Hoje Macau China / ÁsiaPequim pede que UE cumpra obrigações sob entrada do país na OMC [dropcap style≠’circle’]N[/dropcap]as vésperas da visita do primeiro-ministro chinês Li Keqiang ao Quirguistão, Letónia e Rússia, Pequim pressiona a União Europeia a honrar as promessas feitas relativas à entrada da China na Organização Mundial do Comércio A China espera que a União Europeia (UE) possa cumprir com as obrigações definidas no Artigo 15 do Protocolo sobre a entrada da China na Organização Mundial do Comércio (OMC), disse esta segunda-feira um alto diplomata do país. “Estas são obrigações e promessas internacionais da UE”, disse o ministro adjunto dos Negócios Estrangeiros Liu Haixing em conferência de imprensa sobre a próxima visita do primeiro-ministro chinês Li Keqiang ao Quirguistão, Letónia e Rússia. Durante sua estada na Letónia, Li participará na Quinta Cimeira da China e dos Países da Europa Central e Oriental (16+1) em Riga. Ao enfatizar que a China cumpriu com as suas promessas desde que entrou na OMC em 2001, Liu disse que o bloco europeu também tem a obrigação de honrar suas promessas. “Esperamos que a UE possa cumprir nítida e completamente as suas obrigações relacionadas com a OMC até 11 de Dezembro sem nenhuma condição adicional”, disse Liu à imprensa. As obrigações da OMC exigem que a UE abandone o “sistema de país substituto” até 11 de Dezembro de 2016, sob o qual os custos de produção num terceiro país são usados para calcular o valor dos produtos das economias que não são de mercado. Ao responder se a China “pressionará” os países da Europa Central e Oriental sobre o assunto, Liu disse que o país “não pressionará os 16 países, mas que negociará com eles”. “Há 11 membros da UE entre os 16 países da Europa Central e Oriental, esses países certamente esclarecerão as suas posições dentro da UE”, disse Liu. “Esperamos que tomem a decisão correcta e estimulem a UE a cumprir com as suas obrigações dentro do devido tempo”, acrescentou.
Paulo José Miranda h | Artes, Letras e IdeiasPalavra contra palavra (continuação) [dropcap style≠’circle’]A[/dropcap] palavra escrita tem a primazia, não porque seja mais educada ou mais limpa, mas porque tem uma relação especial com “aquilo que não é”, como no poema à página 38, “Poema com muito vago erotismo ao fundo”: “Não é a mesma a língua com que te falo a língua com que te beijo ou esta língua outra em que te escrevo, a tinta espessa, vagamente húmida. É preferível escrever-te que beijar-te: a folha rasa limpa é corpo liso acolhendo quente o contorno da letra e com essa língua sinceramente falo e digo quase sinto o beijo que te escrevo e não te dou.” A narradora do poema diz ser preferível escrever a beijar o amante, e quase sente o beijo que escreve e não lhe dá. Não é a escrita que está aqui em causa, evidentemente, mas aquilo que não é, aquilo que poderia ser ou não, mas que não é e passa a ser daquele modo poderoso sobre nós “como seria” ou “poderia ter sido tão bom”… A palavra escrita tem o poder do invisível, o poder da liberdade infernal. Se é verdade que a poeta assenta os seus poemas num forte chão parmenidiano, ela mesma escreve “(…) Nada / existe sem palavra que o diga (…)” (p. 40), numa identificação entre ser e pensar (e pensa-se com palavras), também não é menos verdade que há um outro lado mais obscuro de entender a relação entre a palavra e o ser. Rita Taborda Duarte começa o seu poema “Quando muito é um cachimbo” – do qual também fazem parte os últimos versos citados – com este verso: “A palavra nunca é uma palavra, quando muito é um cachimbo (…)” (Ibidem) No mesmo poema em que inscreve a sua herança de Parménides, começa por dizer que a palavra está além ou aquém de si mesma. Sem dúvida, é uma tese metafísica, mas de carga contrária à do filósofo eleata. É então talvez chegado o momento de abordarmos o poema “Lá fiz o poema”, onde a poeta escreve aquilo que poderá ser o modo como ela se relaciona com o fazer do poema. Pode ser ou não, verdade é que, neste poema, é assim que o narrador se mostra na sua relação como o fazer do poema, dos poemas. Podemos estar certos de uma coisa: não é nada fácil encontrar um verbo que defina o “fazer do poema” que a poeta aqui nos traz. Leia-se primeiro o poema, para depois podermos entender melhor as dificuldades que a poeta nos arranjou, e algumas alegrias também, evidentemente: “Lá fiz o poema hoje sequer o escutei, primeiro, pois que nem estava dito ainda; os meus poemas não andam sumidos em silenciosinhos cúmplices, à espera de que eu chegue e venha resgatá-los. Nada me sussurra voz nenhuma de deus nenhum. E o meu silêncio sequer é um silêncio-metafórico a murmurar flores escondidas. É um silêncio silencioso silêncio oco: sem nada a declarar por dentro. E esse silêncio, é curioso, nunca me dita poemas. Mantém-se calado, tal lhe convém. Pura e simplesmente, o meu poema não estava em parte alguma, nem agasalhado em sossegos nem em qualquer sítio que se percebesse. Ou se lá estava tanto pior; que se havia um poema omnipresente embrulhado em silêncios em todo lado e em qualquer parte, outro o escutou o mostrou o fingiu o disse, outro, não eu, que a haver poema passou-me distraidamente ao lado. Portanto, resumindo, este poema que eu fiz nem sequer se encontrava inscrito no mundo por aí para que eu fosse lá e ao menos partisse as unhas escavando as pedras. Em lado nenhum. O poema que eu fiz não estava em parte nenhuma em nenhum lugar E tive de ser eu, com certeza, a massacrá-lo letra branca em tecla preta, a confiscá-lo ao teclado, sem a musa do outro arrastada pelo cachaço, e, em mangas de camisa, diria, não fora eu mulher e não usasse nunca nem a camisa nem as mangas nem o casaco. Sequer um cigarro onde pudesse ir fumando rimas por dentro das palavras. O meu poema tive de ser eu a escrevê-lo sozinha. E eu não escrevo como se tocasse piano, que o portátil não traz uma partitura, nem ninguém havia, lá, presente ausente para mo trautear. As teclas fazem barulho, sujam os dedos e nada tem mais micróbios do que um teclado, dizem. Foi, portanto, um mau poema: fiquei cansada e nem uma folha, ao menos, para amarfanhar.” (pp. 14-5) Para além da estrofe final do poema – do mau e do bom poema, de hoje nem podermos esmagar com as nossas mãos o mal que fizemos -, que seria um outro texto, interessa seguir a pista do que aqui temos seguido. O poema não foi escutado; o poema não veio do silêncio, nem de uma musa; o poema não foi escavado; não foi construído (se fosse, a poeta tê-lo-ia escrito); e também não foi inventado (se fosse, a poeta tê-lo-ia escrito); o poema não chega como uma composição e também não é a execução de uma partitura. O que sabemos do poema é: não estava em parte alguma antes, e teve de ser a poeta a escrevê-lo sozinha, num teclado, que tem mais micróbios do que qualquer coisa do mundo. Com este poema a poeta parece querer destruir a metafísica, que tanto acarinha ao longo dos seus poemas. Pois tudo em Rita Taborda Duarte excede