaridades.”

Outro membro do CPU referiu ainda que a construção de um “quarto espaço” no território poderia entrar em conflito com a Lei Básica, que apenas faz referência à composição do território pela península de Macau, Taipa e Coloane. “A Lei Básica faz referência a Macau e a duas ilhas, e será que quando falamos de um quarto espaço estamos a ir contra o preâmbulo da Lei Básica? Temos de aprofundar mais.”

Mi Jian rejeitou qualquer violação constitucional. “Sabemos que Macau é constituída por três zonas. Não podemos dizer que depois de definir Macau não podemos ter mais espaços. A Lei Básica foi implementada há muitos anos. Uma ordem do Conselho de Estado de 2015 diz que Macau pode ter mais espaços e terrenos. O ‘quarto espaço’ não contraria a Lei Básica, do ponto de vista jurídico não há contradições.”

Raimundo do Rosário, secretário para os Transportes e Obras Públicas, confirmou que o documento ontem apresentado servirá de linhas mestras para a elaboração do futuro Plano Director de Macau, que só deverá estar concluído em 2020. Os trabalhos relativos a este documento tiveram início no ano passado.

“A consulta já terminou, estas são as conclusões. Este documento vai servir na hora de adjudicarmos o serviço a uma empresa para desenvolver o Plano Director. Este documento vai servir de base ao futuro desenvolvimento e são grandes linhas orientadoras, e é com base nelas que a futura entidade adjudicada vai desenvolver o Plano Director”, apontou o secretário.

“O Belo Lar” que Macau quer ser um dia

São vários os princípios orientadores traçados para Macau, que deve desenvolver-se além-fronteiras, tornar-se numa cidade inteligente e manter as suas diferentes culturas e tradições. A ideia foi deixada pelo consultor principal do think-tank do Governo, Mi Jian, que fez o alerta: os terrenos devem ser devidamente aproveitados em prol da população, para que o território se transforme num “Belo Lar” para todos.

“Temos de fazer uma distribuição razoável das áreas urbanas e uma boa utilização dos terrenos. Deve ser feito um aperfeiçoamento da reserva dos terrenos. No futuro vamos ter novos aterros que podem proporcionar mais recursos de solos e temos de ver quais são as formas de concepção científica para maximizar os recursos de solos que temos. No futuro temos de criar mais condições para uma melhor gestão das áreas marítimas.”

Pensar no futuro deve ser prioridade: “Quando estamos a fazer o planeamento não podemos pensar apenas no presente. Este foi um grande presente que o Governo Central deu a Macau, já que, além da área terrestre, temos a área marítima. Além do aproveitamento dos novos aterros, temos de pensar em como desenvolver a área marítima, bem como desenvolver mais zonas verdes”.

15 Dez 2016

Calçada do Gaio | UNESCO vai pedir explicações ao Governo

Os dirigentes da Associação Novo Macau, de visita a Paris, garantem que a UNESCO vai pedir explicações sobre a altura do edifício construído na Calçada do Gaio, numa altura em que o Governo se prepara para o fim do embargo da obra

[dropcap style≠’circle’]A[/dropcap] Associação Novo Macau (ANM) disse que a UNESCO vai pedir explicações ao Governo de Macau sobre a altura de um edifício que coloca em causa a vista do Farol da Guia, classificado como património mundial.

“A directora do Centro de Património Mundial da UNESCO [Mechtild Rossler] disse que ia acompanhar o caso e que ia pedir esclarecimentos ao Governo de Macau”, diz um comunicado da ANM, após a reunião em Paris na passada terça-feira do presidente e vice-presidentes daquela associação com representantes da UNESCO, a agência das Nações Unidas para a Educação e Cultura.

A Novo Macau tem contestado a decisão da Direcção dos Serviços de Solos, Obras Públicas e Transportes (DSSOPT) de que o edifício embargado desde 2008 pode manter a altura actual, superior a 80 metros, uma vez que a cota milimétrica para a zona está fixada em 52,5 metros.

A construção do edifício, na Calçada do Gaio, foi embargada após um despacho do anterior chefe do Executivo, Edmund Ho, que limita a altura dos imóveis à volta do Farol da Guia, que integra a lista do património de Macau classificado pela Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura (UNESCO) desde 2005. Embora a medida não tivesse efeitos retroactivos, as autoridades embargaram a obra. No início de Novembro, o secretário para os Transportes e Obras Públicas, Raimundo do Rosário, afirmou na Assembleia Legislativa que o edifício embargado vai poder ficar com 80 metros de altura.

Falar ao mundo

No comunicado, o presidente da ANM, Scott Chiang, diz que “expôs o ‘background’ da revogação do decreto-lei 69/91/M sobre os limites de altura no NAPE [Novos Aterros do Porto Exterior] e a promulgação do despacho do Chefe do Executivo 83/2008 impondo novos limites nas zonas-tampão em redor do Farol da Guia, em resposta à atenção da comunidade internacional”.

Já Sulu Sou, vice-presidente da associação, considerou que “o plano do Governo de permitir a retoma da construção do edifício na Calçada do Gaio e a manutenção da altura actual é uma violação do limite de 52,5 metros fixado no despacho do Chefe do Executivo e do espírito da Convenção para a Protecção do Património Mundial, Cultural e Natural”.

O também vice-presidente Jason Chao disse que, “em linha com a convenção, esforços para preservar o património mundial são partilhados pelas comunidades em todo o mundo”, e que a Novo Macau “considera necessário falar à comunidade internacional sobre as ameaças à conservação do património mundial em Macau”.

O comunicado indica ainda que “Chao manifestou esperança em que a comunidade internacional continue a acompanhar a ratificação das leis internacionais a que a China está vinculada em Macau”. A ANM já tinha pedido à UNESCO para investigar a conservação e protecção do património local classificado, por considerar que o Governo não tem trabalhado para proteger os monumentos dos interesses dos promotores imobiliários. Outra associação – o Grupo para a Salvaguarda do Farol da Guia – também se manifestou contra a decisão do Governo e está a preparar uma petição para enviar à UNESCO, entre outras organizações internacionais.

15 Dez 2016

Expectativas | Analistas acreditam que a retoma dos casinos veio para ficar

Macau termina 2016 com o sector do jogo em recuperação, que deverá manter-se no próximo ano, a não ser que variáveis como Donald Trump destabilizem a China, a principal fonte de clientes para os casinos do território

 

[dropcap style≠’circle’]A[/dropcap]nalistas contactados pela Lusa estão optimistas em relação às receitas dos casinos em 2017, depois de a retoma iniciada em Agosto ter quebrado um ciclo de 26 meses consecutivos de descidas, que arrastaram a economia para a recessão.

Sophie Lin, da S&P Global Ratings, estima um crescimento entre zero e 10 por cento das receitas do jogo em 2017, o académico da Universidade de Macau Ricardo Siu uma subida entre cinco por cento e oito por cento, e o director do Instituto de Investigação sobre o Jogo da mesma universidade, Davis Fong, crescimentos entre dez por cento e 15 por cento.

“Em Agosto e Setembro abriram dois novos casinos. No próximo ano, a MGM também vai ter um novo. Penso que, nos próximos nove a 12 meses, ainda vamos ter o efeito da abertura dos novos casinos”, disse Davis Fong.

Além de ter coincidido com a abertura de casinos, o início da retoma do sector surgiu num cenário de maior controlo dos ‘junkets’, os angariadores dos grandes apostadores – o chamado segmento VIP, que apesar de ter perdido terreno para o mercado de massas, continua a gerar mais de metade das receitas dos casinos de Macau.

“Depois de dois anos de ajustamento, os ‘junkets’ têm mais confiança para fazer negócio, especialmente nos últimos quatro meses”, disse Davis Fong.

O factor Trump

Confiante na manutenção do “ciclo positivo” em 2017, o académico alerta, no entanto, para os reflexos que pode ter na China a imprevisibilidade da presidência norte-americana, a partir de Janeiro.

“Macau é uma cidade muito pequena e dependente do ambiente económico externo, obviamente da China (….). E a economia chinesa é baseada na relação entre a China e os Estados Unidos”, afirmou.

Davis Fong considera que “há um risco para o ambiente macroeconómico se houver uma ‘guerra económica’ entre a China e os Estados Unidos”, dizendo que “se a mensagem de Trump for muito forte” e “pressionar a subida do renminbi, isso vai prejudicar a economia na China”.

“Em especial, [vai afectar] os negócios orientados para as exportações”, afirmou, dizendo que para além da questão da moeda, também é preciso saber qual vai ser a mensagem e atitude de Trump em relação à Ásia-Pacífico.

O pior cenário, segundo Fong, seria a concretização das previsões conservadoras do Governo de Macau e que em 2017 as receitas dos casinos rondem 200 mil milhões de patacas, um valor já superado este ano.

Já o economista Albano Martins aponta como maior risco para o jogo em Macau as operadoras estarem a terminar os contratos de concessão e “ninguém saber exactamente o que é que o governo quer”.

