Sofia Margarida Mota EventosFundação Rui Cunha | Os serões que dão a conhecer as ruas de Macau A rubrica nasceu da vontade de reunir pessoas ao fim do dia e conversar sobre o passado de Macau. O objectivo é a partilha de informações sobre a cultura local para que a memória não se perca [dropcap style≠’circle’]A[/dropcap] proposta de passar o final do dia a contar as histórias antigas de Macau é da Associação dos Antigos Alunos da Escola Comercial Pedro Nolasco. O evento acontece na Fundação Rui Cunha e conta, esta quarta-feira, com a terceira edição, a cargo de Jorge Cavalheiro com o tema “Conhecer a História de Macau, percorrendo as suas ruas”. “A sessão será sobre os primeiros tempos dos portugueses em Macau”, referiu José Basto da Silva, presidente da associação, ao HM. “Na altura existia um muro que separava a parte portuguesa da parte chinesa e vamos abordar o que se passava com essa divisão e nas ruelas que circundavam o muro”, explicou. Depois da palestra, a associação já tem pensado um segundo momento: “A ideia é convidar os interessados visitar a esse recantos que vão ser abordados no dia 12”. Juntos à conversa A criação de encontros para partilhar acontecimentos de outros tempos nasceu da vontade de reunir pessoas a conversar sobre o que é a cultura local. “Queríamos juntar um grupo de amigos no final do dia para recuperar histórias antigas do território ao mesmo tempo que, à volta delas, as pessoas teriam um pretexto para estarem juntas e passarem um final de tarde diferente, depois de um dia de trabalho”, disse José Basto da Silva. De acordo com o responsável, a importância destes pequenos encontros está ainda na surpresa que acarretam. Apesar de o público ser, na sua maioria, residente, muitas vezes não sabe pequenos detalhes sobre o que o rodeia e que acabam por dar outro valor à realidade. O objectivo, disse, é evitar que o conhecimento que, muitas vezes passa de boca em boca, se perca. “A informação dilui-se de geração para geração e este é um espaço para que possa ser partilhada e evitar que as memórias se percam com o tempo”.
Sofia Margarida Mota SociedadeUM | Dia aberto com estudantes de fora a dar as boas vindas Ontem foi o dia aberto da Universidade de Macau. Ao início da tarde realizou-se a cerimónia de abertura e o átrio em frente da biblioteca encheu-se de bandeiras de todo o mundo. São os estudantes internacionais que escolheram Macau para um programa de intercâmbio [dropcap style≠’circle’]T[/dropcap]eve ontem lugar o dia aberto da Universidade de Macau. Por entre algumas centenas de estudantes, famílias e futuros alunos eram as bandeiras internacionais que tinham voz. A segurá-las estavam alguns dos alunos que escolheram Macau para um programa de intercâmbio. A opção pelo território parece ter sido uma escolha pensada. Por um lado a proximidade da China, país que para o ocidente ainda parece distante e que, desta forma, poderia estar mais perto. O ensino no território não apresenta as mesmas vantagens e desvantagens para quem cá vem. Isabela da Silva vem de Brasília e está na UM por um semestre. É aluna de Psicologia e escolheu participar no programa de intercâmbio da universidade local por ter “interesse pela Ásia”. O ensino difere em muito daquilo a que está habituada e vê como vantagem essencial o facto de a sua área estar muito direccionada para a investigação. “Daqui vou levar o treino na pesquisa o que não acontece no meu país”. Por outro lado, todas as semanas há trabalhos individuais acerca da cultura oriental. O resultado: “um conhecimento mais profundo e abrangente do mundo”. A estudar Inglês está a sueca Izabella Tirbal. Macau foi- lhe sugerida e não hesitou em aceitar. Do ensino leva também a diferença e a oportunidade em alargar o conhecimento que isso lhe traz. “Os alunos são muito calados e de onde venho somos muito participativos”, conta. No entanto, este é um dado que marca a diferença cultural e que ao mesmo tempo a aproxima dos colegas. “Acho que foi um choque estar naquela turma porque não me calo”, diz, satisfeita. De Macau leva uma mala cheia de ferramentas que podem ser válidas enquanto professora. Com a disciplina de literatura que, considera, “uma bênção”, tem acesso a obras que versam sobre a história da Ásia e da sua relação com a América. “Os temas culturais são uma constante e nós não temos essa área, não do ponto de vista oriental. Tem sido uma forma de me fazer pensar como poderei utilizar a literatura para pensar a sociedade”, refere. Pouco colectivo Se para uns, os trabalhos individuais são uma mais-valia, para outros, nem tanto. “A maior diferença é o sistema de ensino ser muito individual e não preparar para a vida real”, aponta o aluno de engenharia mecânica que vem de Montreal, no Canadá, Vincent Aguilar. “Temos na maioria do tempo trabalhos pessoais que temos de executar sozinhos. Estava habituado a trabalhar com outras pessoas e a pensarmos em conjunto. No, entanto o nível de exigência acho que é muito bom e o mesmo se aplica aos professores”, diz. De Macau, sublinha satisfeito, leva a experiência de “uma cultura tão diferente como a chinesa e a oportunidade de viajar por alguns países na região que, de outra forma, não seria possível”. O francês Pierre Itey concorda com o colega de vida estudantil. Aluno do último ano do curso de administração e negócios escolheu o território porque queria uma aproximação à cultura asiática. “Normalmente quando temos a oportunidade de fazer programas de intercâmbio, as pessoas optam, na minha área, pelos Estados Unidos ou por países em que conhecem já a cultura”, comenta. Mas Macau é especial: “aqui temos a cultura asiática e a portuguesa o que traz ao território uma influência ocidental particular”. No entanto, no que respeita ao ensino, a distância para com a vida real também é sentida. Habituado a ter aulas com profissionais que partilhavam a experiência, Pierre ainda estranha a aula unilateral, o silêncio do ensino asiático e a teoria sem paralelismo com a prática. No regresso, não tem dúvidas, leva “amizades e boas memórias”.
Sofia Margarida Mota EventosExposição | Anabela Canas mostra série de desenhos feitos para Macau [dropcap style≠’circle’]S[/dropcap]ão dois anos de ilustrações de Anabela Canas que têm a sua exibição marcada para a próxima quarta-feira, na Galeria da Livraria Portuguesa. A acompanhar o evento está o lançamento do álbum que acompanha as imagens com pequenos trechos dos textos que escreveu para a secção do HM, “De tudo e de nada” “Iluminação Artificial” é a exposição de Anabela Canas que vai ser inaugurada esta quarta-feira na Galeria da Livraria Portuguesa. A mostra reúne um conjunto de desenhos que ainda estão a ser seleccionados. “É um conjunto impreciso”, afirma a artista, e sai de uma escolha entre os 78 trabalhos que produziu para a rubrica do HM, “De tudo e de nada”. “Gostaria de os expor todos porque todos fazem sentido, mas há um limite de visibilidade, de elegância e de clareza na galeria que tem de ser respeitado e vou tentar encontrar um limite razoável, sendo que o critério é sempre a escolha dos trabalhos que, considero, mais conseguidos”, conta. Porém, não se trata de uma exposição de meros desenhos, são antes, ilustrações “por estarem ligados a um texto e terem um fim específico.” “São feitos de propósito e podem acrescentar mais às palavras ou dar origem a outros sentidos”, diz. Por outro lado, a exposição só poderia acontecer no território. A explicação é simples: “foram feitos para Macau”. Imagens legendadas A mostra acompanha o primeiro livro da artista que é, de acordo com Anabela Canas, “um álbum” e não um catálogo da exposição porque tem fragmentos das crónicas. “São excertos muito curtos mas que tinham de existir pela ligação existente e que podem fugir para diferentes sentidos”. Anabela Canas queria, nesta estreia, um objecto bonito capaz de guardar as imagens pelas quais, diz, “tem um grande carinho”. “Gosto dos meus desenhos e quando estão feitos olho para eles de um ponto de vista exterior, como se não fosse eu, e quando gosto sinto mesmo muito carinho”, contou. Por isso queria que fossem guardados como merecem. “Não queria que ficassem enterrados”. A escolha de Macau para a estreia das palavras publicadas em livro representa “um dilema enorme depois de 15 anos de ausência para arrumar bem as nostalgias”. Macau é agora uma segunda terra que faz com que o que está a acontecer “ainda faça mais sentido”. Iluminação artificial Um dia, por um daqueles puros e aleatórios acasos, encontrei-me com um aspecto ligado à antiga arte de iluminar, que me encantou. Monges copistas, na sua tarefa de horas perdidas, horas e horas, dias e anos “num trabalho que não tinha pressa de chegar ao fim”, outros, ou os mesmos, a tecer iluminuras preciosas, a ouro ou prata, a negro e a cores, e que de caminho, talvez os primeiros, anotavam nas margens dos manuscritos os seus desabafos nocturnos e humanos. E por temor ao esquecimento, de seres porque sem nome, em que ficariam caídos pelos caminhos longos e infindáveis da posteridade, o costume melancólico de deixar uma impressão condoída no final. Uma assinatura, um desabafo que enaltece a nobreza do trabalho, do esforço, um anseio de que lhes rezasse pela saúde e pela alma, alguém. Imaginá-los ao lado, em noites húmidas a entrar nos ossos e a sair de um sono mal entrado, tocadas a aragens arrefecidas pelas pedras. Agrestes. A fazer dançar chamas a iluminar o cansaço. A ensombrar. E sempre, quase a apagar uma vela grossa mas consumida e suada em grossas lágrimas de cera como gotas alongadas da luz produzida com esforço. A rodeá-los a escuridão povoada de sombras enormes e inquietas, nas velhas abadias medievais, quando as tarefas insaráveis lhes curvavam as costas em dor e tolhiam os dedos. O desenho de uma escrita trabalhosa, vingada em lamentos nas margens do texto. Desabafos esquecidos ao apagamento, ou deixados porque sim. A distinguir o fim antes da madrugada, ou o início no fim da noite. Porque as horas se alongam e a tarefa não tem fim. Porque a tinta está demasiado fina. Porque já mereciam um copo de vinho espesso a aquecer a alma e ou pés. Invento. E assim me podia fantasiar, por vezes, com eles e pela noite fora a tentar laboriosamente vencer o tempo e o sono, e iluminar um texto que só a meio se me começava a desvendar, e só então e não mais, e porque noutros momentos o sentia fechar sobre si, ou a desviar sentidos a meio ou à procura de um reforço a apontar para outros lugares do texto entre linhas. Entre as linhas, como nas margens e como eles, que aí colocavam glosas a desvendar um latim longínquo do falado. Entre as linhas ou nas margens se caminhou para o futuro dicionário de sentidos. A ficar pelos tempos no imaginário da língua, a insinuação sobre as palavras ocultas agora, entre as linhas visíveis e o discurso não dito. A ler nas entrelinhas. E de uma só vez, me surge uma amálgama de três formas objectivas de ocupar aquelas páginas, em que tudo o que menos se esperava seria a da pequena subjectividade de formiga laboriosa a ganhar um espaço clandestino e que ficou esquecido por entre as páginas. Esquecido de apagar ou, perversamente a imiscuir-se na nobreza suposta do manuscrito, a sua pequena significância tornada existente, real e ancorada no texto. Texto que não era deles mas sim ditado, copiado, como a ficção literária não é do autor mas de uma existência própria alheia. Imiscuída também ela de desabafos nas linhas, nas margens brancas de silêncio, ou nas entrelinhas. E tal como a iluminura fugia ao texto nas suas figurações icónicas, antropomórficas ou zoomórficas, motivos florais ou entrançados…tudo para trazer a luz da folha de ouro e prata e só assim a verdadeira luz sem outros sentidos, às escuras páginas de letras apertadas e negras, a poupar o espaço e a fugir para o cimo da página para se desviarem do terreno chão oposto. Terreno demasiado terreno. Uma luz real a iluminar o texto numa fuga ao sentido. As dores do humano nas margens do saber… Luz real, se real é o reflexo. E também eu com a luz ao lado mas de sombras quietas na parede. Vigilantes e meio adormecidas, mesmo as mais ferozes. Roubar tempo ao tempo. Ilustrar. Tornar nobre e iluminar. De ilustris, em latim, o que é claro iluminado. Ou a raiz indo-europeia lux, de onde vem a luz da lucidez, e a dar lugar ao latim, de novo, em luminis, lucubrare, iluminar, elucubrar. Saborosas palavras de luz. Sempre a luz. E, nas iluminuras medievais, uma luz que se ficava pelo brilho denso da folha de ouro, ou da prata, e das cores fortes dos óxidos. Acompanhar o texto ou produzir significados livres. Sem ambições a aprofundar sentidos. Às vezes só o de humor. De revolta. De monge sem outro lugar para desentorpecer a voz. Nada mais nobre – para quê ilustrar –– ou subtil e ambíguo – como iluminar – do que as palavras. Não mais, nem menos do que uma imagem. Mas há o acrescentar, o tornar ainda mais divergente aquilo que por palavras e só, já o é. Aquilo que numa imagem o é por inerência também. Há, pois um diálogo de titãs entre umas e outras. Em que a cada uma das subjectividades se acrescenta a das outras, desmultiplicando sentidos ou ilusoriamente clarificando. Iluminando. Mas por vezes de uma luz enganosa. Acrescentar uma leitura/luz diferente, ou simplesmente aumentar as camadas de leitura do texto com a imagem. E vice-versa. E fez-se uma luz artificial, na fuga irreprimível das linhas insubmissas, ao texto. Estas dos desenhos. Talvez falsas iluminações a fingir a incidência de uma luz polarizada a rir dos sentidos únicos e últimos. Em fuga, sempre. Alumiar noutros sentidos é o desafio do desenho a fugir ao texto, a produzir zonas de sombra, às vezes. O fabuloso desafio do Jornal Hoje Macau, pela voz do seu director Carlos Morais José. Escrever um texto para um dia da semana – faz dois anos. Setenta e oito dias de hoje, sem carta de marear. E o desafio meu. Iluminar todas as semanas as palavras esquivas e, claro, a negro de fumo. Às vezes, depois, as cores a querem chegar. É o que fica neste livro, e pedaços soltos dessa escrita, aqui, já a ilustrar com as suas sombras e sentidos, o desenho. Agora. O sentido contrário. Sem nunca fugir à luz artificial. Do candeeiro ao lado. Já pelo fim da noite ou na frescura da madrugada. Que lança afinal também ela sombras fluidas. Zonas onde a luz não chega. Falsos brilhos e reflexos enganadores. Talvez. Enormes possibilidades e incomensuráveis impossibilidades que se fundam numa mesma incerteza. De desenhar um sentido. Uma certeza, uma luz, uma escuridão. É isso. Iluminar. Artificialmente. Anabela Canas