a própria coisa: os corpos, as partes dos corpos (“qualquer coisa dos corpos fica ainda / ainda quando os corpos se levantam”), as palavras (“O desperdício sobrevindo da palavra”), as próprias coisas (“Só as rugas desta cama enxovalhada / nos perseguem as manhãs, pelo rosto dentro / como a teima de um poema por escrever.”). Tudo, não. Nem tudo excede o si mesmo que é. O fazer do poema é, ou parece ser, a parte não metafísica do mundo. Talvez se entenda melhor se pensarmos que para Rita Taborda Duarte tudo é metafísica, tudo é sempre mais do que é, tudo é o que é e o seu excesso, e a palavra é o lugar onde nós e o excesso nos encontramos. Pois mesmo em silêncio, a palavra arde. Ou dito muito melhor, com versos da poeta: “(…) E no quarto / entranhado na fibra dos lençóis, o cheiro forte e acre, / de uma palavra ardida.” E o fazer do poema é a única coisa concreta que há no mundo (não sabemos se pode ou não ser estendido a outras artes). Fazer um poema é tentar limpar a sujidade da palavra, mantendo nela a centelha ancestral e a vontade do que se quer dizer. Fazer um poema, aqui, neste livro sui generis, é como tudo o que o humano faz, isto é, aquilo que é mais concreto neste planeta: as acções. Só a acção não é metafísica, pois são todas elas éticas, de resto o planeta (adivinha-se o universo) é todo ele, na sua unidade e na multiplicidade dos seus elementos, um excesso de sentido, que a palavra mostra de um modo privilegiado. “(…) Nada / existe sem palavra que o diga (…)” Mesmo aquilo que vive apenas e só nos interstícios da palavra. É também um livro cheio de ironia, como se deve ter entendido pelos versos citados e, principalmente, pelos títulos dos poemas. Resta-me dizer uma ou duas coisas, antes de terminarmos com a voz da Rita Taborda Duarte: sublinhar que se trata de um livro precioso, onde a palavra é simultaneamente sujeito e objecto (por conseguinte para guardar onde se guardam os vinhos mais preciosos), e deixar um conselho ao leitor: se está a tentar deixar de fumar, não leia este livro. Excerto de “Alfabeto”: “Faço, então, a cama, aliso os vincos, bato a almofada entalo um gemido breve de palavra, o sinal da pulga, a pata da borboleta (ou era o veio esgarçado de uma asa ?), entalo o lençol puído no colchão e sacudo para o chão uma sílaba do teu corpo. Tua, sim. Não será minha: As minhas palavras são mais louras e compridas… Nunca saio à rua, sem esticar os lençóis à cama com a precisão de quem faz as manhãs todos os dias, de quem dá um jeito à vida, antes de se pôr a trabalhar. Uma cama bem feita vale bem um verso terminado, sem o desperdício das palavras que não rimam. Há que resgatar o gesto repetido, dia a dia, como quem cumpre a métrica precisa do poema; uma cama desfeita e ao desalinho é um sítio perigoso para deitar o corpo a descansar, lugar de roturas, ligamentos um passo em falso, tropeçado sem cuidado, e podemos dar um mau jeito ao coração.”
Tânia dos Santos Sexanálise VozesO sexo dos pandas [dropcap style≠’circle’]O[/dropcap]s pandas são muito preguiçosos para se envolverem numa actividade sexual. Eles só dormem, comem e julgam qualquer outra actividade para além das suas possibilidades. Julgam-nos assexuados, detentores de uma libido baixíssima. O recorde de envolvimento sexual vai nos 7 minutos e 45 segundos, quando a média é normalmente de 1 minuto. Quando é que eles vão conseguir finalmente procriar? Ninguém sabe. Já é difícil o suficiente saber quando é que uma panda fêmea está a ovular, que normalmente dura uns 3 dias por ano. Uma janela de possibilidade estreitíssima para podermos garantir a continuação da espécie. Como o habitat natural do panda está em risco, os preocupados na matéria viram-se obrigados a levar pandas para serem tratados em cativeiro. A partir do momento que os pandas se viram no ambiente artificial de zoológico, a sua libido caiu ainda mais, sendo por isso muito difícil fazer com que os pandas procriem nestas condições. A criatividade e o desespero dos cientistas e dos seus tratadores fizeram com que aparecessem soluções verdadeiramente originais, uma delas é a pornografia – pornografia de pandas. Com o auxílio de uma televisãozita, obrigam os pandas a verem outros pandas na sua performance sexual. Como devem calcular a eficácia deste tratamento é duvidosa, mas há quem julgue o contrário. Os pandas, como fofos e amorosos que são, têm todo o planeta a torcer pelo seu sexo, custe o que custar. Nós queremos mais pandas bebés! Mas prova-se uma tarefa difícil. Os estudos recentes começam a perceber que, porque estes animais estão em cativeiro, há certos processos naturais de ‘corte’ e namoro que se tornam impossíveis. No habitat natural eles têm a possibilidade de deixar dicas de desejo, através de uns gritos aqui e ali, e de deixar cheiros a sinalizar a chegada do cio. Acima de tudo, os pandas têm mesmo que gostar do parceiro para se envolverem com ele. Sim, sim, há quem o chame de amor ou simplesmente desejo, mas eles precisam de uma ‘ligação’. Quando nós achávamos que os pandas não podiam ser mais adoráveis, eles tornam-se ainda mais adoráveis! Não fossem eles o símbolo da maior instituição de protecção animal e ambiental. O que provavelmente não sabiam é que a China pratica frequentemente a diplomacia do panda – os pandas estão directamente envolvidos na criação de laços internacionais por todo o mundo. Basicamente, desde os anos 50 que os pandas eram usados como oferenda comum a zoológicos de muitos países, contribuindo para o bom relacionamento político. Agora o serviço já não é tão gratuito. Os pandas são ‘emprestados’ por períodos de 10 anos pela módica quantia de 1.000.000 USD por ano. Para além de que todos os bebés que nascem destas aventuras para além fronteiras são indiscutivelmente propriedade chinesa. Mas como já devem ter percebido, ter bebés não é coisa que aconteça muito regularmente. E se acontecer, irá aparecer no telejornal das 8. O sexo dos pandas é como o sexo dos anjos, um mistério ainda por resolver. Na sua tentativa de ser ‘verde’, esta luta pela procriação do panda gigante continua a contribuir às tão generosas oferendas que vêm a fortalecer ligações diplomáticas – mas ainda não sabemos que desenvolvimento terá. A China tem a fama de não ter uma posição clara em relação às estratégias externas utilizadas. Com discursos e acções que contribuem para uma visão múltipla de posições, ficamos na expectativa do que é que vem para aí – muitos mais pandas, provavelmente. Pandas que nos presenteiam com a sua fofura e simpatia, capazes de derreter corações por onde passam, mas que têm muita dificuldade em ter sexo. O que vale é que os pandas são criaturas divertidíssimas. Com uma sexualidade desastrosamente trapalhona, ainda podem deleitar-se com os vídeos que foram apresentados como incentivo ao sexo dos animais algures online. Não é por acaso que este é um animal com fãs por todo o planeta. Nem é por acaso que os pandas são os embaixadores de uma China repleta de fofura.