“Toda a gente suspeita, ou o bom senso aconselha que as seis operadoras se mantenham, mas (…) não se sabe muito bem o que é que o Governo está a preparar para a negociação com as operadoras, que comandam praticamente o PIB em Macau”, observou.

Ao fim de dois anos de contracção, a economia voltou a crescer no terceiro trimestre deste ano, com o PIB a aumentar quatro por cento face ao mesmo período de 2015.

O Fundo Monetário Internacional estimou em Outubro que o PIB de Macau irá cair 4,7 por cento este ano, uma contracção menor do que os 7,2 por cento estimados em Abril. Em 2017, espera um regresso ao crescimento (0,2 por cento).

A questão da bolha

Para Albano Martins, a recuperação do jogo era “normal e expectável” no segundo semestre de 2016, ano que considera “positivo” para Macau.

Atendendo à dependência dos casinos da China, diz que ajudou o país ter mantido um crescimento próximo do previsto e não ter imposto mais restrições à saída de capitais para a região.

Antecipando que “a fase ascendente do jogo seja agora mais calma, não a ritmos tão violentos como no passado”, não vê grandes riscos para a economia de Macau em 2017. “O único risco que vejo é interno, é a bolha do imobiliário”, observou.

Albano Martins recordou que a queda do jogo baixou os preços do imobiliário, mas já se nota uma subida no quarto trimestre. A escassez de terrenos é um dos principais problemas de Macau e a cidade é uma das que tem maior densidade populacional do mundo. Até Setembro, o Governo recuperou o equivalente a cerca 40 campos de futebol em terrenos não aproveitados pelos privados a quem tinham sido concessionados.

Para Albano Martins, a recuperação de terrenos “vai criar problemas”, como o reinício da subida dos preços, porque haverá “menos nova oferta no mercado privado e o Governo não vai fazer casas para toda a gente”, sendo que haverá entrada de novos trabalhadores nos próximos dois anos com a abertura de mais casinos.

15 Dez 2016

The Winter e São Jorge sagraram-se os grandes vencedores

O argentino “The Winter” venceu na categoria de Melhor Filme porque tudo nele foi belo, através das coisas simples. Depois de Veneza, Nuno Lopes voltou a vencer na categoria de Melhor Actor, com o filme “São Jorge”, que ganhou também na categoria Melhor Realizador

[dropcap style≠’circle’]D[/dropcap]iziam as regras do Festival Internacional de Cinema de Macau que um filme não poderia vencer dois prémios, mas o júri não teve escolha. Se “The Winter” (O Inverno), do argentino Emiliano Torres, venceu apenas na categoria principal, como Melhor Filme, o português São Jorge arrecadou dois prémios: o de Melhor Actor (Nuno Lopes) e Melhor Director (Marco Martins). “Sisterhood”, de Tracy Choi, ganhou a estatueta de Melhor Actriz (Jenifer Yu), para além de ter ganho o prémio do público.

“O meu único pedido para os meus colegas do júri foi para verem os filmes com emoções, com o coração”, disse Shekar Kapur após a cerimónia de entrega dos prémios. ”Se alguém fez um trabalho brilhante num filme porque não premiar? Por isso decidimos quebrar as regras”, disse ainda.

O júri falou de “The Winter” como sendo uma bela película onde o minimalismo consegue contar as maiores histórias. “Achei o “The Winter” lindíssimo, os actores incríveis. O filme foi muito completo, bem interpretado, com boa fotografia, com uma história forte. Tive muitas reacções em relação a ele”, disse Giovanna Fulvi, membro do júri.

Emiliano Torres referiu estar sem palavras. “Ganhar um prémio já seria bom, mas ganhar o prémio principal é espectacular. Esperamos que este prémio possa trazer o nosso filme para a Ásia.”

Com excepção de “Sisterhood”, filme local, não houve estatuetas para produções asiáticas. Mas, para Shekar Kapur não há mal nenhum nisso. “Não havia regulamentos que diziam que deveríamos prestar atenção aos filmes asiáticos. São filmes e é isso que é bom no cinema, trespassa geografias e conta histórias sobre nós.”

O risco

“São Jorge” aborda a vida de um pugilista que sem opção arranja emprego numa empresa de cobranças difíceis numa altura em que Portugal vive os constrangimentos de uma crise. Nuno Lopes vê o seu trabalho de actor reconhecido mais uma vez, após vencer em Veneza o prémio na secção “Horizontes”. Apesar de ausente, o actor português deixou uma mensagem via skype a agradecer a distinção: “Tenho pena de não estar presente e é uma honra poder receber este prémio. Quero agradecer ao meu amigo e ao melhor realizador com quem se pode trabalhar” disse referindo-se a Marco Martins.

Marco Martins falou do risco que foi fazer “São Jorge”. “Quando comecei a escrever o guião todos me diziam que era perigoso fazer um filme sobre o presente, porque não temos perspectiva. Concordo com isso, mas para nós era um momento importante, em que muitas pessoas perderam trabalhos e apoios sociais. Assumi o risco, e nunca tinha feito um filme de cariz social.”

O realizador deixou no ar a hipótese de um dia filmar em Macau, mas referiu que filma sobretudo lugares que lhe são próximos. “Escolho sempre temas que me são próximos, fiz muitos documentários na Índia ou no Japão, e Macau gerou em nós um grande fascínio.”

“Elon, não acredita na morte” , a produção brasileira que conta com a realização de Ricardo Alves Júnior ganhou o prémio para a melhor contribuição técnica. Ao HM, o realizador manifestou a sua alegria não só pelo reconhecimento mas por ser um prémio que valoriza a equipa. “Estamos muito satisfeitos com este reconhecimento internacional, e mais do que um prémio individual, este é uma condecoração colectiva que tem em conta o trabalho de todos”, referiu ontem.

Lembrar Muller

Marco Muller foi lembrado por Ricardo Alves Júnior, realizador de “Elon não acredita na morte”. “Para a gente o festival foi importante porque teve a figura do Marco Muller, foi isso que nos levou a fazer a estreia internacional do filme aqui. É importante estar aqui a receber o prémio numa selecção feita por uma figura tão importante do cinema.”

A falta de público em muitos dos filmes foi também notada pelo realizador brasileiro. “(Marco Muller) conseguiu levantar um grande evento, que correu muito bem. O mais importante no festival são os filmes e o público e esperamos que no próximo ano consigamos trazer mais gente para ver os filmes, algo que nos fez muita falta.”

Prémios

  • Melhor Filme – “The Winter”, Argentina
  • Melhor Realizador – Marco Martins – São Jorge – Portugal
  • Melhor Actor – Nuno Lopes – São Jorge – Portugal
  • Melhor Actriz – Lindsay Marshal – Trespass against us – UK
  • Melhor Jovem Actriz – Jeniffer Yu – “Sisterhood” – Macau
  • Melhor Argumento – Amy Jump e Ben Wheatley – “Free Fight” – UK
  • Melhor Contribuição Técnica – “Elon não acredita na morte” – Brasil
  • Prémio do Júri– “Trespass against us” – UK
  • Prémio do Público – “Sisterhood” – Macau
14 Dez 2016

Universidade de Macau | Colégios residenciais não são consensuais

Foi uma das grandes novidades da mudança da Universidade de Macau para a Ilha da Montanha: os alunos têm de viver um ano nas instalações que o estabelecimento de ensino disponibiliza. Alguns concordam com a medida, mas há também quem não veja vantagens num sistema que não dá aos alunos a possibilidade de escolha

[dropcap style≠’circle’]D[/dropcap]esde que a Universidade de Macau foi viver para a Ilha da Montanha que os alunos do primeiro ano são obrigados a viver, durante um ano lectivo, no campus da instituição de ensino superior. Se para os alunos que vêm de fora a obrigatoriedade não coloca, pelo menos numa primeira fase, problemas de maior, para os estudantes locais a situação pode ter contornos caricatos. Deixa-se a casa da família na península e passa-se a viver num campus a 20 minutos de distância.

Quando o projecto do novo campus da UM foi apresentado, a medida causou alguma desconfiança – mas não a suficiente para travar as intenções de quem manda na universidade. Na altura, falava-se em entre oito a 12 colégios residenciais no campus.

Na apresentação que consta do site oficial da instituição académica, explica-se que “os estudantes de diferentes contextos, áreas e anos de estudo são colocados no mesmo colégio residencial”. Para a UM, esta solução de acomodação permite aos estudantes “organizarem e participarem juntos em vários tipos de actividades, receberem educação fora da sala de aula, crescerem com uma perspectiva transversal em termos culturais, desenvolverem um forte espírito de responsabilidade social, boas capacidades de comunicação e espírito de equipa”.

Liberdade garantida?

O HM falou com um antigo assistente de um colégio residencial que, para este texto, prefere identificar-se apenas pelo apelido: Chan. Este ex-responsável pelo apoio aos estudantes não considera que a liberdade esteja a ser colocada em causa, porque “todas as universidades têm as suas regras”, mas reconhece que, por enquanto, os objectivos da UM não estão a ser atingidos. São “objectivos grandiosos” e, pelas palavras de Chan, nem todos os alunos estão dispostos a contribuir para a elevada finalidade da instituição.

