Lei das rendas | Economistas expectantes quanto aos resultados

Contratos com o mínimo de três anos, aumentos das rendas a serem controlados pelo Chefe do Executivo. Dois economistas estão expectantes quanto aos resultados práticos da nova lei de rendas. Trata-se de medidas “correctivas”, mas há “dúvidas”, uma vez que os interesses envolvidos “podem ser maiores”

[dropcap style≠’circle’]A[/dropcap] proposta de lei relativa à alteração do regime jurídico de arrendamento previsto no Código Civil, ou lei das rendas, demorou a ver a luz do dia, mas os nove deputados que apresentaram o diploma conseguiram finalmente chegar a um acordo com o Governo.

Os contratos terão de ter, no mínimo, três anos em vez dos dois anos actualmente definidos por lei, sendo que o Chefe do Executivo poderá implementar um mecanismo de controlo dos aumentos das rendas, quando bem entender.

Dois economistas com quem o HM falou estão expectantes quanto aos resultados, na prática, deste diploma. Para José Sales Marques, trata-se de “uma boa medida”. “Uma coisa importante é o aumento do prazo de arrendamento para três anos. Sabemos que proprietários nem sempre respeitam o período de arrendamento de dois anos, já previsto na lei, mas é uma boa medida.”

O mecanismo a implementar pelo Chefe do Executivo terá sempre um carácter provisório, consoante o desempenho do mercado imobiliário. Na visão de Sales Marques, não deveria ser criado um mecanismo permanente para o controlo das rendas, por ser “um pouco contraproducente”.

“Não me parece que estaria de acordo com os princípios do mercado. Esta é uma medida correctiva, que integraria como uma política pública, que está sujeita a alterações consoante as necessidades e um conjunto de circunstâncias. Deve ser encarada como uma medida que deve entrar em funcionamento como um mecanismo correctivo”, apontou ainda.

Não chega

Para Albano Martins, estas novas medidas são “melhores do que nada”, mas não chegam para controlar os aumentos excessivos das rendas. “Coloca nas mãos do Chefe do Executivo uma decisão que deveria ser de política económica. O Governo deveria dizer que não autoriza que as rendas cresçam acima de determinado valor e as pessoas estariam protegidas.”

O economista alerta para os interesses no sector da parte de quem apresentou o diploma na Assembleia Legislativa. “Essa lei foi feita por deputados e alguns deles dificilmente não estarão em colisão de interesses com os seus próprios interesses, e teremos de ver a lei antes de ela sair”, diz.

Albano Martins lembra mesmo que, caso houvesse a ideia de aplicar, neste momento, o mecanismo de controlo das rendas, o Chefe do Executivo poderia alegar que não era necessário.

“Dizem que o Chefe do Executivo se vai basear nos dados da inflação, mas neste momento poderia dizer que não seria preciso coeficiente nenhum, porque, segundo as estatísticas do Índice de Preços do Consumidor, verificamos que os valores estão a baixar nas rendas, mas na prática sabemos que não é bem assim.”

“As rendas estão a subir, os imóveis também, mas o Chefe do Executivo pode dizer que a inflação está a cair. Ninguém acredita que as rendas estão, portanto, a baixar, e por isso o Chefe do Executivo pode dizer que não é necessário qualquer coeficiente, porque a inflação está em queda”, exemplificou ainda o economista.

Mais transparência

Albano Martins confessa ter “dúvidas” sobre o lado prático deste diploma. “Vamos aguardar para ver como é que as coisas vão correr. Parece-me que esta não é a melhor solução, porque vai passar a resolução do problema para as mãos do Chefe do Executivo, que não fixa, à partida, o tecto máximo de subida das rendas. Vai tomar a decisão em função daquilo que acha [ser o mais correcto].”

O economista considera que é necessária uma maior transparência num processo que demorou cerca de dois anos a ficar concluído.

“Vê-se que as pessoas não estão muito à vontade em relação ao que estão a propor, e acho que os interesses são maiores. As forças que movem o mercado fazem com que a especulação seja enorme e, como os imóveis vão sempre subindo, as rendas vão acompanhando o mercado”, defendeu Albano Martins.

12 Jul 2017

Saúde | Escorregadela obriga a pedido de desculpas

[dropcap style≠’circle’]O[/dropcap]s Serviços de Saúde de Macau (SSM) emitiram ontem um comunicado em que pedem desculpas aos cidadãos afectados por “incumprimento de procedimentos operacionais” na aplicação de larvicidas na Praça das Portas do Cerco. De acordo com a nota, várias pessoas escorregaram e caíram, tendo uma delas sido conduzida ao hospital.

O caso aconteceu na passada segunda-feira à tarde, durante a execução de um trabalho de rotina pela Equipa de Controlo de Vectores dos SSM. Os pesticidas para a eliminação de larvas estavam a ser aplicados nos canais das vias públicas junto da Praça das Portas do Cerco mas, “por incumprimento dos procedimentos operacionais, foram deixados inadvertidamente larvicidas em redor dos drenos das vias públicas, o que causou a queda de vários cidadãos, aos quais os Serviços de Saúde apresentam as suas mais sinceras desculpas”.

Quanto aos transeuntes que caíram, uma mulher de 50 anos de idade foi transportada para o hospital. Apresentava escoriações na zona do cotovelo direito e dor lombar, pelo que foi sujeita a exames, tendo recebido alta após tratamento.

Os SSM prometem reforçar a formação do pessoal em causa, para evitar casos semelhantes no futuro.

12 Jul 2017

Pátio da Eterna Felicidade | Governo continua sem planos para espaço

O Instituto Cultural já concluiu os trabalhos de reparação das velhas estruturas do Pátio da Eterna Felicidade, mas ainda não sabe que tipo de projecto vai ali desenvolver. O Governo continua sem “planos específicos” para outros pátios semelhantes

[dropcap style≠’circle’]O[/dropcap]utrora albergou pessoas, até que estas foram saindo aos poucos, à medida que as paredes das suas casas iam envelhecendo. Já ninguém reside no Pátio da Eterna Felicidade, localizado perto da Rua dos Mercadores, nas imediações das Ruínas de São Paulo.

O HM deslocou-se ao local e viu as portas cerradas e barras de aço a segurar as velhas paredes. Segundo explicou o Instituto Cultural (IC), os trabalhos de reparação das estruturas dos edifícios estão concluídos.

Não há, contudo, ideias sobre os projectos culturais ou artísticos que ali poderão ser desenvolvidos. Nem para o Pátio da Eterna Felicidade, nem para todos os outros espaços semelhantes, que guardam ainda a arquitectura chinesa de outros tempos. “Quanto a esse pátio e a outros pátios ou becos, o IC ainda não tem planos específicos”, apontou.

Interligações

Em 2014, o IC referiu que os trabalhos de reparação das estruturas neste local eram de extrema importância, por estarem relacionados com outros projectos culturais que iriam nascer no mesmo bairro. Um deles era a renovação de um edifício que deu casa à Cinemateca Paixão, entretanto inaugurada.

A renovação das casas do pátio foi mesmo considerada pelo IC como um projecto que seria “um exemplo de defesa do património”. No total, foram recuperados oito edifícios dentro do Pátio da Eterna Felicidade, tendo sido mantidas as estruturas originais, além do reforço que foi feito às colunas e na zona das telhas.

Na zona envolvente, permanecem vários edifícios antigos que correm o risco de ruína. Há meses, ocorreu mesmo a queda de parte de um edifício localizado bem ali ao lado, na Rua da Tercena, sem que tenha havido vítimas ou feridos. Enquanto isso, a zona tem florescido com a abertura de novos espaços comerciais.

Já há poucos pátios de arquitectura chinesa que permanecem habitados, sendo que a maioria continua a ter moradores que residem lá desde sempre e que, já idosos, temem em permanecer. São velhas estruturas que continuam sem um plano definido pelo Governo.

12 Jul 2017

Sentença de Ho Chio Meng conhecida na sexta-feira

[dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] ex-procurador de Macau Ho Chio Meng, que está a ser julgado desde dezembro por mais de 1.500 crimes, conhece a sentença na sexta-feira, informou a imprensa local.

Ho Chio Meng está a ser julgado, desde 9 de dezembro, no Tribunal de Última Instância (TUI). A leitura da sentença está marcada para sexta-feira às 15:00 (08:00 em Lisboa), avançaram os jornais Tribuna de Macau e Ponto final.

A informação foi confirmada num comunicado da Secretaria do TUI divulgado pelo Gabinete de Comunicação Social (GCS).

Nascido em 1955, Ho Chio Meng, que foi o chefe máximo do Ministério Público (MP) entre 1999 e dezembro de 2014, está em prisão preventiva desde o final de fevereiro do ano passado, depois de ter sido detido por suspeita de corrupção na adjudicação de obras e serviços no exercício das funções.

O ex-procurador de Macau é acusado de mais de 1.500 crimes, incluindo burla, abuso de poder, branqueamento de capitais e promoção ou fundação de associação criminosa, em autoria ou coautoria com nove arguidos, num caso que envolve também empresários, alguns deles seus familiares, os quais estão a ser julgados pelo Tribunal Judicial de Base (primeira instância).

Em causa está a adjudicação, sempre às mesmas empresas, de quase 2.000 obras nas instalações do próprio MP, entre 2004 e 2014, indicou o Comissariado Contra a Corrupção (CCAC).

As empresas envolvidas viram adjudicadas a seu favor, de forma ilegal, diversas obras e serviços contratados pelo MP, num valor superior a 167 milhões de patacas (19 milhões de euros), sendo que, deste montante, os suspeitos envolvidos terão beneficiado de pelo menos 44 milhões de patacas (cerca de cinco milhões de euros), segundo o CCAC.