Hoje Macau China / ÁsiaBirmânia | ONG insta Nações Unidas a investigar abusos contra minoria [dropcap style≠’circle’]A[/dropcap] Human Rights Watch (HRW) denunciou ontem a queima de aldeias rohingya no oeste da Birmânia, apelando à ONU para investigar os relatos de abusos das forças de segurança cometidos contra aquela minoria desde o início do mês. O exército birmanês declarou como “zona de operações” o norte do estado Rakhine, na fronteira com o Bangladesh, onde vive a maioria dos rohingya, após o ataque de um grupo armado contra três postos da polícia fronteiriça a 9 de Outubro. O assalto e posteriores distúrbios causaram pelo menos 40 mortos entre polícias, militares, assaltantes e moradores, e levou ao destacamento do exército, a quem activistas locais acusam de execuções, violações e saques contra os rohingya. A HRW utilizou imagens de satélite para fundamentar a nova denúncia, que fez horas antes da chegada ao local de uma delegação das Nações Unidas e do Governo birmanês, criticado pela organização não-governamental por causa das “desculpas” para impedir o acesso das agências humanitárias àquela zona. “Novas imagens de satélite revelam destruição em Rakhine que exige uma investigação imparcial e independente, algo que o Governo birmanês ainda não foi capaz de fazer”, afirmou o sub-director da HRW para a Ásia, Phil Robertson, em comunicado. Danos desconhecidos Segundo a HRW, as imagens mostram rastos de incêndios que coincidem com as denúncias de organizações locais e alertou que, apesar de o número de habitações afectadas ser “incerto”, os danos na zona podem ter sido subestimados. Os rohingya vivem na Birmânia (Myanmar) há séculos mas não são reconhecidos como cidadãos birmaneses nem como imigrantes bengalis. Aproximadamente 120 mil rohingya – minoria apátrida que as Nações Unidas consideram uma das mais perseguidas do planeta – vivem confinados em 67 acampamentos e sofrem todo o tipo de restrições desde o surto de violência sectária em 2012 entre esta minoria muçulmana e a maioria budista da região, que causou pelo menos 160 mortos. Os rohingya são um assunto sensível na política birmanesa, condicionada por grupos budistas radicais que levaram o anterior Governo a adoptar múltiplas medidas discriminatórias contra aquela minoria, como a privação da liberdade de movimento. O actual Governo, liderado pela Nobel da Paz Aung San Suu Kyi, criou em Agosto uma comissão liderada pelo ex-secretário-geral da ONU Kofi Annan, incumbida de elaborar um relatório com recomendações para solucionar o conflito sectário.
Hoje Macau Manchete PolíticaLAG 2017 | Associação Comercial de Macau apresenta propostas a Chui Sai On A revisão da lei laboral, os tradicionais incentivos às pequenas e médias empresas, a cautela em tempos de prosperidade para evitar a desgraça nos dias difíceis. A mais influente associação foi falar com o Chefe e levou os recados por escrito [dropcap style≠’circle’]A[/dropcap] economia de Macau “é saudável”, a “estrutura de finanças públicas é estável e a taxa de desemprego é baixa”, mas o território “enfrenta vários desafios”, pelo que é preciso “manter a orientação de sempre, isto é, haver uma preparação para adversidades em tempos prósperos e ter planos face às eventuais conjunturas que surjam”. A ideia foi defendida pelo presidente da Associação Comercial de Macau (ACM), Ma Iao Lai, junto do Chefe do Executivo, em mais uma reunião de Chui Sai On no âmbito da preparação das Linhas de Acção Governativa para 2017. De acordo com um comunicado oficial, Ma Iao Lai disse ainda que há que “aproveitar, ao máximo, as medidas vantajosas que o Governo Central tem oferecido”. Princípios orientadores à parte, a ACM deixou oito propostas concretas que gostaria de ver concretizadas no plano de acção do Executivo do próximo ano, a começar pela revisão das leis que digam respeito às relações entre as partes patronal e laboral. Ma Io Lai disse ainda é preciso auscultar opiniões sobre a proposta de lei referente ao Regime de Previdência Central Não Obrigatório. A associação entende também que convém estipular, “o mais rápido possível”, os diplomas e regulamentos no âmbito da Lei da Actividade Comercial de Administração de Condomínios, da lei sobre a profissão dos seguranças dos prédios e do regime de trabalho a tempo parcial. Uma ideia muito contestada pelo sector laboral, mas que Ma Io Lai defendeu, tem que ver com a revisão da política de importação de motoristas profissionais, profissão neste momento vedada a não residentes. “Garantir o espaço de desenvolvimento das pequenas e médias empresas, concretizar a diversificação adequada da economia de Macau, bem como participar na estratégia “Uma Faixa, uma Rota; e acelerar a formação e atrair quadros qualificados, aprofundando o papel de plataforma” são ideias que fazem também parte da lista da ACM. O presidente rematou pedindo que “se aproveite ao máximo as oportunidades trazidas pela ponte Hong Kong-Zhuhai-Macau, no sentido de reforçar o desenvolvimento da cooperação regional”. Boa-fé no equilíbrio Quanto à reacção do Chefe do Executivo, Chui Sai On concedeu que “diferentes opiniões da sociedade” indicam que existem “dificuldades e problemas” na aplicação prática da lei das relações laborais, pelo que “a equipa governamental procura estudar as necessidades de uma eventual revisão”. O líder do Governo pronunciou-se ainda sobre o Fundo de Segurança Social (FSS), garantindo que, “com base no princípio de boa-fé”, o Executivo tenta “manter o equilíbrio dos devidos interesses das partes patronal e laboral”. “Os vários sectores da sociedade percebem a situação do Fundo de Segurança Social”, disse ainda Chui Sai On, citado na nota à imprensa. “Além da injecção de capital nos últimos anos, o FSS necessita aumentar as receitas, através do aumento do montante e da proporção das contribuições, por forma a que funcione, a longo prazo, de forma saudável, pois só assim é que se poderá salvaguardar ambas as partes patronal e laboral.”