Em relação ao convívio e ao espírito de camaradagem, o entrevistado reconhece que os colégios residenciais – construídos num campus de grande dimensão – “não conseguem criar um ambiente [académico] e a universidade é responsável por este facto”.

Numa entidade que pretende chamar cada vez mais alunos de fora para o campus, sobretudo da China Continental, coloca-se ainda a questão da diferença de formas de estar entre quem é de cá e quem está longe de casa. “É verdade que os alunos locais têm diferentes hábitos em relação aos outros”, reconhece Chan que, ainda assim, considera que “os colégios têm as suas vantagens e benefícios, pelo que vale a pena frequentá-los”.

Os estudantes que chegam do Continente, descreve, “têm um sentido de pertença mais elevado” ao local que passa a ser a casa. Já os alunos locais têm tendência a encarar os colégios residenciais como sendo “um dormitório”, uma vez que têm as suas redes sociais e familiares fora do campus na Ilha da Montanha.

O antigo assistente fala ainda de um grande investimento da UM nestes colégios e o retorno que, segundo diz, “não é alto”. “A universidade tem pensado muito em formas de os alunos se dedicarem mais a este sistema”, garante. “Quer que os alunos façam mais. Muitos alunos aprendem de forma passiva. A culpa não é totalmente da universidade”, afiança.

A lógica do dormitório

Fernando Leong, natural de Macau, a frequentar uma licenciatura na Universidade de Macau, explica que os alunos locais não são particularmente entusiastas em relação às actividades promovidas pelos colégios residenciais. Mas conta também que aqueles que vieram de fora – sobretudo da China Continental – gostam dos programas que são oferecidos.

Concluído um ano a dormir no campus, os estudantes podem sair – e, diz a experiência de Leong, a maioria dos jovens de cá volta para casa. Há também quem não seja de Macau e procure uma solução de habitação mais próxima da cidade e dos seus residentes.

“Há pouca gente que gosta de morar nos colégios residenciais. Pessoalmente não aprecio. Mas é obrigatório e, se os alunos não morarem no campus, não podem graduar-se na universidade. É por essa razão é que estou a viver lá. Só quem já tem uma licenciatura é que pode pedir a isenção de residência”, diz.

“Os colégios não conseguem moldar a personalidade dos alunos”, acrescenta ainda Fernando Leong. “Não tenho muito contacto com professores nos colégios, tenho mais na universidade. Mas é preciso participar nas actividades dos dormitórios para ganhar alguns créditos no final de cada semestre.”

Uma colega de Leong, do terceiro ano, que preferiu não ser identificada, atira, a começar, que “o modelo não é razoável”. Em causa não está apenas a questão da residência obrigatória no campus, mas também o facto de os alunos “terem de cumprir muitos requisitos e entregar trabalhos de casa”.

“Semanalmente, temos de dormir pelo menos quatro noites no dormitório. Quando entramos e saímos do colégio temos de cumprir um método de verificação, temos de usar um cartão para entrar e sair”, relata. “Temos de frequentar uma disciplina que se chama ‘University Life’, que dura quatro anos, e que está ligada à vida do colégio residencial. Se os alunos saírem do colégio ao final do primeiro ano de licenciatura precisam de participar em mais actividades, em jantares do colégio”, continua a estudante. “Todos os semestres temos de cumprir um número de actividades. Tenho um amigo que perdeu uma parte dos estudos porque não cumpriu os requisitos do colégio.”

Quanto ao ambiente destas estruturas, diz a aluna que “tudo depende dos alunos e dos tutores”. No seu caso, “os tutores raramente realizavam actividades”. “Muitas vezes não conhecemos os alunos que moram nos quartos ao lado. Muitas vezes me pareceu estar a morar num dormitório e não num colégio residencial.”

Da China aos States

Quem tem como vida profissional orientar estes colégios residenciais tem uma perspectiva bem diferente sobre a matéria. É o caso de Liu Chuan Sheng, orientador do colégio Chao Kuang Piu, que não só vai buscar às mais prestigiadas universidades internacionais fundamentos para justificar a existência destas estruturas, como recua no tempo, e vai ao encontro da história da China para fornecer argumentação adicional.

Para Liu Chuan Sheng, o sistema de colégios residenciais “é uma parte essencial da formação e diferente das faculdades”. Por outras palavras, “o colégio residencial dedica-se à formação da personalidade e dos interesses dos alunos, focamo-nos nos estudantes e este é um aspecto que as universidades comuns não são capazes de ter em conta”.

O modelo, destaca, foi adoptado “há centenas de anos em Oxford e em Cambridge, e foi também adoptado por universidades americanas”, país que, de resto, serve em várias matérias como fonte de inspiração para a universidade pública de Macau. “O nosso colégio residencial começou bastante tarde, mas já tem uma escala significativa na Ásia.”

O orientador assegura, no entanto, que foram feitas muitas alterações, pelo que não se trata de uma cópia do que se faz lá fora. “A maior mudança que fizemos foi a adopção do modelo de colégio residencial com a tradição chinesa, que começou no tempo do Confúcio, onde os professores conversavam com os alunos. Até ao ano 1100 ou 1200, foram criados quatro grandes colégios residenciais que contaram com mais de mil alunos. Foi uma pena que, na dinastia Ming, este sistema tenha sido abolido”, lamenta. “Já não existe este tipo de academias ou colégios na China.”

Quanto ao ambiente que se vive nos colégios, o orientador assegura que são promovidos almoços e jantares, onde se produzem discussões académicas, o que permite aos estudantes travarem conhecimento uns com os outros.

Mais de tudo

Para já, a grande falha do sistema, reconhece Liu Chuan Sheng, tem que ver com o número de tutores. “A Universidade de Cambridge conta com mais de 100 tutores de várias áreas, mas a UM ainda não tem tantos. O que a UM está a fazer é a ligar as faculdades com os colégios residenciais. O nosso colégio tem cerca de 80 professores vindos de várias faculdades para o almoço e o jantar.”

O orientador deixa uma ideia do que é a vida no colégio residencial Chao Kuang Piu: “Todas as quintas-feiras, depois de almoço, há uma hora reservada para um pequeno seminário onde convidamos professores de várias universidades para uma apresentação. Mas os alunos, de Macau ou do interior da China, têm pouca curiosidade. Ainda assim, penso que cada vez mais estão a alargar os seus conhecimentos”.

Os alunos estrangeiros – que, no campus da Taipa, tinham um contacto maior, até pela dimensão da própria universidade – estão agora separados, o que não facilita, segundo o que HM apurou, a adaptação a uma realidade nova que fica a milhares de quilómetros de casa. Liu Chuan Sheng admite que “é desnecessário fazer esta separação”, embora diga também que a mistura de estudantes de diferentes nacionalidades e origens é uma prática comum nos Estados Unidos e no Reino Unido.

“Há muitos aspectos onde temos de fazer mudanças, é preciso eliminar algumas regras”, concede, sem entrar em detalhes. “Há muitas actividades, os alunos e os professores estão ocupados, e para os colégios residenciais alcançarem um equilíbrio e poderem fazer melhor são necessários mais recursos humanos e um maior apoio dos alunos”, remata.

14 Dez 2016

Medalhas | Cheong U, ex-secretário, distinguido pelo Chefe do Executivo

Liderou a tutela dos Assuntos Sociais e Cultura durante cinco anos e vai receber no dia 20 de Dezembro a medalha Lótus de Ouro. Personalidades do sector da saúde garantem que Cheong U fez o que pôde, muitas vezes sem apoio e com muitos dossiers por concluir

 

[dropcap style≠’circle’]D[/dropcap]esde que Chui Sai On deixou de ser secretário, no final de 2009, até Dezembro de 2014, Cheong U foi o homem que liderou o destino das pastas da saúde, educação, cultura e turismo, e vai agora receber das mãos do Chefe do Executivo a medalha Lótus de Ouro, juntamente com Lei Pui Lam, vice-presidente da Associação de Educação Chinesa de Macau (ver lista nesta página).

Para Fernando Gomes, presidente da Associação de Médicos dos Serviços de Saúde (SS), esta é uma medalha “forçada”. “Como cidadão, penso que poderia ser feita uma avaliação mais isenta em termos de atribuição de medalhas, porque estas atribuem-se a quem fez obra. E muitas das obras não chegaram a ser feitas ou terminadas. Isso é público e parece que o actual secretário [Alexis Tam] está a pegar em projectos que nunca avançaram. Por isso a população que tire as suas conclusões. Penso que é uma medalha um pouco forçada”, disse ao HM.

Rui Furtado, que dirigiu a Associação dos Médicos de Língua Portuguesa, garante que Cheong U não fez mais porque, em muitas situações, não houve a colaboração devida. “Enquanto fui presidente da associação, a minha relação com o secretário foi sempre boa. A actividade que desenvolveu foi pautada pelo bom senso, pela discrição, e sempre tendo em vista os bons objectivos para a área da saúde em Macau”, considera.