Sofia Margarida Mota Manchete SociedadeTurismo | Gabinete de Ligação sugere voos directos para o espaço lusófono A representação de Pequim em Macau propôs ontem o investimento da RAEM em voos directos com os países de língua portuguesa. A ideia é usar a situação privilegiada do território para multidestinos turísticos. O Governo Central quer ainda estabelecer mecanismos de ajuda na criação de um produto turístico próprio [dropcap style≠’circle’]M[/dropcap]acau deve estudar a possibilidade de ter voos directos entre o território e os países de língua portuguesa. O recado foi deixado ontem pelo subdirector do Gabinete de Ligação do Governo Central, Yao Jian, na reunião anual de 2017 da comissão conjunta de trabalho para impulsionar a construção de Macau num centro mundial de turismo e lazer. “Macau é uma plataforma importante entre a China e os países de língua portuguesa e, por isso, devem ser desenvolvidas actividades que envolvam o intercâmbio entre o Continente e estes países”, disse o responsável. Para o efeito, “deve estudar a possibilidade de explorar voos directos com os países de língua portuguesa, de modo a atrair mais visitantes destes países para o território e, ao mesmo tempo, dar oportunidade a estes turistas para que possam transitar para outros destinos na China”, explicou. No final da reunião, o secretário para os Assuntos Sociais e Cultura, Alexis Tam, não acrescentou qualquer informação acerca da vontade do Gabinete de Ligação, sendo que, garantiu, seria uma iniciativa acarinhada pela sua tutela. “É uma boa ideia, mas é necessária ainda uma análise. Não falámos dela durante a reunião, o que não significa que não a vamos desenvolver no futuro”, afirmou. Acção conjunta De acordo com Li Shihong, vice-presidente da Administração Nacional do Turismo da China, o Governo Central está disponível para ajudar nas políticas do território que tenham como fim a promoção de um turismo diversificado e “a criação de um produto internacional de grande procura”. “O desenvolvimento do território está no bom caminho e temos, em conjunto, de depositar confiança no Governo local e ajudar na colaboração com províncias chinesas”, sublinhou. A ideia do responsável do turismo do Continente vai no sentido de fomentar tempos de estadia maiores no território e, em simultâneo, explorar o turismo para multidestinos. “O Governo Central já o faz e podemos associar Macau às políticas aplicadas a outras províncias chinesas.” Por outro lado, Li Shihong considerou que é importante que as medidas a serem tomadas sejam práticas e concretizáveis. “Discutimos acerca das políticas em que podemos apoiar Macau na elevação da indústria turística, e como aprofundar os serviços e fiscalização numa cooperação integrada de todos os sectores”, disse. A entrada facilitada no território também esteve em discussão na reunião de ontem. A ideia é que os turistas não tenham de pagar para entrar em Macau, prática que, segundo o Alexis Tam, tem sido desenvolvida à margem da lei. É fundamental, disse o secretário, “aumentar a fiscalização das actividades turísticas, sendo que a abertura da ponte Hong Kong-Macau-Zhuhai é também uma grande oportunidade para o desenvolvimento da cooperação”. De acordo com Li Shihong, o Governo Central está a estudar, com Fujian e Guandong, uma cooperação conjunta com o território. No bom caminho O secretário para os Assuntos Sociais e da Cultura não deixou de se mostrar particularmente entusiasmado com as iniciativas que a sua tutela tem desenvolvido. “Desde a celebração do acordo entre o Interior da China e Macau sobre a criação de uma comissão conjunta, em Junho de 2015, bem como a realização da reunião anual de trabalho desta comissão em Fevereiro do ano passado, o Governo e a China Continental aceleraram a cooperação. Tem sido aprofundado tanto o nível, como o conteúdo, no âmbito do turismo”, recordou. Na prática, Alexis Tam refere alguns dos trabalhos que o Governo tem vindo a desenvolver em cooperação com o Continente, entre eles “a participação nas acções de promoção conjuntas para itinerários multidestinos, a implementação do projecto pioneiro de turismo individual com embarcações de recreio Macau-Zhongshan, o reforço de cooperação com a Administração do Turismo da Província de Guangdong e vários serviços turísticos de outras cidades da China na fiscalização da qualidade turística para assegurar o desenvolvimento saudável no mercado”. Para o secretário, o turismo local atingiu uma fase de estabilidade. “Actualmente, a indústria turística de Macau encontra-se numa fase de desenvolvimento estável. Em 2016, mesmo havendo factores externos de instabilidade económica, o número de visitantes manteve-se em mais de 30 milhões, registando-se um ligeiro acréscimo em termos anuais”, afirmou. De sublinhar, para o secretário, é a formalização, com o apoio do Ministério da Educação da China, da candidatura de Macau à Rede de Cidades Criativas da UNESCO, enquanto Cidade Gastronómica.
Sofia Margarida Mota Perfil PessoasJoão Picanço, jornalista: “Estou em Macau para ficar” [dropcap style≠’circle’]C[/dropcap]hegou há cerca de dois meses a Macau. O convite para trabalhar veio da TDM, depois de ter enviado um currículo, e aceitar a proposta que recebeu foi a “melhor decisão na vida”. João Picanço é uma das vozes da informação quando se sintoniza a 98.0 FM. Depois de muitas decisões que pensou terem sido mal tomadas, com a chegada ao território e a concretização do sonho de trabalhar numa rádio profissional, considera agora que “afinal correu tudo bem”. A ideia de sair de Portugal e vir para terras distantes era um sonho antigo. Quando soube que vinha para Macau, tentou seguir o conselho daquela que diz ser a mulher da sua vida, a irmã, e não criar expectativas para não se desiludir. “Mas não consigo fazer isso e claro que tive muitas. Quando soube que vinha para cá mentalizei-me de que o território ia ser a minha casa. Saí do Sporting TV, um mês antes, e fui à Bélgica e à Holanda. Não tinha estado em nenhum destes dois países e senti necessidade de me preparar para a mudança com uma viagem”, conta. As expectativas foram muitas mas a chegada conseguiu, ainda assim, surpreender. “Estava à espera de gostar mas, ao chegar, senti que tinha sido superado. Macau tem uma energia estranha. Pode parecer sufocante e é mesmo, por vezes, uma região claustrofóbica mas, aqui, sinto-me em casa”, refere. Na rádio desde cedo A opção pelo jornalismo vem “desde miúdo”. Se no nono ano ainda se é muito novo para saber o que se quer no futuro, João Picanço lembra-se de que já queria ser jornalista sem saber muito bem porquê. “No secundário comecei logo a fazer coisas nesse sentido. Reactivei a Rádio Escola e quando cheguei a Coimbra, onde tirei o curso, tive várias experiências. Tive cinco programas semanais na Rádio Universidade de Coimbra, trabalhei com o Jornal Universitário de Coimbra – A Cabra, e ainda hoje mantenho a ligação a Coimbra com um programa semanal que faço à distância dedicado à música britânica: o “U-Quem?”, relata. No final do curso, foi estagiar para o Jornal Record, um volte-face nos desejos. A ideia era conseguir uma oportunidade na Blitz porque queria trabalhar na área da música. “Mas ninguém me respondeu. Houve um dia em que a minha coordenadora me disse que tinha mesmo de arranjar um estágio ou teria de fazer uma tese. Preferia o estágio por ser mais prático. Havia uma vaga no Diário das Beiras em Coimbra e outra no Jornal Record em Lisboa. Optei pelo segundo.” O jornalista conta que “nunca tinha feito desporto na vida, gostava de futebol, mas não percebia grande coisa”. “Lembro-me do Bernardo Ribeiro me dizer que apenas ficaria nos quatro meses de estágio porque não tinham lugar para mim. Acabei por ficar seis anos.” A passagem pelo Record marcou o percurso do jornalista da melhor maneira até porque foi lá que teve oportunidade de fazer uma das suas “melhores histórias e um jornalismo a sério numa vinda à Ásia, em 2014”. “Vim à Indonésia para assinalar os dez anos do tsunami de 2004 e senti que fiz jornalismo mais a sério. Andei à procura do Martunis, o menino que depois do tsunami apareceu vestido com a camisola de Portugal numa imagem que correu mundo. Entrei em contacto com ele no Twitter. Não tinha a certeza que era ele, mas deu-me uma morada e fui lá com o Paulo Calado, um excelente fotojornalista. Saímos de lá a chorar. Foi um dos grandes momentos da minha vida profissional e foi na Ásia. Quase poderia dizer que foi um presságio”, assinala. No entanto, o jornal não dava a João Picanço a segurança financeira que queria e, depois da reportagem com Martunis, recebeu uma proposta do canal do Sporting TV. “Martunis acabou por ir fazer um estágio no clube e foi quando senti que podia fazer alguma coisa por alguma coisa.” Entre o jornalismo em Portugal e o de Macau, João Picanço nota já algumas diferenças. “Em Portugal é muito agressivo e aqui ainda há alguns valores, e cooperação entre os profissionais da informação. Vi muitas pessoas com idade para se comportarem de outra forma. Estive rodeado de gente boa, mas também de pessoas que, francamente, acho que não fazem muita falta no mundo.” A distância não é fácil, principalmente das pessoas de quem se gosta. “Há dias que custam mais do que outros. Felizmente são mais os dias em que me consigo abstrair e ver que o que tenho aqui e agora é bom, que esta casa é boa e que tenho boas pessoas à minha volta.” Agora, quer dar mais um passo na integração e aprender chinês é uma meta. “Gosto de aprender línguas e acho que é fundamental saber falar a língua do lugar. Além disso, acho que é altamente cool, além de ser útil”, referiu em tom de brincadeira. “No entanto, sinto que, de facto, há aqui alguma distância promovida pelo fosso linguístico e que poderia ser encurtada. Por parte dos portugueses, sinto que já existe alguma resignação e os chineses podiam também tentar aprender um pouco da segunda língua oficial do território”, remata.
Sofia Margarida Mota SociedadeAvenida Wai Long | Governo quer habitação pública, mas CPU não chega a consenso O destino do terreno que fora destinado ao empreendimento La Scala, situado na Avenida Wai Long, não reúne consenso no Conselho de Planeamento Urbanístico. Apesar de decidida a construção de habitação pública, há dúvidas quanto à falta de transporte, de infra-estruturas sociais e de consequências na paisagem [dropcap style≠’circle’]A[/dropcap] decisão está tomada à partida. O terreno, envolvido no caso Ao Man Long e já revertido para a Administração, vai mesmo servir para a construção de mais um complexo de habitação pública. Ainda assim, o consenso continua a não existir no seio do Conselho do Planeamento Urbanístico (CPU), que reuniu ontem. O projecto já foi “aperfeiçoado”, disse ontem Cheong Ion Man, o representante da Direcção dos Serviços de Solos Obras Públicas e Transportes (DSSOPT). “Depois de verificar que a sociedade dá muita importância ao projecto e que tem preocupações quanto ao destino da colina, decidimos utilizar apenas a parte plana para a construção e teremos em conta a construção de instalações sociais adequadas às necessidades”, referiu. Para o efeito, o Governo garante que cerca de 25 mil metros quadrados são destinados a equipamentos sociais. Mesmo sem definição, está na calha a construção de instalações desportivas, de uma biblioteca e de um mercado “de proporções idênticas às do Mercado Vermelho”. Está também a ser pensada a construção de um jardim, sendo que “sobrará espaço para serviços a idosos e construção de creches”. “O planeamento da zona terá 60 por cento do espaço destino para a habitação e 40 por cento para equipamentos sociais”, esclareceu o representante governamental. Tendo o complexo de habitação pública de Seac Pai Van como “uma lição”, a zona de Wai Long estará agora a ser pensada de modo a colmatar as falhas. “Podemos comparar com Seac Pai Van, onde a proporção foi de 30 por cento de espaço destinado a estruturas sociais, o que se revelou insuficiente. Neste caso, houve um ajustamento”, concluiu Cheong. Sabe-se pouco, diz Neto Valente As explicações do Executivo não bastaram e foram vários os membros do CPU que manifestaram reservas. Jorge Neto Valente, também presidente da Associação dos Advogados de Macau, considerou que “independentemente das questões que ainda não têm solução, e que têm a ver com a proximidade do aeroporto – o ruído e a poluição – é necessário ter mais noção da concretização efectiva do projecto e ainda se sabe pouco para dar uma opinião”. O tipo de escolas a construir é também uma preocupação. Os estabelecimentos de ensino que ainda não estão projectado podem não só vir a ser insuficientes, como constituir uma limitação para as escolhas dos futuros moradores. “Que tipo de escolas querem construir? É um assunto importante que pode aumentar ou reduzir a vontade de ali morar e não podemos apoiar, de forma cega, as políticas do Governo se não tivermos as informações certas”, disse Lam I Leng, outro membro do CPU. O difícil acesso àquela zona também preocupa alguns membros, sendo que pode condicionar as candidaturas da classe mais baixa, pelo facto do terreno “estar longe dos seus locais de trabalho”. Colina invisível A altura dos edifícios e a sua influência na paisagem, nomeadamente na vista da colina, foi também tema de debate. Para Manuel Iok Pui Ferreira, “a ponderação da reserva da colina, enquanto zona não edificada, não está ainda clara: a parcela dedicada à construção de habitações tem um limite máximo de altura de cerca de 105 metros acima do nível do mar, o que pode fazer com que a paisagem possa vir a ser tapada”. Já Lou Lam Wai refere que das duas parcelas em que o limite da construção foi dividido uma com 105 e outra com 90 metros de altura, nenhuma é aceitável. “Não concordo com 90 metros nem com a altura de 105 metros, pelo que acho que é necessário ter em conta a dimensão humana”, disse. O romantismo não ficou de fora na reunião de ontem. Zheng Dehua recordou aquela área como “um sítio romântico, que está ameaçado pela altura dos futuros edifícios”. Luta de classes Se para uns a habitação social é uma das prioridades, para outros a situação dos jovens de classe média ganha mais importância, sendo que o terreno na Avenida Wai Long pode ser uma solução. “Se calhar podíamos pensar nos jovens de Macau que agora estão a ter dificuldades em arranjar casa porque não são nem de classe baixa nem de alta. Estão no meio”, disse Lou Lam Wai. A aparência não foi esquecida, sendo que “a estética é muito importante e por isso deve-se pensar num modelo novo, com características próprias para os jovens de classe média”. Por outro lado, “a vida ali é cara e o terreno deve ser destinado a habitação mais cara do que a social”, acrescentou. As questões ambientais, que têm vindo a ser levantadas por membros do CPU e por associações, serão resolvidas, de acordo com a representante da Direcção dos Serviços de Protecção Ambiental (DSPA). “Ainda estamos na fase de concepção e vamos coordenar os trabalhos com a DSSOPT. Se calhar há que fazer ponderações técnicas para, no futuro, sabermos como minimizar impactos”, disse.