Hoje Macau Manchete SociedadeCentenário do padre Benjamim Videira Pires – Uma vida dedicada a Macau Tereza Sena* [dropcap style≠’circle’]E[/dropcap]ntendo não ser o calendário que determina ou regula a evocação, a celebração, a reprodução da memória. Mas ajuda. Sobretudo se for democraticamente gerido. Porque há que conciliar disponibilidades, recursos, oportunidades, mesmo numa era dita de informação, cada vez mais desinformada pela atoarda da ilusão de que toda ela está acessível à distância de um “click”. A memória, a sua reprodução, o apelo que lhe fazemos são processos selectivos, e muito, todos o sabemos. Como indivíduos, cidadãos, profissionais, afiliados, amigos, precisamos, utilizamos e reproduzimos pedaços de memória(s), nela nos visitando, revisitando e representando, quer individual, quer colectivamente. Uns mais, outros menos. E Macau é um local de memórias, de muitas diversas memórias, nem sempre partilhadas, nem sempre plenamente conhecidas, nem sempre unanimemente aceites ou reconhecidas por todos, a ela arribados de um sem número de proveniências e por outras tantas vias. Memórias nem sempre evocadas, ou dados a conhecer por aqueles que reclamam o direito à cidadania e à intervenção num espaço que também assumem como seu. Vem tudo isto a propósito da passagem, neste 30 de Outubro, do centenário do nascimento do padre jesuíta Benjamim Videira Pires (1916-1999), um homem que dedicou a sua vida a Macau, onde permaneceu de 1949 a 1998, e nela se afirmou pela acção educativa, criando uma instituição de ensino de elite, vocacionado para a instrução da população chinesa, mas também pelo contributo intelectual honesto, rigoroso, e marcante nas décadas de 50 a 80 do século passado. Antropologia e outros estudos Ensaísta, versou sobretudo temas antropológicos, como é o caso da sua conhecida obra Os Extremos Conciliam-se (1988), que foi vertida para chinês; e históricos, de que destaco a história da Companhia de Jesus, Ordem na qual ingressara jovem, em 1932, e o estudo da actividade marítima de Macau. Recorreu para isso a fontes primárias, pesquisando e disponibilizando documentos até então inéditos, anotando-os e comentando-os profusa e cuidadosamente, deixando obra de relevo, em grande parte ainda hoje dispersa. Mas foi também poeta, dramaturgo, jornalista e interventor político, para além de pedagogo e de sacerdote, naturalmente. Menos conhecida é actividade de Videira Pires em prol do estudo, classificação e perservação do património edificado de Macau, realizada no seio da Comissão de Estudo do Património Artístico e Histórico de Macau, criada em 1960 e reformulada em 1962, que integrou, sobre o que lavrará relatório em 1963. Coube-lhe o estudo detalhado das igrejas e cemitérios antigos (o que constituí uma novidade), o que é testemunhado pela bibliografia que produziu neste domínio, onde pontuam, entre outros, textos sobre vestígios e achados arqueológios. Também será chamado a integrar a comissão incumbida da recuperação e reorganização do espólio do Arquivo do Leal Senado, após os incidentes do 1,2,3, em 1966 — onde aliás teve um papel activo na defesa das Escolas Católicas de Macau, cujo Conselho secretariava —, embora a tarefa tenha sido maioritariamente realizada por Luís Gonzaga Gomes (1907-1976), à época (1962-1967) director da Biblioteca Pública Municipal, situada no edifício da mesma câmara de Macau, como se sabe. É certo que, de quando em vez, o nome de Videira Pires vem sobretudo à baila nos escritos de António Aresta e de Jorge Rangel, um dos poucos a relenbrarem o centenário e a promover, através do Instituto Internacional de Macau, discreta sessão assinalando a efeméride e relembrando o homem, o padre e o intelectual, Benjamim Videira Pires, na qual foi oradora Beatriz Basto da Silva. Tratou-se, tanto quanto julgo saber, da única homenagem institucional que a memória e o legado de Benjamim Videira Pires suscitaram, pelo menos em Macau. Não que os seus méritos não tenham sido reconhecidos, entre outros, pela Academia Portuguesa de História, que o fez sócio correspondente em 1988, quando já era sócio-efectivo da Academia de Marinha de Lisboa. É de lamentar. Relembro a forma esforçada e proveitosa como a Biblioteca Central de Macau, do Instituto Cultural, assinalou a passagem do 90º aniversário de Monsenhor Manuel Teixeira (1912-2003) com iniciativas que se prolongaram até 2004, tal como aconteceu com outras instituições, ou grupos ad-hoc, em Portugal. Manuel Teixeira foi indubitavelmente o mais mediático e célebre de todos os estudiosos de Macau nela residentes do Século XX. Não pretendendo aqui estabelecer comparações entre as personalidades, contributos e legados destes dois homens de vulto, Teixeira e Videira Pires, que partilharam interesses comuns, conviveram, colaboraram (rivalizando um pouquinho é certo, de quando em vez), trilhando caminhos idênticos e atravessando os mesmos tempos. Apenas pretendo sublinhar que não pode a nossa memória colectiva, não podem as nossas instituições, não devemos nós pautar-nos pelo brilho das luzes da ribalta e pelo volume do eco com que esses nomes soam na cidade a partir de além-fronteiras. Macau tem uma palavra a dizer sobre o valor e a utilidade destes e de outros legados, deve relembrá-los e ensiná-los como homens de Macau e do seu património, cultural, histórico, literário e historiográfico, para nos ficarmos por aqui. Quero com isto dizer que instituições públicas como o Instituto Cultural e a sua Biblioteca, ou privadas como a Companhia de Jesus e o seu Instituto Ricci de Macau, estabelecimentos de ensino superior como, por exemplo, a Universidade de S. José, entre outros, e para apenas citar os mais óbvios, deviam uma palavra e um gesto de atenção a Benjamim Videira Pires. Ignoro se o seu tão querido colégio, rebaptizado de “Mateus Ricci” em detrimento de “Melchior Carneiro”, e não obstante todos os tristes percalços por que passou nos finais dos anos 1990, relembrou ou não o homem que com tanto esforço e dedicação o criou em 1961. Por fazer Mas, para além da evocação e da homenagem, muito há a fazer: Urgentemente ― não sou a primeira a dizê-lo, mas nunca será de mais repeti-lo ―, a inventariação e localização da obra de Benjamim Videira Pires, sobretudo a que se encontra dispersa pelas muitas revistas e jornais que dirigiu ou onde colaborou, assim acontecendo também com as inúmeras entradas que preparou para a Enciclopédia Luso-Brasileira, da editora Verbo. E, neste campo, a Biblioteca Central podia e devia oferecer o seu prestimoso contributo, na pesquisa de todo este acervo, tal como o fez para Monsenhor Manuel Teixeira, actualizando o trabalho que iniciou em 1992 e desenvolveu em 1997, se bem que ainda bastante lacunarmente, como reconheceu o mesmo Jorge Arrimar, que à época dirigia a instituição e assinou as notas introdutórias desses dois pequenos catálogos. Há ainda a considerar a reunião de manuscritos, alguns eventualmente inéditos, levantando-se aqui a magna questão da localização presente do espólio(s) do próprio Videira Pires, sobre o que não me detenho, a que acresce toda a informação iconográfica e registo