Os Estados Unidos e a saúde mundial

“Global Health Governance must be understood broadly. Health is made in all policy and political areas-from agricultural through education policy. Without adequate nutrition, education and hygienic standards, mechanisms to fight global pandemics will remain a drop in an ocean.”
“Coordinating Global Health Policy Responses: From HIV/AIDS to Ebola and Beyond” – Annamarie Bindenagel Sehovic

[dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] governo dos Estados Unidos tem permanecido na vanguarda do estabelecimento de políticas internacionais, o que até à eleição do Presidente Donald Trump trouxe maior segurança para os cidadãos americanos e de outros países, através da melhoria da saúde e ajudando a criar sociedades mais estáveis em outros países e um mundo mais humano para milhões de pessoas que enfrentam sérias e graves doenças.Os Estados Unidos trabalham com outros países para criar a “Aliança das Vacinas (GAVI na sigla inglesa)” que é uma organização internacional, constituída em 2000, para melhorar o acesso a novas e subutilizadas vacinas para crianças que vivem nos países mais pobres do mundo. Tem sede em Genebra e reúne os sectores públicos e privados, com o objectivo comum de criar acesso igual a vacinas para crianças, onde quer que vivam.

A GAVI tem desempenhado um importante papel na redução da mortalidade por doença evitável por vacinação, sendo um contribuinte importante para se atingirem os “Objectivos de Desenvolvimento do Milénio (ODM)”. Os Estados Unidos a trabalhar com Oganizações Não Governamentais (ONG`s) apoiaram a criação da “Iniciativa Global de Erradicação da Pólio (GPEI na sigla inglesa)” que é uma parceria público-privada liderada por governos nacionais, com cinco parceiros, a “Organização Mundial da Saúde (OMS)”, o “Rotary International”, os “Centros para o Controlo e Prevenção de Doenças (CDC na sigla inglesa)” dos Estados Unidos, o “Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF na sigla inglesa)” e a “Fundação Bill & Melinda Gates”.

O seu objectivo é erradicar a pólio em todo o mundo e conta com vinte milhões de voluntários, catorze mil milhões de dólares de investimento internacional, duzentos países envolvidos e mais de dois mil e quinhentos milhões de crianças vacinadas, o que levou o mundo à beira da permanente vitória sobre o vírus da pólio. A indústria dos Estados Unidos e as ONG`s têm estado na linha da frente  para dar resposta a emergências sanitárias globais, e ao avanço da pesquisa e inovação que ajudou a reduzir os patógenos mais perigosos do mundo. Os esforços de colaboração internacional, especialmente o fortalecimento da capacidade dos sistemas nacionais de saúde, são essenciais para prevenir e se preparar para um variedade de ameaças, de pandemias de doenças infecciosas aos assassinos silenciosos de doenças não transmissíveis crónicas.

O “Comité de Saúde Global e Futuro Papel dos Estados Unidos” tem lutado pelo bom equilíbrio no cumprimento do seu mandato para examinar o papel dos Estados Unidos no futuro da saúde global, ao mesmo tempo que reflecte como membro da comunidade global de estados, que tem desafios e lições comuns para aprender com outros para influenciar o nosso futuro. O Comité deu prioridade aos desafios globais da saúde com o potencial de perda catastrófica da vida e impacto na sociedade e na economia, como pandemias, doenças transmissíveis persistentes, como a SIDA, tuberculose e malária e doenças não transmissíveis, como a saúde cardiovascular e diversos tipos de cancro, bem como áreas onde os investimentos significativos dos Estados Unidos criaram ganhos que devem ser consolidados e sustentados, como promover a saúde das mulheres e das crianças, aumentar a capacidade,  inovar e implementar a saúde global.

O Comité concluiu que o governo deve manter a sua posição de liderança na saúde global como um interesse nacional urgente e como um benefício público global, que melhore a posição internacional da América. Embora seja necessário um investimento adicional, pois o dinheiro por si só não é a única resposta. O Comité elaborou um relatório qur contém catorze recomendações, significativas, para fortalecer os programas de saúde globais dos Estados Unidos, reconhecendo que muitas outras áreas merecem atenção. A fim de maximizar o trabalho em direção aos desafios de saúde globais priorizados, o Comité concentrou-se em como aproveitar os recursos, fazendo negócios de forma diferente, especialmente através do uso de processos de pesquisa e desenvolvimento aperfeiçoados, e mecanismos de financiamento de saúde digital para maximizar o retorno dos investimentos, e demonstrar a liderança dentro da arquitectura e governança da saúde global.

Ao investir na saúde global nos próximos vinte anos, existe a possibilidade de salvar a vida de milhões de crianças e adultos. Além desses benefícios de saúde para os indivíduos, a saúde global está directamente ligada à produtividade e ao crescimento económico em todo o mundo. Assim, e de acordo com a “Comissão Lancet sobre Investir na Saúde”, o retorno dos investimentos em saúde global pode ser substancial, pois os benefícios podem exceder os custos, nos países de baixo rendimento e países de baixo rendimento médio. Trata-se de a nível mundial, investir em capacidades básicas para prevenir, detectar e responder a surtos de doenças infecciosas através do desenvolvimento de sistemas multidisciplinares.