Sofia Margarida Mota SociedadeGabinete Coordenador de Segurança cria novas medidas para assistência em caso de tufões [dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] período de tufões aproxima-se e o Gabinete Coordenador de Segurança está em fase de preparação para evitar acidentes e melhorar a assistência aos residentes. Este ano a entidade prevê que cheguem a Macau cinco a sete tufões, estando agendado para sexta-feira o primeiro exercício para testar a capacidade de coordenação de resposta das entidades envolvidas. A primeira tempestade tropical está prevista para o final de Junho, sendo que o último tufão deve chegar na última quinzena de Setembro. “Com o balanço dos mecanismos de assistência de emergência das acções e das dificuldades sentidas em anos anteriores vamos realizar o `Wistéria´”, disse ontem Ma Io Kun, comandante de acção conjunta e comandante geral dos Serviços de Polícia Unitários, num encontro com a comunicação social. O objectivo, referiu Ma Io Kun, “é elevar a capacidade de respostas de emergência durante a chegada de tufões, de modo a garantir a segurança da população”. A divulgação da informação da situação meteorológica do território vai também ser aperfeiçoada. Ao atendimento telefónico junta-se uma estratégia conjunta que visa permitir uma melhor divulgação do estado do tempo em situações de calamidade. “Os residentes podem, agora, através de chamadas telefónicas, do WeChat e de outras aplicações em estudo, acompanhar a situação meteorológica”, disse Lao Ieng Wai, membro dos quadros dos Serviços Meteorológicos e Geofísicos (SMG). Para as escolas os cuidados são redobrados. De acordo com o representante da Direcção dos Serviços de Educação e Juventude, Kou Iao Choi, para além das medidas já previstas em situações meteorológicas adversas, juntam-se outras que visam o seu aperfeiçoamento e eficácia. “Quando há previsão dos SMG de temperaturas de menos de zero graus ou superiores a 40 graus, todos os níveis de ensino devem suspender as aulas para o dia seguinte, sendo que, em caso de tempestade ou tufão, todas as escolas devem tomar as devidas acções antes das 6h30 aquando içado o sinal 8 ou superior”. Também para as pessoas que sofrem de deficiência o Instituto de Acção Social (IAS) tem programada a activação de uma série de mecanismos. Em causa está a implementação de sistemas de informação e de apoio que tenham em conta necessidades específicas. Para o efeito, o IAS estabeleceu vários grupos diferenciados e vai proceder a acções a eles dirigidas. “Quem tem deficiência auditiva tem necessidade de um meio de comunicação diferente de quem tem deficiência visual ou mental”, justificou Choi Sio Un, representante do IAS.
Sofia Margarida Mota EventosPhil M. Reavis, músico da banda “The Bridge”: “A música, com o tempo, torna-se visceral” Phil M. Reavis é professor de Inglês e músico em Macau desde 1982. Veio para dar aulas e agora é um dos rostos associados ao jazz local. Autodidacta, toca saxofone tenor com a banda local “The Bridge”. Ao HM, falou do que pensa relativamente ao estado do género musical no território Como é que veio para Macau? Vim para o território em 1982. Já tocava, na altura, mas só para mim. Apesar de professor era, acima de tudo, um desportista e treinador. Tive muita sorte. Cresci numa cidade operária dos Estados Unidos que tinha muitos campos para a prática de desporto. Com o salto em altura consegui uma bolsa que me deu acesso à universidade, com pagamento total de propinas. Acabei os estudos e comecei a trabalhar como professor, mas acabei por ir para o Camboja como treinador de uma equipa internacional que englobava várias modalidades. Com o agravamento da situação política naquele país fui destacado para o Vietname. Foi aí que conheci a minha mulher. Por sermos de cores diferentes, não éramos um casal bem visto. Recordo-me quando os Estados Unidos obrigaram todos os dependentes de quem estava no exército ou a trabalhar para o Governo a irem embora, e queriam que a minha mulher também o fizesse. Mas não éramos casados e, por isso, ela conseguiu ficar. Acabámos por ir para o Laos ensinar Inglês cerca de seis anos. Voltámos aos Estados Unidos. Pensava que poderia ter mais oportunidades se fizesse um mestrado em Estudos Migratórios, mas acabei por aceitar um emprego numa universidade. Na Universidade do Minnesota o movimento negro estava no auge, o que me incomodava muito. A minha mulher era branca e nada daquilo fazia sentido para mim. Aliás, durante a minha infância e adolescência não senti, de todo, a discriminação. Lembro-me da primeira vez que senti isso na pele. Estava no ensino secundário quando vi uma caixa enorme que tinha lá dentro um saxofone e fiquei encantado. Um amigo disse-me que podíamos ter aulas a um preço simbólico e o direito a ter o instrumento. Fui falar com o professor, que não me aceitou. O meu amigo voltou a insistir e lá consegui, mas em vez de uma caixa grande, tive uma caixa pequena com um clarinete. Agora, enquanto docente, estava no meio das questões raciais mais profundas dos Estados Unidos. Convidámos, na altura, um poeta para vir falar com os estudantes e, quando ele chegou e se deparou com uma plateia de brancos e negros, não quis falar para os brancos. Era tudo tão absurdo. Apareceu, mais tarde, a oportunidade de vir para Macau dar aulas de Inglês numa escola chinesa. Tínhamos, eu e a minha mulher, de ficar cinco anos para dar início ao departamento de Inglês. Tivemos muita sorte. Naquela altura, em Macau, já havia uma consciência muito grande de que se as pessoas quisessem progredir na vida teriam de aprender línguas. Tinha alunos espectaculares e que aprendiam muito depressa. Havia a combinação de dois factores fundamentais: queriam muito aprender e o território estava aberto. Acabaram-se os problemas raciais e essas coisas absurdas. Onde é que andou a música durante esse tempo? Comecei a tocar ainda no ensino secundário. Dada a situação em que me senti discriminado, acabei por aprender sozinho. Ao longo do tempo, chegava a casa e “fechava-me no armário” para tocar. Tinha um bom ouvido e achava que, se tocasse o que ouvia de forma perfeita, podia ir avançando. A música, com o tempo, torna-se visceral. Mas foi realmente em Macau que comecei a tocar para os outros. Vi um folheto de um concerto de jazz promovido pelo clube da altura. Ao perceberem que também tocava, convidaram-me a fazê-lo, mas em público. Foi em Macau que comecei a tocar realmente. Como era a cena musical local da altura e em que aspectos tem mudado, nomeadamente no jazz? Era muito limitada. Dentro da comunidade chinesa, a única coisa que era considerada como música era a clássica. O único instrumento real era o piano, por vezes o violino e, quanto muito, a flauta. A cena musical estava parada e agarrada ao virtuosismo da música clássica. Por exemplo, sempre que tínhamos concertos, os professores de música não apareciam. Lembro-me apenas de duas situações em que estiveram presentes. A ideia de ter música num clube ou num bar, penso, parecia-lhes motivo para ser desconsiderada. Mais tarde, tivemos a Casa de Vidro. Foi um grande salto na nossa visibilidade, era perfeita. Já não era a falácia de música nos bares. Era um passo em frente. Acabámos por ter festivais com alguma regularidade e o género teve um grande desenvolvimento no território. Actualmente, as diferenças são muitas e considero que está tudo melhor, principalmente com as novas gerações de músicos. O que é que aconteceu? Os jovens agora vão para a universidade para seguir música, por exemplo. Isso dá-lhes competências muito fortes. A escola de música está também muito bem organizada e há toda uma geração de novos artistas. Por outro lado, estamos numa sociedade altamente consumista e isso também se nota na música. As pessoas pensam que se conseguem ganhar dinheiro com ela, então é melhor aprender. O que é preciso ao nível pessoal para tocar, especificamente, jazz? O que quer que seja, vem com o tempo. Por exemplo, Ella Fitzgerald, enquanto jovem, canta bem mas, com a idade, a voz dela atingiu outra intensidade. É a maturidade que passa para a música. O mesmo se passa com o jazz. Esta nova geração começa agora a ter uma noção da expressão. Já não se trata unicamente de tocar as notas certas nos tempos certos. Um músico de jazz faz outra coisa: sente. É o sentimento que demora tempo. Se calhar, nos Estados Unidos, pode ser mais fácil para os mais novos que começam a ouvir jazz desde pequeninos na rádio mas, ainda assim, depois vem o tempo. No entanto, os miúdos que saem das escolas correm um grande risco. Quando os ouvimos, são todos iguais e não se pode fazer nada contra isso. Têm o grau académico, mas a questão é saber se conseguem fazer música daquilo. No território, temos uma grande referência que está a fazer muito pelo jazz e pelo seu ensino: José Eduardo. Há um público em Macau? Costumava existir, mas foram-se todos embora. Era, em grande parte, a comunidade portuguesa. Na noite de domingo, que marcou o regresso do Clube de Jazz, fiquei muito surpreendido com o público no Live Music Association. Vi jovens chineses, além dos portugueses. Mas lá está, é uma sociedade virada para o consumo e, em Macau, isso é mais evidente ainda. O jazz tem dificuldades. Foi sempre um género alternativo e nunca foi para maiorias. É triste, mas penso que será sempre considerado, de alguma forma, um género menor, até mesmo nos Estados Unidos. Há dois ou três anos, estava num bar com uns amigos que não ganhavam mais de 50 dólares por concerto. É terrível. Muitos deles acabam por saber interpretar mais do que um instrumento, porque lhes dá mais oportunidades de tocar. Mas há muita necessidade de instrumentistas, principalmente que saibam tocar baixo. É o instrumento em que é mais difícil encontrar um substituto e não há banda que não precise dele. Se tivesse agora um filho que quisesse seguir música, o meu conselho seria só que aprendesse baixo. O que pensa do regresso do Clube de Jazz de Macau? É um renascer da vontade de ouvir o género com frequência ao mesmo tempo em que se aposta numa geração mais nova, tanto de público, como de músicos. O jazz não tem a visibilidade que deveria, nem nunca teve. Não é ainda visto como uma música séria. É importante também perceber que o mito dos negros tocarem jazz é apenas isso, um mito e uma estupidez. Toda a gente o pode tocar, e bem. Esta política identitária não faz sentido algum.
Sofia Margarida Mota EventosAFA | Aguarelas de Cai Guo Jie expostas a partir de hoje São paisagens locais vistas com olhos de pássaro. A proposta é de Cai Guo Jié que adoptou Macau como casa e a quer mostrar a todos. A exposição é uma organização da Art for All Society e está patente até 23 de Abril no Art Garden [dropcap style≠’circle’]“O[/dropcap]verlook the Macau City” é a exposição de Cai Guo Jie que está, a partir de hoje, aberta aos visitantes no Macau Art Garden. A iniciativa promovida pela Art for All (AFA) traz uma série de 14 aguarelas que representam alguns dos espaços mais emblemáticos da cidade, produzidos pelo artista. A escolha da técnica, disse o autor ao HM, tem a ver com motivos históricos e culturais. “Antigamente, a aguarela era utilizada na cerâmica que, antes de ser levada para cozedura, era pintada com esta técnica”, explicou. A aplicação é realizada na pintura de espaços como Mong Ha, o Porto Interior, as Ruínas de São Paulo, a Igreja de São Lourenço e o Alto de Coloane. O objectivo é dar um panorama geral do território. “É um retrato dos lugares por onde passo todos os dias e que fazem parte da cidade”, disse. Depois de várias exposições com passagens por Pequim, a mostra que hoje inaugura representa ainda uma mudança na perspectiva do artista. As paisagens agora elevadas a um plano superior do olhar, pretendem mostrar os lugares comuns de residentes e visitantes quando passeiam pela cidade. “Na pintura `Camões Olhando para o Leste´, o espectador parece ter sido levantado no ar e colocado num ponto mais alto, o horizonte também se levanta e a maior dimensão é ampliada à utilização de uma folha de aguarela completa”. Cai Guo Jie, natural de Taiwan veio para Macau à cerca de cinco anos. “Era o local onde tinha o coração”, disse ao HM. Ao longo da carreira, passou por várias fases e, se num momento inicial tinha como meta a adaptação e técnicas ocidentais a motivos do oriente, com o tempo o objectivo também se transformou: “tornou-se fundamental dar mais relevo às técnicas locais”. “Prefiro exportar a cultura a importar o que vem de fora e, quando me senti preparado, decidi produzir uma série de trabalhos sobre Macau”, recordou. Liberdade local Vindo de fora e com os olhos postos nos jovens criadores, Cai não tem dúvidas de que, em Macau, a liberdade é um marco na criação artística capaz de levar ao sucesso. Em contraponto está a realidade de Taiwan. “A maioria dos alunos de arte de Taiwan estudam muito mas o objectivo não passa de tentarem passar nos exames. Os estudantes de Macau são diferentes: “são muitos os que se dedicam à arte por sentirem um verdadeiro interesse e gosto por ela e, como tal, trabalham muito para conseguirem fazer o que gostam”, apontou Cai. Por outro lado, a diferença pode estar na formação, até porque “os professores de Taiwan não consideram a questão da carreira. Como tal, aquando de dificuldades, os estudantes acabam por optar por outras carreiras. “Já aqui, e baseado na minha experiência no Instituto Politécnico de Macau, sinto que as escolas estão mais empenhadas em ajudar os artistas no encontro de um caminho profissional”. É a autonomia que sente na vida artística de Macau que dá a Cai Guo Jie confiança para ficar e trabalhar no território. “Aqui, há liberdade e possibilidade de cada um de nós desenvolvermos as nossas características”, concluiu o artista.