“Se alguma coisa deixou por fazer, e algumas coisas deixou certamente, fica a dever-se à falta de apoio de vários sectores, tal como do director dos Serviços de Saúde [Lei Chin Ion] e outros serviços que não lhe tenham dado o apoio necessário. Fez aquilo que pôde, foi limitado em algumas coisas na sua actuação.”

Cheong U era o nome que faltava na lista de antigos governantes que ainda não tinham sido distinguidos pelo Chefe do Executivo. No ano passado, a medalha Lótus de Ouro foi atribuída a Florinda Chan, Francis Tam e Cheong Kuoc Va, três ex-secretários, responsáveis pela a Administração e Justiça, Economia e Finanças, e Segurança.

O antigo membro do Governo trabalhou 36 membros na Função Pública. Cheong U foi o primeiro comissário contra a Corrupção depois da transferência de administração, tendo exercido o cargo durante dez anos. Na nota à imprensa, justifica-se a distinção agora atribuída com “o grande contributo para a luta contra a corrupção e para os assuntos sociais e cultura”.

A surpresa de Senna Fernandes

A directora dos Serviços de Turismo, Helena de Senna Fernandes, vai receber das mãos de Chui Sai On a medalha de mérito turístico. “Claro que é uma grande honra”, começou por dizer ao HM. “É um reconhecimento não só para mim, mas também para a equipa com a qual trabalho na área do turismo. É um trabalho de equipa e não é feito apenas por uma pessoa. Tenho um grande orgulho em receber esta distinção. Agradeço ao Chefe do Executivo e ao secretário pela confiança dada. Não estava nada à espera.”

Já o artista Mio Pang Fei será o distinguido com a medalha de mérito cultural. Pedro Cardeira, autor de um documentário sobre o artista plástico nascido em Xangai, fala de uma distinção que nunca chega tarde, mas que é merecida.

“É uma distinção muito importante, porque Mio Pang Fei foi uma das pessoas fundamentais para o desenvolvimento da arte em Macau e foi uma pedra no charco no panorama das artes em Macau nos anos 80. De certa forma foi ele que trouxe a contemporaneidade para Macau. É muito merecida esta distinção”, rematou o realizador de cinema.

 

 

 

Lista de medalhas

Lótus de Ouro – Cheong U

Lótus de Ouro – Lei Pui Lam

Lótus de Prata – Kou Hoi In

Lótus de Prata – Van Kuan Lok

Medalha de Mérito Profissional – Direcção dos Serviços de Identificação

Medalha de Mérito Profissional – Cândida da Silva Antunes Pires

Medalha de Mérito Industrial e Comercial – Ho Ioc Tong

Medalha de Mérito Industrial e Comercial – F. Rodrigues (Sucessores), Limitada

Medalha de Mérito Turístico – Maria Helena de Senna Fernandes

Medalha de Mérito Turístico – Lou Chi Seng Moisés Francisco Xavier

Medalha de Mérito Educativo – Leong Lai

Medalha de Mérito Educativo – Universidade de Macau

Medalha de Mérito Educativo – Escola da Associação para Filhos e Irmãos dos Agricultores

Medalha de Mérito Educativo – Ip Hong Kit

Medalha de Mérito Cultural – Associção dos Artistas de Belas-Artes de Macau

Medalha de Mérito Cultural – Mio Pang Fei

Medalha de Mérito Altruístico – Associação de Bem-Estar dos Moradores de Macau

Medalha de Mérito Altruístico – Associação dos Amigos da Caridade de Macau

Medalha de Mérito Altruístico – Associação dos Familiares Encarregados dos Deficientes Mentais de Macau

Medalha de Mérito Desportivo – Associação Geral de Wushu de Macau

Medalha de Mérito Desportivo – Mário Ferreira Sin

Medalha de Mérito Desportivo – Lau Vai Hong

Medalha de Valor – Grupo de Vacinação para a Prevenção de Doenças dos Serviços de Saúde

Medalha de Valor – Comissariado de Trânsito de Macau do Departamento de Trânsito do Corpo de Polícia de Segurança Pública

Medalha de Dedicação – Maria do Céu Dourado Amorim da Silva Hung

Medalha de Dedicação – Vicente João Monteiro

Medalha de Dedicação – Porfírio Zeferino de Souza

Medalha de Serviços Comunitários – Ieong Iu

Medalha de Serviços Comunitários – Chang Mong I Georgiana Lau do Rosário

Medalha de Serviços Comunitários – Lei Pou Loi

Medalha de Serviços Comunitários – Wong Man I

Título Honorífico de Prestígio – Lew Hwan Kyu

Título Honorífico de Valor – Equipa da Escola para Filhos e Irmãos dos Operários de Macau – “Medições das Forças de Atrito”

Título Honorífico de Valor – Equipa da Escola para Filhos e Irmãos dos Operários de Macau – “Eco-Purificador de água portátil”

Título Honorífico de Valor – Lei Kuan Hou

Título Honorífico de Valor – Lei Wai Shing

14 Dez 2016

Lei da droga | Testes à urina podem constituir um “abuso”

 

Augusto Nogueira, presidente da ARTM, e o advogado Pedro Leal mostram-se contra uma mudança prevista na nova lei da droga, que será votada amanhã na especialidade. A hipótese de as autoridades exigirem testes à urina a suspeitos que estejam em bares ou em locais semelhantes pode constituir “um abuso”

 

[dropcap style≠’circle’]P[/dropcap]erante uma suspeita de consumo de droga num bar ou noutro local do género, a polícia poderá deslocar-se a esse lugar e obrigar o suspeito a um teste de urina, bem como outras pessoas que estejam presentes. É o que diz a proposta de lei de revisão da lei da droga, que será amanhã votada na especialidade. Para o presidente da Associação de Reabilitação dos Toxicodependentes de Macau (ARTM), a medida pode levar a abusos, defendendo mesmo que este artigo não seja aprovado pelos deputados na sessão plenária de amanhã.

“Da parte da ARTM, pensamos que o artigo referente aos testes de urina tem problemas bastante graves, inclusive acho que poderá ir contra os direitos humanos e a Lei Básica. Esse artigo não faz sentido e pode ser bastante prejudicial para muitas pessoas inocentes. Basta qualquer pessoa depositar droga numa bebida, essa pessoa consome, não sabe que está a consumir droga, e a seguir entra a polícia no bar e essa pessoa vê-se envolvida numa acusação sem saber como, podendo enfrentar três meses a um ano de prisão. Espero que esse artigo não seja votado e implementado”, disse Augusto Nogueira ao HM.

Também o advogado Pedro Leal alerta para as consequências desta prática. “Obrigar todas as pessoas a fazerem um teste à urina, se não houver indícios de que cometeram o crime de consumo de estupefacientes, é um abuso. Não digo que vá contra a Lei Básica, mas parece-me que abre portas a abusos por parte da polícia.”

O causídico afirma, contudo, que esta medida já vem sendo prática habitual por parte das autoridades policiais nas rusgas que efectua a bares e discotecas.

“A polícia, hoje em dia, quando há indícios de qualquer situação relacionada com droga, já ‘obriga’ os arguidos e os suspeitos a fazerem esse exame médico. Que eu saiba, não tem havido recusa por parte das pessoas, porque quando têm o desconhecimento da lei, as pessoas fazem [o que lhes mandam fazer]”, apontou.

Seringas dão prisão

Outra das medidas a apreciar no plenário de amanhã prende-se com o facto de a nova lei prever uma pena de prisão de três meses a um ano para os portadores de equipamento para consumo de droga, sejam seringas ou equipamentos para fumar e inalar droga. Augusto Nogueira chama a atenção para a possibilidade desta medida poder deitar por terra anos de trabalho no combate ao HIV.

“Preocupa-me o artigo da posse de equipamento para uso de droga. Sabemos que o programa de seringas é bastante importante para a saúde pública, para evitar o contágio do HIV entre consumidores de droga injectável, e se vamos criminalizar a posse desse equipamento com três meses a um ano de prisão pode levar a que a partilha de seringas entre consumidores aumente e que o HIV também possa aumentar”, diz.

Para o presidente da ARTM, “é bastante gravoso, no sentido em que são dez anos de trabalho realizados pela ARTM, Instituto de Acção Social e Comissão de Luta contra a Sida que podem ir por água abaixo”. Em 2015, aponta, “não houve nenhuma nova infecção, e este é um trabalho que tem sido bem-sucedido”, remata Augusto Nogueira.

O aumento das penas de prisão para o consumo de droga tem sido bastante criticado, inclusivamente pelos deputados, mas Augusto Nogueira tem uma explicação para o facto. “A ideia inicial da comissão ou do IAS era que, através do aumento das penas de prisão para o consumo, mais jovens optem pelo tratamento numa ONG. O que se tem vindo a passar é que muitos dos jovens, quando lhes era dada essa hipótese de ficarem dois meses na prisão ou um ano num centro de tratamento, muitos deles optavam por ficar na prisão.”

O presidente da ARTM garante que as associações em Macau têm capacidade para responder a um eventual aumento de consumidores em tratamento. “Temos 70 camas, temos pessoal qualificado, no caso da ARTM estamos preparados para receber estas pessoas. Penso que as restantes ONG e os serviços que existem em Macau são suficientes.”