O caso ficou marcado pela desistência do processo do primeiro advogado de defesa de Ho Chio Meng, Leong Veng Pun.

Em maio, nas alegações finais da defesa, a nova advogada de Ho Chio Meng, Oriana Pun, considerou não existirem provas suficientes em relação à acusação de associação criminosa.

Por estar a ser julgado no TUI, o antigo procurador não tem direito a recorrer da decisão.

O TUI é a única instância que, em Macau, é chamada a decidir sobre processos que envolvam titulares ou ex-titulares de cargos públicos.

Esta característica do sistema judicial tem sido criticada por diversos setores que sublinham que estas pessoas não têm direito ao recurso, por não haver uma instância superior ao TUI em Macau.

O caso de Ho Chio Meng é o segundo a confrontar o sistema com esta questão. O primeiro foi o do ex-secretário para os Transportes e Obras Públicas Ao Man Long, detido há mais de dez anos.

Ao Man Long, detido em dezembro de 2006, foi julgado e condenado em três processos, por corrupção e branqueamento de capitais, abuso de poder e riqueza injustificada, a uma pena única de 29 anos de prisão.

A pena máxima permitida, em cúmulo jurídico, é de 30 anos.

12 Jul 2017

Pintura | Os sentidos de Denis Murrell

[dropcap style≠’circle’]É[/dropcap] inaugurada na próxima segunda-feira uma exposição de Denis Murrell. “Para Baixo e Para Cima” está integrada no Projecto de Promoção de Artistas de Macau, uma organização da Fundação Macau (FM) que conta com a colaboração da Fundação Rui Cunha.

Em comunicado, a FM explica que a mostra reúne mais de 30 obras de Denis Murrell. Na cerimónia de inauguração será lançada uma publicação com o mesmo título da exposição.

Denis Murrell nasceu em Upper Ferntree Gully, nos arredores de Melbourne, na Austrália, em 1947. Vive em Macau desde 1989. Antes de se mudar para o território, foi durante 14 anos professor de inglês na Papua Nova Guiné e na Austrália.

Em 1995, o artista ganhou o 1.º Prémio de Pintura Ocidental na II Bienal de Arte de Macau. No ano seguinte, a sua obra “Ambos” ganhou o primeiro prémio na categoria de pintura de expressão ocidental na XIII da Exposição Colectiva dos Artistas de Macau. Em 2000, a sua pintura “Fantasia Lunar” ganhou uma medalha de bronze no Concurso de Arte Asiática do Século XX Forte Cup, em Washington. Em 2006, Denis foi seleccionado pela empresa Liquitex como Artista do Mês, tendo sido apresentado no seu website. Em 2012, o Museu de Arte de Macau realizou uma exposição que contou, entre outras peças, com mais de 20 trabalhos que Denis Murrell doara ao longo dos anos ao museu.

Considerando-se há muito um artista de Macau, sempre activo, o pintor tem participado em muitas exposições, tanto no território, como no estrangeiro. “Nos últimos anos tem-se dedicado ao ensino, transmitindo aos seus alunos as técnicas do seu estilo particular, que faz uso do acrílico, aguarelas e tinta-da-china, em toda a espécie de papel absorvente”, descreve a FM.

A inauguração está marcada para as 18h30, na Galeria da Fundação Rui Cunha. A exposição estará patente até ao próximo dia 26. A entrada é gratuita.

12 Jul 2017

Exposição | Taipei recebe a primeira exposição com temas LGBTQ na Ásia

No dia 9 de Setembro é inaugurada “Spectrosynthesis – Asian LGBTQ Issues and Art Now”. Esta é a primeira exposição de arte dedicada a temas relacionadas com a homossexualidade exibida num museu estatal na Ásia

[dropcap style≠’circle’]A[/dropcap] Formosa continua na vanguarda da luta pelos direitos civis, desta vez com um acontecimento cultural pioneiro no continente asiático: a estreia na museologia asiática estatal de um evento de cariz LGBTQ, a exposição “Spectrosynthesis – Asian LGBTQ Issues and Art Now”.

O evento decorre no Museu de Arte Contemporânea (MOCA) e estará patente ao público entre 9 de Setembro e 5 de Novembro, contando com a colaboração de 22 artistas de Hong Kong, Taiwan, Interior da China, Singapura e artistas chineses baseados nos Estados Unidos e no Canadá.

Os 50 trabalhos que constituem “Spectrosynthesis” focam-se na confluência de dois conceitos: espectro e fotossíntese. O tema central da exposição é o espectro de luz que pretende iluminar, dar visibilidade, à riqueza cultural e histórica da comunidade LGBTQ. O próprio arco-íris que simboliza o movimento representa o espectro e a diversificação que existente na própria comunidade.

A exposição tem quase meio século de criação e foi composta pelo curador Sean Hu, um local de Taiwan. As obras tocam em assuntos como a identidade, igualdade, a propensão dos media para a caça à novidade, opressão social, estigmatização, luxúria, vida e morte.

Olhar para fora

A exposição que estará patente no MOCA em Taiwan surge no seguimento de uma tendência internacional de visibilidade a um conjunto de comunidades historicamente ligadas às artes, mais normalmente no Ocidente. Ainda este ano, tanto a Tate Modern, como a Tate Britain organizaram mostras de larga escala dedicadas aos feitos artísticos de criadores LGBTQ.

Um dos incontornáveis destaques da exposição, que é inaugurada em Setembro, é o trabalho “Muted Situation #5: Muted Chorus”, de Samson Young. O artista de Hong Kong, que usa o som como forma de expressão, apresenta uma performance de palco, uma composição de coro, sem qualquer projecção consciente de notas musicais. Este método permite revelar sonoridades que normalmente não estão incorporadas em composições musicais, tais como as respirações dos cantores, os sons produzidos pelo corpos dos artistas e o barulho das pautas musicais a serem folheadas. Tudo entra na performance, numa peça sonoramente inclusiva.

Noutra vertente, o artista de Taiwan, Ho Chun-ming, apresenta uma selecção de 13 quadros intitulada “Man Hole”, cada um com duas composições, que resultaram de uma série de entrevistas conduzidas pelo artista em 2014. Durante as conversas, o pintor convidou os “modelos” a desenharem num pedaço de papel algo representativo da sua vida. Em seguida, o pintor “responde” aos testemunhos em papel preto. A série pretende encapsular em tinta as memórias das pessoas, os desejos, segredos, perdas e explorações.

Em comunicado, Pan Sheau Shei, director do MOCA Taipé, refere que “a arte contemporânea deve ser agradável aos sentidos mas, também, responder a assuntos de relevo cultural que permitam o diálogo com o público, abrindo horizontes e entendimento do mundo”.

Esta exposição surge numa altura de avanço em termos de direitos civis com a legalização do casamento entre pessoas do mesmo sexo em Taiwan, mais uma vez, pioneiro no contexto asiático.

12 Jul 2017

Liu Xiaobo | Governo chinês não cede a pressões

[dropcap style≠’circle’]U[/dropcap]m jornal oficial do Partido Comunista Chinês (PCC) disse ontem que a China é agora mais “forte e segura” e “não cederá” perante a pressão internacional no caso do Nobel da Paz Liu Xiaobo, que está hospitalizado. Após as petições internacionais a Pequim para que liberte e deixe sair Liu do país, o jornal considera que “forças” do ocidente estão a politizar o caso.

“As autoridades tiveram em conta os sentimentos da sociedade ocidental e não têm qualquer intenção de utilizar Liu como moeda de troca”, apontou o Global Times, jornal em inglês do grupo do Diário do Povo, o órgão central do PCC.

Condenado em 2009 a uma pena de 11 anos de cadeia por subversão, Liu Xiaobo, 61 anos e prémio Nobel da Paz 2010, foi colocado em liberdade condicional em meados de Junho após lhe ter sido diagnosticado, em Maio, um cancro no fígado em fase terminal. Desde então, o dissidente está internado, sob vigilância, no hospital universitário n.º 1 de Shenyang, na província Liaoning, nordeste da China.

Os Estados Unidos e a União Europeia e organizações de defesa dos Direitos Humanos têm apelado a Pequim para que deixe Liu e a sua família procurar tratamento médico no estrangeiro. O Governo, no entanto, defende que o dissidente está a receber o melhor tratamento médico possível na China. Pequim permitiu este fim de semana que dois médicos da Alemanha e EUA pudessem ver o paciente.

O Global Times recorre às declarações de um dos especialistas para argumentar que Liu não deve sair do país. O diário cita o médico alemão que diz não crer que Liu possa receber na Alemanha melhor tratamento médico do que o que está a receber na China.

O vídeo difundido pela imprensa chinesa, no entanto, dura apenas alguns segundos e está claramente editado, de forma a mostrar apenas essas declarações. As declarações do médico norte-americano, Joseph M. Herman, não foram, entretanto, reproduzidas.

“A questão é, se os médicos chineses estão a fazer bem e os médicos alemães não podem fazer melhor, e tendo em conta que existem riscos em transportar o paciente, porque é que determinadas forças fora da China insistem em dar tratamento médico no estrangeiro e em pressionar o Governo chinês”, questiona o editorial.

“Trata-se do tratamento médico de Liu? Parece que não”, afirma.

12 Jul 2017

António Costa sugere à China incluir porto de Sines na nova Rota da Seda

Foi ontem a inauguração da rota Lisboa-Pequim. O primeiro-ministro falou da vocação portuguesa e tentou convencer os chineses a incluir Sines no projecto Uma Faixa, Uma rota.

[dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] primeiro-ministro português, António Costa, insistiu ontem na “posição capital” do porto de Sines, Setúbal, para ser incluído na Nova Rota da Seda, um projecto internacional de infra-estruturas proposto pela China. “Não ignoramos como o porto de Sines tem uma posição capital para poder vir a ser, ao nível das rotas marítimas, uma peça fundamental desta iniciativa”, afirmou durante a cerimónia, num hotel de Lisboa, de inauguração dos voos directos Lisboa-Pequim, com a presença do presidente do parlamento da China, Zhang Dejiang, de visita a Portugal desde segunda-feira.

“Uma Faixa, Uma Rota” – versão simplificada de “Faixa Económica da Rota da Seda e da Rota Marítima da Seda para o Século XXI” – diz respeito ao projecto de investimentos em infra-estruturas liderado pela China, que ambiciona reavivar simbolicamente o corredor económico que uniu o Oriente o Ocidente.

Esta iniciativa abrange mais de 60 países e regiões da Ásia, passando pela Europa Oriental e Médio Oriente até África.

Divulgado em 2013 pelo Presidente chinês, Xi Jinping, a Nova Rota da Seda visa reactivar a antiga via comercial entre a China e a Europa através da Ásia Central, África e sudeste Asiático.

O projecto inclui uma malha ferroviária, portos e auto-estradas, abrangendo 65 países e 4,4 mil milhões de pessoas, cerca de 60% da população mundial.

Em Maio, o secretário de Estado da Internacionalização, Jorge Costa Oliveira, agora demissionário, esteve em Pequim para propor às autoridades chinesas “uma rota marítima até Sines e que a rota da seda terrestre ferroviária, que já vai de Chongqing até Madrid, vá um pouco mais e chegue a Sines”.

António Costa disse ontem esperar que os voos directos Lisboa-Pequim, a partir de 26 de Julho, sejam um reforço de Portugal como “grande ‘hub’ intercontinental” (centro de operações). Costa destacou que a rota vai ser operada pela Beijing Capital Airlines (BCA), do grupo Hainan Airlines (HNA), que é “hoje indirectamente accionista da TAP”. “Isto significa que, com a abertura desta linha, nós reforçamos a dimensão de Portugal como grande ‘hub’ intercontinuental. Já somos o grande ‘hub’ para o Brasil, o grande ‘hub’ para África”, recordou.

“Com a abertura destas rotas para Oriente”, afirmou ainda, Portugal pode transformar-se num ‘hub’ estratégico para fazer aquilo que, ao longo da História, Portugal e os portugueses sempre fizeram, unir povos, unir culturas, abrir rotas, abrir portas”.

Para António Costa, a abertura desta rota Lisboa-Pequim tem um “enorme simbolismo” e “é a nova rota da seda do século XXI”.

O chefe do executivo sublinhou o contributo da comunidade chinesa residente para o desenvolvimento do país e lembrou o “investimento activo” da China em Portugal.

Com esta rota, noves meses depois de ter sido acordada durante uma visita de Costa a Pequim, o Governo espera que o actual número de frequências (três) venha a aumentar e que haja uma diversificação de destinos em Portugal, designadamente para o Porto.

12 Jul 2017

Viver as paisagens

Alportel, 3 Julho

[dropcap style≠’circle’]D[/dropcap]esço, em boa companhia, à serra algarvia ao encontro do crocodilo-mor, João de Azevedo. Fomos recolher as cores fortes, primárias, solares que assombrarão a galeria nos próximos dias. Acabadinho de cumprir meio século a pintar com diletante militância, o seu percurso não se resume ao trabalho sobre a cor, ainda que ela tenha a importância de um mergulho nas raízes, de um encontro com os primitivos de sempre e de agora, os que procuram o sabor do orvalho, o poiso do olhar da aurora nas coisas. As cores, bebidas das muitas paisagens onde se desfez, começando pelo mar natal, servem temas de sombra e assombro: os barcos, os barcos logo carregados de refugiados, os barcos-caixão, o corpo, nossa paisagem portátil, erotismo, o rosto, autorretratos, o garrote, depois ícaro, sinal maior das utopias onde se fez e desfez, depois os crocodilos, por causa de Timor e de um regresso à pintura largamente simbólico. Agora, e também isso mostraremos, regressam os empurrados da vida, mas em fundo negro, corpos atirados para a frente, com as mulheres nuas a rasteirar quem foge (ilustração algures na página).

Sentámo-nos a mesa, de que outro modo podia ser?, a mastigar paisagens, a das ervas aromáticas que temperaram a noite, outras de verduras vizinhas, mas sobretudo as das muitos lugares (Níger, Moçambique, Holanda, Itália, Timor) e pessoas onde foi montando tenda. E semeando, que trabalhou muito com sementes. Juntou-se a nós um velho professor, o comum amigo Eduardo Campos Martins, que quase me empurrava para as sociologias, há muitas luas. Tantas luas e tantas vidas perdidas pelo caminho. Andámos desencontrados, por ser ele também da tribo dos nómadas, sendo eu mais árvore. E refrescado limoeiro me senti a beber os ventos naquela noite do princípio dos tempos.

Joaquim Casimiro, Lisboa, 5 Julho

São as coincidências que nos governam. O Pedro [Salgado], que anima o Grupo do Risco, em viagens de olhos e mãos atentas às paisagens de selvagem natureza, oferece-me o resultado da expedição mais recente, em Junho de 2016, ao Príncipe. E que contém o volumoso álbum além das ilustrações de aves e caranguejos, de pássaros e árvores, registos dos que caminham sobre a atenção? O mangal, em todo o seu sombrio esplendor. Ora, por estes dias, ando encantado com Ponta Gea, o mais recente – que dizer, romance? Talvez, mas não explica tudo. Livro de viagem a um lugar chamado infância? Memórias do que só agora existe? – de João Paulo Borges Coelho. Um dos fragmentos relata a travessia do… mangal, lugar onde a terra e o mar se cruzam de um modo tal que deixam de ser um ou outro! Deslumbrante viagem iniciática, contada como se de ilustração científica se tratasse, sendo a ciência aqui a da aventura e ao nível de um Melville ou de um Stevenson. Não há por ali moral, claro, mas tomo nota que somos obrigados a atravessar as movediças paisagens para descobrir o rosto da morte. Desencontrei-me do João Paulo, por exemplo, em Moçambique, aqui há atrasado, mas a elegante Maria Helena convocou-nos para a sua mesa. Falámos, conversámos, historiámos. Recuperámos, quem sabe, algum do atraso. O dia vinha tintado de tristeza, mas a noite mudou-lhe o tom.

CCC, Caldas da Rainha, 9 Julho

Naquele tempo, não via necessidade de fazer colecções na abysmo. Ei-las que surgem, de modo orgânico, ou não se tratasse de silvestre jardim. Na capa, o Sal [Nunkachov] coreografou pequena e desfocada dança de corpo nu e ramo. Ajudou a fazer um programa. Não a nomeámos, mas existe doravante, esta dedicada aos micro-contos, e existe mais ainda por se iniciar com Insanus, do Carlos (duplamente) Querido. Ou talvez seja nome seu a epígrafe roubada a Flaubert, afinal, a entrada para «livro» do seu Dicionário das Ideias Feitas: «Quel qu’il soit, toujours trop long.» Este livro vai durar, vaticino, de tão longa que será a sua permanência nos leitores. Nestas peças de relojoaria onde nada sobra ou falta, o absurdo toma as vezes de pano de fundo para o encaixe em movimento das personagens. Breves, mas intensas. Gente que consegue viajar no tempo, tornar-se invisível, perder as palavras, enlouquecer por via de um quotidiano gesto. As minhas segundas leituras floresceram no horto do absurdo, com plantas e jardineiros como Beckett ou Henrique Leiria, Jarry, Camus ou Mário de Carvalho. Descobrimos que o dito cujo cresce como espelhos de circo da nossa relação com o mundo. Por ele acedemos à matéria primeira dos objectos e dos gestos. Com a subtileza da maresia, sente-se ainda a ruralidade, essa peculiar atenção à terra, a rimar ironicamente com um Deus que protege quem se aproxima das margens, dos precipícios, dos abysmos. O Carlos, sendo mais homem bom que juiz, foi sendo, nos andamentos mais recentes, um verdadeiro mecânico de paisagens. Curiosamente, ou nem por isso, com ele os timbres mais graves da liberdade. Personagens e autores, andam presos pelo umbigo, bem o sabemos. No conto «Sombras», sublinho, portanto regressando a uma das muitas infâncias: «Fazíamos os mesmos gestos, em simultâneo, numa harmonia sem arestas, até que um dia comecei a perceber de que era ela quem tomava a iniciativa. Percebe o que lhe digo? A minha sombra movia-se, e eu imitava-lhe o movimento.»

Imitar o movimento das sombras, não será vocação para um editor?

Horta Seca, Lisboa, 10 Julho

Começo a semana de costas, a mirar a que passou. A minha-terra-agenda fez-se confluência de rios-projectos, ao mesmo tempo adubada de desilusões e amarguras. Clássicas tragédias cheias de futuro de par com contemporâneos do risco, fotografia e ensaio, talvez ensino. Dá-me jeito a melancolia, nas manhãs de segunda… E Lucebert, traduzido por Jos van den Hoogen, que desceu, com Daniel Rocha, de outra serra ao meu encontro: «o abraço deixa-nos num jogo desesperado/com o vazio/ por essa razão procurei /a língua na sua beleza/ onde ouvi que de humana não tinha mais/ do que os defeitos de pronúncia da sombra/ da luz ensurdecedora do sol».

12 Jul 2017

China Gate – o portão de entrada

China Gate, documentário realizado há seis anos e galardoado com diversos prémios internacionais

[dropcap style≠’circle’]J[/dropcap]á anteriormente tinham sido feitos alguns documentários sobre os exames de entrada nas Universidades, mas este tornou-se inesquecível pela angústia que nos transmite.

A história desenrola-se um três locais geograficamente distintos, onde se espelha a situação que a nova geração chinesa tem de enfrentar.

