A Antecipação de um Encontro Num Leque de Zhu Ling

Gao Gu (1391-1460), um político e calígrafo da dinastia Ming, escreveu em 1447 um comentário numa pintura do sacerdote daoísta Fang Congyi (1301-1392) que se encontra no Metmuseum, intitulada Montanhas enevoadas em que, a certa altura, diz:

«Os portões da casa de montanha parecem tão quedos como se lá não estivera ninguém. Isto será ou um lugar eleito por imortais, ou alguma visão suprema do mundo dos mortais.»

Admirando a cadeia montanhosa, Gao estende a dúvida à própria representação, envolta em nuvens e nevoeiros, em que as montanhas dir-se-iam dotadas de uma leveza que em breve as faria soltar-se e voar. Essas montanhas pesadas e leves ao mesmo tempo eram um limiar, um lugar propício para encontros desde os mais improváveis aos mais certos da amizade.

Foi uma dessas reuniões menos assombrosas mas não menos deslumbrantes que ficou registada pelo pintor Zhu Ling (c.1635-c.1680) na pintura Embarcação de regresso às montanhas da Primavera, em formato de um leque dobrável (tinta e cor sobre papel, 18 x 50,5 cm, na Colecção Kaikodo, Hawai). Chegando a uma cadeia montanhosa junto de um rio vem, numa embarcação guiada por um barqueiro, um literato que ansiosamente vira a cabeça antes de chegarem, apesar de não estar ninguém na margem. Ao lado um poema breve:

«Pinto uma cena

sublime e eloquente,

cedendo à fantasia de captar

os sons das montanhas.

Procurarei entregá-la

a este homem das montanhas sonoras,

que chegará nesta altura

para nos encontrarmos

e depois regressará.»

Pode-se imaginar que esse habitante das montanhas, que uma vez por ano desce para um encontro, seja alguém como o seu amigo próximo Wan Shouqi (1603-1652) que, dois anos após a queda dos Ming, se torna um monge e retirado se dedicou só às artes do pincel. E que por vezes ilustrou histórias daoístas na fronteira da credibilidade, como a de Fei Changfang, possuidor de um bastão que lhe permitia viajar inacreditáveis distâncias.

Zhu Ling não só seguia nas suas pinturas o estilo característico de Huang Gongwang (1269-1354), o mestre autor do rolo Refúgio nas montanhas Fuchun, com a acumulação de pequenos traços separados cun, «rugas», para descrever as formas das montanhas, como o seu nome alternativo (zi) deriva de uma frase sua.

Adoptado por uma família rica, em criança, teria exclamado na altura: Huang gongwang zi jiu, «O senhor Huang há muito desejava ter um filho», cuja primeira parte Huang gongwang seria adoptada como o seu nome, e a última Zijiu como o seu nome alternativo. Zhu Ling tirou dessa frase dois caracteres do meio, Wangzi para serem o seu nome alternativo. No leque que pintou antes do figurado momento de antecipação da reunião, Zhu Ling anotou: «Durante o último Inverno de 1661 pintou e, divertindo-se, inscreveu-a para seu grande prazer, o seu discípulo Zhu Ling de Changzhou.»

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