 

14 Dez 2016

EUA | Presidente eleito causa polémica com declarações sobre “uma só China”

 

 

As relações entre Pequim e Washington aqueceram na última semana com o telefonema entre Donald Trump e a presidente de Taiwan. O Presidente eleito usou esta manobra como pressão para renegociar acordos de comércio, e forçar a China a rever políticas cambiais e a posição em relação à Coreia do Norte

 

[dropcap style≠’circle’]E[/dropcap]m entrevista à Fox News, o presidente eleito Donald Trump questionou numa assentada as relações entre a China e os Estados Unidos da América ao dizer que não tem de respeitar a política “uma só China” defendida por Pequim. Acrescentou ainda que não aceita que um país dite com quem deve falar ao telefone. O rastilho diplomático acendeu-se com um telefonema da presidente Tsai Ing-wen a congratular Trump pela vitória nas eleições, algo que à partida parece inócuo, mas que representa um acto inédito em termos diplomáticos desde a administração de Jimmy Carter. As reacções não se fizeram esperar. Desde as várias sensibilidades entre políticos cimeiros do Partido Republicano à Casa Branca e, claro, a Pequim.

Em primeira instância, o Governo Central relativizou o contacto telefónico, retratando-o como um pequeno truque político de Taiwan. O Ministro dos Negócios Estrangeiros chinês, Wang Yi, afirmou não acreditar estar iminente uma mudança de política de Washington em relação a Pequim, em declarações à Phoenix TV de Hong Kong. “A política ‘uma só China’ é a fundação do relacionamento saudável nas relações sino-americanas, algo que espero não se venha a deteriorar”, acrescentou Wang Yi. Curiosamente, no dia do polémico telefonema, em Pequim reuniam-se Xi Jinping e Henry Kissinger, o antigo secretário de Estado das administrações Nixon e Ford, para promover as relações China-Estados Unidos.

Tudo como dantes?

O analista de política internacional Arnaldo Gonçalves acha que a situação está a ser exacerbada fora do seu verdadeiro relevo. “É natural que quando um Presidente é eleito se façam contactos informais. Taiwan é aliado dos Estados Unidos desde a 2ª Grande Guerra Mundial”, relativiza. O analista realça a “posição de princípio da China, que considera Taiwan uma província renegada, com a qual não mantém relações políticas”, apesar de manterem contactos permanentes no plano comercial. É, portanto, uma situação híbrida, que não é clara, que se junta à dúbia posição norte-americana nas relação de forças em jogo na região.

Para Francisco Leandro, coordenador do Instituto dos Estudos Sociais e Jurídicos da Universidade de São José, “parece haver uma mudança de paradigma na política externa norte-americana, para uma visão mais mercantilista, quase num prisma neo-realista, muito na base dos interesses nacionais”. O analista considera que as boas relações são do interesse de ambas as potências, e que “ninguém ganharia nada com um escalar bélico, militar ou económico, nem a China, nem a Formosa, nem os Estados Unidos da América”.

A Casa Branca tentou, de imediato, apaziguar as tensões diplomáticas reiterando a posição oficial da administração Obama, ou seja, de manter intactas as relações externas em relação à política “uma só China”. A administração norte-americana também alertou para o perigo de, ao se exacerbar a questão de Taiwan, correr-se o risco de colocar em cheque os progressos diplomáticos conseguidos nas últimas décadas entre Washington e Pequim. Na verdade, a questão de Taiwan continua a ser uma embrulhada internacional, um paradoxo. Ao mesmo tempo que existe uma cooperação com os americanos em questões de segurança, a Casa Branca mantém intacta a posição firmada com a China, desde a administração Nixon, acerca da questão formosina.

Mike Pence, o vice-presidente eleito, e bombeiro de serviço, veio a terreiro relativizar as palavras de Trump, ao afirmar que “apenas se tratou de uma chamada de cortesia”, semelhante ao telefonema com o Presidente Xi Jinping. “Não foram discussões de substância e não me parece que haverá uma mudança de política nesta matéria”, afirmou o ainda governador do Indiana ao Meet the Press. Reince Priebus, que será nomeado como chefe de pessoal da Casa Branca, também meteu água na fervura, desdramatizando toda a questão como um simples exercício de cordialidade. O próprio Trump considerou que seria uma indelicadeza não receber a chamada da líder de Taiwan.

Seguir o dinheiro

Não há coincidências, muito menos em política. Neste capítulo é de realçar que o único antigo candidato republicano à Casa Branca que apoiou abertamente a campanha de Trump, Bob Dole, é hoje lobista numa firma que tem como cliente a diplomacia de Taiwan. O antigo político foi um dos homem de bastidores por detrás da chamada polémica. A firma onde trabalha recebeu 140 mil dólares para estabelecer uma ponte entre o recém Presidente eleito e Tsai Ing-wen.

A informação foi revelada pelo New York Times, ao abrigo da legislação sobre o registo de agentes estrangeiros. O antigo candidato republicano às eleições de 1996 não escondeu em entrevista ao Wall Street Journal a sua influência na chamada. “Quando representamos um cliente, supostamente temos de responder aos seus pedidos”, revelou Dole. O cliente em questão é o departamento de representação económica e cultural de Taiwan, uma espécie de gabinete diplomático do território. De acordo com o ex-político, o seu cliente está muito satisfeito e optimista em relação às futuras relações com Washington.

Outro aspecto económico por detrás do suposto faux pas diplomático está relacionado com comércio externo. Ainda na entrevista à Fox News, Trump revela que o que está em causa não será, exactamente, uma posição de princípio. O magnata de Nova Iorque comentou que não tem de respeitar a política “uma só China”, a não ser que se redesenhem as relações no plano do comércio externo. Como é seu hábito, Trump levou estas questões para o Twitter e aproveitou para se referir à possível manipulação cambial do yuan, como uma forma de concorrência desleal que deverá ser travada durante a sua administração. O magnata afirmou várias vezes na campanha que a desvalorização da moeda chinesa em relação ao dólar é uma tragédia para a economia americana. Ironia das ironias, as próprias declarações de Trump tiveram como consequência a desvalorização do yuan. Esta parece ser outra condição ligada à manutenção da política externa com a China. No fundo, Taiwan está a ser usada como arma de arremesso para questões económicas, e para pressionar Pequim a ser mais inflexível com o regime de Kim Jong-un.

Às armas

Com o avançar das declarações de Donald Trump, a China resolveu mostrar o seu músculo militar. Na semana passada, um bombardeiro Xian H-6, com capacidade nuclear, sobrevoou a disputada “nine dash line”, em torno do Mar do Sul da China, passando por uma série de ilhas com soberania disputada. Um claro sinal para a futura administração Trump, apesar de não representar propriamente uma novidade. É de recordar que os Estados Unidos também enviaram uma mensagem similar a Pyongyang com dois bombardeiros U.S. B-1 a sobrevoar a Coreia do Sul no passado mês de Setembro. Foi a resposta de Washington aos testes nucleares realizados pelo regime norte-coreano. Outra das questões que Donald Trump quer rever em matéria internacional, e para a qual “a China pode fazer mais”.

Para o especialista Arnaldo Gonçalves, estas “manobras são normais, e funcionam para intimidar a outra parte”. O investigador prevê que Washington faça também “exercício militares juntamente com o Japão, ou a Austrália, numa jogada do habitual xadrez geopolítico”.

Outra questão de máximo interesse foi a possibilidade de levantar o protecção em termos nucleares ao Japão e à Coreia do Sul. Donald Trump repetiu várias vezes durante a campanha que “quem quer segurança tem de a pagar”. Um assunto muito sensível, com “muito maior repercussão para a própria Ásia, e de vital importância no Conselho de Segurança da OUN”, comenta Francisco Leandro. Por um lado, “esta posição poderia ser encarada pela China como um certo desanuviar da sua vizinhança, mas por outro os chineses estão também muito interessados no equilíbrio”. O académico considera que não estão em causa apenas os interesses de segurança da Coreia do Sul e do Japão, mas de toda a lógica asiática, até extensiva à Euro-Ásia.

Diz-me com quem andas

Para já, no panorama internacional ainda nos movemos em total imprevisibilidade, restando aos analistas políticos interpretar as nomeações que o magnata nova-iorquino fará. Nesse capítulo, Trump também dá uma no cravo e outra na ferradura. Se, por um lado, nomeou o Governador do Iowa Terry Branstad como embaixador norte-americano em Pequim, um político com ligações próximas a Pequim, por outro, John Bolton tem sido um nome muito mencionado na campanha como uma forte possibilidade para ocupar um lugar de destaque no Departamento de Estado. O antigo oficial da administração de George W. Bush tem sido um dos defensores de uma abordagem mais dura nas relações sino-americanas.