Em Huining, província de Gansu, os estudantes reúnem-se ao final do dia, para estudar numa zona recreativa do campus. Levam água e comida e só fazem umas curtas pausas para ir à casa de banho. Estão totalmente concentrados nas montanhas de trabalhos para preparação dos exames. Mesmo depois da meia-noite, hora do recolher, alguns continuam a estudar debaixo dos lençóis à luz das lanternas. E vocês perguntam porquê. Porque, para estes miúdos, este Exame é muito mais do que uma prova: é a sua única hipótese de ascensão social. Numa aula, um dos orientadores grita para os alunos: “Se vocês são demasiado burros para atingirem os vossos objectivos, mostrem-me ao menos que conseguem suar!”

Se entrevistássemos um destes jovens, ele diria: “Eu não nasci com os privilégios dos rapazes da cidade, mas tenho confiança em mim. Posso mudar o meu futuro.” Huining tornou-se famosa pela elevada percentagem de alunos que conseguem aceder à Universidade. Aqui, os estudantes aprendem para sobreviver. Para eles, o sistema de acesso à Universidade é sagrado. É como atravessar um portão inacessível e muito bem guardado. O vencedor do desafio entra na cidade consagrada e numa nova vida.

De Huining passamos para Pequim, o segundo lugar do documentário. Centenas de milhares de jovens acabados de se graduar reúnem-se em Tianjialing. Muitos vieram de zonas rurais e chegaram à capital por via do exame de acesso. Agora vão lutar para ficar. Têm à sua espera uns salários miseráveis que mal chegam para garantir as necessidades básicas. A próxima escolha vais ser: ficar ou partir. Todos partilham um sonho: “Pequim não é a minha terra, mas pode vir a ser a terra do meu filho.”

Vão fazer todos os esforços para ficar na capital. Se esta ambição se revelar impossível, resta-lhes, antes de se despedirem dos seus sonhos gorados, ir assistir ao ritual do hastear da bandeira e depois partir para casa, num qualquer lugar remoto do país. Para os que ficam, todas as preocupações, lamentos e a ansiedades diárias valem a pena, porque as melhores coisas da vida estão todas na capital.

O terceiro lugar é Xangai. Zhang Jie é oriunda de uma família normal, no entanto toca e dá aulas de piano para ganhar a vida. Tem ainda um segundo trabalho, mas o dinheiro continua a não ser suficiente para as despesas do dia a dia. Embora tenha nascido na cidade, a precaridade que enfrenta torna-a semelhante aos jovens provincianos.

Na China, desde há muito tempo, o sistema do exame de acesso à Universidade passou a ser a pequena janela de oportunidade para mudar o destino. É a única opção para a maior parte dos jovens que batem em desespero a este assustador portão de entrada.

12 Jul 2017

A Biologia do Amor

[dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] complexo sistema hormonal que cada um de nós possui alimenta as sensações amorosas do nosso corpo. Nós sabemos quando estamos com tesão, apaixonados ou enamorados porque interpretamos os sinais ao nosso redor, ao mesmo tempo que interpretamos os sinais do nosso próprio corpo e mente. Há quem vá ainda mais longe para perceber estes sistemas que nos sustentam, ao ponto de explorar estas normais palpitações corpóreas para um mapeamento mais fidedigno do amor – da sua biologia, fisiologia e anatomia.

Há neurocientistas por todo o planeta a perceber como é que o cérebro trabalha quando se apaixona ou quando se ama. Porque queremos perceber melhor estes processos? Porque assim podemos trabalhar com as melhores estratégias para garantir (escolher) um bom parceiro e assim investir num relacionamento duradouro e feliz. A investigação está tão avançada que já sabemos bastante acerca das zonas cerebrais que são activadas quando estamos apaixonados; conseguimos explorar o comportamento sexual e as suas bases inatas – ou as suas tendências evolutivas – e tenta-se perceber porque é que o amor acontece, se não é o cupido a lançar umas setas pr’áli e pr’acolá, que raio se passa então? Todas estas tentativas de desmanchar estes mecanismos poderiam desfazer a magia do amor romântico mas, lá por sabermos a receita do melhor bolo de chocolate do mundo, não quer dizer que vamos deixar de ter prazer em comê-lo.

Contudo, esta visão atomista do amor – que é feita de mecanismos e processos cerebrais – mostra-nos uma realidade descontextualizada do mundo vivido. Por isso é que uma das mais conhecidas investigadoras na área do amor e das neurociências, Helen Fisher, é uma optimista acerca da história do amor e do seu futuro. Eu cá aconselho muita cautela nestas interpretações. Não só porque sou uma pessimista, mas porque não conseguiria funcionar sem uma representação do mundo complicado em que vivemos.

Será que o amor se manteve o mesmo ao longo de tantos de existência da nossa espécie? Que são entre 200.000 e 100.000 anos? Eu diria que não. O amor, que é uma forma tão inata de ser, de estar e de cuidar, por mais natural que possa parecer, não é totalmente reproduzida de geração em geração. O sexo, que também é daquelas necessidades biológicas básicas das nossas vidas, também não se manteve o mesmo na nossa espécie. Estas necessidades levam uma roupagem cultural e social que lhe conferem variabilidade e imensa criatividade – que é trabalhada e transformada em conjunto.

Por exemplo, quando alguém me vem dizer que o amor em nada se alterará mesmo que as nossas artes de sedução se tenham alterado drasticamente (e aqui estou a pensar nos auxiliares tecnológicos), porque os mecanismos do amor (no cérebro) são sempre os mesmos… Eu pergunto-me: exactamente como? Quando é que nos limitamos a sentir o corpo como um ditador de funções e não ouvimos as nossas complicadas cabecinhas acerca de quem somos, onde estamos, para onde queremos ir ou do que é que estamos rodeados?

Por mais que se queira reduzir o amor a um processo neuro-cognitivo eu não deixo de pensar no conteúdo deste processo que é muitas vezes ignorado (e dado como redundante) nestas perspectivas mais neurológicas. Não estou de todo a julgar o ser humano como umas tabulas rasas do sexo e do amor e a pensar-nos totalmente permeáveis a tudo o que acontece à nossa volta. Nada disso! O amor há-de ter uma essência semi-universal para a forma como nos relacionamos e criamos laços vinculativos com os nossos parceiros românticos e amantes. Mas que as formas de expressão são mais que muitas, disso não tenho dúvidas nenhumas. O sexo transforma-se não só naquilo que precisamos, mas naquilo que desejamos que o sexo seja – e o amor também.

12 Jul 2017

Parlamentos de Portugal e da China assinam memorando

[dropcap style≠’circle’]O[/dropcap]s presidentes dos parlamentos de Portugal e da China assinaram ontem um memorando de entendimento, pelo qual se comprometem a reforçar os instrumentos jurídicos e políticos para aumentar a cooperação económica entre os dois países. Este documento foi assinado na Assembleia da República, no âmbito da visita oficial do presidente do Comité Permanente da Assembleia Nacional da República Popular da China, Zhang Dejiang, a Portugal, que é a primeira ao país de um titular deste órgão de soberania chinês.

No memorando, Ferro Rodrigues e Zhang Dejiang referem que os dois parlamentos irão desenvolver esforços “para tirar o máximo proveito do papel dos órgãos legislativos na promoção da cooperação entre os dois países”. “No âmbito das suas competências, ambas as partes apoiarão os respectivos governos no sentido de se aperfeiçoarem os documentos e consolidarem as bases jurídicas para a cooperação bilateral em todas as áreas”, salienta-se no texto do acordo.

Em concreto, a Assembleia da República e a Assembleia Popular Nacional da China comprometem-se a fiscalizar e impulsionar os respectivos governos “na implementação dos acordos de cooperação em todos os domínios, reforçando as sinergias entre as suas estratégias de desenvolvimento”. Especifica-se depois no texto que a cooperação abrange a iniciativa “Uma Faixa, Uma Rota”, “a fim de criar um melhor ambiente jurídico e político para incrementar a confiança política mútua, promover a cooperação económica e comercial e o intercâmbio entre os dois povos”.

Pelo mesmo memorando, os parlamentos português e chinês assumem que irão desenvolver esforços para “promover o estabelecimento de contactos regulares entre comissões, grupos de amizade e serviços administrativos” dos dois órgãos de soberania. Uma medida que visa reforçar “o intercâmbio e a aprendizagem mútua de experiências no que toca às relações bilaterais, à governação e ao desenvolvimento da democracia e do Estado de Direito”.

“Ambas as partes empenhar-se-ão activamente no reforço da coordenação e colaboração no âmbito da União Interparlamentar e de outras organizações parlamentares internacionais e regionais, salvaguardando os interesses comuns”, acrescenta-se no documento.

12 Jul 2017

AL | Antigos rostos pedem renovação e dizem que há mais populismo

Quase tudo mudou desde que a Assembleia Legislativa da era RAEM começou a operar. Antigos deputados como Jorge Fão e João Manuel Baptista Leão falam das práticas populistas levadas a cabo por alguns tribunos, por culpa de Hong Kong. Iong Weng Ian defende a substituição dos velhos pelos mais novos

[dropcap style≠’circle’]F[/dropcap]oi há tanto tempo que João Manuel Baptista Leão foi deputado que a memória falha. É hoje mais difícil recordar os momentos de quando esteve na Assembleia Legislativa (AL), a partir da legislatura de 1999/2000. Esta foi uma das antigas vozes do hemiciclo que aceitou recordar o passado e falar do trabalho desempenhado pela AL nos dias de hoje.

João Manuel Baptista Leão é membro da comissão que elege o Chefe do Executivo, além de ser dirigente de uma associação que organiza cursos de formação contínua para adultos, em parceria com a Universidade Cidade de Macau.