Sofia Margarida Mota Entrevista MancheteCarlos Martins, secretário de Estado do Ambiente: “O empenho da China é a melhor memória que levo” O secretário de Estado do Ambiente, Carlos Martins, marcou ontem presença no Fórum e Exposição Internacional de Cooperação Ambiental de Macau. A visita incluiu uma reunião com Raimundo do Rosário e ficou a possibilidade de colaboração futura. Ao HM, Carlos Martins falou das necessidades locais, do ambiente em Portugal e do empenho chinês na matéria Do que constou a reunião que teve com o secretário para os Transportes e Obras Públicas, Raimundo do Rosário? Vai existir colaboração na área do ambiente entre Macau e Portugal? Ficou no ar a possibilidade de virmos a estudar um protocolo que permita, naquilo que são as autoridades do ambiente nacionais, cooperar na área da educação ambiental, na capacitação de recursos humanos e na cooperação com empresas portuguesas. Foram identificados ainda os pontos fortes da região e as áreas em que pode necessitar, a curto prazo, de mais colaboração. Estiveram também presentes representantes das empresas que trabalham no sector e que, com certeza, tomaram boa nota do que pode vir a constituir uma oportunidade para o futuro. De relevante, ficou uma vontade recíproca de podermos vir a fazer um memorando que leve a um reforço da colaboração. Que áreas foram identificadas como estando a precisar de uma intervenção mais rápida? As questões relacionadas com transportes, a área dos resíduos e a qualidade do ar. O que é que se pode fazer, em colaboração, na melhoria da qualidade do ar? As fontes que influenciam a poluição do ar podem estar no próprio território e, como tal, a solução vem de dentro. Mas, como sabemos, a qualidade do ar está associada a um meio que recebe inputs que, muitas vezes, estão além das fronteiras físicas e territoriais e, desse ponto de vista, o controlo da qualidade torna-se mais difícil. Uma das questões que me pareceram mais problemáticas e consensuais está relacionada com a situação crítica associada ao excesso de veículos. É necessário um melhor controlo das emissões produzidas. Em Portugal também estamos nesse processo, sobretudo nos veículos de duas rodas, e já temos um histórico alargado. Do ponto de vista da indústria, não estamos num território que a tenha e, se esse risco acontecer, vem de fora. Temos experiência na monitorização da qualidade do ar, pelo que poderíamos vir a cooperar e a acompanhar a situação, bem como dar algumas competências na matéria. Esteve sempre associado à área da água. Como é que vê a situação de tratamento de águas em Macau? Temos duas dimensões na água do território. Uma pareceu-me estar relativamente bem resolvida e está relacionada com os serviços públicos de abastecimento de água. Entra na esfera de manutenção e gestão de uma rede que já existe, e que agora terá mais procura do que teve no passado, fruto da maior densidade populacional que se tem vindo a registar, mas que parece ter uma tendência para a estabilidade. Neste domínio, em que Portugal também tem competências, não antecipo uma grande oportunidade porque estará a funcionar num quadro normal de estabilidade. No que respeita às águas residuais, temos experiência e know-how. Em Macau, a população tem aumentado, mas as estações de tratamento de águas residuais já têm alguns anos de operação, o que pode vir a determinar a sua modernização a médio ou curto prazo. É um território que, dado o desenvolvimento urbano que tem registado, deve ter maiores exigências com instalações deste tipo e ter uma especial atenção a questões de cheiros, à eficiência do tratamento da parte líquida e das próprias lamas que decorrem no processo. Temos muitas bandeiras azuis que resultam do mérito de gerirmos bem estas infra-estruturas. Há também casos em Portugal em que tivemos de modernizar estações importantes de tratamento de água com elas em funcionamento. São obras de uma grande complexidade no planeamento, às vezes mais do que fazer uma obra de raiz. Também neste sentido podemos dar o nosso contributo. Há uma outra dimensão da água que diz respeito aos recursos hídricos. Temos algumas situações que são referências internacionais, como o programa de despoluição do estuário do Tejo e a despoluição do rio Trancão, que era considerado o mais sujo da Europa. Em Macau, não haverá situações tão dramáticas quanto aquelas que tivemos de enfrentar com a limpeza do rio Trancão. De qualquer maneira, podemos partilhar as nossas metodologias. Neste momento, temos monitorização quer das massas de água, quer dos fundos do estuário, que fazemos em colaboração com as universidades e podemos pôr ao serviço da região, se for entendido que pode ser útil. Há abertura por parte do território? Fiquei com a ideia de que há uma grande abertura e interesse em podermos vir a concretizar o memorando e, à medida que as questões apareçam e sejam interessantes para as partes, podermos avançar. Portugal está no sétimo lugar do ranking dos países no bom caminho na implementação de medidas coniventes com o Acordo de Paris. É uma boa posição? Mais do que bom, é muito bom. Em termos internacionais, Portugal representa uma percentagem muito reduzida, mas é bom saber que estamos a fazer bem aquilo que são as nossas responsabilidades no âmbito do Acordo de Paris. O facto de termos feito uma grande aposta dentro do uso das energias renováveis também nos coloca no patamar da excelência. Em 2016, tivemos quatro dias e meio em que Portugal foi auto-suficiente à custa de energias renováveis. A aposta para os próximos anos está muito focada no melhor aproveitamento de um bem que temos: o sol. Temos muito sol, muitos dias por ano. Estamos a apostar na energia solar combinada com a renovação urbana. O Governo determinou que, para reanimar alguns sectores de actividade económica e melhorar a eficiência energética nos edifícios, é necessário um investimento muito grande em termos de reabilitação urbana recuperando o centro das grandes cidades, que tem estado muito abandonado. Na emissão de gases, estamos a investir nos transportes públicos através da renovação da frota, aumentando a oferta e, ao mesmo tempo, a dar valor ao uso individual de transportes com a criação de condições para que possam existir mais veículos eléctricos. Tudo isso combinado acaba por resultar naquilo que hoje é a nossa maior aposta: renovar o paradigma de consumo energético em Portugal. A ideia é ter a energia solar nos edifícios para produzir electricidade para as águas quentes e o calor. O projecto “casa eficiente” tem como objectivo tornar os edifícios mais ecoeficientes, sendo que temos uma má tradição: as construções não foram pensadas com qualquer preocupação energética. Tudo isto associado aos transportes, que ainda é a área que reúne as medidas com menos sucesso, Portugal pode ficar muito acima do sétimo lugar. O que é que tem sido feito, concretamente, nos transportes eléctricos? Estamos a testar autocarros eléctricos completamente produzidos em Portugal. Há dois autocarros na frota da Carris que integram estes testes. O Governo não deveria dar o exemplo através da utilização deste tipo de veículos? Lançámos recentemente um grande desafio nesse sentido aos municípios e tivemos 119 que se candidataram, e vão ter as frotas dos serviços ambientais todas elas eléctricas. Aproveitámos essa circunstância para colocar postos de carregamento e, assim, aumentar a rede de abastecimento que tem sido sempre uma limitação, dado o problema de autonomia dos veículos. Entre o Porto e o Algarve criámos uma rede de postos de carregamento rápido em que as pessoas, em dez minutos, podem carregar 80 por cento da bateria. As candidaturas também estão abertas às autoridades e o Ministério do Ambiente já tem por tradição o uso de veículos eléctricos. Estamos também a lançar o desafio a algumas empresas públicas, como as Águas de Portugal, para que possam vir a ter frotas eléctricas em grade parte dos seus serviços. Já foram cancelados dois contratos relativos à prospecção e exploração de petróleo na costa portuguesa, e estão ainda dois em andamento. Porquê o cancelamento e que consequências têm estas iniciativas? Os processos que foram cancelados tinham lugar na plataforma continental. Para já estão interrompidos e não irão prosseguir. Entravam em rota de colisão com aquilo que são os interesses e estratégias regionais que apostam no turismo. A associação dos municípios e os agentes económicos tinham muito receio que uma intervenção nesse sector pudesse fazer perigar aquilo que têm sido as estratégias de sucesso. Os processos ainda em curso não têm ilegalidades na concessão e ocorrem a muitos quilómetros de distância da costa. Estão ligados a procedimentos de outra natureza e que são, sobretudo, prospectivos. Servem essencialmente para fazer uma avaliação, mais do que para exploração, e devem continuar a seguir os procedimentos de licenciamento normais. Como vê esta edição do Fórum e Exposição Internacional de Cooperação Ambiental de Macau? Pareceu-me importante a área expositiva que temos presente e o nível das empresas que cá estão. A nossa presença está na linha do que podemos considerar uma oportunidade, tendo em conta uma cultura e uma história que nos ligou a este território e, espero, continue a ligar. É do interesse da China esta colaboração, dado o nosso papel enquanto ponte com as economias dos países de expressão portuguesa. Fiquei surpreendido com o grande número de presenças que já será pouco frequente na Europa, mas que demonstra um outro potencial. A minha maior satisfação é ver que um país que tem um importante papel para o Acordo de Paris, como a China, tem um discurso assertivo e orientado para as questões do ambiente. O empenho da China é a melhor memória que levo. Já tinha observado, em Paris, que as autoridades chinesas estavam muito focadas nas questões ecológicas e agrada-me saber que esta é uma linha estratégica do país. Tendo em conta a sua quota de emissões no contexto mundial, é uma boa notícia. Com a participação da China na protecção ambiental podemos ter um contributo, à escala planetária, contra o aquecimento global. A posição de Donald Trump, pelo contrário, parece não ter em consideração a questão do aquecimento global. Representa, de algum modo, algum impasse? Julgo que políticas como as do ambiente acabam por estar acima dos actores políticos momentâneos. São iniciativas feitas para durar gerações, pelo que as acções e posições das pessoas acabam por ser mais relevantes. Creio que as grandes empresas americanas, independentemente de um abrandamento da pressão de natureza governativa, não vão querer ser tidas como entidades menos empenhadas na matéria ambiental quando todos somos mais exigentes enquanto consumidores à escala global. Independentemente da flexibilidade que venha a ser dada pelas autoridades, estou convicto de que se imporá, ao tecido empresarial americano, um papel de responsabilidade e terão de ser agentes comprometidos com o ambiente.