audio-visual que lhe respeitem. Depois, a reunião em volume(s) dessa obra dispersa, e a reedição de alguns dos seus livros, hoje já inacessíveis, sem pôr de lado, a eventual tradução para língua chinesa, ou até inglesa, do que se considerar mais relevante para o desenvolvimento dos “estudos de Macau”, em que se empenham grupos e instituições, domínio em que o contributo de Benjamim Videira Pires tem lugar de direito próprio. Finalmente, o próprio estudo da vida, obra e pensamento de Benjamim Videira Pires, na suas diversas vertentes, para o que já dispomos de textos biográficos, mais ou menos emotivos, como é o caso de P. Benjamim Videira Pires, Meu Irmão, da autoria de Francisco Videira Pires, dado à estampa pelo Instituto Internacional de Macau em 2011, e alguns contributos de António Aresta, de que destaco “A Identidade Cultural de Macau no Pensamento de Benjamim Videira Pires, SJ”, incluso no seu livro, Macau Histórico Cultural, que acaba de ser dada à estampa pela editora Livros do Oriente. Mas há certamente muito a dizer sobre o pedagogo, o pensador, o mediador e o político. Uma ressalva final, esta sim, contendo talvez alguma novidade, e que reputo da maior importância. Qualquer edição ou reedição da obra de Benjamim Videira Pires deverá ser cotejada com os exemplares dessas mesmas obras que lhe pertenceram já que, atendendo ao rigor e seriedade intelectual que o caracterizavam, tudo anotava, corrijia, acrescentava, mesmo após a publicação dos textos, o que, naturalmente, merece e é de justiça ser considerado, para além de ser urgente recuperar. E isto enquanto tivermos acesso àquela que foi, pelo menos em parte, a sua biblioteca pessoal ou/e da residência dos jesuítas (outro tema a merecer a atenção de especialidade, tanto mais que anotava e criticava profusamente o que lia e consultava), e que integra hoje o espólio do Instituto Ricci de Macau. Exemplifico apenas com um conjunto de textos, profusamente documentados, que o nosso autor preparou sobre os “Jesuítas e Macau”, tema de investigação que o ocupou desde cedo mas que terá ganho maior fôlego quando pretendia assinalar a passagem do IV centenário do estabelecimento dos inacianos na cidade, em 1964, dando então à estampa um pequeno volume sobre o assunto. Sabe-se que o Padre Videira Pires preparava a edição de vários volumes sobre o tema, o que tudo já estaria mais ou menos delineado em 1994, tratando-se muito possivelmente da reunião dos artigos que vinha publicando desde os inícios da década de 1950 nas páginas da “Religião e Pátria”, do “Boletim Eclesiástico da Diocese de Macau”, da Enciclopédia Luso-Brasileira, da “Brotéria” e noutras sedes. Por onde andará tal trabalho desconheço, mas talvez valesse a pena indagar. O padre Videira Pires teria certamente em mente uma versão revista e anotada desses textos, contemplando as aludidas correcções, acrescentos e actualizações bibliográficas, que atrás referi e de que junto exemplos que bem atestam da relevância do legado que temos entre mãos e de que urge cuidar. * Historiadora Um homem na cidade [dropcap]C[/dropcap]hegou a Macau em 1948 e aqui passou grande parte da vida. “Foi um homem de Igreja, mas foi um homem com impacto social”, diz Luís Sequeira. É assim que o jesuíta começa por descrever Benjamim António Videira Pires, um retrato que “não é fácil de fazer para conseguir ser objectivo”. É que Videira Pires, cujo centenário do nascimento se assinalou ontem, 30 de Outubro, foi um homem com várias dimensões. Transmontano nascido em Mirandela, saiu de casa cedo, como acontecia à época, para estudar. Depois de passar pelo seminário em Guimarães, entrou na Companhia de Jesus, em 1932. Quatro anos depois, concluiu o curso superior de Humanidades Clássicas e de Literatura Portuguesa. Já em Braga, estudou Filosofia e, em Granada, Teologia. A ordenação enquanto sacerdote aconteceu em 1945. Três anos depois chegou a Macau. Luís Sequeira conta que Videira Pires se “impunha pelo seu valor intelectual e sensibilidade aos problemas da sociedade”. Foi este lado do jesuíta que o levou a ser voz activa na Macau administrada então por Portugal. “Mantinha num jornal uma série de textos chamada ‘Calçada das Verdades’, escrevia artigos de opinião”, explica. “Sendo um homem da Igreja, era um homem com impacto e tinha presença na sociedade de Macau. Ao mesmo tempo, recordo que era uma pessoa com um temperamento delicado, respeitoso, com muito boas relações humanas, expressando-se até na recolha de fundos, ao nível internacional, para as suas obras” no território. À chegada a Macau, Benjamim Videira Pires estudou chinês e foi professor do Liceu Nacional Infante D. Henrique, além de exercer funções pastorais. “A sua grande obra foi o Instituto Melchior Carneiro – foi ele que lançou esse grande colégio – embora na parte final da sua vida tivesse sido transformado no Colégio Mateus Ricci”, contextualiza Luís Sequeira. O padre jesuíta faz referência à vertente das humanidades e literatura que Videira Pires cultivava: deixou obra poética, “era um homem sensível, delicado, era culto, lançou-se na poesia e fazia-o bem”. Depois, há a dimensão da história, “com muita repercussão ao nível internacional, com pequenos artigos ligados à presença portuguesa no Oriente – sempre manteve esta linha – e teve uma postura que lhe granjeou respeito no campo da história”. Luís Sequeira repara que, “por vezes, era demasiado patriótico, embora fosse uma pessoa com o sentido da interculturalidade”. A espiritualidade é outro lado recordado: “Foi sempre um homem muito dedicado, atento à comunidade cristã, particularmente à de língua portuguesa”. Benjamim Videira Pires deixou Macau em Agosto de 1998. Morreu no ano seguinte em Portugal. POR Isabel Castro
Angela Ka PolíticaAL | Ho Iat Seng quer terminar análise de propostas nesta sessão legislativa [dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] presidente da Assembleia Legislativa (AL), Ho Iat Seng, espera que as mais de dez propostas que estão sob análise do hemiciclo cheguem ao fim de apreciação ainda nesta sessão legislativa. A informação é divulgada pelo Jornal do Cidadão em que Ho Iat Seng, em entrevista, apela também à entrega de propostas para que estas não caiam no abandono. O presidente da AL assegurou que o organismo “ iria fazer tudo ao seu alcance para ajudar o Governo a concluir as apreciações”. “Quanto às propostas que ainda não foram entregues, a AL vai tentar coordenar com o Governo”, afirma. Por outro lado, Ho Iat Seng considera que é necessário ter em conta o tamanho das propostas, “se é uma proposta completamente nova ou se só vai alterar alguns artigos da lei,” explicou, exemplificando com a revisão do Código Penal relativamente aos crimes sexuais, cuja revisão pode passar pela adição de artigos que já obtiveram consenso social. Quando questionado acerca do processo da Lei de Terras, Ho Iat Seng voltou a explicar que não se trata de uma revisão mas sim de uma interpretação legal, sendo que a AL ainda está na fase de audição das reuniões tidas a esse respeito. O presidente estima que a presente análise termine entre Março e Abril do próximo ano.
