Multa ou prisão, eis a questão!

[dropcap style≠’circle’]N[/dropcap]o passado dia 9 ocorreu um acidente de viação perto de La Baie Du Noble. Um carro preto, conduzido por um indivíduo do sexo masculino, chocou com um táxi e acabou por capotar. Uma das portas do táxi foi arrancada. Felizmente os carros transportavam apenas os condutores, que saíram do acidente com ferimentos ligeiros.

Posteriormente ambos os condutores foram submetidos ao teste de alcoolemia. Numa análise preliminar percebeu-se que o condutor do carro preto apresentava valores superiores ao normal. O condutor do táxi não apresentava sinais de ter ingerido álcool. Mais tarde veio a saber-se que o condutor do carro preto estava efectivamente embriagado.

Este incidente foi divulgado pela imprensa de Macau e, ficou a saber-se, que o condutor do carro preto iria ser indiciado por “conduzir sob efeito de bebidas alcoólicas”. Acabaria por ser condenado a 100 dias de prisão, substituídos pelo pagamento de uma multa de 20.000 patacas. Ou seja, o transgressor pôde sair em liberdade pagando a multa. Ficou também com a carta apreendida durante um ano.

O acidente teve lugar à luz do dia e foi testemunhado por muitas pessoas. Algumas tiraram fotografias e postaram-nas no Facebook. Este incidente desencadeou surpreendentemente uma quantidade de discussões. Um dos temas mais debatidos no Facebook foi a pena aplicada ao condutor. As pessoas em geral gostariam de tê-lo visto preso.

Para analisar este assunto em pormenor, teremos de olhar para o Código Penal de Macau. O Artigo 279 (1) estabelece que, a condução sob efeito de bebida alcoólica, que ponha em risco terceiros ou bens alheios, implica uma pena de prisão até três anos ou uma pena pecuniária. Os Artigos 279 (2) e (3) estabelecem o montante da multa e o período de detenção consoante as circunstâncias.

Por aqui podemos ver que o Artigo 279 deixa duas opções em aberto. O réu pode ser detido ou condenado ao pagamento de multa.

Mas quem decide a opção a tomar, o juiz ou o réu?

Para responder a esta pergunta temos de voltar à lei. Em primeiro lugar, a lei deve estabelecer de forma clara as circunstâncias que conduzem a uma penalização e as circunstâncias que conduzem à outra. Em segundo lugar, deverá ser inequívoca ao estabelecer sobre quem pesa a responsabilidade da decisão.

Se a lei não for suficientemente clara nestes aspectos o juiz terá dificuldade em pronunciar-se adequadamente quando é chamado a decidir.

O artigo 125 (1) do Código Penal de Macau, estabelece que a pena pecuniária não pode substituir a pena de prisão, salvo algumas excepções. Por aqui se depreende que o objectivo da nossa lei é impedir que os réus comprem a liberdade.           

Mas será que o réu pode escolher entre pagar a multa ou ir para a prisão? Mais uma vez a resposta depende da lei. Se esta lho permitir, uma vez cumpridos todos os requisitos, pode. Caso contrário terá de se sujeitar à decisão do Tribunal.

O incidente que temos vindo a referir foi muito aparatoso e provocou muitos danos materiais e além disso envolveu um condutor alcoolizado. Foi uma situação grave, pelo que muita gente apelou à prisão do transgressor. No entanto, devemos salientar que, à parte os ligeiros ferimentos dos condutores, não houve mais danos pessoais. Só se pode pronunciar uma sentença de forma justa se todos os factores forem tomados em linha de conta.

Se a lei permite que o transgressor pague uma multa em vez de ir para a prisão, teremos de aceitar. Se não concordarmos teremos de alterar a lei. Se este sentimento for maioritário, precisará de ser reportado ao Governo e, a partir daí, serem implementados os procedimentos que abrem caminho à criação de uma emenda à lei. Mas, mais uma vez, antes de abraçar essa opção, há que pesar todos os factores pois estão em jogo questões vitais e de justiça para todos.

David Chan

Professor Associado do IPM

Consultor Jurídico da Associação para a Promoção do Jazz em Macau

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