Sofia Margarida Mota Entrevista MancheteMelinda Chan, deputada: “Nós, as mulheres, temos as mesmas capacidades” A deputada Melinda Chan ainda não dá certezas quanto à sua candidatura nas próximas eleições para a Assembleia Legislativa. Ao HM, falou do caminho que percorreu e das suas prioridades. E apontou ideias pelas quais quer continuar a lutar É candidata às próximas eleições legislativas? Ainda estou a pensar. Tenho de reunir uma equipa e depois tenho de verificar o mais importante: saber se as pessoas também querem que eu continue. Não sou só eu que tenho de querer, o mais importante é sentir que sou apoiada. Passou a ser deputada quando o seu marido, David Chow, deixou a Assembleia Legislativa (AL). Sente que foi um legado que herdou? Candidatei-me pela primeira vez em 2009. O meu marido tinha sido deputado desde 1996, ainda antes da transferência de Administração. Eu já estava, desde 2002, à frente da associação de beneficência Sin Meng. Em 2009, existiram duas razões para que me sentisse motivada a candidatar-me à AL. Por um lado, David Chow reformou-se da função de deputado. Com a sua saída, as pessoas que ele representava ficariam sem um porta-voz que protegesse as suas opiniões. Era minha responsabilidade continuar o trabalho, até porque muitos dos problemas da altura ainda estavam sem solução. Por outro, ao lidar com os membros da associação que representam diferentes classes da população com necessidades também diferentes, senti que tinha a responsabilidade de trabalhar com eles. Na altura, que necessidades exigiam uma intervenção mais urgente? A segurança social, especialmente no que dizia respeito às pensões dos idosos. O montante era então de 1700 patacas e, na minha opinião, tinham de ser aumentadas para, pelo menos, três mil patacas. Ouvi dizer que seria uma missão impossível por ser um aumento muito grande. Mas certo é que consegui. Os cuidados hospitalares também eram urgentes. A população idosa tinha de esperar muito tempo para ser atendida. A lei do erro médico, recentemente aprovada, também foi uma luta. Outra causa que sempre tive foi a legislação contra a violência doméstica. O início da discussão na AL foi muito difícil e o mais importante era fazer entender aos deputados o que estava em causa. Tem lidado com portadores de deficiência na sua associação. As necessidades com os deficientes também são muitas. A ideia de aumentar os seus rendimentos ou os apoios financeiros do Governo não é suficiente. O cuidado para com esta população deve ser tido desde que nascem e começa no rastreio. É necessário formar equipas médicas capazes de os acompanhar e ajudar a obter ferramentas para que um dia possam ser o mais autónomos possível. O sistema educativo deve acompanhar estes cuidados e fornecer meios para acolher portadores de deficiência. Deve existir um ensino especial munido de profissionais e especialistas. Também acho que temos feito muitos progressos, mas o Governo deveria investir mais recursos financeiros na criação de toda uma estrutura capaz de ajudar esta população. Deveria ser dada em dois sentidos: cuidados médicos e educação especial. A percentagem de fundos dirigida a esta população em Macau ainda é muito reduzida. Em 2013, dizia que uma das suas prioridades era a reforma de Administração Pública. Como correu este trabalho? O problema da Administração Pública de Macau é, acima de tudo, a lentidão. Tudo o que se pretenda fazer implica demasiada burocracia. Precisamos de mudanças no sentido de diminuir o número de procedimentos. As decisões têm de ser mais rápidas na base. Por exemplo, a ponte Hong Kong-Macau- Zhuhai, irá abrir, em princípio, no final deste ano, mas, dadas as complexidades burocráticas, temo que o troço de Macau não possa estar aberto ao mesmo tempo que os outros. Macau vai ficar mais tempo isolado e gostava que isto não acontecesse. Já vivo aqui há cerca de 50 anos, já é a minha terra e gostava de ver o seu desenvolvimento mais fluido porque Macau é um bom sítio. Outra questão que não me agradava, por exemplo, há 30 anos, era a comparação de Macau a Hong Kong como se o território vizinho fosse a cidade grande e Macau um pequeno lugar. Mas penso que isso está a mudar. No entanto, tem de ser uma mudança apoiada e com consciência por parte de todo um Governo e de políticas que o permitam. Como é que vê Macau enquanto “plataforma”? Macau é muito especial porque temos vários contrastes que dificilmente se encontram noutros lugares. Temos a cultura chinesa e a ocidental dentro de uma cidade pequena. Temos património mundial a conviver com os casinos e hotéis de cinco estrelas. As pessoas podem ter contacto com coisas muito diferentes num pequeno espaço. Faz parte da identidade de Macau e até o Governo Central dá ao território uma denominação especial enquanto plataforma. Não nos podemos também esquecer que, aqui, convivemos com a língua portuguesa, pelo que temos uma situação privilegiada e que devemos usá-la da melhor maneira. Como? Podemos pensar em formas de melhorar o conceito de plataforma, tendo em mente a utilização da língua portuguesa. Na China Continental, mesmo em Cantão, há muitas fábricas que exportam os seus produtos. Macau podia ser o local de excelência a considerar na exportação dos produtos entre o Continente e os países de língua portuguesa enquanto plataforma logística. Hong Kong, por exemplo, tem um porto marítimo conhecido historicamente pelas trocas comerciais. Macau tem uma grande vantagem linguística e como tal podia investir no desenvolvimento de estruturas logísticas. Isto é só um exemplo de como podemos tirar o maior partido da “plataforma”. O território pode ter o mesmo papel que Hong Kong, mas enquanto o território vizinho leva muita coisa para o Continente, nós podíamos fazer o inverso: levar para os países de língua portuguesa. Posteriormente, poderíamos aproveitar os mercados em desenvolvimento e que estão muito perto de nós, como o Camboja e o Laos. Além de um porto para o efeito, podemos ainda usar a ponte que está a ser construída, desde que salvaguardemos a liderança nos processos logísticos. Também existe o problema do aeroporto. É muito pequeno e já não se adequa nem às necessidades turísticas enquanto centro de turismo mundial, nem às necessidades para transporte de cargas. Macau deveria ser uma plataforma comercial e logística. A lei sindical não tem chegado a consensos. A sua opinião também não tem sido clara. Como é que vê uma futura implementação do diploma no território? Sou a favor da criação da lei sindical, mas temos de resolver outro tipo de problemas antes para que seja viável. Macau é diferentes de outras regiões porque tem muitas associações de trabalhadores. No mesmo tipo de emprego, há várias associações. Este é um dos problemas. Há cerca de 700 associações neste momento, não seria fácil ter uma entidade de defesa, como um sindicato que agradasse a todas elas porque têm ideias e interesses diferentes. Por exemplo, só para os enfermeiros há várias e a questão é: quem é que os passaria a representar? Outra questão tem que ver com os financiamentos. Noutras regiões, os sindicatos não são subsidiados pelo Governo e têm de ir buscar os fundos aos associados. O que é que se pode fazer em Macau neste sentido, sendo que as associações são financiadas pelo Executivo? Em terceiro lugar, também gostaria de ver claro um outro assunto: se existirem associações sindicais e estas terminem a actividade, para onde vai o dinheiro que lhes pertence? Vai ser dividido pelos seus membros? Seria justo dividir o património pelos seus membros. Isto tem de estar definido por lei. Quando estas questões estiverem devidamente clarificadas, votarei a favor do diploma. Não sou em nada contra os princípios sindicais, mas tem de existir um limite nas associações sindicais e não sei como isso iria acontecer em Macau. Se vamos ter uma nova lei, deve ser justa para ambas as partes. Se se candidatar nas próximas eleições, quais serão as suas prioridades? Em primeiro lugar, estarei sempre junto daqueles que têm mais dificuldades em expressar-se. Por isso, estarei, mais uma vez, a lutar pela inserção da população portadora de deficiência. Esta população não tem capacidades para lutar pelos seus direitos. Penso também que Macau precisa de algumas mudanças e continuarei a reivindicar mais rapidez na administração pública. Quero, se possível, trabalhar na área dos negócios, essencialmente na variedade de emprego. Este objectivo está associado a um bom funcionamento da segurança social. Para termos um bom sistema, temos de garantir uma economia viva e diversificada. O Governo já disse que não podemos estar apenas dependentes dos casinos e que temos de ser diversificados. Eu quero pegar nesta ideia e promovê-la. Lido com muitos jovens que, depois de irem para a faculdade, regressam a Macau e não têm trabalho nas suas áreas porque não existem. Acho que é muito importante alargar os sectores de empregabilidade além do jogo e do turismo. É preciso promover mais escolhas e mais tipos de negócios. Considera que a imigração rouba empregos aos locais numa sociedade em que o desemprego é residual? A mão-de-obra estrangeira é importante para o desenvolvimento de Macau No que respeita a quadros especializados, o território precisa de chamar peritos de fora para trabalhar e, ao mesmo tempo, formar os nossos residentes. Precisamos de tempo para desenvolver as nossas capacidades. As pessoas saem da universidade sem experiência, é necessário que a adquiram com pessoas que a tenham, e ter peritos de fora a dar formação ajuda muito. Por outro lado, no que respeita a trabalho ligado ao serviço na hotelaria e construção, Macau precisa de importar mão-de-obra porque não temos pessoas para esse tipo de serviço. No domingo passado, Carrie Lam venceu as eleições em Hong Kong. Que comentário faz? Fiquei muito contente. Penso que é uma mulher muito trabalhadora e boa para as pessoas. Tendo em conta o seu trabalho nos últimos anos, tem mostrado que é responsável. Muitos países começam a ter mulheres como líderes. Penso que é muito positivo que a tendência esteja a acontecer em Hong Kong. Nós, mulheres, temos a mesma educação e as mesmas capacidades, pelo que espero que esta igualdade se comece a sentir na política. Também penso que as mulheres têm sensibilidade para coisas que os homens não têm. O que acha da possibilidade de existir em Macau a eleição do Chefe do Executivo através de sufrágio universal? Macau irá ter o sistema de voto universal, só não sabemos quando.
Sofia Margarida Mota SociedadeSão Januário | Hospital volta a ser acreditado por entidade australiana Foi ontem formalizada a acreditação do Centro Hospitalar Conde de São Januário pelo Conselho Australiano de Normas de Saúde. A distinção não é nova. Foi agora prolongada por mais quatro anos [dropcap style≠’circle’]D[/dropcap]ecorreu ontem a cerimónia de entrega do certificado de acreditação, por mais quatro anos, ao Centro Hospitalar Conde de São Januário (CHCSJ). A distinção foi atribuída pelo Conselho Australiano de Normas de Saúde (ACHS, na sigla em inglês). O secretário para os Assuntos Sociais e Cultura realçou que, para que a distinção alcançada, “todos os 47 critérios das três áreas de avaliação foram aprovados”. Entre os parâmetros constam a assistência médica, os serviços de apoio e a administração institucional. Os critérios de avaliação tiveram em conta o funcionamento de quatro serviços: a informação ao público, a participação por parte dos utentes nos cuidados de assistência médica, a prevenção de recaídas e a gestão dos actos de vigilância nos cuidados médicos. Em todos, o São Januário teve a classificação de nível quatro que corresponde a uma “realização extensiva”, disse Alexis Tam. De acordo com o secretário, as avaliações mais positivas dadas pelo ACHS registaram-se nas acções para a redução de listas de espera. A causa, afirmou, foi a “criação de consultas externas nocturnas”. À acção juntou-se o alargamento da divulgação de informação médica à comunidade, e a criação dos centros de avaliação conjunta pediátrica e de avaliação e tratamento da demência. John Smith, presidente da ACHS, recordou o processo de avaliação que teve lugar em Outubro de 2016, em que foi identificado “um alto desempenho por parte do CHCSJ”. O responsável foi mais longe e sublinhou a qualidade dos serviços de informação que a entidade tem disponíveis, “o forte compromisso para com a participação da comunidade e a minimização de recaídas”. A ACHS já existe há mais de 40 anos e é acreditada pela International Society for Health Care (ISQua) desde 1997. Actualmente, opera em cerca de 20 países e tem, como membros, mais de 1600 instituições hospitalares e dedicadas aos cuidados de saúde. Melhoras de milhões O CHCSJ conta também com novos equipamentos e estruturas de vanguarda na área da imagiologia. Em visita guiada, o director do centro hospitalar, Kuok Cheong U, fez questão de mostrar a convidados e jornalistas as novas aquisições. O hospital tem agora um novo aparelho de rastreamento de cancro da mama. A ideia é, afirmou, conseguir diagnósticos cada vez mais precisos e com maior antecedência, de forma a permitir intervenções precoces. Ainda na mesma área está em funcionamento uma sala para operações híbridas, ou seja, evasivas e não evasivas e que podem ser assistidas numa outra sala, criada para o efeito, por outros especialistas. No total, o Governo investiu mais de 37 milhões de patacas: a sala de angiografia teve um custo de 33 milhões de patacas e o equipamento de rastreio de cancro mamário envolveu 4,4 milhões. Classificação quanto antes Alexis Tam quer que os procedimentos de avaliação para a classificação dos estaleiros de Lai Chi Vun possam estar concluídos antes do período de um ano previsto por lei. “Vou dar ordens ao Instituto Cultural (IC) para que o procedimento de classificação possa ser acelerado”, disse ontem, à margem da cerimónia de acreditação do São Januário. O secretário para os Assuntos Sociais e Cultura esclareceu que o IC irá trabalhar com a Direcção dos Serviços de Assuntos Marítimos e de Água e com as Obras Públicas, sendo que, por ora, estão suspensas as obras de demolição. Já há trabalho agendado a partir de Abril. “Vamos ter uma reunião com o Conselho do Património Cultural para ouvir as opiniões dos profissionais”, explicou. No entanto, Alexis Tam não deixou de ressalvar que uma futura classificação está dependente do processo de avaliação. Quanto ao futuro, caso os estaleiros sejam classificados como património cultural, o secretário já tem uma ideia. “É o maior conjunto deste tipo de instalações do sul da China e podemos requalificar o local, transformando-o numa zona de turismo e lazer, e oferecer aquela zona aos residentes.”
Sofia Margarida Mota SociedadeConcertação Social | Lei laboral vai a consulta pública a partir de Julho O Governo promete avançar com o processo de consulta pública à lei laboral a partir da segunda metade do ano. Quanto ao salário mínimo universal e à lei sindical, a Concertação Social continua sem fazer avanços [dropcap style≠’circle’]A[/dropcap] revisão da lei laboral vai a consulta pública durante o terceiro trimestre deste ano. A ideia foi deixada ontem por Wong Chi Hong, responsável máximo pela Direcção dos Serviços para os Assuntos Laborais (DSAL), após mais uma reunião do Conselho Permanente de Concertação Social (CPCS). Após a consulta pública, o Governo pretende terminar o relatório final até ao final do ano, de forma a que a proposta de lei possa dar entrada na Assembleia Legislativa no início de 2018. Na reunião de ontem, foi ainda debatida a elaboração de uma lei sindical, prevista na Lei Básica. O Governo pretende avançar com a abertura de um concurso para a realização de um estudo por parte de uma entidade independente. O objectivo, apontou Wong Chi Hong, “é recorrer a um organismo independente para analisar as condições que devem existir na sociedade para se poder implementar a lei sindical”. A investigação vai passar por um estudo sobre o conhecimento que cada sector tem acerca do regime jurídico e explorar as características de leis idênticas implementadas nas regiões vizinhas, “de modo a ter um suporte científico para a sua implementação no território”, explicou o responsável pela DSAL. Os trabalhos para abertura do concurso público serão iniciados “com a maior brevidade possível” e o processo “contará com as opiniões de trabalhadores e patronato”. A iniciativa não parece desagradar aos empregadores. António Chui Yuk Lum, representante da classe, aprovou a apresentação da minuta do programa de investigação. “Só após o estudo será possível saber as condições específicas de Macau para se poder elaborar a lei sindical”, afirmou. Para os trabalhadores, os procedimentos sobre a matéria devem “seguir as convenções laborais internacionais”, afirmou Lei Chan U, representante da classe no CPCS. Lei Chan U admite que, entre os diversos interesses, as opiniões diferem, mas cabe ao Executivo exercer a sua função. “O Governo deve aplicar todos os esforços para a elaboração do diploma e esperamos que, com este estudo, se possa vir a saber em concreto a melhor maneira de o fazer, ou seja, de proteger os direitos dos trabalhadores.” Salários pouco universais A universalização do salário mínimo em Macau também esteve na mesa da reunião de ontem. No entanto, os passos ainda são cautelosos e, para já, a DSAL, patronato e trabalhadores não se entendem. Em causa está a análise de um inquérito feito junto das entidades que já aplicam a medida, ou seja, do patronato de trabalhadores de limpeza e da área da segurança. De acordo com Wong Chi Hong, foi dada resposta a 30 por cento dos inquéritos que, “segundo os requisitos internacionais, podem servir de referência para fazer a análise da situação”. António Chui Yuk Lum afirmou, no entanto, que apenas tinham sido entregues três por cento das respostas. O representante das entidades empregadoras referia-se apenas aos inquéritos dirigidos às empresas de administração predial, sendo que o director da DSAL clarificou a situação. “Os inquéritos foram dirigidos ao Governo, assembleias gerais de proprietários e companhias de administração predial”, explicou. Para o representante dos empregadores, os números não revelam a situação concreta do sector, nomeadamente do impacto que a política possa ter. “Iremos administrar um novo inquérito às companhias de administração predial e, depois de obtidos os resultados, vamos enviá-los para análise”, contou. A falha nas respostas às questões do Executivo, aponta António Chui Yuk, terá tido que ver com lacunas na concepção do próprio inquérito. “Dentro dele constam questões que as empresas não querem e que estão relacionadas com montantes e informações detalhadas acerca do funcionamento das empresas.” Que valores? Já Lei Chan U considera que é tempo não de análises, mas de ajustamentos de valores. Apesar das actuais 30 patacas horárias, o salário mínimo deve, para o representante dos trabalhadores, acompanhar o custo de vida e seguir o que se faz nas regiões vizinhas. “Hong Kong já tem aumento marcado para 1 de Maio”, salientou. “O resultado do estudo do Governo não revelou impactos negativos para os trabalhadores, pelo que achamos que o Executivo deve acelerar a sua plena implementação, para que todos possam usufruir deste direito”, concluiu.