Hoje Macau PolíticaAssociação Geral das Mulheres quer ver licença de paternidade resolvida [dropcap style≠’circle’]É[/dropcap] a primeira reivindicação de uma lista de seis propostas deixadas a Chui Sai On, num encontro mantido para se falar das Linhas de Acção Governativa para 2017: a Associação Geral das Mulheres de Macau (AGMM) quer que o Executivo leve por diante o processo de legislação sobre a licença de paternidade com vencimento. Neste momento, a lei do território indica que os pais podem faltar apenas dois dias ao trabalho, após o nascimento dos filhos, sendo as faltas em questão justificadas. Tina Ho, presidente da AGMM, quis deixar claro ao Chefe do Executivo que a associação apoia a iniciativa do Governo em relação à licença de paternidade, tendo deixado uma proposta por escrito a Chui Sai On. Há outros assuntos que preocupam o organismo liderado pela antiga deputada: de acordo com uma nota à imprensa, a AGMM quer que seja promovida “a política favorável à família e generalizada a educação familiar”. Em matéria de saúde, as Mulheres defendem a generalização do rastreio do cancro cervical e do cancro da mama, e gostariam de ver acelerada a construção do Hospital das Ilhas. A construção da habitação pública – com maior qualidade –, os transportes públicos e medidas para facilitar a mobilidade da população são as restantes sugestões deixadas pela associação. O comunicado oficial não deixa pistas sobre a questão da licença de paternidade, mas diz que Chui Sai On concorda com “o reforço da educação junto dos pais, e a cooperação entre família e escola”, por corresponderem “à ideologia de educação moderna, favorecerem o estreitamento das relações entre pais e filhos e um crescimento saudável para as crianças”. Por isso, a questão “merece um estudo cuidadoso da parte do Governo para apoiar as escolas a desenvolver mais trabalhos neste sentido”. Quanto às medidas relacionadas com o bem-estar da população, o Chefe do Executivo afirmou, à semelhança do que tinha já feito em encontros com outras associações, que se prevê que possam ser mantidos os apoios actuais, atendendo à situação financeira que Macau vive.
Andreia Sofia Silva Manchete PolíticaImobiliário | Novos índices sem dados sobre arrendamento O Governo vai começar a divulgar novos índices de compra e venda de casa a partir de Janeiro, com base em novos factores. O economista Albano Martins alerta para o facto de o arrendamento e a especulação imobiliária continuarem de fora [dropcap style≠’circle’]É[/dropcap] já a partir de Janeiro que a população terá acesso a um novo índice de preços do imobiliário, feito com base nos dados já publicados pela Direcção dos Serviços de Finanças (DSF) e pela Direcção dos Serviços de Estatística e Censos (DSEC). Foram analisadas as declarações de liquidação do imposto de selo por transmissão de bens, referentes à compra e venda de habitação. Os valores dizem respeito aos anos de 2011 a 2015. O índice será feito com base num estudo realizado pela Universidade de Macau (UM), que teve em conta factores como a localização das casas, o número de quartos de cada apartamento, a existência de varandas e até a proximidade a escolas e supermercados. Rose Neng Lai, académica da UM responsável pelo estudo, referiu que, caso os residentes queiram saber os valores do mercado, “vão à DSEC ver o preço do metro quadrado, e essa também é uma forma razoável”. “Mas estes dados reflectem apenas as transacções daquele mês e não diferenciam o piso das fracções e ano de construção, entre outras características.” Apesar disso, o relatório elaborado pela UM assume que “é irrelevante a diferença” entre os novos dados e os que já vinham sendo publicados. De acordo com o relatório, o valor mais alto verificado na transacção de imóveis remete para o terceiro trimestre de 2014, com um índice de 257,16, mais 1,72 vezes face ao primeiro trimestre de 2011. Sem rendas Para o economista Albano Martins, este índice pouco difere dos dados que são habitualmente lançados pelo Governo. “Isso não vai acrescentar nada e está dito no relatório. Não vai acrescentar muito mais ao que já existe, porque a maior parte dos dados vão ser buscados nas transacções divulgados pela DSF e DSEC, onde está especificado onde estão os imóveis e a sua área. Há apenas um tratamento em termos de índice. Não é louvável que o Governo continue a esquecer que há uma grande fatia da população que não tem habitação própria e que não vai adquirir casa alguma”, aponta. “Vamos continuar a ter uma enorme lacuna que poderia facilmente ser colmatada com uma publicação trimestral, onde seriam analisadas das mesmas formas as rendas em várias áreas de Macau”, acrescenta. “Era muito importante que o Governo repensasse que há uma outra grande componente que é o arrendamento, num local onde grande parte da população não tem acesso à sua habitação própria. Devia haver essa componente”, concluiu.