Em declarações ao Wall Street Journal em Janeiro último, Bolton defendeu a tomada de uma posição musculada para travar a “agressividade militar chinesa nos mares do Este e Sul da China”. Nesse sentido, o possível nomeado considera útil uma “escalada diplomática como, por exemplo, receber uma visita de Estado da diplomacia de Taiwan na Secretaria de Estado da Casa Branca, no sentido de reconhecer a soberania da região”. Algo que seria tomado por Pequim como uma total afronta, e um romper com a linha de cooperação estabelecida nas últimas décadas. São nomeações que deixam todos os cenários em aberto, seja no plano económico, ou bélico.

Por enquanto, ainda só temos o famoso telefonema. Para Francisco Leandro, “é algo que faz parte do jogo, e não tem importância por aí além, mas não nos podemos esquecer que houve coisas que se disseram na campanha que não se podem repetir”. O académico vê este episódio como a marcação de um penálti. Quem marca ameaça para um lado para ver para onde o guarda-redes cai. Vejamos se a bola entra.

13 Dez 2016

Caso Ho Chio Meng | Ministério Público pagou viagens à Europa com a família

O antigo procurador da RAEM confirmou em tribunal que o Ministério Público pagou uma viagem que fez à Dinamarca a título oficial, tendo Ho Chio Meng aproveitado para conhecer outros países da Europa com a família com o mesmo orçamento

[dropcap style≠’circle’]N[/dropcap]o segundo dia do julgamento de Ho Chio Meng, o ex-procurador continuou a negar que cometeu os crimes de que é acusado, mas, segundo a Rádio Macau, admitiu ter viajado em família com o dinheiro do Ministério Público (MP). A Rádio Macau, que esteve presente na sessão de julgamento, conta que o ex-procurador fez uma viagem oficial à Dinamarca, em 2005, mas aproveitou para conhecer outros países europeus com a família. A acusação referiu que tudo foi pago pelo MP, e Ho Chio Meng não negou.

Este afirmou no Tribunal de Última Instância (TUI) que assinou o despacho que autorizou o pagamento de todos os gastos, mas disse que pagou o bilhete de avião do seu sobrinho e que recebeu o aval do então Chefe do Executivo, Edmund Ho, para realizar a viagem. Ho Chio Meng disse mesmo que Edmund Ho lhe desejou “Boa sorte. Boa viagem”.

As despesas terão sido superiores a 500 mil patacas, montante que excedeu o limite previsto. Ainda assim, Ho Chio Meng referiu que não sabia a forma como as despesas foram liquidadas no seio do MP. A autorização de Edmund Ho para a viagem levou Sam Hou Fai, actual presidente do TUI, a questionar as razões para essas despesas terem sido pagas em prestações e estarem associadas a facturas que, segundo a Rádio Macau, estavam ligadas a viagens fantasma a países como a Tailândia e Singapura.

O caso da vivenda

Na sessão de ontem falou-se ainda de uma vivenda localizada em Cheoc Van, Coloane, que durante 14 anos serviu de hospedagem ao MP. A acusação defende que a casa serviu de residência a Ho Chio Meng e à sua família, algo que o antigo procurador refutou. Ao recusar a acusação, disse lamentar nunca ter informado o actual procurador do MP, Ip Son Sang, da existência da vivenda.

Ho Chio Meng disse ter feito “um erro”, já que, se tivesse acompanhado o “actual líder do MP” numa visita ou “organizado um barbecue” para delegados do procurador, “talvez não tivesse sido acusado” de mais de 1500 crimes.

A acusação afirma que a vivenda vinha a ser usada como habitação pessoal de Ho Chio Meng e a família nos últimos dez anos. Uma rusga, realizada em Abril, levou à descoberta de vários objectos pessoais do antigo procurador. A habitação representava, para o MP, uma despesa de meio milhão de patacas anuais.

O contrato de arrendamento da habitação chegou ao fim em Dezembro de 2014, ano em que Ho Chio Meng deixou de ser procurador da RAEM, e só aí este terá, segundo o próprio, habitado efectivamente a casa. Num ano e quatro meses não pagou qualquer renda, admitiu em tribunal, pois tinha a intenção de adquirir a casa.

Ho Chio Meng levou para tribunal uma lista de pessoas que, de facto, terão ficado hospedadas em Coloane, tendo referido ainda que foi em Cheoc Van que várias “personalidades” lhe falaram da eleição para o cargo de Chefe do Executivo, isto no ano de 2009. De frisar que o nome de Ho Chio Meng chegou a ser apontado como eventual candidato. O MP recebeu uma ordem de despejo da vivenda por parte do proprietário, quando Ho Chio Meng já se encontrava preso preventivamente.

13 Dez 2016

Jorge Neto Valente continua à frente da Associação dos Advogados de Macau

A Associação dos Advogados de Macau foi a votos e mais de 90 por cento dos membros concordaram com a ideia de que Jorge Neto Valente deve continuar a liderar a entidade. A grande prioridade para o novo mandato é “contribuir para evitar o desprestígio da justiça”

[dropcap style≠’circle’]H[/dropcap]á uma linha de continuidade, mas existe também uma renovação na constituição dos órgãos sociais da Associação dos Advogados de Macau (AAM). A entidade de direito público conseguiu chamar novas pessoas. “Espera-se que venham imprimir algum dinamismo à continuidade”, afirmou Jorge Neto Valente ao HM.

Em termos gerais, no que toca à direcção, há apenas três membros que vinham já do passado, entre eles Neto Valente, presidente da direcção, e o secretário-geral, Paulino Comandante. Como vogais, a direcção passa a ter, além de Álvaro Rodrigues, os advogados Oriana Pun, Bruno Nunes, Chu Lam Lam e Regina Ng.

O resultado das eleições foi anunciado ontem. O acto serviu para eleger não só os órgãos sociais da AAM, mas também o Conselho Superior de Advocacia. Em nota à imprensa, explica-se que, “apesar de se apresentarem a sufrágio apenas listas singulares, a assembleia eleitoral, realizada no passado dia 6, contou com 257 advogados votantes, sendo considerados nulos 15 votos”. O mesmo comunicado indica que cerca de 94 por cento dos eleitores expressaram apoio aos candidatos.

Ainda no que diz respeito à AAM, a mesa da assembleia-geral continua a ser liderada por Philip Xavier, que vai ter como secretários Leong Hon Man e Lei Wun Kong. Quanto ao conselho fiscal, mantém-se Rui Cunha na presidência e Diamantino Ferreira como vogal, sendo que Francisco Leitão se junta ao órgão na qualidade de vogal.

Quanto ao Conselho Superior de Advocacia, é constituído por dois grupos: com mais de dez anos de exercício da profissão no território estão Frederico Rato, Sou Sio Kei e Artur Robarts (como substitutos Luísa Empis de Bragança, Leong Weng Pun e Kuong Iok Kao); com menos de dez anos, Diane Aguiar, Rita Martins e José Liu (Cheang Seng Cheong, Lou Sio Fong e José Abecasis são os substitutos).

Protocolo para retomar

Entre os principais objectivos para o novo mandato, Neto Valente destaca o impulso aos mecanismos de arbitragem, bem como o estabelecimento de um centro de arbitragem “na linha da plataforma entre a China e os países lusófonos”.

A direcção pretende ainda prosseguir com a formação, para “continuar a elevar o nível dos profissionais”, e garantir a saúde financeira da associação, que não tem, até à data, dado quaisquer problemas, segundo explica o presidente. Ainda no que diz respeito ao funcionamento da AAM, está já planeada a construção de um novo site.

Existe ainda a possibilidade de ser restabelecida a relação com a Ordem dos Advogados Portugueses”. O protocolo entre as duas entidades tem estado suspenso. A associação de Macau está já a trabalhar para que haja uma maior colaboração.

A ideia não é só facilitar o acesso dos advogados portugueses ao mercado de trabalho do território, é permitir que o movimento aconteça em sentido inverso. “Tem havido uma tendência para advogados de Macau se querem inscrever na Ordem em Portugal e isso passa por estabelecer uma relação privilegiada com a Ordem dos Advogados Portugueses”, indica Neto Valente.

O problema da lei de bases

Quanto ao estado do sector, o presidente da AAM – uma das vozes mais críticas do modo como tem evoluído – diz que o grande objectivo do mandato é “contribuir para evitar o desprestígio da justiça”. Neto Valente desdobra a ideia com um exemplo, que considera prioritário: a alteração à Lei de Bases da Organização Judiciária.

“Só quando surgem episódios é que se lembram dessa alteração”, lamenta. “Mas não está na nossa mão. Se estivesse, há muito que tinha sido alterada”, afiança. Em causa está, mais uma vez, o julgamento de um arguido que, à data dos factos, tinha um estatuto equiparado ao dos titulares dos principais cargos. O ex-procurador Ho Chio Meng está a ser julgado em primeira instância no Tribunal de Última Instância, sem possibilidade de recurso das decisões do colectivo de juízes. O mesmo problema já se tinha verificado aquando do julgamento do antigo secretário para os Transportes e Obras Públicas, Ao Man Long, detido há dez anos.

Jorge Neto Valente conta que, no ano passado, fez um apelo ao responsável pelo TUI, para que os vários intervenientes no sector se juntassem e discutissem a questão, mas a sugestão caiu em saco roto.