Sofia Margarida Mota PolíticaEleições | Song Pek Kei não abre o jogo [dropcap style≠’circle’]A[/dropcap] deputada Song Pek Kei diz que não sabe ainda se se vai recandidatar à Assembleia Legislativa. Em declarações ao HM, a deputada afirma que, mais importante do que pensar em concorrer às eleições, é terminar os trabalhos a que se propôs. “Ainda há muito a fazer antes de pensar na possibilidade de uma candidatura”, refere. A n.º 3 da Associação dos Cidadãos Unidos de Macau (ACUM), liderada por Chan Meng Kam, sublinhou que a prioridade do momento é conseguir que o projecto de Lei da Alteração do Regime Jurídico do Arrendamento previsto no Código Civil seja aprovado ainda nesta sessão legislativa. Sem adiantar pormenores, a deputada diz acreditar que a associação que integra já tenha “alguma ideia quanto ao que vai fazer no próximo processo eleitoral, mas ainda não é a altura certa para divulgar intenções, porque há muito que tem de ser feito”. Para já, explica, a primeira experiência enquanto deputada tem ocupado grande parte do seu tempo. “Foi tudo novidade pelo que demorei muito tempo a conseguir adaptar-me ao cargo”, confessa. Song Pek Kei é advogada e foi eleita em 2013 a seguir a Chen Meng Kam e Si Kan Lon, numa vitória da ACUM considerada histórica. A ACUM teve mais oito mil votos do que União Guangdong-Macau liderada por Mak Soi Kun, a segunda classificada do sufrágio directo.
Sofia Margarida Mota EventosPoly Auction | Leilão traz obra de Zeng Fanzhi a Macau O Poly Auction Hong Kong colabora pela primeira vez com a organização homónima local. O objectivo é trazer a arte chinesa a ambos os territórios e traduz-se numa exposição de uma das obras emblemáticas de Zeng Fanzhi. Depois do Louvre, o n.º 6 da “Mask Series” está no Regency Hotel [dropcap style≠’circle’]“F[/dropcap]usão” é o nome do certame do Polly Auction que, pela primeira vez, conta com a colaboração entre as delegações de Hong Kong e de Macau. Com a iniciativa, a cargo de Sabrina Ho, pretende-se mostrar o que de melhor se faz na arte moderna e contemporânea chinesa. A ideia é partilhar entre os dois territórios a arte, em exposição e de olhos postos no mercado, que se faz no Continente. Em Macau a “Fusão” acontece no Regency Hotel com a mostra de um dos nomes mais importantes da expressão plástica chinesa da actualidade, Zeng Fanzhi. Depois de passar pelo Louvre, o n.º 6 da colecção “Mask Series” está até 5 de Abril no átrio do Regency para quem o quiser apreciar. A pintura a óleo sobre tela, de larga escala, data de 1996. Três anos antes, Zeng mudou-se para Pequim e “sobreviveu num tempo de grandes mudanças”, lê-se no catálogo do evento. Terá sido a dinâmica histórica que o incentivou à realização da série. Marcado pelo expressionismo que já caracterizava o seu trabalho, “exagera na proporção das mãos e da cabeça, enquanto esconde expressões por detrás das máscaras, brancas e frias, que sorriem”. Ao contrário dos primeiros quadros da série, em que as personagens apareciam bem vestidas e com ar contemporâneo, o n.º 6 é o primeiro trabalho que “envolve a narrativa de uma terceira pessoa na elaboração de uma perspectiva individual”. Situa-se já longe de uma experiência pessoal, mas “permanece nas memórias de quem a viveu de perto e remonta à juventude da Revolução Cultural”. “As máscaras, os sorrisos, os corpos e os contrastes compõem uma imagem íntima e cheia de hipocrisia”, ilustra a organização. A obra de Zeng Fanzhi vai a leilão, mas não é revelado o valor de licitação. Obras preciosas Já os restantes cinco trabalhos que integram o evento deste ano, e que vão estar em exposição no Grand Hyatt Hong Kong. de 1 a 4 do próximo mês, perfazem uma base de licitação de quase cinco milhões de dólares americanos. O conjunto é constituído por obras de Zao Wou-Ki, Wu Guanzhong, Chu Teh-chun, Li Keran e Xu Beihong. De Zao Wou-ki é a tela “06.02.74”, que marca uma ruptura dentro do trabalho do artista. Produzido após a morte da segunda mulher, é uma obra que deixa para trás o recurso às cores ricas que marcavam os trabalhos do mesmo período. “06.02.74” é considerado um quadro de transição técnica que revela “uma composição complexa, traços dinâmicos e uma gradiente delicada de cores, num trabalho clássico que integra a pintura a óleo do Ocidente e o a tinta do Oriente”, lê-se na apresentação. “Reclining” de Wu Ganzhong data de 1990 e é dedicado à expressão do nu, tema pelo que o artista é também conhecido e que marca “a primeira metade do seu período criativo”. Wu Ganzhong diz ter percebido, enquanto jovem estudante em França, que “toda a beleza plástica está relacionada com o corpo humano”. A partir desse momento, as suas obras passaram a retratar a nudez de forma a conceber paisagens. Foi esta abordagem que fez com que todos os seus trabalhos viessem a ser queimados durante a Revolução Cultural. “Reclining” é um regresso às origens produzido já com 72 anos de idade, motivo que tem levado à sua exibição por todo o mundo. A utilização de tons de azul é o mote para “Summer”, de Chu Teh-Chun, na representação de profundidade espacial. A ideia é a “perseguição da evolução da natureza, mais do que a combinação de elementos abstractos”. Das cinco obras presentes em Hong Kong, “Summer Mountains” de Li Keran tem a base de licitação mais valiosa. Com um valor inicial acima dos dois milhões de dólares americanos, é um “exemplo excepcional de estética da paisagem” do artista. Datado de 1986, já na final de carreira, o clássico da pintura chinesa combina técnicas orientais com ocidentais para a expressão “de uma atmosfera poética na representação de bosques e montanhas”. De 1939 é “Standing Horse” de Xu Beihong. O quadro foi criado durante a guerra sino-japonesa em que o artista foi também activista, empenhado na recolha de donativos. De acordo com a organização, “Standing Horse” é uma obra particularmente importante porque representa uma das maiores especificidades de Xu Beihong na pintura de cavalos, ao mesmo tempo que é uma representação simbólica da força chinesa”.
Sofia Margarida Mota Entrevista ManchetePaul Pun, secretário-geral da Cáritas: “Macau não é só dinheiro” Candidatou-se quatro vezes à Assembleia Legislativa e em todas perdeu. Em ano de eleições, o secretário-geral da Caritas Macau, Paul Pun, diz que não pondera, por enquanto, uma nova candidatura. Ao HM falou das razões e de algumas prioridades que tem na instituição que dirige [dropcap style=’circle’]É[/dropcap] candidato às eleições deste ano? Neste momento, não tenho qualquer intenção de me candidatar às próximas eleições para a Assembleia Legislativa (AL). Tenho sido abordado na rua por residentes que me colocam a mesma questão e que me incentivam a concorrer. Gosto de sentir que sou apoiado e o argumento de quem me apoia é de que a AL deve ter diferentes vozes. Mas, independentemente de concorrer ou não, continuo a ouvir o que as pessoas têm a dizer, o que pensam, e os seus apelos e preocupações. Neste momento, não tenho um plano. Se o tivesse avançaria e seria para que fosse concretizado. No entanto, se até ao momento da formalização das candidaturas, tiver ideias concretas para avançar com uma lista, assim o farei. Nas quatro vezes em que me candidatei pensava seriamente no processo e sentia que tinha de avançar. Este ano, e até à data, nem me ocorreu pensar nas pessoas que poderiam avançar comigo. Que tipo de eleitores mais se dirige a si e o que procuram com a sua representação? Posso dizer que represento os menos privilegiados, pois trabalho com eles. Mas as pessoas que me abordam são de diversos estratos sociais e não só os mais necessitados. Alguns trabalhadores, alguns reformados, alguns portugueses, por exemplo. A minha prioridade é continuar a fazer o que faço e não vejo como a minha presença na AL possa melhorar as minhas funções. As pessoas dizem que posso fazer mais, mas não vejo como. Tem defendido a integração dos imigrantes no território. Essa é uma das minhas prioridades. Mesmo nas campanhas que fiz para as eleições, tive sempre em mente a questão dos imigrantes em Macau. Acho que é essencial para qualquer deputado pensar em todas as pessoas que habitam no território. Pensa que a defesa dos imigrantes pode ter tido interferência nos resultados? Não. Os imigrantes trabalham em Macau, vivem cá e, como tal, temos de pensar neles. Mas as pessoas tendem a não falar muito no assunto. Parece que o que consta da agenda política relativamente à importância dos imigrantes no território é o silêncio. Mas eu falo sempre, talvez porque não tenho preocupações políticas, nem tenho de agir segundo o politicamente correcto. Digo o que penso com base no pulso que sinto por parte da sociedade e das necessidades das pessoas. O que acha que tem de ser feito nesta área? Cerca de 40 por cento da nossa força de trabalho depende dos imigrantes. Os residentes pensam, de alguma forma, que estas pessoas que vêm de fora lhes roubam os empregos, o que não corresponde, de todo, à verdade. Por exemplo, no que respeita a cargos de chefia, apenas 1,9 por cento são ocupados por imigrantes. Estes dados podem comprovar que não são os estrangeiros que ocupam os lugares destinados aos residentes. O seu papel tem de ser respeitado. Se não se sentirem respeitados, os residentes ficam em dívida. Se tiverem o devido respeito também trabalham melhor e contribuem activamente para a dinâmica económica e social local. Há muitas pessoas a dizer, por exemplo, que os trabalhadores não residentes não devem ter acesso e apoio nos cuidados médicos porque é uma forma de “levarem” o dinheiro do território. Dizem que a riqueza de Macau não deve ser partilhada com os estrangeiros e argumentam que devem ser os empregadores a suportar seguros de saúde. Defendo que o nosso sistema de saúde deveria incluir esta faixa da população. Estamos a falar de cuidados básicos que não devem ser negados a quem vive no território. Mas isso não está na agenda política. Sem imigrantes, Macau não existiria e seria estático, sem qualquer desenvolvimento. Temos de ter essa consciência e apoiar, pelo menos, as áreas dos cuidados básicos. Até mesmo para os turistas, que lidam directamente com esta população em várias funções, é benéfico que vejam as pessoas a sorrir e satisfeitas. Acaba por dar uma boa imagem de Macau para o exterior. O Governo tem feito melhorias no sistema de saúde e no sistema social, mas ainda é dirigido aos residentes e há uma franja da população que não é abrangida. Macau é um sítio pequeno, seria muito fácil educar as pessoas para o respeito umas pelas outras. No entanto, penso que as pessoas de Macau são generosas por natureza. Mas é necessário analisar e ter a consciência do todo da sociedade com a sua diversidade. Neste sentido, cabe aos políticos ter um papel também mais interventivo e seguirem no sentido da inclusão. Há vozes na política muito duras com a questão dos imigrantes e dos trabalhadores não residentes. Sim, mas Macau também dá a oportunidade de ter vozes livres. Foi recentemente aprovada a Lei Eleitoral. O que acha da revisão? É um passo positivo para umas eleições mais abertas e para a luta contra a corrupção. O diploma prevê também regras que são importantes para evitar comportamentos desapropriados. Mas continuo a duvidar que o sistema actue em conformidade com a lei. No meu escritório, por exemplo, não admito que ninguém pergunte a quem entra as razões da sua vinda. Defendo uma política de portas abertas. No caso das eleições, também todos se podem juntar. Desta vez, há a questão do juramento de fidelidade à Lei Básica e ao Governo Central, mas acho que sempre que alguém vai para um cargo político já deve ter subentendido a sua fidelidade ao país. No entanto, quando dizemos que amamos o nosso país, isso não pode querer dizer que não gostamos dos outros, de outras regiões e que possamos discriminar outras pessoas. Claro que quando se fala de terrorismo o trabalho é outro e tem de ser feito de forma coordenada. Ainda relativamente à nova lei, penso que poderia ser mais uma razão para me candidatar. A legislação mais clara, e uma sociedade mais desenvolvida e educada como a de hoje são factores apelativos, mas, de facto, ainda não sinto que o deva fazer. Recente também é a lei da violência doméstica. A Caritas tem vindo a trabalhar com vítimas. Foi uma lei muito importante e, depois de o diploma ter sido aprovado, as pessoas, felizmente, começam a sentir-se mais à vontade para denunciarem casos de abuso. O mesmo acontece nas situações em que as vítimas são do sexo masculino. Antes da entrada em vigor da nova lei, já tinha casos de homens a recorrem à Caritas para falar da situação. A questão do abuso está muito relacionada com a falta de auto-estima e o trabalho que tem de ser feito é o da sua recuperação. Normalmente são pessoas, principalmente nos casos do sexo masculino, que não são respeitadas por ninguém e que vivem o mesmo tipo e situações de abuso em casa e no trabalho. É necessário promover a confiança. Na Caritas, por exemplo, tentamos integrar estes casos em programas de voluntariado onde podemos fazer com que se sintam úteis e respeitadas. Tem trabalhado na área da pobreza. Quem é que procura mais ajuda? Macau não é só dinheiro. Podíamos fazer do território uma terra maravilhosa, dado o dinheiro que existe. Se me perguntasse isso há uns anos, diria que precisam de ajuda aqueles que têm uma renda alta e, como tal, não podem suportar a renda de um tecto, aqueles que partilham casas muito pequenas e aqueles que não têm cozinha em casa. Mas o que tenho constatado é que, felizmente, há cada vez menos pessoas nestas condições. Uma das acções que terá contribuído para esta diminuição é a política de habitação pública do Governo. As pessoas que têm este tipo de apoio já não procuram tanto a Caritas. Temos também o banco alimentar que se destina a quem não tem o que comer. E também aí, há cada vez menos pessoas a precisar de ajuda, sendo que são os idosos que vivem sozinhos quem mais nos procura. Além das iniciativas sociais já conhecidas da Caritas, há novos projectos? Estamos agora com o processo de abertura de uma clínica de cuidados dentários. O espaço, num momento inicial, vai ser dirigido, essencialmente, a doentes mentais e a idosos locais, mas o objectivo é que, correndo tudo bem, seja aberta a todos, e aos imigrantes também. Os idosos parecem ser dos que mais precisam de ajuda no território. É necessária ajuda em três sentidos: a criação de lares, o apoio domiciliário e o apoio ao cuidador, que pode ser um profissional ou um familiar. A Caritas já dispõe destes três serviços e damos formação geriátrica. Temos também um centro de dia para quem precisa de apoio. Não é um centro de lazer e está preparado para acolher utentes com vários tipos de problemas, como a demência, por exemplo. Está desde 1991 à frente da Caritas. Tenciona continuar por mais tempo? Não sei. Pode ser para sempre. Mas isso não é importante. Com ou sem título de secretário-geral da Caritas, pretendo continuar a trabalhar naquilo em que acredito. Algumas pessoas acham que é importante que tenha o cargo e o título porque pensam que é uma forma de ter mais respeito, tanto da população, como do próprio Governo. Não concordo. Quando acreditamos em nós e naquilo que fazemos encontramos sempre o nosso espaço para servir a sociedade. Quando era pequeno tive quem tomasse conta de mim. É a minha função também tomar conta dos que mais precisam.