Andreia Sofia Silva Manchete SociedadeUniversidade do Porto quer aceitar exames do ensino secundário da China e de Macau A Universidade do Porto está a analisar a possibilidade de aceitar os exames finais do ensino secundário da China e de Macau para que os alunos se possam inscrever nas licenciaturas. Maria de Fátima Marinho, vice-reitora da instituição, fala ainda da necessidade de reforçar a cooperação na área do Direito do Jogo [dropcap style≠’circle’]A[/dropcap] possibilidade de os alunos do ensino secundário da China Continental e de Macau verem reconhecidos os seus exames nacionais pela Universidade do Porto (UP) é um objectivo a cumprir nos próximos tempos. A garantia foi dada ao HM por Maria de Fátima Marinho, vice-reitora para as relações externas e cultura da UP, que esteve no território por ocasião da Feira Internacional do Ensino Superior de Macau, que se realizou no fim-de-semana. “Estamos a analisar as várias possibilidades com o exame unificado de Macau e o exame nacional da China. Estamos a iniciar conversações. Terá de ser feito um acordo, podemos fazer uma coisa semelhante ao que fazemos com o Brasil, pois aceitamos o exame do ensino médio do Brasil. O estudante pode depois candidatar-se como estudante internacional a uma licenciatura”, explicou a vice-reitora. Maria de Fátima Marinho admitiu ainda a vontade de reforçar a oferta curricular ao nível do Direito do Jogo, área que, garantiu, está muito pouco desenvolvida em Portugal. “É uma área que pode ser desenvolvida na UP pois Portugal não tem grande tradição, dado o sector do jogo ser incipiente. A cooperação que temos com a Faculdade de Direito da Universidade de Macau (UM) pode ser interessante também a esse nível. Ainda não há protocolo, e poderemos ter uma especialização ou pós-graduação.” A ideia é que a oferta curricular da UP se possa debruçar sobre áreas pouco desenvolvidas no ensino superior português. “Pode haver estudos sobre o Direito do Jogo ou outros, como Economia do Extremo Oriente, por exemplo. Podemos abordar áreas específicas que, em Portugal, ainda não são muito conhecidas ou estudadas, e que podem ser enriquecidas com a colaboração com Macau e China”, contou Maria de Fátima Marinho. Um MUST de acordo A UP arrancou com um novo ano lectivo com as vagas totalmente preenchidas, mas ainda assim a presença de alunos chineses é importante do ponto de vista académico e cultural, disse a vice-reitora. As áreas das ciências, engenharia e aprendizagem ou ensino do português são as mais procuradas numa entidade que, desde 2004, já recebeu mais de 190 alunos chineses. A UP está ainda a pensar na melhor forma de aprofundar a investigação na área da medicina tradicional chinesa. “Em Portugal é uma área que não está muito desenvolvida e onde isso pode acontecer com a participação de investigadores chineses em Portugal. Estamos a preparar uma cooperação com a UM, no sentido de melhorarmos o ensino da medicina tradicional chinesa.” Actualmente, a UP tem um mestrado nesta área, ministrado no Instituto de Ciências Biomédicas Abel Salazar. Maria de Fátima Marinho não deixou o território sem assinar um acordo com a Universidade de Ciências e Tecnologia (MUST). “Está em preparação um acordo com a MUST na área da engenharia”, referiu, adiantando que “outra universidade privada” de Macau poderá também colaborar com a UP. “A cooperação com as universidades portuguesas é também importante para a UM. Macau foi uma região sob administração portuguesa durante muitos anos e essas raízes culturais não podem ser esquecidas, e vemos como prioritário para as universidades portuguesas a cooperação com o ensino superior de Macau”, disse a vice-reitora. Se começa a ser comum os estudantes chineses optarem por Portugal para fazerem os seus cursos, pelo facto de as propinas serem mais baixas do que noutros pontos do globo, a verdade é que a ida de alunos portugueses para a China e Ásia só começou a verificar-se o ano passado. “Não há muitos portugueses a estudar na China. Ainda é um grande desafio, por causa da língua. Há casos de Medicina, de estudantes que não conseguiram entrar em Portugal. Temos cinco casos de alunos que estão na China a fazer ligação com a nossa faculdade. Temos também estudantes que estão a fazer mestrado na China com uma bolsa da China Tree Gorges. A mobilidade no sentido da Europa-Ásia é uma coisa muito recente, que só surgiu em 2015. É necessário fazer mais cooperações e que as universidades portuguesas se tornem atractivas para um público diferenciado, de países que tradicionalmente não procuravam Portugal no ensino superior. O novo programa Erasmus Mais, que começou em 2015, está a ser um bom incentivo para começar”, concluiu.
Hoje Macau SociedadeÁgua| Novas tarifas entram em vigor amanhã [dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] ajustamento das tarifas de água tem início amanhã. A informação, divulgada em comunicado pela Direcção dos Serviços de Assuntos Marítimos e da Água (DSAMA), pretende “promover o papel de mecanismo regulador das tarifas de água como alavanca económica e aumentar a motivação para a poupança de água”. O aumento previsto será moderado, informa a DSAMA, e as tarifas de consumo residencial correspondentes aos quatro escalões será de 4,48, 5,18, 6,04 e 7,27 patacas por metro cúbico, sendo que mais de 90% dos utentes “irão pagar um aumento inferior a 4,5 patacas. “Com o ajustamento, tornar-se-á maior o fosso entre os escalões implementando o princípio de quem mais consome , mais paga”, lê-se em comunicado. A mesma ideia é aplicado ao consumo não residencial em que o metro cúbico passa a ter o valor de 6,04 patacas e o Governo apoia com um subsidio de 1,7 patacas por unidade de medida, num total de 22%. Por outro lado, e de modo a promover a poupança, a DSAMA continuará a implementar o Plano de Bonificação. “Durante o período entre Outubro de 1016 e Março de 2017, de entre todos os utentes de água da torneira de Macau, a quem tiver economizado de 10% a 30% face ao período homólogo do ano transacto, será atribuída a bonificação”, explica a entidade, avançando que esta “ajuda” pode ir das 30 às 250 patacas.
