Manchete PolíticaEscutas | Ultimato da PJ a Au Kam San dentro da legalidade João Santos Filipe - 9 Out 2018 Questionável, mas inteiramente legal. É desta forma que os advogados ouvidos pelo HM classificam o pedido de desculpas exigido pela PJ ao deputado Au Kam San na sequência de declarações em que o deputado levantou suspeitas de realização de escutas ilegais [dropcap style≠’circle’]A[/dropcap] Polícia Judiciária (PJ) está a actuar dentro da lei quando exige ao deputado Au Kam San que peça desculpas pelas declarações em que acusou a força de segurança de realizar escutas ilegais, ou seja, sem a autorização prévia de um juiz. A situação foi explicada por dois advogados ao HM, Álvaro Rodrigues e Pedro Leal, que sublinham o facto de se tratar de um crime que exige a apresentação de queixa. “O crime de difamação é um crime particular, ou seja o ofendido pode retirar a queixa mediante um pedido de desculpas. Se alguém me difamar, eu posso abordar a pessoa e dizer que se ela me pedir desculpa fica tudo bem”, começou por dizer Álvaro Rodrigues. “Quando se trata de uma entidade pública, como a Polícia Judiciária, a questão já é mais delicada. Embora qualquer entidade pública também possa ‘negociar’ com o cidadão. Se este pedir desculpas, a PJ também pode desistir da queixa ou do direito à queixa. Está dentro dos parâmetros da forma de lidar com este tipo de crimes. Estamos a falar de crimes menores”, acrescentou. Pedro Leal partilha também esta opinião. “O direito de queixa depende da vontade da parte. A Polícia Judiciária pode perfeitamente dizer, venha cá pedir desculpas porque se excedeu”, apontou o causídico. “É uma situação legal. A PJ também pode escolher apresentar queixa e tem seis meses para o fazer. Tendo em conta a natureza do crime, não pode ser o Ministério Público a avançar com o caso, porque uma eventual investigação está dependente de queixa”, clarificou. Dúvidas sobre a actuação Se por um lado, os juristas ouvidos pelo HM não têm dúvidas em reconhecer que a PJ está a actuar dentro dos limites da lei, por outro lado questionam se esta será a melhor forma de lidar com toda a situação. “Uma vez que se trata de uma instituição pública que tem como funções prevenir e combater o crime, se atentarmos ao facto da Polícia Judiciária ter de dar o exemplo à sociedade e que as acusações podem ser entendidas como graves, apesar do crime estar dependente da apresentação da queixa, não sei se deixar passar o caso com um pedido de desculpas é a melhor forma de lidar com a situação”, ressalvou Álvaro Rodrigues. “Mas é legal”, vincou. Pedro Leal entende que a PJ deveria pedir ao deputado que provasse os factos imputados, ou seja que apresentasse provas sobre escutas feitas sem autorização prévia. “A PJ pode dizer ao deputado para pedir desculpas. Isso é legal. Agora, se eles disserem venha apresentar desculpas ou fazemos queixa, esta forma de actuar não me parece a mais correcta para um instituto público. A PJ devia pedir ao deputado que provasse os factos imputados. Só se este não conseguisse é deveria apresentar queixa”, considerou. Au Kam San tinha dito a um jornal em língua chinesa que acreditava na prática de escutas ilegais por parte da PJ e mencionou um caso em 2009. Na altura, um homem ameaçou imolar-se pelo fogo numa esquadra de Macau. Quando chegou ao local já as forças da autoridades estavam preparadas com extintores. A PJ defendeu-se com o facto de o indivíduo ter prestado declarações à imprensa sobre o assunto e ter gritado na rua, até chegar à esquadra. Por isso, as autoridades, sob a tutela de Wong Sio Chak fez um ultimato a Au: ou pede desculpas ou responde em tribunal.