China | Montenegro espera frutos de “relação próxima” com a Rússia

O primeiro-ministro português disse ontem, num encontro com o Presidente Xi Jinping, que espera que a “relação próxima” entre a China e a Rússia ajude a alcançar um acordo de paz na Ucrânia. De visita oficial à China, com passagem por Macau, Luís Montenegro realçou papel fundamental da China no contexto global

 

O primeiro-ministro português afirmou ontem, perante o Presidente da República Popular da China, Xi Jinping, que conta com a sua relação próxima com a Rússia para “construir uma paz justa e duradoura” na Ucrânia.

Luís Montenegro fez estas declarações no início do primeiro dia da visita oficial à China, durante o encontro com Xi Jinping, do qual os jornalistas só puderam gravar os primeiros três minutos. “Não posso deixar de, em nome do Governo de Portugal, transmitir ao Sr. Presidente que contamos muito com o vosso contributo e a relação próxima que a China mantém com a Federação Russa para podermos, o mais rápido que seja possível, construir uma paz justa e duradoura na Ucrânia”, afirmou.

Antes, Montenegro sublinhou que, no contexto internacional, Portugal e a China têm mantido “em muitas ocasiões uma base de cooperação e de partilha de valores”. “A China tem um papel fundamental no contexto global e internacional, é membro permanente do Conselho de Segurança das Nações Unidas e nós esperamos o vosso contributo para podermos construir pontes entre povos, aproximar alguns daqueles que se encontram em conflito, promover a paz, promover o multilateralismo, promover o respeito pelos direitos humanos”, afirmou o político português.

Montenegro disse estar confiante de que o apelo que dirigiu ao Presidente da China, sobre o conflito Rússia-Ucrânia, vai ser ouvido. “Creio que o apelo, vindo de um país amigo, vindo de um país da União Europeia (UE), vindo de um país, como o Sr. Presidente Xi Jinping enfatizou também, que tem uma identidade de valores e de percurso, não cairá em saco roto”, afirmou.

Dizendo não poder responder pelo Presidente da China, Montenegro manifestou-se convicto de que Portugal tem feito o que lhe é exigido quanto a este conflito.

“A minha convicção é que, à nossa dimensão e sem nenhum tipo de pretensiosismo, nós fazemos aquilo que se exige a uma nação com a história e com a respeitabilidade internacional que Portugal tem. Nós somos construtores de pontes, nós somos protagonistas da aproximação entre povos, nós somos defensores da paz, defensores dos valores, do respeito pelos direitos das pessoas”, sublinhou.

Montenegro considerou que, no encontro com Xi Jinping, se limitou “a ser franco, leal e directo no apelo” para que a capacidade de influência da China possa ser desenvolvida e “trazer resultados práticos” para a Ucrânia.

Luís Montenegro referiu também que “é com muito gosto” que realiza esta visita oficial à China, depois de breves declarações do Presidente chinês, Xi Jinping.

“Como o Sr. Presidente afirmou, Portugal e a China têm uma relação fundada numa história que partilharam com vários momentos em comum, mas também uma relação virada para o futuro. Recordo bem a visita do Sr. Presidente a Portugal há sete anos e quero transmitir-lhe também os cumprimentos do Sr. Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa”, disse.

Bons amigos

O primeiro-ministro português manifestou concordância com as palavras de Xi Jinping sobre a forma como decorreu a transição da administração de Macau de Portugal para a China, em 1999.

“Tivemos na transição de Macau uma boa expressão da forma como conseguimos convergir e conseguimos garantir a identidade cultural e o relacionamento entre a região administrativa especial de Macau, com Portugal e com a China”, disse.

No encontro de ontem, Xi Jinping disse que “Portugal é um bom amigo da China”, referindo ser “um prazer” conhecer o primeiro-ministro, Luís Montenegro.

“Seja bem-vindo na visita à China. Lembro que em 2018 eu fiz uma visita de Estado a Portugal, que me deixou uma bela impressão, e profunda”, disse, aproveitando para pedir a Montenegro que transmita ao chefe de Estado português, Marcelo Rebelo de Sousa, “sinceros cumprimentos”, de acordo com a tradução simultânea para português das suas declarações.

O Presidente chinês salientou que China e Portugal “são países com profunda história, e os dois povos possuem idiossincrasia, abertura, inclusão, progresso e autonomia”, defendendo que “Portugal desempenha um papel importante e singular no palco internacional”.

Xi Jinping destacou ainda “o papel importante” desempenhado por três antigos primeiros-ministros portugueses nos assuntos internacionais e regionais.

“O secretário-geral das Nações Unidas, António Guterres, o presidente do Conselho Europeu, António Costa, e o ex-presidente da Comissão Europeia Durão Barroso. Eu tenho boas relações com eles”, frisou.

Na breve declaração, o Presidente chinês afirmou que “Portugal é bom amigo da China” e considerou que ambos os países resolveram “de forma adequada a questão de Macau através de negociações amistosas”.

“Portugal também foi o primeiro país da Europa Ocidental a assinar com a China actos de cooperação no âmbito da iniciativa ‘Uma faixa, uma rota”, e o primeiro país da Zona Euro que emitiu títulos” na moeda chinesa, disse.

Uma ajudinha na crise

Por sua vez, Luís Montenegro agradeceu o apoio da China a Portugal durante o período da crise financeira. “Ao nível da nossa cooperação económica bilateral, é meu dever dizer-lhe que não nos esquecemos, pelo contrário, temos muito bem presente e respeitamos a aposta que a China desenvolveu na economia portuguesa, num dos momentos mais críticos do nosso país, aquando da crise financeira”, afirmou.