O “One Health” focado na interacção da saúde humana e animal pode resultar em uma economia estimada em quinze mil milhões de dólares anuais contra a prevenção de surtos isolados. À luz desses benefícios, bem como o surgimento contínuo e ressurgimento de doenças infecciosas e a crescente ameaça de resistência antimicrobiana, um compromisso sustentável com a segurança sanitária global é um imperativo para todos os países. É de recordar que “One Health” é um esforço de colaboração de múltiplas disciplinas, a trabalharem a nível  local, nacional e global para alcançar a saúde ideal para pessoas, animais e meio ambiente.  O “One Health” é uma nova frase, mas o conceito  remonta aos tempos antigos.

O reconhecimento de que os factores ambientais podem afectar a saúde humana, foi defendida pelo médico grego Hipócrates no seu texto “On Airs, Waters e Places”, em que promove o conceito de que a saúde pública dependia de um ambiente limpo. Os Estados Unidos têm sido um líder na saúde global, inclusive através de programas de alto desempenho como o “Plano de Emergência do Presidente dos Estados Unidos Para Alívio do Sida, (PEPFAR na sigla inglesa)”; a “Iniciativa Presidencial Contra a Malária (PMI na sigla inglesa” que foi criada em 2005; o “Fundo Mundiall de Combate à Sida, Tuberculose e Malária (GFATM na sigla inglesa).”

O GFATM é uma associação criada em 2002, entre governos, sociedade civil, o sector privado e as pessoas afectadas pelas doenças e concebida para acelerar o fim das epidemias de SIDA, tuberculose e malária, recolhendo e investindo quatro mil milhões de dólares anualmente, para financiar programas dirigidos por especialistas locais nos países e comunidades mais necessitados, tendo salvo mais de vinte e dois milhões de vidas, e recentemente a “Agenda Global de Segurança da Saúde (GHSA na sigla inglesa)” que foi criada em 2014, e é uma parceria crescente de mais de cinquenta países, organizações internacionais e partes interessadas não governamentais para ajudar a construir a capacidade dos países a criar um mundo seguro e protegido contra ameaças de doenças infecciosas, e elevar a segurança sanitária global como uma prioridade nacional e global.

A GHSA prossegue uma abordagem multilateral e multissectorial para fortalecer tanto a capacidade global, quanto a capacidade dos países de prevenir, detectar e responder a ameaças de doenças infecciosas humanas e animais, que ocorrem naturalmente, acidentalmente ou deliberadamente. Todavia, os recursos não são ilimitados, e o compromisso contínuo deve ser realizado.  A nova administração americana no contexto do legado influente dos Estados Unidos no desenvolvimento da saúde global, enfrenta a escolha de garantir ou não os ganhos na saúde global, tendo em conta os beneficios de milhares de milhões de dólares, anos de dedicação e programas fortes que são sustentados e preparados para um maior crescimento.

O enorme crescimento das viagens e do comércio internacional que ocorreu nas últimas décadas, aumenta a urgência de investimentos contínuos na saúde global. A crescente interconexão do mundo e a interdependência entre os países, economias e culturas trouxeram melhor acesso a bens e serviços, mas também a uma variedade de ameaças para a saúde. A assistência externa é muitas vezes considerada um tipo de caridade, ou suporte para os menos afortunados. Ainda que,  possa ser verdade para as populações mais pobres e vulneráveis, a maioria desses auxílios, especialmente,  quando direccionado para a saúde, são um investimento na saúde do país receptor, bem como dos Estados Unidos e do mundo em geral.

Tal motivação de investimento para os Estados Unidos tem duas vertentes, a de proteger contra ameaças globais à saúde e promover a produtividade e o crescimento económico em outros países. Embora o ónus das doenças infecciosas recaia predominantemente em países de baixo rendimento, essas doenças representam ameaças globais, que podem ter consequências terríveis para qualquer país, incluindo os Estados Unidos, em termos de custos humanos e económicos. Aproximadamente duzentas e oitenta e quatro mil mortes foram atribuídas ao surto gripe  H1N1 em 2009, por exemplo, e dois milhões de mortes são previstas em caso de surto de uma pandemia de gripe moderada futura. Em apenas alguns meses, de 2003, o surto do “Síndrome Respiratória Aguda Grave (SARS na sigla inglesa) custou ao mundo entre quarenta e cinquenta e quatro mil milhões de dólares, enquanto em 2014 os Estados Unidos dispenderam 5,4 mil milhões de dólares como  resposta ao surto Ebola, dos quais cento e dezanove milhões foram gastos em monitorização doméstica e acompanhamento dos passageiros das companhias aéreas.