A AL que deixou já não é a mesma mas, na sua visão, isso não é necessariamente mau. “Tudo mudou. Antes da transferência de soberania, a AL podia, por própria iniciativa, produzir uma lei. Depois deixou de ter este direito e cabe ao Chefe do Executivo autorizar previamente.”

Foto: HM

Este é o primeiro exemplo de mudança apontado pelo antigo deputado, mas João Manuel Baptista Leão fala ainda da maior representatividade social que hoje existe, pelo facto de o hemiciclo ter 33 deputados. Há, contudo, falhas a apontar.

“A AL deveria analisar melhor as leis, ter mais tempo para os seus trabalhos. Os deputados deveriam trabalhar a tempo inteiro e não a tempo parcial, porque precisam de mais tempo para analisar as leis”, disse ao HM.

Ao olhar de fora para a casa política que já foi sua, João Manuel Baptista Leão considera que é altura de os jovens assumirem a dianteira do poder legislativo.

“Já é altura de dar oportunidade aos jovens para se candidatarem. Há pessoas que estão na AL há muitos anos e é altura de alterar o elenco. Os mais velhos têm de entregar os seus lugares.”

Jorge Fão, que foi deputado há 12 anos, diz que nunca foi homem de querer ficar na AL por muito tempo. “Há quem goste de ficar ali eternamente, não foi o meu caso, porque fiquei ali uns anos, conheci os cantos à casa e não me encostei.”

Hoje é dirigente da Associação dos Aposentados, Reformados e Pensionistas de Macau, sem nunca ter deixado de ser uma voz activa nesta área.

Foto: Sofia Margarida Mota

Estabelecendo uma comparação com o seu tempo, Jorge Fão, que foi número dois de David Chow, acredita que hoje o hemiciclo é mais populista, muito por culpa de actos de alguns deputados, como a apresentação de cartazes nos debates.

“No meu tempo havia debates mais sérios, com menos fogos-de-artifício, por assim dizer”, apontou. “Hoje em dia está na moda o populismo, que se verifica em toda a parte, como em Hong Kong. Em Taiwan este populismo existiu uns tempos, mas verificam-se hoje menos debates desse género. De Hong Kong alastrou para Macau.”

Jorge Fão recorda que alguns deputados “começaram a levar cartazes para os debates, a levar bonecos para cima da mesa”. “Nunca vi uma coisa semelhante nos parlamentos em Portugal ou no Reino Unido. Isto está aliado a uma certa imaturidade política e ao facto de as pessoas quererem fazer um pouco de show-off. Algumas declarações não têm fundamento e não passam de um embuste eleitoral para enganar os eleitores menos informados ou atentos.”

Menos debates, mais leis

Jorge Fão e David Chow chegaram a ser autores de um projecto de lei sindical que, à semelhança de todos os outros que se seguiram, não foi aprovado. Para Fão, antes a AL tinha mais iniciativa legislativa, algo que faz falta nos dias de hoje.

“A AL tem realizado um trabalho inquestionável, mas não vejo muito trabalho legislativo a partir da própria Assembleia. A entidade que legisla praticamente não tem apresentado qualquer projecto digno de registo. A esmagadora maioria dos articulados são propostos pela própria Administração”, diz, falando “num certo desequilíbrio.”

“No meu tempo conseguimos apresentar os nossos projectos, e não foram poucos. Nem todos foram aprovados, como é natural, mas muitos foram apresentados, e subscritos por vários deputados”, recorda.

Hoje há mais pedidos de debates apresentados pelos deputados mas, para Jorge Fão, isso não é um sinal de amadurecimento político do hemiciclo.

“Verificam-se mais debates, há uma maior participação por parte dos deputados, nomeadamente no ano em que estão marcadas eleições. Isto é uma questão de visibilidade e tem a intenção de caçar votos. Todo este tipo de show-off não passa de populismo. Não tem qualquer interesse para a comunidade ou sociedade”, acusa.

Tal como João Manuel Baptista Leão, também Jorge Fão considera importante chamar mais jovens para a política, algo que se verifica nas próximas eleições legislativas, agendadas para 17 de Setembro.

“Vão participar pessoas mais jovens, que querem lançar-se na vida política. Isto é muito saudável, até porque temos de rejuvenescer. Vai haver caras novas e faço votos para que se possam inteirar das questões de Macau e encontrar as melhores soluções para a sociedade.”

Da AL para a APN

Iong Weng Ian foi deputada com ligações à Associação Geral das Mulheres de Macau (AGMM). Actualmente é mandatária da lista de Wong Kit Cheng para as eleições deste ano e desempenha o cargo de deputada por Macau à Assembleia Popular Nacional onde, junto de Pequim, apresenta algumas ideias em prol do desenvolvimento do território.

Além disso, a ex-deputada fala de um intenso trabalho desenvolvido junto das comunidades que mais precisam. “Quando tomei a decisão de sair da AL já tinha o objectivo de deixar o lugar aos mais jovens. Continuei a participar nos serviços sociais, sobretudo nos assuntos ligados às mulheres.” 

Hoje olha para a AL como um local onde “há vários aspectos por desenvolver”. “Os diferentes grupos têm diferentes tópicos a que dão destaque mas, como membro da AGMM, quero que a AL trabalhe mais na área dos assuntos familiares, que legisle sobre as garantias dos idosos e dos inválidos, e que aborde a questão da habitação”, aponta.

Convidada a fazer um comentário sobre as eleições deste ano, Iong Weng Ian lembra que, este ano, a concorrência é muito grande na eleição pelo sufrágio directo, pelo facto de existirem 25 listas. “Não será fácil a reeleição, mas queremos dar o nosso melhor e os esforços nas eleições.”

“Macau é uma sociedade democrática, quantas mais comissões de candidatura houver melhor, e todos contribuem para o desenvolvimento de Macau com os seus conhecimentos e experiências. É bom haver muitas comissões de candidatura. Espero que as eleições deste ano decorram de forma justa e limpa”, declarou a antiga deputada.

Iong Weng Ian faz ainda algumas críticas ao trabalho do Executivo. “Acho que a sociedade se desenvolveu nos últimos anos, tal como o Governo. Mas o Governo pode fazer melhor em relação às políticas de apoio à família, tendo em conta o desenvolvimento dos jovens e dos idosos.”

 

 

Sistema de contagem de votos para continuar

Num ano em que vários grupos optaram por apresentar listas separadas, na expectativa de conseguirem melhores resultados eleitorais, os antigos deputados consideram que não é necessário alterar o actual sistema de conversão de votos em mandatos. “Neste momento, há várias opiniões sobre este assunto, mas podemos continuar com este sistema. Tentamos lutar pelos votos dos eleitores com base neste método”, referiu Iong Weng Ian. Para Jorge Fão, não é aconselhável alterar o sistema nesta fase. “Este é um método de Hondt adulterado, mas traz vantagens, porque o território é pequeno e não temos partidos políticos. Como tal, este tipo de método serve para aqueles que querem participar na vida pública. Os grupos mais pequenos têm hipótese de ser eleitos. Não é oportuno mudar o sistema”, defendeu o antigo deputado.

Mais juristas e tradutores precisam-se

Se no tempo de Jorge Fão a AL tinha falta de tradutores e de juristas, hoje esse problema é ainda mais visível. “Todos os deputados têm estado muito atarefados, porque as propostas de lei do Governo são mais. Acho que o número de juristas que trabalham na AL é pouco, e deveriam pensar em recrutar mais pessoal de apoio, com experiência e que perceba a legislação local. Quanto aos intérpretes-tradutores, o grupo também deve estar desfalcado, pois já no meu tempo sentia a falta de tradutores. Estou a ver que continua a existir essa situação”, frisou.

11 Jul 2017

Eleições | Activismo para a Democracia submete documentos

[dropcap style≠’circle’]S[/dropcap]ão os cavalos-de-batalha do costume aqueles que ontem foram apresentados pela Associação Activismo para a Democracia, que participa em Setembro nas eleições legislativas. A equipa encabeçada por Lee Kin Yun esteve ontem na Comissão de Assuntos Eleitorais da Assembleia Legislativa (CAEAL) para entregar a lista de candidatos e o programa político.

Ao todo, são cinco os aspirantes a deputados à Assembleia Legislativa: além de Lee Kin Yun, do grupo fazem parte Ng Sio Hong, Tam Kai Chong, Leong Seac e Chu Kai Chon. O programa político tem como grande objectivo fomentar o processo democrático em Macau, lutando pelo sufrágio universal nas eleições para a Assembleia Legislativa e para o Chefe do Executivo.

Lee Kin Yun destaca ainda outras prioridades, como a implementação do sistema de responsabilização dos funcionários públicos, a protecção da liberdade de imprensa, a definição da lei sindical, a diversificação adequada da economia e a ascensão profissional dos jovens.

À margem da entrega da documentação à CAEAL, o activista contou que uma fotografia sua foi usada indevidamente na criação de uma conta de uma rede social, que serviu para “atacar um candidato de apelido Kou”. O líder da Activismo para a Democracia assegura que não tem qualquer responsabilidade no ocorrido, pelo que vai apresentar queixa à Polícia Judiciária.

11 Jul 2017

Jogo | Lionel Leong pondera revisão à lei de concurso de concessão

O secretário para a Economia e Finanças admite a possibilidade de rever a legislação que regula os concursos públicos de concessão de jogo. Fica em aberto se a figura das subconcessionárias será para manter, assim como o número de concessionárias

[dropcap style≠’circle’]“E[/dropcap]stamos a ponderar vários aspectos quanto ao concurso público mas queremos, primeiro, ouvir as opiniões da sociedade”, explicou Lionel Leong. O secretário para a Economia e Finanças debruçou-se ontem sobre o fim dos contratos de concessão do jogo, que terminam em 2020 e 2022. As declarações foram feitas à margem de uma reunião da 2.ª Comissão Permanente da Assembleia Legislativa.

