E depois do adeus ao trabalho

A semana passada foram publicadas duas notícias sobre reformas e pensões. A primeira debruçou-se sobre a proposta do Governo francês que visa a alteração do sistema de reformas. Recorrendo ao Artigo 49.3 da Constituição, o Governo aprovou a alteração do sistema de pensões sem a ter submetido ao escrutínio da Assembleia Nacional. Com esta alteração, a idade de reforma em França subiu dos 62 para os 64 anos.

Além disso, para receber a pensão sem penalizações são necessários pelo menos 43 anos de descontos. Estas alterações revoltaram os franceses, que organizaram enormes manifestações de protesto. O Governo francês temia que se esta proposta passasse pela Assembleia Nacional não viesse a ser aprovada, por isso recorreu ao Artigo 49.3 para garantir a sua aprovação.

Embora a proposta de lei tenha sido aprovada, o Governo enfrenta uma moção de censura na Assembleia Nacional. Se a moção passar, o Presidente Macron corre o risco de demissão.

Aumentar a idade da reforma implica que as pessoas tenham menos tempo para desfrutar deste período das suas vidas. No entanto, o aumento da idade da reforma foi ditado por pressões financeiras. Digamos que o Governo passou a “batata quente” para os cidadãos. Esta manobra revoltou os franceses, o que é compreensível.

A reforma e as pensões de reforma não são apenas questões sociais, são também questões pessoais. A sociedade precisa de estabelecer um sistema de pensões eficaz para que possa existir ter um determinado fundo de previdência para a reforma. As pessoas também precisam de apostar em fundos de pensões privados para aumentar os seus rendimentos na reforma. Como o Governo só pode atribuir uma pensão para cobrir as despesas básicas, o restante rendimento terá de vir de fundos privados. Não é uma boa opção depender apenas do Governo para garantir o rendimento na idade da reforma.

A outra notícia sobre este tema está relacionada com um estudo feito pela Universidade de Harvard. O estudo foi feito ao longo de 85 anos e foca-se no que os aposentados esperam da aposentadoria. A Universidade de Harvard iniciou esta pesquisa em 1938, e realizou entrevistas de reavaliação a cada dois anos, com 724 inquiridos.

Os inquiridos indicaram que sentem sobretudo falta dos colegas de trabalho e das relações sociais que construíram ao longo das suas vidas activas. Um dos entrevistados, Henry Keane, disse que depois da reforma, passou a trabalhar como voluntário numa organização sem fins lucrativos e que voltou a ter interesse na recuperação de móveis antigos, mas que sentia que ainda lhe faltava qualquer coisa. Mais tarde, quando já tinha 65 anos e voltou a ser entrevistado, Henry disse que precisava de um trabalho. Só tinha percebido depois de estar reformado que gostava de estar rodeado de pessoas. Henry deixou claro que considera o trabalho como o factor mais importante da sua vida.

A reforma do sistema de pensões em França e o estudo da Universidade de Harvard indicam que a reforma não envolve só questões financeiras, mas também questões de qualidade de vida. Prevê-se que Macau tenha uma população envelhecida em 2026. Presentemente, o Governo de Macau tem um sistema de pensões que garante a cobertura das despesas básicas.

No entanto, o acesso a fundos privados só é possível ser feito com as poupanças individuais, não é feito através de um sistema social. Cada pessoa deverá preparar-se de acordo com a sua própria situação e a quantia aplicada também será variável. Como cada vez se reformam mais pessoas, cada vez haverá mais pensões que têm de ser pagas e os encargos financeiros do Governo de Macau também aumentarão.

No caso de os fundos privados não serem obrigatórios, é duvidoso que todas as pessoas recorram a esta opção. A investigação da Universidade de Harvard sugere que os aposentados precisam de se sentir valorizados e que esse sentimento pode ser encontrado no trabalho. Por conseguinte, a idade da reforma pode ser aumentada opcionalmente, por exemplo, dos 65 para os 70 anos, para que as pessoas possam escolher trabalhar até esta idade. Se desta forma as pessoas podem continuar a sentir-se valorizadas, e também resolver alguns problemas financeiros, porque não fazê-lo?

 

Consultor Jurídico da Associação para a Promoção do Jazz em Macau
Professor Associado da Escola Superior de Ciências de Gestão do Instituto Politécnico de Macau
Blog: http://blog.xuite.net/legalpublications/hkblog
Email: legalpublicationsreaders@yahoo.com.hk

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