“Por isso é que digo [que a prioridade] é evitar o desprestígio contínuo da justiça que, na minha opinião, se verifica perante a sociedade e a opinião pública”, sublinha. “A justiça não tem estado a ser prestigiada, pelo contrário.”

13 Dez 2016

Eleições | Eternos perdedores falam de desigualdades no sistema

Agnes Lam perdeu todas as eleições a que se candidatou, mas mantém a esperança. Paul Pun não sabe se volta a ser candidato. Casimiro Pinto nem quer pensar mais nisso. Os eternos perdedores das eleições legislativas falam de um sistema desigual, onde os pequenos não conseguem competir com os grandes

[dropcap style≠’circle’]F[/dropcap]azem parte dos rostos que se candidatam a lugares na Assembleia Legislativa (AL) sempre que há eleições, a cada quatro anos, mas nunca ganham. Mantêm a esperança de lutar por algo novo e ganhar assentos aos nomes de sempre. Chan Meng Kam é um deles e surge à cabeça com três deputados eleitos, incluindo ele próprio, os quais representam a comunidade de Fujian. José Pereira Coutinho elegeu, em 2013, Leong Veng Chai; Ho Ion Sang, da União Geral das Associações de Moradores de Macau (Kaifong) faz parelha política com Wong Kit Cheng. Já a Federação das Associações dos Operários de Macau (FAOM) tem dois deputados eleitos pela via indirecta no hemiciclo (Lam Heong Sang, vice-presidente da AL, e Ella Lei), incluindo Kwan Tsui Hang, eleita pela via directa. Mak Soi Kun, que representa a comunidade oriunda de Guangdong, conseguiu eleger mais um nome, Zheng Anting.

É contra estes números que eles tentam lutar a cada quatro anos, mas reconhecem que cada vez é mais difícil lidar com um sistema desigual.

Agnes Lam, candidata em 2009 e 2013, assume ao HM que está a compor uma equipa para se candidatar novamente às legislativas de 2017. Contudo, não quer avançar nomes. “Estamos a tentar fazê-lo, mas queremos fazê-lo de uma forma melhor e diferente. Temos de conhecer bem a equipa, mas estamos a tentar formar uma. Temos uma decisão interna de não anunciar qualquer nome até que tenhamos algo mais concreto. Estou a motivar as pessoas para que queiram trabalhar comigo.”

Convidada a apontar as razões que estiveram por detrás das suas sucessivas derrotas, a docente da Universidade de Macau e presidente da Associação Energia Cívica assume que “não foi forte o suficiente”. “Em Macau as pessoas votam de formas diferentes e a cultura política é diferente. Penso que não fui forte o suficiente a captar as atenções do eleitorado. Da última vez que concorremos às eleições, tivemos pouca cobertura dos media chineses, de facto os media portugueses fizeram uma cobertura mais intensiva.” É uma realidade que, afirma, tem vindo a mudar com a realização de diversos debates através da sua associação, com outros oradores convidados. “Através do Facebook posso atrair mais pessoas, através da realização de debates hoje em dia.” agnes lam

Agnes Lam é a primeira a referir que o sistema para os candidatos é desigual. “Não temos recursos suficientes para concorrer ao lado desses candidatos. Mas acredito que há algumas pessoas lá fora que querem algo diferente. Não vou concorrer contra eles, só procuro um assento no hemiciclo. Apresento as coisas em que acredito e se houver pessoas que acreditem nelas também… Só preciso de captar mais a atenção das pessoas.”

Para a ex-candidata, a desigualdade é um “problema sistemático”. “As eleições contribuem cada vez mais para um sistema de desigualdade, e esse tem sido um problema sistemático. Não fui forte o suficiente, e esse foi o problema. Mas também acredito que a lei eleitoral e as políticas que existem não são favoráveis à participação de pequenas organizações.”

O defensor dos mais fracos

Paul Pun é talvez o candidato que mais eleições perdeu, já que se candidatou a todos os actos eleitorais desde o estabelecimento da RAEM. Ao HM dá a entender que uma nova eleição pode não ser realidade no próximo ano.

“Ainda que tenha pessoas a dizerem-me ‘deveria candidatar-se’, costumo dizer que a hipótese de me candidatar é mínima. Não é minha intenção dizer que me vou candidatar. As diferentes comunidades têm diferentes expectativas. Independentemente de uma candidatura, quero continuar a servir as pessoas consoante as minhas capacidades.”

O secretário-geral da Caritas refere que perdeu as eleições “devido a vários problemas”, mas ressalva que, “em termos gerais”, não é “um perdedor”. “Não consegui um assento, porque o processo eleitoral deveria ter um período mais longo. As minhas anteriores candidaturas não correram bem por esse motivo. Em segundo lugar, as pessoas escolhem e eu respeito as suas escolhas. Continuo a poder fazer outras coisas.” Paul Pun 1

A existência de candidatos mais fortes também não ajuda. “Não tenho a preparação que esses grupos que mencionou têm. Tenho uma maneira muito própria de me defender, não sou um candidato com muito poder. Devemos pensar como é que o processo pode ser mais justo para que todos possam ser candidatos.”

A tímida candidatura

Casimiro Pinto liderou, em 2009, a “Voz Plural” para garantir uma maior representação da comunidade macaense no hemiciclo, que já tem os rostos de Pereira Coutinho e Leonel Alves, este último deputado eleito pela via indirecta. A derrota aconteceu e Casimiro Pinto nem quer ouvir falar de uma nova candidatura.

“Não me volto a candidatar porque penso que a participação cívica pode ser feita de outra forma. Acho que devem existir outras pessoas, mais jovens do que eu, que representem a comunidade. Não fazemos essa participação cívica como deputados, mas continuamos a acompanhar tudo o que tem que ver com Macau.”

O que falhou, então, em 2009, apesar de Casimiro Pinto ser um rosto bem conhecido da comunidade macaense? “Era uma lista que a população ainda não conhecia e, portanto, era óbvio que não poderíamos obter muitos votos. As pessoas desconheciam ainda os candidatos. Na altura, o grupo juntou-se em cima da hora e não havia muita experiência no assunto, incluindo eu próprio, para uma actividade eleitoral. Havia um desejo e o amor pela terra. Falhámos nesse sentido, porque as eleições exigem mais do que isso, exigem a experiência que nós na altura não tínhamos.”v

Além da luta de titãs com os actuais deputados, Casimiro Pinto lembra que, para uma lista que não tem continuidade, é difícil garantir uma eleição.

“Teria de ser um trabalho contínuo para ganhar visibilidade e a confiança da população. Se é para lutar pelos interesses da população, o trabalho tem de ser feito de forma contínua. No início houve uma vontade para dar continuidade, mas houve dificuldades.”

Ainda assim, Casimiro Pinto considera que o trabalho da “Voz Plural” não foi em vão. “Foi pena não termos dado continuidade mas não foi infeliz, sabemos que na sociedade todos estão a desempenhar um papel no território. Agora ainda é mais difícil. Não aparecemos nas últimas eleições [em 2013] e agora seria mais difícil ter alguma expressão.”

 

 

 

 

Larry So: “Nova lei eleitoral não deverá mudar o cenário”

Para o politólogo Larry So, o cenário de desigualdade entre candidatos não deverá alterar-se com a implementação de uma nova lei eleitoral. “Penso que a nova lei eleitoral não deverá mudar muito esse cenário.”

“Não se pode dizer que é um jogo justo. [Os candidatos mais fortes] têm vantagens porque a maioria dos membros eleitos têm mais recursos, se compararmos com aqueles que já concorreram várias vezes. Estes não têm esses recursos, dinheiro, materiais. Além disso, há muitas pessoas por detrás destes grupos que elegem os deputados e podem fazer maior propaganda em várias plataformas. Caso não haja os recursos humanos acaba por se gerar uma situação de desigualdade.”

Larry So explica, contudo, que o facto de uma pessoa estar há alguns anos no hemiciclo faz com que os eleitores acreditem no seu trabalho. “É quase uma regra de que determinada pessoa, que esteve na posição de membro eleito, quando participa numa nova eleição, terá melhores possibilidades de vencer. Tem mais vantagens. Já estão nessa posição e já conhecem o funcionamento da Assembleia Legislativa”, afirma. “Um novo candidato não tem essa vantagem. As pessoas reconhecem os nomes, o que não acontece com os novos candidatos. Quando vão votar, fazem-no nas caras que já são mais familiares ou até nos nomes mais familiares. Um novo candidato terá de trabalhar muito mais para conseguir chegar lá”, conclui.

12 Dez 2016

Justiça | Ho Chio Meng começou a ser ouvido e nega acusações

Começou o julgamento de Ho Chio Meng. No dia da leitura da acusação, o antigo líder do Ministério Público tentou explicar por que razão havia uma sala, no mesmo prédio onde funcionava o seu gabinete, com equipamentos para massagens e uma mesa de bilhar

[dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] antigo procurador de Macau, Ho Chio Meng, negou a prática dos crimes de que é acusado no arranque do seu julgamento no Tribunal de Última Instância (TUI). “Não correspondem à verdade os factos constantes da acusação”, declarou Ho Chio Meng, 61 anos, depois de revelar que ainda não conseguiu acabar de ler o processo, devido aos constrangimentos decorrentes do facto de estar detido preventivamente, como ter de consultar os documentos sob “luz muito fraca” à noite na casa de banho. O ex-responsável pelo Ministério Público (MP) sublinhou que, como arguido, tem direito a conhecer a base em que se sustenta a acusação.