Para já, o secretário explicou que ainda não existem decisões, mas que o importante será o “desenvolvimento do sector do jogo da forma mais saudável possível” e que, para tal, é essencial auscultar e analisar opiniões de vários quadrantes da sociedade.

Um dos aspectos de maior relevância é se as concessões vão manter a mesma configuração, com três concessões e três subconcessionárias. Nesse aspecto, Lionel Leong explicou que tudo está em aberto. “Na altura da liberalização do jogo, o concurso público foi feito com uma conjuntura económica completamente diferente da que temos hoje em dia”, recorda.

O secretário explica que actualmente há mais concorrência e um panorama económico diferente que deverá ser tido em conta na altura do concurso. A indefinição parece ser o ponto de partida. “O Governo tem de responder e pensar em novas formas de desenvolvimento em termos de concurso público, não eliminamos qualquer possibilidade”, perspectiva Lionel Leong.

Maduro Junho

Caso se altere o número de operadoras de jogo em Macau, um dos aspectos que terá de ser adequado para prever este novo paradigma é uma mudança ao regime legal. Mais especificamente, no concurso público “se as propostas não corresponderem à legislação em vigor, será necessário revê-la”, revelou Lionel Leong.

Para já, o governante adianta que o Executivo está a analisar várias possibilidades, na antecipação de 2020. O número de licenças, assim como os respectivos requisitos de concurso terão de se adequar ao desenvolvimento do mercado dos casinos, assim como às “várias expectativas que a sociedade tem”.

De modo a aferir se haverá necessidade de alterar os moldes do concurso, o Governo está a realizar “um estudo pormenorizado”.

Lionel Leong não escapou à evidência de que “o jogo é o pilar da economia de Macau, portanto, é necessário que tenha um desenvolvimento saudável”.

O secretário para a Economia e Finanças ainda mencionou os lucros do sector em Junho. No mês passado, os casinos do território obtiveram receitas de quase 20 mil milhões de patacas, o que representou um aumento de 25,9 por cento em relação ao período homólogo do ano passado. Os dados oficiais, porém, são um pouco enganadores. Lionel Leong explicou que, devido aos péssimos resultados de Junho de 2016, o crescimento dos lucros desta ordem “não é um aumento real”, sendo necessário ter em atenção “os dados estatísticos dos próximos meses”.

Noutro aspecto, Lionel Leong ainda destacou o bom comportamento das pequenas e médias empresas do território. “Os serviços terciários tiveram um aumento de 20,9 por cento”, explica. Esta vitalidade económica que, apesar de estar fora do sector do jogo é intimamente conexa com o mesmo, é encarada pelo secretário como um bom indicador da economia de Macau.

11 Jul 2017

Lei do Orçamento | Governo ausculta Comissariado da Auditoria

A lei do enquadramento orçamental está na recta final do processo legislativo. O Governo vai pedir um parecer ao Comissariado da Auditoria quanto a termos técnicos, enquanto a Assembleia Legislativa se prepara para elaborar o parecer antes de a lei voltar ao plenário

[dropcap style≠’circle’]U[/dropcap]ltimam-se os derradeiros detalhes para a aprovação da lei de enquadramento orçamental. Para já, o processo encontra-se numa fase de aperfeiçoamento terminológico, de forma a não causar problemas de natureza legal. “Em matéria de responsabilização, temos de ver a melhor forma para elaborar esse artigo, tendo em atenção os vários aspectos técnicos e jurídicos em análise”, explicou Lionel Leong, à saída da reunião da 2.ª Comissão Permanente da Assembleia Legislativa (AL).

O secretário para a Economia e Finanças referia-se à parte da legislação referente à responsabilidade de pessoal administrativo na devolução de fundos resultantes da quebra de regras de execução orçamental. Como existem outras leis que regem esta matéria, o Governo quer evitar sobreposições normativas. Assim sendo, Lionel Leong refere que é necessário “ouvir juristas” de modo a limar os detalhes técnicos e jurídicos da proposta.

Outro dos detalhes que necessitam de melhoria é o artigo que trata as definições legais sobre o regime contabilístico. Nesse sentido, Chan Chak Mo, presidente da 2.ª Comissão Permanente da AL, afirma que o “Governo vai perguntar ao Comissariado da Auditoria se esta redacção da lei está correcta, ou não”. Quando as imperfeições linguísticas forem eliminadas dos artigos, para evitar confusões terminológicas e legais, o processo legislativo aproximar-se-á do fim.

Orçamento mais cedo

Definidos estes detalhes de terminologia, Chan Chak Mo revela que vai “pedir à assessoria para começar a escrever o parecer”.

O presidente da comissão explica que “o novo texto de trabalho é mais rigoroso e aproxima-se mais da Lei Básica, nomeadamente nas regras sobre aprovação, elaboração e apreciação do Orçamento”. O deputado congratula-se com o facto de as regras serem mais detalhadas e o conteúdo enriquecido.

A data limite para o orçamento ser apresentado também foi outro assunto na ordem do dia, sendo que os deputados pediram ao Executivo para que proceda à apresentação até 15 de Novembro. Nesse capítulo, a resposta do Governo foi no sentido de que o Orçamento será apresentado em articulação com a ida do Chefe do Executivo à AL para a divulgação das Linhas de Acção Governativa. Esta solução visa dar ao Executivo flexibilidade para a redacção da proposta orçamental.

No que diz respeito à responsabilização, Chan Chak Mo interrogou o Executivo sobre os tipos de infracções que seriam tipificados como ilícitos em casos de má execução orçamental. “Estes casos podem abranger o abuso de confiança, o furto e o desvio de montantes”, vincou o deputado.

11 Jul 2017

APN | Lionel Leong não se recandidata

[dropcap style≠’circle’]L[/dropcap]ionel Leong não é candidato às eleições locais para a Assembleia Popular Nacional. O secretário já representava Macau no órgão nacional quando passou a integrar a equipa de Chui Sai On. Agora, e de acordo com o canal chinês da Rádio Macau, não tenta a reeleição precisamente por ter funções diferentes daquelas que tinha aquando do último acto eleitoral. O responsável pela Economia e Finanças explica que quer concentrar-se nas tarefas que tem mãos como secretário. Entre os trabalhos a executar, exemplificou, estão as missões dadas pelo Governo Central, como a diversificação adequada da economia, e a participação da RAEM na política “Uma Faixa, Uma Rota” e na Grande Baía Guangdong-Hong Kong-Macau. Questionado sobre a possibilidade de estar interessado num cargo político com maior poder do que o actual – ou seja, ser Chefe do Executivo –, Lionel Leong disse apenas estar concentrado no trabalho como secretário para a Economia e Finanças.

11 Jul 2017

Ng Kuok Cheong pede libertação de Liu Xiaobo

[dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] deputado Ng Kuok Cheong enviou ontem um comunicado em que apela à libertação de Liu Xiaobo. O Nobel da Paz encontra-se em estado crítico, devido a um cancro no fígado. O pró-democrata de Macau entende que chegou a hora de deixar o dissidente chinês sair em liberdade, para que possa ser tratado no local que desejar.

Na carta enviada às redacções, Ng Kuok Cheong escreve que Liu Xiaobo tem insistido, ao longo dos anos, que a luta que levou a cabo pela democracia não tinha como alvo as pessoas que fazem parte do regime, mas sim o próprio regime. “Apesar de ter sido detido várias vezes, rejeitou ser invadido pelo ódio, o que o levou a merecer o Nobel da Paz em 2010”, prossegue o deputado à Assembleia Legislativa.

Foto: Reuters

Ng recorda depois o percurso do dissidente chinês, condenado a uma pena de 11 anos de prisão em 2009. No mês passado, foi tornado público que lhe tinha sido diagnosticado um cancro de fígado em estado terminal.

Além da libertação sem limitações de Liu Xiaobo, que foi transferido da prisão para um hospital, o pró-democrata de Macau pede que seja dada autorização a Liu Xia, mulher do dissidente, para que possa acompanhar o marido no tratamento. O deputado defende ainda que se investiguem as circunstâncias em que esteve detido o Nobel da Paz, para se averiguar se teve acesso a tratamento de forma atempada.

O hospital onde Liu Xiaobo se encontra internado afirmou ontem que o dissidente se encontra em “estado crítico”. “A equipa nacional de especialistas pensa que o paciente está num estado crítico”, indicou num comunicado o hospital de Shenyang, no nordeste da China, declarando-se pronto a transferir o defensor dos direitos humanos para os cuidados intensivos caso seja necessário.

Condenado por subversão, Liu Xiaobo, de 61 anos, foi colocado em liberdade condicional após lhe ter sido diagnosticada a doença. O activista, intelectual e dissidente foi detido por ter participado na redacção de um manifesto conhecido por “Carta 08”, em que se exigiam reformas fundamentais no regime de Pequim.

11 Jul 2017

Lei das rendas | Contratos vão passar a ter o mínimo de três anos

Os deputados chegaram a acordo sobre a lei das rendas, que será votada ainda nesta legislatura. Os contratos de arrendamento terão o mínimo de três anos e será o Chefe do Executivo a decidir quando e qual será o limite máximo a cobrar por uma renda. Esse mecanismo será sempre “provisório”

[dropcap style≠’circle’]J[/dropcap]á há luz verde sobre o projecto de lei apresentado por nove deputados da Assembleia Legislativa (AL) em 2015, intitulado “alteração do regime jurídico de arrendamento previsto no Código Civil”.

Segundo explicações do presidente da 3.ª Comissão Permanente da AL, Cheang Chi Keong, os contratos de arrendamento, quer sejam de habitação ou para fins comerciais, terão um mínimo de três anos de duração, mais um do que está previsto na legislação em vigor.