A crescente prevalência de doenças não-transmissíveis (DNTs) também afectou negativamente as economias globais, ameaçando ganhos societários na expectativa de vida, produtividade e qualidade de vida global. As perdas de produtividade associadas à incapacidade, ausências não planeadas ao trabalho e aumento dos acidentes incidem em custos até 400 por cento superiores aos custos de tratamento. As pesquisas também mostram que os investidores são menos propensos a entrar em mercados onde a força de trabalho sofre uma pesada carga de doenças. Assim, populações saudáveis são importantes em vários níveis. Investir no capital humano contribui significativamente para o crescimento económico, prosperidade e estabilidade nos países e cria parceiros mais confiáveis e duradouros no mundo. Tal estratégia mostrou-se bem-sucedida, como é evidenciado pelo facto de onze dos quinze principais parceiros comerciais dos Estados Unidos serem ex-receptores de assistência estrangeira.

O Comité foi encarregado de realizar um estudo de consenso para identificar prioridades globais de saúde à luz das ameaças e desafios actuais e emergentes para a saúde global e fornecer recomendações ao governo dos Estados Unidos, e outras partes interessadas, para aumentar a capacidade de resposta, coordenação e a eficiência para enfrentar essas ameaças e desafios, estabelecendo prioridades e mobilização de recursos. Tendo o apoio de um conjunto amplo de agências federais, fundações e parceiros privados, foi nomeado um Comité ad hoc composto de catorze membros para realizar esta tarefa ao longo de seis meses e com base em um processo de consenso rigoroso e fundado em evidências. Os membros do Comité formularam um conjunto de catorze recomendações que implementadas, oferecerão uma forte estratégia global de saúde e permitirão aos Estados Unidos manter o seu papel como líder mundial em saúde.

As recomendação passam por melhorar a coordenação internacional de resposta às  emergência, combater a resistência antimicrobiana, construir a capacidade de saúde pública em países de baixo e médio rendimento, observar o próxima actuação do PEPFAR, confrontar a ameaça da tuberculose, sustentar o desenvolvimento na eliminação da malária, melhorar a sobrevivência de mulheres e crianças, assegurar uma vida saudável e produtiva para mulheres e crianças, promover a saúde cardiovascular e prevenir o cancro, acelerar o desenvolvimento de produtos médicos, melhorar a infra-estrutura digital da saúde, realizar investimentos de transição para bens públicos globais, optimizar recursos através de financiamento inteligente e comprometer-se a liderar continuamente a saúde global. A paisagem da saúde global é vasta, e com prioridades novas e por vezes díspares em todo o sector da saúde, pelo que considerar cada questão ou doença no seu local próprio pode ser contraproducente. Uma perspectiva tão estreita, dificulta a capacidade de incentivar investimentos em outros programas e adaptar recursos de programas existentes quando surge uma nova ameaça.

Assim, embora a prioridade para os recursos seja necessária, também é essencial adoptar conceitos holísticos e centrados no sistema de integração, capacitação e parceria para obter resultados de forma mais abrangente e com esse entendimento, o Comité identificou quatro áreas prioritárias para acções de saúde global que, se abordadas, terão um maior efeito positivo na saúde, sendo a primeira alcançar a segurança da saúde global, pois nos últimos dez anos, os surtos de pandemia de gripe,  no  Médio Orienteo, o síndrome respiratório  coronavírus (MERS-CoV), Ebola e, mais recentemente, o Zika ameaçaram populações em todo o mundo. A segunda, será manter uma resposta sustentada às ameaças contínuas de doenças transmissíveis. Os esforços dedicados dos governos nacionais, das fundações e da comunidade global resultaram em milhões de vidas salvas da SIDA, tuberculose e malária, mas as três doenças continuam a apresentar ameaças imediatas e de longo prazo para a saúde das populações em todo o mundo. Mais de trinta e seis milhões de pessoas vivem com o Vírus da Imunodeficiência Humana (HIV na sigla inglesa), com dois milhões de novas infecções em cada ano.

A terceira área, será economizar e melhorar a vida das mulheres e das crianças. Os esforços para salvar a vida de mulheres e crianças em todo o mundo, historicamente foram um múcleo importante para o governo dos Estados Unidos, embora as taxas de mortalidade infantil e materna tenham diminuído a partir de 2000, em cada ano cerca de seis milhões de crianças morrem antes de fazerem cinco anos de vida e mais de trezentas mil mulheres morrem por causas relacionadas com a gravidez e o parto. A quarta área, será promover a saúde cardiovascular e prevenir o cancro, pois as doenças infecciosas muitas vezes atraem os meios de comunicação, mas uma preocupação igualmente importante é o aumento das taxas de doenças não transmissíveis, em todos os países, independentemente do seu  nível de rendimento. Os custos para gerir essas doenças está a aumentar. As doenças cardiovasculares deverão custar ao mundo um trilião de dólares por ano em custos de tratamento e perdas de produtividade até 2030.

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