Sofia Margarida Mota SociedadeEfeméride | Mais de meio milhão para festejar Lei Básica [dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] orçamento para a comemoração do 24.º aniversário da Lei Básica de Macau é de cerca de 600 mil patacas, aplicadas na realização de um conjunto de actividades. A ideia é dar a conhecer o diploma aos residentes de forma lúdica. O valor, aponta a chefe de divisão de formação e informação cívicas do Instituto para os Assuntos Cívicos e Municipais, Lam Lei Sio, é “bem investido e mostra resultados junto da população”. A efeméride é festejada no próximo sábado com a realização de um “bazar comemorativo” na Praça do Tap Seac. Cheong Kuai San, director do Centro de Educação Permanente dos Serviços de Educação e Juventude, destaca alguns dos eventos que integram a iniciativa, sublinhando a adesão da população. “Para o concurso de desenhos sobre a Lei Básica recebemos três mil trabalhos e, para os jogos sobre o mesmo tema, 32 pedidos de formação de equipa”, afirmou ontem em conferência de imprensa. O sábado vai ainda ser preenchido com concertos, espectáculos de dança e de teatro para “promover o entendimento da Lei Básica junto dos residentes através da aproximação dos seus conteúdos a iniciativas práticas”, disse Lam Mei Sio. Acresce ainda às actividades previstas um workshop dirigido a todos sobre o diploma fundamental de Macau. Entre Maio de Dezembro, os Serviços de Assuntos de Justiça vão promover um concurso alusivo ao plano de divulgação nas escolas. De acordo com os responsáveis pela iniciativa, é uma forma de juntar alunos e professores na discussão e esclarecimentos sobre a Lei Básica. A equipa que organiza as comemorações prevê que as actividades cheguem a cerca de 15 mil residentes e espera duas mil pessoas no evento do fim-de-semana. A Lei Básica de Macau foi criada em Março de 1993 pela Assembleia Popular Nacional da República Popular da China e entrou em vigor a 20 de Dezembro de 1999 com a transferência de Administração.
Sofia Margarida Mota PolíticaLicença de maternidade | Pereira Coutinho pede igualdade para trabalhadoras [dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] princípio da igualdade determinado pela Lei Básica não está a ser cumprido no que diz respeito à licença de maternidade. A ideia é defendida pelo deputado José Pereira Coutinho que, em interpelação escrita, afirma que “há um tratamento injusto para os residentes do sexo feminino”. Pereira Coutinho vinca que a licença de maternidade para as mulheres que trabalham no sector privado são de apenas 56 dias, enquanto as funcionárias dos serviços públicos têm direito a 90 dias. O deputado lamenta a discrepância entre direitos das mães que trabalham no público e no privado. O também presidente da Associação dos Trabalhadores da Função Pública de Macau recorda que o colega de bancada, Leong Veng Chai, em Maio do ano passado, colocou esta questão ao Governo. A Direcção dos Serviços para os Assuntos Laborais foi vaga na resposta e referiu que “na regulamentação dos 56 dias de licença de maternidade foram consideradas a protecção às trabalhadoras e a capacidade de aceitação das entidades patronais”. Para o deputado, não houve qualquer explicação quanto à violação do princípio da igualdade. O tribuno dá ainda o exemplo de outras jurisdições: nos países europeus a licença é de, pelo menos 90 dias, na Mongólia é de 101 e na China Continental pode chegar aos 120 dias “consoante o grupo etário da mulher”. Aqui ao lado, em Hong Kong, as mães têm 70 dias de licença sendo que, argumenta Pereira Coutinho, “quando se verifica algum tratamento injusto, é possível apresentar queixa à Equal Opportunities Comission”. Queixas no feminino O deputado justifica a missiva agora entregue ao Executivo com o aumento de queixas que tem vindo a receber por parte de mulheres. Em causa está o tratamento diferenciado no emprego, pelo que as queixosas solicitam a introdução de alterações na Lei das Relações de Trabalho. O argumento para a revisão do diploma, escreve Pereira Coutinho, assenta no dever do Governo de cumprir com rigor o Artigo 25.º da Lei Básica: “Os residentes de Macau são iguais perante a lei, sem discriminação em razão de nacionalidade, ascendência, raça, sexo, língua, religião, convicções políticas ou ideológicas, instrução e situação económica ou condição social”. Pereira Coutinho quer saber se o Executivo pondera corrigir a situação e se, à semelhança de Hong Kong, equaciona a possibilidade de criar um departamento público para o tratamento de desigualdades.
Sofia Margarida Mota Perfil PessoasPang Iok Chan, médica de medicina tradicional chinesa: “Quis ajudar a minha família a sobreviver” [dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] amor pela medicina apareceu em pequena e quase como uma necessidade. “Os meus pais estavam sempre doentes e eu queria poder ter conhecimentos para curar os males da minha família”, conta Pang Iok Chan. A médica de medicina tradicional chinesa não esconde que a escolha da profissão ficou marcada pela morte prematura do pai, quanto tinha apenas sete anos. Ainda a frequentar o curso de medicina no Continente, Pang Iok Chan optou por abandonar os estudos e veio para Macau. “Não tinha um objectivo específico quando deixei tudo para vir para aqui.” A maior razão foi fugir à pobreza e, “já na altura, Macau aparecia como um local em que se poderiam encontrar mais oportunidades de emprego”. “Só pensava em poder ganhar dinheiro rapidamente para ajudar a minha família a sobreviver”, confessa. Já passarem muitos casos pelo consultório de Pang Iok Chan. No entanto, há um, também na família, que não lhe sai da memória e que fez com que retomasse os estudos: um primo que sofria de um tumor congénito e que, após sete anos de tratamentos, não apresentava melhoras, “estava quase a morrer”, recorda. Recorrendo aos conhecimentos adquiridos ainda na China Continental, Pang Iok Chan conseguiu mudar a situação e, um ano depois, o primo melhorou, tendo acabado por recuperar totalmente a sua saúde. “Foi quando decidi voltar à universidade, ter o meu diploma e realizar um sonho.” “Comprei um apartamento na Taipa, perto da actual Universidade de Ciência e Tecnologia de Macau, que na altura estava em construção.” A proximidade, diz, foi mais um alento para continuar a estudar. Depois de licenciada, Pang Iok Chan abriu a sua clínica e desde logo se assumiu como diferente dos seus colegas de profissão. “Em vez de passar receitas com os chás que os meus doentes devem tomar, prefiro apostar no incentivo a uma boa alimentação”, explica. Para a médica, os nutrientes presentes nos alimentos do dia-a-dia têm grandes propriedades de cura e “são o melhor tratamento para doenças”. Outra inovação foi a criação de um método de massagem que, ao invés de usar a massagem tradicional, utiliza os dez dedos. Para a médica “é um método mais rápido e eficaz”. Comprimidos em excesso Relativamente à saúde no território, Pang Iok Chan tem algumas reservas, não deixando de responsabilizar o Governo pela atitude dos residentes em relação à saúde. “As pessoas não dão importância à sua alimentação o que, penso, tem tudo que ver com os produtos que estão disponíveis em Macau.” O facto de muitos alimentos serem importados faz com que os produtos frescos sejam raros e o “Governo não fiscaliza de forma eficaz a higiene dos bens que chegam ao território”. A médica não deixa de lamentar que, para as autoridades, os medicamentos ainda sejam prioritários em relação à alimentação. “Infelizmente, o Governo ainda dá mais importância à cura tradicional feita à base de remédios. Deveria promover mais a importância de uma boa alimentação.” Pang Iok Chan considera ainda que, por usar métodos de tratamento alternativos, acaba por afastar alguns utentes do serviço de saúde público, até porque considera que tem procedimentos ineficazes. “Devido à falta de conhecimento e de coragem, o serviço de saúde não ajuda os utentes”, afirma. Apesar da já longa estadia em Macau, Pang Iok Chan tem agora outro sonho: o regresso à China Continental. É lá que pensa encontrar mais pessoas com quem partilhar ideias e conhecimentos. “No Continente posso estar em contacto com colegas que pensam como eu e posso ser mais útil, enquanto aqui as pessoas dão cada vez menos importância à medicina tradicional chinesa.” Para deixar um legado, a médica está agora a trabalhar num livro. O objectivo, diz, é poder dar a conhecer e divulgar os métodos que desenvolveu ao longo da carreira, “para que possam continuar a ser aplicados e aperfeiçoados”, remata.
Sofia Margarida Mota PolíticaTabaco | Ella Lei manifesta-se contra retrocesso no diploma Não se conforma com a solução encontrada e, por isso, manifestou-se junto da comissão que está a analisar a revisão à lei do tabaco. Ella Lei entregou um parecer em que lamenta as excepções para os casinos, por considerar que a saúde dos trabalhadores ficará afectada. O diploma deve ser votado por todos os deputados em Maio [dropcap style≠’circle’]A[/dropcap] deputada Ella Lei entregou ontem um parecer à 2.ª Comissão Permanente, que está a analisar a alteração ao regime de prevenção e controlo do tabagismo, para demonstrar o descontentamento em relação às salas de fumo nos casinos. Lei defende que “a revisão do regime deveria visar a proibição total do consumo de tabaco nos locais públicos e de trabalho”, algo que não acontece após o Governo ter decidido manter locais onde será possível fumar dentro dos espaços destinados ao jogo, através da criação de padrões mais rígidos. De acordo com a proposta inicial, recorda Ella Lei, o Governo definia claramente que não seria permitido o consumo de cigarros e charutos nas áreas de jogo e responsabilizava-se pela implementação de medidas para proteger a saúde dos não fumadores. A deputada entende que o voto dado por unanimidade na apreciação na generalidade na Assembleia Legislativa teve como mote a proibição total de zonas de fumo, sendo que exclui a instalação de espaços para o efeito. Em causa está a saúde dos trabalhadores que, aponta, é defendida por lei. Ella Lei faz ainda referência aos relatórios da Organização Mundial de Saúde que demonstram que só um ambiente cem por cento sem fumo é seguro para a saúde dos trabalhadores, sendo que “está provado que qualquer tipo de ventilação e filtros em nada contribuem para um ar mais saudável”. Também o relatório apresentado pelos Serviços de Saúde de Macau, afirma Ella Lei, reitera que, “uma vez sendo permitido o tabaco, não há forma de garantir efectivamente a limpeza do ar, nem evitar o contacto com o fumo dos cigarros”. “Desde 2012 que a proibição do tabaco em lugares fechados está em vigor. A partir do primeiro dia de 2015, o período de permissão temporária do tabaco em bares e discotecas acabou. No entanto, os casinos são a excepção”, vinca. De acordo com a deputada representante da Federação das Associações dos Operários de Macau (FAOM), a excepção representa uma contradição para um ambiente livre de fumo e é injusta para com os trabalhadores do sector, visto ser “difícil prevenir por completo os malefícios para o tabaco com a existência de salas de fumo”. No entanto, já após a aprovação na generalidade da proposta de lei, “o Governo mudou de ideias passou a admitir a instalação de salas de fumo”, lembra. A proposta que vai a votos na especialidade é substancialmente diferente daquela que foi aprovada na generalidade. Tudo natural Para Chan Chak Mo, que preside à 2.ª Comissão Permanente, “é normal que existam alterações em sede de comissão”. “Os deputados, aquando do voto em plenário, podem não ter feito uma leitura minuciosa da proposta de lei, pelo que quando segue para comissão, cada um dos artigos é apreciado minuciosamente”, defende. Apesar de o Governo ter prometido a exigência de altos padrões para as salas de fumo, Ella Lei considera que “ainda não foi dada a conhecer ao residentes qualquer evidência da medida, pelo que é difícil acreditar” no que diz o Executivo. Para a deputada, importa ainda o intervalo de um ano entre a publicação das novas regras para as salas de fumo e a sua aplicação efectiva. De Janeiro de 2018 a Janeiro de 2019, os “funcionários têm de trabalhar dentro de zonas que não reúnem os requisitos finais”. Mudança de assinatura As normas para as salas de fumo autorizadas nos casinos não vão ser determinadas pelo Chefe do Executivo, mas sim por Alexis Tam. A alteração foi dada a conhecer ontem, após reunião da comissão. “O regulamento administrativo não vai existir e os requisitos para as salas de fumo serão definidos por despacho do secretário Alexis Tam, com base no relatório dos Serviços de Saúde”, afirmou Chan Chak Mo. “Não é um problema de maior, podia ser algo feito tanto pelo Chefe do Executivo, como pelo secretário”, referiu. A mudança surge porque Alexis Tam “tem a tutela das pastas ligadas à matéria”. A apreciação da alteração do regime de prevenção e controlo do tabagismo está “acabada” e contou, interinamente, com dois votos contra: Ng Kuok Cheong e Leong Veng Chai. O diploma vai seguir para o trabalho técnico de análise de modo a que seja emitido o parecer final. Após a apreciação do documento, e “estando tudo resolvido”, segue para votação na especialidade em sessão plenária. A data, aponta Chan Chak Mo, vai depender da velocidade do trabalho, mas pode acontecer em Maio. Salas vão ter “exigências muito rigorosas” O director dos Serviços de Saúde de Macau (SSM), Lei Chin Ion, garante que os padrões de exigência nas salas de fumo autorizadas nos casinos vão ser altos. Em declarações após a reunião de ontem, o responsável insistiu que as salas de fumo vão ter exigências “muito rigorosas”, dando como exemplo as portas de acesso aos espaços para fumadores. “As portas não são de abertura livre, passam a abrir através da pressão de um botão, e não podem permanecer abertas mais de um minuto”, disse. Por outro lado, a entrada e saída nos espaços destinados aos fumadores terão, de acordo com os SSM, de ter uma distância mínima das mesas de jogo, de modo a que os efeitos do fumo não se façam sentir junto dos trabalhadores. O director disse ainda que “os requisitos não são definidos pelos serviços”, sendo que “as indicações servem de orientação para o despacho a ser feito pelo responsável pela tutela.