“Decidimos passar os contratos de arrendamento para habitação também para três anos, para sermos justos. Nesses três anos o senhorio não pode mexer no contrato e, segundo o Código Civil, o inquilino pode mexer. Isto serve para proteger os inquilinos, em especial os que vêm temporariamente para Macau”, explicou Cheang Chi Keong.

O diploma vem, sobretudo, introduzir o mecanismo de definição do coeficiente máximo da renda a cobrar ao inquilino. Este será implementado por despacho do Chefe do Executivo, que passa a decidir quando é que os aumentos das rendas devem ter um travão, e por quanto tempo. O Chefe do Executivo também vai determinar quais os tipos de contrato onde se aplica este controlo.

Foto: Tiago Alcântara

“O mecanismo de coeficiente de actualização das rendas será uma medida excepcional e transitória, e só pode ser usado em determinados contratos”, adiantou o deputado.

Isto significa que a definição de um tecto máximo para os aumentos das rendas terá a duração que o Chefe do Executivo entender, dependendo da situação do mercado imobiliário.

A definição deste coeficiente terá em conta os índices económicos como o Índice de Preços do Consumidor, a taxa de inflação ou a média salarial.

“Não é que não se possam aumentar as rendas. As rendas podem ser aumentadas, desde que não se vá além deste coeficiente máximo definido pelo Governo. Quando o Governo quiser implementar este mecanismo tem de ter em conta os vários índices existentes. O Governo passa a ter uma arma para controlar os aumentos”, acrescentou Cheang Chi Keong.

Segundo o deputado, nunca houve a ideia de criar um mecanismo permanente de controlo dos aumentos das rendas.

“O Chefe do Executivo é que vai decidir quando implementa e quando cancela essa medida. É uma medida, digamos, picante, e será boa porque o Chefe do Executivo pode intervir a qualquer momento”, frisou.

Mais um centro de arbitragem

O projecto de lei prevê ainda que o Governo venha a criar um centro de arbitragem para a resolução dos conflitos de arrendamento, ainda que existam actualmente quatro centros a operar.

Cheang Chi Keong recorda que os casos poderão ser reencaminhados para os centros de arbitragem que já funcionam junto da Associação dos Advogados de Macau e do World Trade Center. “Podemos utilizar os actuais mecanismos, mas o Governo pode, segundo o projecto de lei, criar um centro de arbitragem. Cabe ao Governo decidir”, apontou o presidente da 3.ª Comissão Permanente.

Outra das regras instituídas será a do reconhecimento das assinaturas dos contratos através das assinaturas feitas noutros documentos. Tal vai permitir, na visão dos nove proponentes, a redução dos casos de pensões ilegais, pois “muitos dos documentos apresentados aquando das assinaturas dos contratos são ilegais”.

Um “consenso geral”

Cheang Chi Keong falou ainda das razões para a demora na análise deste diploma na especialidade. Nestes meses, a comissão apreciou as opiniões apresentadas pelo sector imobiliário e associações, no âmbito de uma consulta pública.

A versão final do diploma reúne, hoje, um “consenso geral”. “Poderemos assinar o parecer em breve e, de acordo com os trabalhos, é totalmente possível finalizar o trabalho até ao final do mês”, disse o deputado, que acredita que, com este diploma, o mercado imobiliário ficará numa situação mais estável.

“No futuro, o Governo poderá manter os valores do mercado mais estáveis, uma vez que as rendas ainda são elevadas. Até agora o Governo não podia mexer nas rendas, porque não tinha armas para isso”, concluiu Cheang Chi Keong.

 

“Não estamos a interferir no mercado”

À margem da reunião de ontem, a deputada Song Pek Kei, uma das signatárias do projecto de lei, garantiu aos jornalistas que não se está a intervir no mercado. “Pensamos que seria necessário ajustar o mercado privado de arrendamento com vista a um desenvolvimento mais saudável. O projecto de lei está mais detalhado e tem um elevado grau de operacionalidade, que corresponde à nossa intenção inicial de avançar com esta política”, frisou.

11 Jul 2017

Indústria | Expo Turismo em crescimento

[dropcap style≠’circle’]N[/dropcap]o final da 5.ª edição da Expo Internacional de Turismo de Macau, o balanço da Direcção dos Serviços de Turismo (DST) foi francamente positivo. O evento contou com a presença de 36 mil visitantes, o que representou um aumento de 12,5 por cento em relação ao ano passado. Foram assinados 31 acordos de cooperação. De acordo com a DST, esta foi a maior exposição entre as cinco edições, contando com uma maior área de exposição e um maior número de expositores oriundos de mais países e regiões.

O certame teve uma área total da exposição de dez quilómetros quadrados, por onde se espalharam 473 expositores de um total de 303 empresas e entidades de turismo. As companhias do sector vieram dos cinco continentes, totalizando 45 países, sendo que 19 dos quais estão abrangidos pela iniciativa “Uma Faixa, Uma Rota”, e 20 eram autoridades do turismo de províncias e cidades do Interior da China.

As áreas mais relevantes do sector foram exploradas na exposição, nomeadamente a alimentação, alojamento, transporte, entretenimento, viagens e compras. As empresas que se fizeram representar foram, sobretudo, agências de viagens, hotéis, pontos turísticos, transportes, entre outros serviços conexos com a actividade. Nas áreas de exposição, destaque para o Seminário e Bolsa de Contactos de Turismo China – Portugal.

A 6.ª edição da Expo Internacional de Turismo de Macau tem data prevista de realização em Abril do próximo ano, de forma a facilitar às entidades expositoras a promoção dos seus produtos turísticos atempadamente antes da época alta das férias de Verão.

11 Jul 2017

Estudo | Confiança dos consumidores desceu no segundo trimestre

A habitação é um problema cada vez mais difícil de resolver em Macau, depreendem os autores do índice de confiança do consumidor feito pela Universidade de Ciência e Tecnologia. Em termos globais, o optimismo está em queda

[dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] Índice de Confiança do Consumidor de Macau (ICCM) desceu no segundo trimestre deste ano. A diminuição de 1,21 por cento, em comparação com os primeiros três meses deste ano, é causada sobretudo pelo desânimo que existe em torno da habitação. Feitas as contas, o ICMM fixou-se em 85.30, numa escala de zero a 200, revelando assim que existe uma generalizada falta de confiança junto dos inquiridos.

O estudo compreende seis campos de análise, a saber: economia local, emprego, preços junto do consumidor, padrões de vida, aquisição de habitação e investimento em bolsa. O mais recente relatório da Universidade de Ciência e Tecnologia de Macau (UCTM), divulgado ontem, resulta de inquéritos feitos a 1015 residentes com mais de 18 anos, entre os dias 13 e 19 do passado mês de Junho.

Numa análise global, os autores destacam que cinco dos seis subíndices desceram no período em análise. Salva-se apenas a “economia local”, que tem vindo a aumentar e fica acima da marca dos 100 pontos, com 102.28.

A este propósito, a UCTM recorda que as estatísticas oficiais indicam que houve um crescimento de 10,3 por cento do Produto Interno Bruto entre Janeiro e Março, bastante mais do que os sete por cento verificados nos últimos três meses de 2016. A contribuir também para este aumento da confiança na economia do território estão os resultados obtidos no sector do jogo, a principal indústria da RAEM.

Desde 2009, é a primeira vez que este campo de análise ultrapassa a linha dos 100 pontos.

Emprego sem garantias

Já o optimismo em relação ao emprego diminuiu ligeiramente, sendo que continua a ser o mais alto entre todos os campos analisados. As contas da Direcção dos Serviços de Estatística e Censos indicavam uma taxa de desemprego para o período entre Março e Maio deste ano. Entre os residentes que integram a população activa, apenas 2,6 por cento se encontravam sem trabalho. Ainda assim, a percepção dos participantes no inquérito faz com que o valor se situe abaixe dos 100 pontos, com 97.45.

Também no subíndice “preços junto do consumidor” se registou uma ligeira queda, estando agora em 74.22. Para este resultado contribuiu a taxa de inflação, que tem estado a aumentar nos últimos meses.

É na aquisição de habitação que se verifica um maior pessimismo. O valor registado neste campo voltou a descer, estando fixado em 51.16. “Sugere que está a aprofundar-se a sensação negativa entre os potenciais compradores de casas”, indicam os especialistas da UCTM. Em relação ao primeiro trimestre do ano, este subíndice do ICCM desceu 4,15 por cento.

Os autores do estudo recordam que desde o fenómeno não é novo: desde 2012 que se tem verificado uma quebra de confiança a este nível.

 

O que pode melhorar

São conselhos que já foram dados noutras ocasiões, mas que são agora reiterados pela equipa da Universidade de Ciência e Tecnologia de Macau, de modo a que seja possível melhorar o nível de confiança dos consumidores. A começar, entendem os autores do estudo que é preciso aumentar a cooperação regional com a China Continental e com Hong Kong. Depois, há que promover a diversificação económica, reduzir o efeito de “certos factores externos” na economia local, consolidar os resultados obtidos na inflação, e melhorar a relação entre a oferta e a procura no sector da habitação. Convém também encorajar o empreendedorismo entre os residentes, bem como a educação, que tem reflexos directos no nível de confiança.

11 Jul 2017

Ensino | GAES organiza visita de estudantes a Portugal

O Gabinete de Apoio ao Ensino Superior vai organizar a visita de 80 estudantes de Macau a Lisboa e ao Porto durante quatro semanas. Esta viagem acontece depois de docentes e investigadores locais se terem descolado à Universidade de Coimbra para participarem no curso de formação de Verão

[dropcap style≠’circle’]A[/dropcap] viagem destina-se a alunos de Macau que estudem no território, no Interior da China, em Hong Kong, em Taiwan, no Reino Unido e noutros países. Os felizes 80 estudantes contemplados pela iniciativa do Gabinete de Apoio ao Ensino Superior (GAES) serão divididos em grupos. A viagem, com duração de quatro semanas, tem como objectivo a aprendizagem da língua portuguesa.

