China / ÁsiaInvestigação | Após décadas a copiar, a China aposta na inovação Hoje Macau - 25 Out 2017 [dropcap style≠’circle’]A[/dropcap] China passou a proteger a propriedade intelectual à medida que aposta na inovação depois de, durante décadas, ter feito da usurpação de ‘know-how’ parte do seu modelo de desenvolvimento, afirma a investigadora brasileira Rosana Machado. “A China não defende mais a infracção da propriedade intelectual, porque quer ser uma potência inovadora”, diz a autora do livro “Counterfeit Itineraries in the Global South: the human costs of piracy in China and Brazil”, publicado este Verão. Rosana Machado foi professora de Desenvolvimento Internacional na Universidade de Oxford e investigadora do Centro de Estudos Chineses em Harvard, universidade na qual tirou um pós-doutoramento em propriedade intelectual. Empresas europeias e norte-americanas há várias décadas que acusam empresas chinesas de pirataria e roubo de tecnologia. O país asiático é visto como um centro mundial de espionagem industrial mas quer agora transformar-se numa potência tecnológica, com capacidades nos sectores de alto valor agregado, incluindo inteligência artificial, energia renovável, robótica e carros eléctricos. Durante o discurso inaugural do XIX Congresso do Partido Comunista Chinês (PCC), que ontem chegou hoje ao fim (ver grande plano), o secretário-geral da organização, Xi Jinping, definiu como meta tornar a China num “país de inovadores”, até 2035. No seu mais recente livro, Rosana Machado estabelece uma comparação entre a forma como o Brasil e a China reagiram à pressão dos Estados Unidos para combater as infracções de propriedade intelectual. “A China defendeu que [a usurpação de ‘know how’] era importante para os primeiros anos do seu desenvolvimento e o Brasil colocou a polícia para proibir a economia informal”, afirma. “O Brasil gastou mais a proteger a propriedade intelectual do que perdeu com o contrabando e marginalizando os seus pobres, enquanto a China não”, acrescenta. Para Rosana Machado, Pequim tomou a “decisão correta”. “A propriedade intelectual é um sistema hegemónico de protecção muito questionável” e não é condição de produção de inovação, afirma. “Existe no âmbito académico sobre propriedade intelectual a tese de que a abertura do conhecimento gera inovação”, explica. No entanto, a investigadora diz que “hoje, a China está a adoptar um modelo parecido com o norte-americano”, ao reforçar a protecção da propriedade intelectual, à medida que se torna uma potência inovadora. “A China hoje tenta colocar-se como uma potência da propriedade intelectual”, diz. Rota asiática Rosana Machado começou a estudar a China no final dos anos 1990, atraída pelo impacto na economia informal brasileira dos produtos baratos chineses que então começaram a chegar ao país. Durante dez anos, seguiu a rota dessas mercadorias e, a partir de 2003, começou a visitar anualmente a China, onde conheceu as fábricas e trabalhadores por detrás do ‘boom’ que tornou o país asiático na maior potência comercial do planeta. Nos últimos três anos deixou de ir à China e, quando aterrou em Pequim, em Setembro passado, admite ter ficado “chocada”. “A cidade está muito mais limpa e organizada”, diz. A modernização da China, no entanto, não implica maior liberdade política, com o PCC a não abdicar do controlo da economia e sociedade. “O que nunca mudou na China ao longo da História é a maneira como a liderança política controla ideologicamente a cultura chinesa”, afirma, apontando “o uso do confucionismo para a manutenção da autoridade ao longo de 3500 anos”. “As pessoas são modernas e extremamente ligadas ao partido”, afirma Rosana, que tem um outro livro, intitulado “China – Passado e Presente – Um Guia Para Compreender a Sociedade Chinesa”, publicado em 2013. “A gente não consegue pensar a China no nosso ‘mindset’ ocidental”, conclui.