Sofia Margarida Mota SociedadeLai Chi Vun | Residentes exigem classificação dos estaleiros [dropcap style=’circle’]S[/dropcap]ão 670 as assinaturas que constam da petição entregue ontem junto do Instituto Cultural (IC) contra a demolição dos estaleiros de Lai Chi Vun, em Coloane. A iniciativa, organizada por um grupo de residentes, tem como objectivo “a suspensão da demolição de estaleiros e iniciar, desde já, o seu processo de classificação de bens imóveis”. De acordo com Tam Chon Ip, representante do grupo, Lai Chi Vun reúne características particulares que exigem a classificação dos estaleiros. O responsável exemplifica com “o estilo próprio da arquitectura que, segundo especialistas, tem um grande valor artístico, e a integração dos espaços enquanto parte importante da ecologia de Coloane”. Tam Chon Ip espera que o Executivo interrompa o processo de demolição que se encontra em curso e que proteja os estaleiros dando, de imediato, início ao processo de avaliação das estruturas como património cultural imóvel. “A recolha de assinaturas teve início antes de serem iniciadas as demolições e pedimos que o IC pare já [com o processo] e que proceda a um planeamento claro para Lai Chi Vun”, diz. O responsável aponta ainda que a Direcção dos Serviços de Assuntos Marítimos e de Água (DSAMA) foi negligente nas suas responsabilidades, sendo que deveria ter tido em consideração o estudo e a protecção do património marítimo. Leong Kam Hon, representante dos moradores de Coloane, manifesta-se preocupado com o destino daquela povoação. “Já vivo aqui há meio século, testemunhei o desenvolvimento desta área e agora estou a assistir à sua queda e destruição”, afirmou. Resposta Em resposta à petição, o IC afirma que “irá analisar os materiais relevantes e irá seguir rigidamente os termos da Lei de Salvaguarda do Património Cultural”, lê-se num comunicado emitido. O Instituto salienta que “levará a cabo uma rigorosa avaliação e uma análise das informações recebidas”. Para o efeito, o IC aponta que vai continuar a “recolher dados e a executar o trabalho de mapeamento ambiental na área dos estaleiros de Lai Chi Vun”. A demolição dos estaleiros na zona de Coloane teve início no passado dia 8. Tem sido alvo de vários protestos e manifestações por parte de residentes que não concordam com a intervenção.
Sofia Margarida Mota PolíticaAmbiente | Deputados pedem ao Governo que dê o exemplo [dropcap style≠’circle’]A[/dropcap] protecção ambiental esteve ontem em destaque no período de antes da ordem do dia na Assembleia Legislativa (AL). Mak Soi Kun questionou o Executivo acerca do desprezo com que, considera, se trata esta matéria. Para o deputado, no que respeita a medidas verdes, “o Governo, que assume o papel de orientador, deve servir de modelo”. Tal não acontece e Mak Soi Kun dá exemplos: “Os serviços públicos, quando tiram fotocópias, não utilizam a frente e o verso da folha desperdiçando muito papel e muitos governantes não conseguem poupar energia, nem reduzir as emissões pois não partilham os veículos nas suas deslocações”. Por outro lado, o Executivo mantém uma presença assídua em feiras e exposições, como o Fórum e Exposição Internacional de Cooperação Ambiental de Macau, de modo a aceder às mais recentes informações e tecnologias no sector, “mas nunca compram nada”, afirmou. As atitudes do Governo demonstram, sublinhou Mak Soi Kun, “que o Executivo continua a assumir uma atitude passiva neste âmbito”. O tribuno alerta também para a urgência nos apoios a “todos os que se dedicam à promoção da protecção ambiental”, bem como o incentivo à educação cívica. Também com os olhos postos no ambiente, Angela Leong alerta para a necessidade de esforços na área da reciclagem. “A reciclagem de recursos é um trabalho importante da protecção ambiental, trata-se de um sector que é a base de toda a indústria verde. No entanto, o apoio das autoridades tem sido sempre insuficiente”, disse. Em causa estão as dificuldades relativas aos veículos abandonados e a falta de espaço para os albergar. Por outro lado, a deputada salienta os resultados não satisfatórios relativos ao lixo doméstico e alimentar, que “ainda se encontram a um nível básico”. Angela Leong recorda as palavras do secretário para os Transportes e Obras Públicas, Raimundo do Rosário, que “confessou que o trabalho da recolha e reciclagem em Macau é um fracasso e que os problemas existentes não foram devidamente identificados, não sendo suficientes, nem o trabalho de sensibilização nem as medidas complementares”.
Sofia Margarida Mota Manchete PolíticaAL | Debate sobre taxas para veículos foi chumbado A proposta de debate do aumento das taxas para os veículos foi ontem chumbada na Assembleia Legislativa. Os votos dividiram-se mas, na maioria, os deputados consideram a medida positiva. Os que se mostraram a favor do debate entendem que é preciso ouvir a população [dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] pedido de debate de Leong Veng Chai acerca do aumento das taxas administrativas e de remoção de veículos foi ontem recusado em sessão plenária da Assembleia Legislativa (AL). A discussão em torno da medida, que entrou em vigor no passado dia 1 de Janeiro, dividiu o hemiciclo, sendo que a proposta acabou chumbada com 14 votos contra, 10 a favor e duas abstenções. Dos deputados que se manifestaram contra o debate da acção do Governo, Ma Chi Seng defendeu que representa um passo no combate ao estacionamento desregrado. Apesar de ser uma medida que “gerou reacções na sociedade, “há muitas vozes que entendem que, desta forma, se combate o fenómeno do estacionamento ilegal”, frisou. Já Vong Hin Fai apontou duas razões que o motivaram ao voto contra. Por um lado, a matéria já tinha sido alvo de interpelação, a 6 de Janeiro, e de resposta por parte da Direcção dos Serviços para os Assuntos de Tráfego (DSAT). Por outro, a medida não prejudica os residentes, diz. “Não vejo que a implementação prejudique os cidadãos e vou votar contra.” Na ala dos votos a favor, José Pereira Coutinho colocou-se ao lado do seu colega de bancada, o proponente Leong Veng Chai. Para o deputado, é necessário “perceber as razões que motivaram o Executivo a avançar com a medida”. “Ninguém é contra, mas é preciso perceber se a taxa aplicada é razoável”, disse. Pereira Coutinho defende que é preciso saber se o aumento em causa “reflecte a atenção do Executivo dada ao sofrimento dos residentes”, deixando no ar a questão se o Governo estará interessado em que se fale dos motivos que levaram a um aumento tão significativo. O tribuno sublinhou ainda o facto de a implementação não ter levado em conta a opinião da população. “Será que o Governo pode abster-se da consulta pública?”, questiona, sendo que espera que “os governantes se justifiquem à AL e, principalmente, à população”. O deputado Au Kam San salientou que é uma acção polémica existindo quem a apoie e quem a conteste. O tribuno concorda que “o aumento exorbitante representa um encargo muito grande para a população e, como tal, deve ir a debate”. Para o pró-democrata, trata-se de uma medida que não evita infracções, até porque, disse, “há centenas de milhares de veículos e apenas dezenas de milhares de lugares de estacionamento”. A voz do povo Já em declaração de voto, a deputada Ella Lei, que manifestou apoio à proposta de debate, afirmou que compreende a necessidade de controlo dos veículos. No entanto, alerta, “a maior falha do Governo foi a ausência de diálogo com a população e é nesse sentido que o Executivo tem de ter mais atenção.” Também Kwan Tsui Hang apelou a uma maior sensibilidade em relação aos desejos dos residentes. Apesar de achar a medida adequada, a deputada entende que o Executivo “tem realmente de fazer uma consulta pública para que a população esteja preparada para as decisões tomadas”. Por outro lado, e sob o ponto de vista dos utentes, Kwan Tsui Hang apontou a necessidade de utilização de menos veículos. A deputada votou a favor do debate porque, sublinhou, quer que “o Governo vá ao hemiciclo justificar detalhadamente a medida”. Ng Kuok Cheong acha que é uma manobra de distracção. “Antes de 2019, o metro ligeiro não estará pronto e, como o próprio Governo considera os trabalhos insuficientes, decidiu avançar com uma medida e foi esta, sem ponderar a elaboração de uma proposta de lei.” A razão, afirmou, foi evitar possíveis críticas. Dificuldades acrescidas Na proposta de debate entregue à AL, Leong Veng Chai questionava se “este aumento é razoável”, esperando que “todos os deputados possam apresentar as suas opiniões, de modo a ir ao encontro da opinião pública e evitar suspeitas sobre a existência de transferência de interesses entre o Governo e as entidades privadas”. Para o deputado, a realização do debate com membros do Governo permitiria ao Chefe do Executivo, Chui Sai On, “reunir amplamente os conhecimentos, a fim de tomar uma decisão resoluta”. “Os salários dos residentes não só não conseguem acompanhar a subida da inflação, como também vão ter de suportar a subida em flecha, cerca de 13 vezes, do valor das taxas, aumentando assim cada vez mais o custo de vida das famílias”, argumentava ainda o deputado na nota justificativa. Leong Veng Chai julga ainda que “a actual rede de trânsito é desequilibrada, os lugares de estacionamento são insuficientes e as taxas tiveram um aumento exagerado”. O deputado eleito por sufrágio universal sustentava igualmente que o Governo não melhorou a qualidade de vida da população, mas antes “aumentou as dificuldades dos cidadãos”.
Sofia Margarida Mota EventosBtr | Autor de Xangai condensa o tempo para memória futura [dropcap style≠’circle’]C[/dropcap]om o heterónimo Btr, o autor e fotógrafo produz um ainda raro registo da sociedade contemporânea chinesa. Natural de Xangai, prefere escrever o presente em mutação para que fique um registo dos dias de mudança. A escrita está intimamente ligada a um modo de expressão mais abrangente em que utiliza o desenho, a fotografia e o vídeo. “Tudo para emoldurar a realidade chinesa da actualidade”, afirmou ao HM. O mundo virtual, por exemplo, é fonte de alterações que ainda não se compreendem, mas que estão a afectar a vida de todos, indica Btr. Em causa estão também as mudanças de valores. Se até há pouco tempo a sociedade chinesa era influenciada pelas antigas tradições e palavras, hoje, diz, tudo isso está a mudar. “Um dos problemas na língua chinesa é a utilização de palavras-chave como símbolos e o que tenho vindo a constatar é o aparecimento e a criação diária de novas palavras com origem, por exemplo, no vocabulário da Internet”, explica. Para o autor, o fenómeno não é de estranhar até porque “as palavras que tínhamos não seriam capazes de representar a nova realidade”. O facto representa, já por si, uma mudança a ocorrer. Crítica criativa O trabalho que produz reúne a utilização de vários meios e começou com uma crítica à arte contemporânea. “Comecei a interessar-me pelo presente através da arte contemporânea há dois anos”, conta. O interesse em particular veio da abundância do estilo no Continente e especialmente em Xangai, “onde há muitas exposições”. No entanto, longe da crítica tradicional, o autor escreve histórias inspirado pelo que vê. O trabalho que realiza acerca do que se faz na arte contemporânea recria-se com a escrita. “Não faço uma crítica das obras, por assim dizer, escrevo pequenos contos em torno delas, do que elas me transmitem. Acabo por confundir o trabalho crítico com o criativo e criar outra coisa a partir da observação da arte que se faz hoje em dia”. Btr acabou por achar que a fotografia e o desenho podiam juntar-se à palavra e criar uma aproximação mais verosímil da realidade. Na semana passada, inaugurou a sua primeira exposição a solo em Xangai. “Chama-se yisi yisi, 意思意思, uma expressão chinesa muito difícil de traduzir”, afirma. No seu todo, a exposição “é uma espécie de livro visual, pendurado nas paredes, e que descreve um dia, repartido em dez momentos na vida de um trabalhador de colarinho branco de Xangai”. Mais uma vez, a ideia é mostrar a contemporaneidade e ilustrar a forma como as redes sociais são capazes de influenciar o quotidiano. “Actualmente na China, as pessoas não tiram os olhos dos telefones, sendo que até o trabalho, penso, é decidido através desta interacção virtual”, constata. É esta mudança, ainda rumo a parte incerta, que mais o incentiva a fazer o seu retrato. Btr diz ainda que em cada conto ou imagem que produz consegue sintetizar, “em formato instantâneo, um passado e um futuro”. Por outro lado, aponta, já há muitos e bons escritores que retratam a história recente e o panorama rural do país, mas raros os que se dedicam a este momento tão importante que é o presente. Btr não deixa de sublinhar que o retrato da mudança a que se dedica está condicionado. Se, por um lado, o mundo virtual possibilita um acesso cada vez maior à informação, e a mais interacções, na China essa informação continua a ser circunscrita aos links autorizados, o que acaba por formar uma bolha da qual não se consegue facilmente sair. “Usamos o WeChat para tudo, mas é uma plataforma que funciona como uma bolha e que não autoriza o acesso à informação do exterior. Não podemos aceder ao New York Times”, exemplifica. Da passagem por Macau, para o festival Rota das Letras, leva a oportunidade “única de estar em contacto com outros autores, tanto chineses, como ocidentais”.