O presidente do TUI, Sam Hou Fai, reconheceu que a questão do tempo foi levantada por o arguido estar detido, mas realçou que foi concedido um prazo de três meses para a preparação da defesa e que, no decurso do julgamento, poderá continuar a consultar o processo, sendo “impossível” aguardar mais devido ao prazo máximo previsto para a prisão preventiva.

Ho Chio Meng, que liderou o MP entre 1999 e 2014, está detido desde Fevereiro, estando acusado de mais de 1500 crimes, incluindo burla, abuso de poder, branqueamento de capitais e promoção ou fundação de associação criminosa, em autoria ou co-autoria com outros nove arguidos. Apesar das ressalvas, Ho Chio Meng optou por responder em tribunal.

Descanso para convidados

O primeiro ponto abordado foi a designada “sala de descanso para docentes” – relativamente à qual lhe são imputados nove crimes de burla qualificada ou nove de abuso de poder –, localizada em fracções no edifício Hotline, arrendadas entre 2006 e 2014 pelo gabinete do procurador, que funciona no mesmo prédio, as quais seriam alegadamente destinadas ao uso pessoal de Ho Chio Meng.

Segundo a acusação, nessa sala foram encontrados, em Janeiro de 2015, uma televisão de ecrã panorâmico, mesa de ténis-de-mesa e de bilhar, equipamentos de massagem, sauna, colchões, móveis de pau-rosa e de outras madeiras valiosas e também colecções do próprio arguido.

Além disso, diz a acusação, os trabalhos relacionados com a referida sala foram classificados como confidenciais e não havia nada que a identificasse como sendo do MP. Terão sido dadas instruções para que os telefones nem sequer constassem da lista interna de contactos e para que o acesso àquele espaço fosse vedado a outros funcionários.

Ho Chio Meng afirmou que a referida sala do 16.º andar do edifício não foi um “contrato independente”, havendo outras instalações no mesmo piso interligadas.

O arguido contestou a acusação, explicando que a criação da “sala para descanso de docentes” teve que ver com “o desenvolvimento” do próprio MP, uma vez que depois da transferência de Macau de Portugal para a China, em 1999, a formação tinha especial importância.

A acusação diz que o gabinete que dirigia nunca usou aquela sala para convidar docentes do exterior para efeitos de formação de pessoal do MP, algo que Ho Chio Meng negou: “Há provas de que funcionários tiveram formação no local – pelo menos dez”. Deu ainda o exemplo de uma palestra proferida pelo director da Faculdade de Direito de Pequim no local, onde também teria reuniões e receberia convidados, como membros do Governo ou magistrados, outros de fora e até do Tribunal Superior de Justiça da China, mas também associações de Macau.

Além disso, afirmou que era onde recebia “informadores” que evitavam o processo de identificação necessário à entrada do gabinete do procurador, pelo que o espaço era para “uso exclusivo” do exercício de funções – como “existe noutras entidades”, apontando que no gabinete do TUI há uma sala semelhante.

Sobre os contratos de arrendamento da sala, afirmou ter-se limitado a assiná-los: “Não tenho qualquer relação com os senhorios, não tenho qualquer relação com as rendas”.

As buscas

Essa “sala de convidados” foi “arrombada” a 23 de Janeiro de 2015 pelo actual procurador, Ip Song Sang, pouco antes de Ho Chio Meng ter ido buscar coisas que ali armazenara, como mobílias, aquando de uma mudança de casa, dado que depois de terminar o mandato como procurador, teve de abandonar a residência oficial, em “finais de Março” do ano passado.

Ho Chio Meng questionou, por isso, por que razão a porta foi arrombada, passado um mês, sem o informarem, queixando-se por o procedimento das buscas não ter tido em conta que nem ele, nem nenhum representante seu estava presente. Alegou que houve pertences seus que desapareceram, falando de uma caixa de documentos dos tempos em que trabalhou no Alto Comissariado Contra a Corrupção, na década de 1990.

Confrontado com a possibilidade de apresentar uma denúncia, Ho Chio Meng afirmou que nunca falou em furto, acrescentando que pode haver várias razões para explicar o desaparecimento.

O Ministério Público de Macau apresentou um pedido cível de indemnização de 76,19 milhões de patacas ao antigo procurador que continua a ser ouvido hoje.

12 Dez 2016

Sexualidade na deficiência | Hong Kong quer debater assunto com Macau

 

A sexualidade vivida pelas pessoas com deficiência é ainda um assunto tabu e é preciso debater o assunto com a sociedade, até para prevenir casos de abusos sexuais. A ideia é defendida pelo Hong Kong Women Christian Council, que pretende trazer a discussão para Macau

[dropcap style≠’circle’]É[/dropcap] um assunto tabu em quase todo o mundo, e mesmo na Europa, em Portugal, só recentemente começou a ser abordado. Os portadores de deficiência também vivem a sua sexualidade, mas continua a persistir a ideia de que a intimidade é uma área que eles não vivenciam.

Foi a pensar nisso que o Hong Kong Women Christian Council promoveu um debate sobre o assunto na região vizinha, mas a ideia é que possam ser estabelecidas ligações com entidades de Macau para discutir este tema no território. “Estamos a planear partilhar a nossa conferência com alguns grupos que tenham interesse na questão ou com organizações de apoio à deficiência em Macau. Também estamos a planear fazer alguma peça de teatro educacional para os portadores de deficiência em Macau”, disse ao HM Little Wing Yick, uma das responsáveis pela organização.

A discussão em torno da sexualidade na deficiência começou em 2012, quando o Hong Kong Women Christian Council publicou 12 histórias no livro “O amor não tem deficiência”. Desde então que tem feito também investigação sobre o assunto e sobre casos noutros países.

“A sexualidade na deficiência é ainda um grande tabu na sociedade de Hong Kong. Encontrámos alguns casos de deficientes que, no seu dia-a-dia, sofrem abusos sexuais e existe falta de educação sexual para eles. Os subsídios que são concedidos permitem aos portadores de deficiência manterem os seus empregos, viagens, manterem uma casa e serviços médicos, mas não existe nada para as suas necessidades sexuais ou íntimas. Há uma ideia de que o portador de deficiência não deveria ter sexo. Por isso esperamos alertar o público para esta questão dos direitos dos deficientes em relação ao sexo e prevenir os abusos contra estas pessoas”, adiantou Little Wing Yick.

Para a responsável, “tudo está relacionado com o problema da indústria em Hong Kong”. “Acreditamos que, quando abordamos a prática de serviços sexuais em relação aos portadores de deficiência, deveríamos aprofundar questões que têm que ver com a lei, direitos humanos e medicação”, disse ainda.

Abusos sexuais são realidade

Hetzer Siu, presidente da Macau Special Olympics, uma das entidades que representa os portadores de deficiência, fala da existência de casos de abuso sexual que nunca chegam a constituir processos judiciais, por falta de provas.

“No passado aconteceu e mesmo hoje em dia há vários casos de abusos sexuais em Macau, porque as pessoas com deficiência mental estão mais vulneráveis, porque mesmo que sejam alvo de abusos não conseguem falar do que se passou. Mesmo que os casos vão parar à polícia, não conseguem encontrar provas porque a vítima não consegue expressar o que aconteceu. Ainda assim não há muitos casos porque Macau é uma sociedade pequena e comunidade irá saber quem abusou de um portador de deficiência. Nesse sentido é vantajoso vivermos numa sociedade pequena”, explicou.

Ainda assim, existe o lado bom da medalha: os deficientes que conseguem ter uma vida normal e constituir família.

“Há um ponto interessante na sociedade de Macau, porque segundo a tradição chinesa os filhos homens têm de ter filhos e casar, então há muitos pais que tentam encontrar uma esposa para os seus filhos. Tentam arranjar um casamento tradicional para eles. Em relação às mulheres, alguns pais também procuram que as suas filhas encontrem um parceiro, porque pensam que é muito importante constituir uma família.”

Hetzer Siu considera que é importante debater o assunto em parceria com Hong Kong, mas alerta para as dificuldades em abordar a realidade dos abusos sexuais.

“É necessário apostar na educação sexual para os pais destas pessoas, porque a sexualidade é uma necessidade básica de qualquer ser humano. É preciso que haja mais informação sobre o controlo de doenças sexualmente transmissíveis e também sobre relações sexuais protegidas. Todas as pessoas têm essa necessidade, sobretudo de intimidade, e não me refiro apenas ao sexo. As pessoas com deficiência têm necessidade de estabelecer relações íntimas e não apenas relações sexuais”, rematou o presidente da Macau Special Olympics.

12 Dez 2016