Esta actividade será realizada em duas fases. A primeira refere-se ao Curso Básico de Língua Portuguesa ou o exame de conhecimentos de língua portuguesa. A segunda fase é o Curso de Verão em Portugal.

Do universo de alunos concorrentes, o GAES seleccionou 277 pupilos para participarem na primeira fase do curso, entre 463 interessados. Apenas os 80 melhores alunos que se distinguiram participaram na segunda fase.

Os planos de estudo prevêem a organização de duas turmas do Curso de Verão em Portugal, uma este mês e outra em Agosto. No início de Julho partiram 36 estudantes, que frequentam um curso intensivo de Português, na Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa. O segundo grupo irá frequentar o curso na Universidade do Porto.

Além da visita a Portugal, o GAES vai organizar viagens à Austrália e ao Interior da China para que os estudantes do ensino superior de Macau desenvolvam competências ao nível do inglês e mandarim.

Professores alunos

Também uma comitiva de 20 docentes e investigadores de instituições do ensino superior de Macau estiveram em Portugal para participar no curso de formação de Verão na Universidade de Coimbra.

Os professores são oriundos da Universidade de Macau, do Instituto Politécnico de Macau, da Universidade de Ciência e Tecnologia de Macau, da Universidade da Cidade de Macau e da Universidade de São José.

O GAES realizou uma videoconferência, conduzida por um representante da histórica instituição de ensino português, para dar a conhecer aos formandos algumas informações sobre Portugal.

O curso intensivo, com duração de dez dias, abordou temas como a “Língua e Cultura”, “Direito e Administração Pública”, análises comparativas dos ordenamentos penais e civis de Macau e Portugal, leis europeias, entre outros aspectos históricos e culturais.

Este programa do GAES é organizado desde 2015 e pretende apoiar a formação contínua dos docentes das instituições de ensino superior de Macau.

11 Jul 2017

Museu de Arte de Macau apresenta “Ballada –Animamix Arte Contemporânea”

[dropcap style≠’circle’]É[/dropcap] inaugurada esta semana, no Museu de Arte de Macau, a exposição “Ballada – Animamix Arte Contemporânea”. De acordo com o Instituto Cultural (IC), a mostra é composta por 46 peças, incluindo animações, vídeos, instalações, esculturas, pinturas a óleo e pinturas ao vivo de grande dimensão. São trabalhos de artistas da China Continental, Coreia do Sul, Japão e Macau.

A iniciativa é, assegura a organização, uma representação do “campo emergente da arte contemporânea que se desenvolve no sentido da diversidade cultural, visualização de textos, virtualização surrealista e regionalização transnacional”.

A “Bienal de Animamix” teve início em 2007, pretendendo dar a conhecer, através da cooperação e de projectos de intercâmbio, as características estéticas e culturais únicas da arte contemporânea que se desenvolveu sob a influência da animação e da banda desenhada. O MAM participou no evento de arte asiática em 2014, com um projecto subordinado ao tema “Expressão Macau”. “Uma das características de Animamix é um texto narrativo repleto de assombro e mudanças, permitindo que as imagens se tornem numa linguagem visual expressiva”, sublinha o IC.

Este ano, a participação do MAM na “Bienal Animamix 2017-2018”, que tem como tema “Ballada”, faz-se ao lado de instituições como a Power Station of Art de Xangai, o Museu de Arte MoA da Coreia e o Centro de Artes Visuais de Hong Kong.

Doze artistas e grupos artísticos da China foram convidados para participar na exposição. Quanto aos participantes locais, são eles Lei Ieng Wai, Leong Man Teng e Sanchia Lau.

As obras são diversificadas. Quem passar pelo MAM poderá ver “animação de marionetes, imagens aéreas imersivas, animação fosforescente e cenas bizarras criadas com instalações de som mecânicas e itens pré-fabricados”. Diz o IC que “as obras reflectem o pensamento e a representação dos artistas sobre a narração espaço-tempo ou a visão mundial numa perspectiva contemporânea”.

Os trabalhos de grande dimensão, em formatos inovadores, serão exibidos no rés-do-chão, primeiro e segundo pisos do MAM, perfazendo uma área total de mais de 1100 metros quadrados. A inauguração está agendada para quinta-feira, sendo que a exposição pdoerá ser vista até 15 de Outubro.

11 Jul 2017

Isabel Valadão, autora de “O Rio das Pérolas”: “As palavras são o que restará de nós”

Viveu aqui na década de 1980, uma passagem de três anos que a marcou. África tinha ficado para trás, Lisboa foi o destino que se seguiu à vida no Oriente. Mais de três décadas depois, Isabel Valadão regressa a Macau através da literatura. “O Rio das Pérolas”, romance recentemente lançado pela Bertrand, conta a história de Mei Lin, uma mulher que existiu e que agora ganha uma nova vida

Viveu em Macau durante algum tempo, tendo deixado o território em 1986. Como é que surge este regresso, através da escrita, 30 anos depois?

Macau não foi mais uma passagem por um lugar que desconhecemos e que nos desperta curiosidade. Claro que também foi isso. Mas foi, sobretudo, uma etapa importante da minha vida. Angola tinha ficado para trás mas estava sempre presente nos meus pensamentos. Portugal, Lisboa, Cascais tinham apenas sido locais de passagem, apeadeiros impostos pelas circunstâncias. O regresso a Macau por este livro – uma forma de regressar que talhamos à medida dos nossos desejos e não pelos caprichos do tempo – talvez tenha a ver com a saudade mas está, muito certamente, relacionado com a minha formação em História e com o hábito de investigar o que o tempo guardou dos locais, das terras e das gentes por onde passo. 

Tem obra como romancista sobretudo em torno de África, onde viveu, continente que em muito a marcou. “O Rio das Pérolas” obrigou a uma mudança na geografia. Foi fácil esta transição?

Não foi, exactamente, o Continente que me marcou, mas Angola – embora exista uma relação de afecto entre mim e toda a África. “O Rio das Pérolas” é uma memória como são de memórias todos os livros que escrevi – frequentemente romanceadas. Se um dia deste nosso futuro tão incerto me for oferecida a oportunidade de passar por qualquer outro ponto do mundo e por lá me detiver por algum tempo voltarei a sentir-me emocionalmente compelida a investigar e a escrever sobre esse lugar e as suas gentes. A geografia é importante para o contexto. Mas o que é realmente importante são as pessoas, mesmo que algumas delas tenham de regressar da eternidade para as páginas dos romances que vou escrevendo. 

Em “O Rio das Pérolas”, há uma mulher no centro da narrativa. Convida os leitores para uma viagem entre os anos 1940 e 1960. De onde partiu esta história? Quem é a Mei Lin?

Mei Lin existiu na história de Macau. É um personagem que resgatei da vida real e coloquei no meu livro porque é um dos símbolos da mulher chinesa daquele tempo. Provavelmente, dei-lhe o brilho romanceado de uma história de encantar, emprestei-lhe uma personalidade que talvez nunca tenha tido, envolvi-a em mistérios orientais eternamente indecifráveis e ofereci-lhe um coração que ela talvez nunca tenha tido a oportunidade de conhecer. O resto da história é um romance sobre um lugar e as suas gentes… Uma espécie de fresco.

Estamos perante uma obra de ficção, mas com uma componente histórica. É licenciada em História de Arte. Sente que a sua obra ganha significado por partir de factos reais? Como é fazer este exercício de encaixe da história e da ficção?

Não existe nada na ficção que não seja, tenha sido ou venha a ser um dia uma realidade. Antes de ser historiadora sou, sobretudo, escritora e romancista. Mas é na História que me inspiro. E nela, das gentes desse mundo fora. Não existe nada de mais belo e de mais inspirador para um escritor do que as pessoas que se cruzam connosco num determinado momento ou numa esquina por onde o tempo já passou. Cada um de nós é um templo, tantas vezes misterioso na singularidade das nossas vidas, livros abertos que ninguém lê, exemplos de coragem, de altruísmo, de genialidade que o anonimato esconde na morte e enterra na campa mais profunda. Eu gosto muito de descobrir os heróis do passado e emprestar-lhes por um instante a homenagem que a vida lhes negou.

Viveu em vários continentes e teve actividades profissionais completamente distintas. Como é que surge a escrita, no meio de todas estas vivências diferentes?

A escrita chega quando tudo o mais se aproxima do fim. Chega-me numa idade mais madura, depois de todas as experiências que a vida me proporcionou. Chega-me também da necessidade de me ocupar e de me manter viva. De me manter, sobretudo, alerta. E da necessidade imperiosa de não esquecer! É a última casa de quem sobe na direcção da saída grande. Tenho 72. 

Faz investigação na área da defesa e conservação do património. Escrever sobre o passado de locais onde viveu é também, de certo modo, uma forma de preservar outro tipo de património?

Sim. O património imaterial que todos nós somos. As nossas palavras são tudo o que restará de nós para as gerações futuras.

Sei que tem planos para voltar a Macau nas suas obras. Podemos esperar para breve um novo livro?

Provavelmente voltarei a Macau – um dia. Mas o meu próximo romance terá o antigo Reino do Congo como chão. Uma princesa-escrava. Heróis avulsos. Guerreiros, estrategas e generais. Mártires e defuntos. Despojos. Escravatura. Epopeias, algumas que a História esqueceu. E uma história de amor, como não poderia deixar de ser.

11 Jul 2017