Tal como tinha sido destacado momentos antes pelo Presidente da República Popular da China, também Montenegro considerou que, nos últimos anos, os dois países reforçaram laços “em vários sectores da economia, da energia à banca, da saúde ao abastecimento de água”. “A nossa convicção é que podemos continuar a trilhar esse caminho na base da confiança”, disse o primeiro-ministro.

Luís Montenegro aterrou em Pequim ao início da tarde de segunda-feira, num momento fechado à comunicação social, e não teve qualquer agenda pública nesse dia. A agenda oficial do primeiro-ministro começou ontem de manhã com uma cerimónia de deposição de uma coroa de flores no monumento aos Heróis do Povo, na Praça Tiananmen, em que esteve acompanhado pela mulher e pelos três ministros que integram esta visita: Paulo Rangel, ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros, Manuel Castro Almeida, ministro da Economia e da Coesão Territorial, e Graça Carvalho, ministra do Ambiente e Energia.

Além do encontro com Xi Jinping, Luís Montenegro reuniu-se antes com o presidente da Assembleia Popular Nacional da China, Zhao Leji.

Ao final da tarde, o chefe do Governo português teve um encontro de trabalho com o homólogo chinês, Li Qiang, também no Grande Palácio do Povo, tendo seguido para Macau, onde tem hoje agenda apenas na parte da manhã. Amanhã e sexta-feira, Montenegro fará uma visita oficial ao Japão, com passagens por Tóquio e Osaka.

Medir o pulso

Ao HM, o analista Tiago André Lopes, professor auxiliar responsável pela área de estudos sobre a Ásia na Universidade Lusíada do Porto, defendeu que “Lisboa e Pequim partilham visões bastante diferentes no que concerne aos conflitos internacionais”. De frisar que Montenegro visita a China quando passam poucos dias sobre a realização da cimeira da Organização da Cooperação de Xangai, que decorreu na cidade chinesa de Tianjin, e onde foram discutidos conflitos Gaza ou Rússia-Ucrânia.

“Podemos notar que Lisboa é displicente na questão palestiniana, parecendo pouco incomodada com a barbárie que se abate sobre os palestinianos; enquanto a China se posiciona num espectro diferente de Portugal na Guerra da Ucrânia. O que é que isto nos diz? A viagem será muito focada na dimensão de diplomacia económica e muito menos na chamada diplomacia tradicional”, defendeu o analista.

Tiago André Lopes considera que Portugal poderia aproveitar esta viagem pela Ásia “para se autonomizar um pouco da dependência do eixo Bruxelas-Washington e ganhar espaço de manobra integrando a força de Pequim”, embora considere que “o actual Governo aposta num Atlanticismo-Europeísta sem ambições globais”.

Questionado sobre a questão do 5G, que pautou a relação Portugal-China nos últimos meses, Tiago André Lopes entende que a ida de Montenegro a Pequim serve para “minimizar o impacto” dessa questão e “tentar alavancar a cooperação económica entre os dois países”.

“Um elemento que poderá ajudar a medir o pulso da visita do Primeiro-Ministro de Portugal será a assinatura de documentos. Serão assinados Memorandos de Entendimento (que geralmente não são vinculativos), ou Acordos Comerciais? Ou apenas notas de imprensa vagas? Este será o melhor barómetro, para além das palavras de circunstância que naturalmente serão proferidas”, destacou.

Investimentos | Montenegro diz que Portugal é “confiável e confiante”

Luís Montenegro afirmou ontem que, durante a visita oficial à China e depois ao Japão, quer trazer a mensagem de que Portugal “é um país confiável e confiante” para investimentos económicos.

Segundo o primeiro-ministro, o programa “congrega a oportunidade que o primeiro-ministro português tem de conversar e interagir directamente com o presidente da Assembleia Nacional da República Popular da China, com o Presidente da República, com o primeiro-ministro”.

“Ao mesmo tempo que o ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros, o ministro da Economia e a ministra do Ambiente e Energia interagem bilateralmente com os seus congéneres e também com empresários e empresas chinesas que operam em Portugal e com empresas portuguesas que operam na China”, acrescentou.

Para Montenegro, o facto de as visitas estarem a ser feitas “com alguma compressão em termos de durabilidade” – quatro dias divididos entre China e Japão – deve ser visto por outra perspectiva.

“É apenas o registo de que nós somos capazes de fazer tudo isto em simultâneo, somos capazes de partir daqui para Macau, somos capazes de Macau partir para Tóquio e para podermos, nesta área geográfica, trazer a mensagem de que Portugal é um país confiante, é um país confiável, é um país para onde vale a pena olhar e que também olha para o mundo”, defendeu.

Montenegro salientou ainda que Portugal já “usufrui de vários investimentos que têm origem na China e que têm sido alavancas para a transformação e desenvolvimento económico de Portugal”.

“É a nossa pretensão contribuir com esta nossa vinda cá para podermos também abrir portas a que mais empresas portuguesas possam encontrar no mercado chinês o destino dos seus produtos e, por via disso, também aumentar a nossa quota de exportação para esta geografia”, afirmou. A.S.S. / Lusa

Subscrever
Notifique-me de
guest
0 Comentários
Mais Antigo
Mais Recente Mais Votado
Inline Feedbacks
Ver todos os comentários