Hoje Macau SociedadeDetidos da Crown sem impacto na indústria do Jogo local [dropcap style≠’circle’]A[/dropcap] detenção na China de 18 funcionários da australiana Crown Resorts, há duas semanas, por crimes relacionados com o jogo, não teve impacto na indústria em Macau, de acordo com a entidade reguladora. “Até ao momento, não vemos qualquer impacto [das detenções] em Macau. Pelo contrário, este caso é um ‘lembrete’ para as operadoras de jogo aqui [em Macau] de que quando realizam as suas operações de ‘marketing’ no interior da China têm de ter um claro entendimento das suas leis e cumpri-las”, afirmou o director da Direcção de Inspecção e Coordenação de Jogos (DICJ), Paulo Martins Chan na quinta-feira, citado pelo portal GGRAsia, de acordo com a agência Lusa. O secretário para a Economia e Finanças de Macau, Lionel Leong, já tinha dito, no final da semana passada, que as detenções não deveriam ter uma relação directa com as empresas de jogo que operam casinos em Macau. Na sequência das detenções, houve um encontro entre o director da DICJ e as seis operadoras de jogo de Macau no sentido de as “lembrar” da estrita necessidade de cumprirem as leis locais e as de outros lugares. Sem ligações ? Paulo Martins Chan afirmou ainda que nenhum dos detidos tem ligações a Macau: “Daquilo que percebemos, nenhum dos 18 detidos no interior da China eram funcionários de Macau, e as empresas de jogo aqui disseram-nos que sempre cumpriram as leis no interior da China”. A imprensa australiana noticiou, contudo, na quarta-feira, que mais dez indivíduos foram detidos posteriormente no interior da China, descrevendo-os como “organizadores chineses de ‘junkets’ [angariadores de grandes apostadores]” com ligações a Macau. O magnata de jogo australiano James Packer afirmou, na semana passada, estar “extremamente preocupado” com as detenções que, segundo disse, terão ocorrido no âmbito de uma investigação sobre os esforços do grupo para convencerem chineses endinheirados a gastar as suas fortunas em casinos no estrangeiro.
Hoje Macau SociedadeHistória religiosa converge em museu no Seminário de São José Inaugurou este mês o museu do Seminário de São José que reúne objectos de carácter religioso vindos de vários cantos do mundo. A iniciativa não só é um contributo para a história local como uma possibilidade de atrair mais diversificação turística [dropcap style≠’circle’]“T[/dropcap]esouro de Arte Sacra do Seminário de S. José”, é o museu inaugurado este mês em Macau e que mostra a história da cidade e a sua relação com a igreja católica, através de objectos trazidos por missionários de várias partes do mundo, como Goa ou Portugal. “Temos objectos de Portugal, de Goa [Índia], e de outros sítios, porque os missionários vieram de diferentes países, especialmente os jesuítas, que trouxeram muitos coisas dos seus países e das suas próprias culturas, e isto tem um valor acrescido para a população local”, disse à agência Lusa o padre Jojo Ancheril, que esteve na organização do museu, ao longo dos últimos três anos. O espaço está organizado em sete salas, exibindo desde pinturas a óleo e imagens de santos, a vestuário e objectos usados nas eucaristias. Uma das zonas é dedicada a documentos e livros escritos pelos próprios missionários, que testemunham a introdução do catolicismo na China e que são relíquias culturais de Macau protegidas, inscritos na lista “The Memory of the World Regional Register for Asia/Pacific da UNESCO” em 2010. “Temos alguns dicionários em português e inglês. (As pessoas têm curiosidade em saber) como os missionários tiveram curiosidade em aprender a língua e como foram capazes de escrever um dicionário. Na verdade, isto mostra o compromisso dos missionários”, afirmou. O projecto está a ser desenvolvido com o apoio do Instituto Cultural, e tem margem para crescer, uma vez que ainda há objectos armazenados no Seminário de São José que podem vir a ser expostos ao público, explicou. Congregar interesses O padre Jojo Ancheril destacou também a importância do museu no âmbito do turismo religioso. “[O museu] também enriquece o turismo em Macau porque muitos visitantes vêm do Japão, da Coreia do Sul, etc, para visitar as igrejas, especialmente para ver a relíquia de São Francisco Xavier e como este museu está adjacente à igreja (do Seminário de São José), as pessoas estão bastante interessadas em visitá-lo”, disse. Segundo o padre Jojo Ancheril, nas últimas três semanas o museu tem registado “boa afluência, sobretudo entre sexta-feira e domingo”, tanto por locais, como por visitantes estrangeiros, que chegam do Japão, da Coreia do Sul e até de Portugal para percorrer os dois pisos do edifício adjacente à igreja do Seminário de São José, fundado em 1728 por missionários jesuítas e património classificado pela UNESCO desde 2005. Macau, território administrado por Portugal durante mais de 400 anos, até 1999, é considerado o berço do catolicismo na Ásia e a diocese de Macau é a mais antiga do Extremo Oriente ainda em funcionamento – a primeira foi a Arquidiocese de Pequim, erguida em 1307, seguida da de Quanzhou, também na China, mas ambas desapareceram ao fim de pouco tempo.
Hoje Macau SociedadeSão Januário garante que agiu de forma correcta em caso de bebé com hipóxia O caso de uma criança que nasceu no São Januário com baixos níveis de oxigénio tem estado a dar que falar nas redes sociais. O hospital garante que o que se diz por aí é falso e vinca que fez o que podia [dropcap style≠’circle’]É[/dropcap] uma história que aconteceu já em Julho, mas que só agora chegou às redes sociais e que mereceu, nos últimos dias, dois esclarecimentos dos Serviços de Saúde. Na primeira nota à imprensa, o Centro Hospitalar Conde de São Januário (CHCSJ) explica que teve conhecimento de que há afirmações que estão a ser feitas e que não são verdadeiras: a unidade é acusada de atrasos na assistência médica no parto, o que teria provocado baixos níveis de oxigénio ao bebé em causa. “Como essas afirmações não correspondem à verdade, o Centro Hospitalar Conde de São Januário entende divulgar o histórico da situação para verdadeiro esclarecimento público”, começam por escrever os Serviços de Saúde. De acordo com CHCSJ, no passado dia 5 de Julho deu entrada no hospital uma parturiente de 40 semanas e 6 dias, de nacionalidade vietnamita, que não tinha feito a avaliação pré-natal em Macau. Uma vez que já apresentava “manifestos sinais do início do processo de parto”, o médico especialista de obstetrícia “cumpriu, de forma rigorosa, as orientações previstas para realizar o parto, após o conhecimento e consentimento da parturiente”. O bebé nasceu no dia seguinte, a 6 de Julho, às 17h15. Foi enviado para a Unidade de Cuidados Intensivos Pediátrica, local onde acabaria por ficar até 9 de Setembro. O hospital explica que depois de feitos “diversos exames foi confirmada a existência de uma doença genética rara que provoca deficiência múltipla de carboxilase, ou seja, perante esta doença e após o nascimento, o bebé manifesta hipóxia e uma série de sintomas conexos”. Por outras palavras, os baixos níveis de oxigénio não se deveram a atrasos na assistência médica mas sim à doença do bebé. O São Januário garante que “os médicos efectuaram de imediato os tratamentos indispensáveis e recomendaram à mãe a realização de exames indispensáveis, por forma a evitar a repetição de uma gravidez futura com o mesmo tipo de doença genética”. No comunicado, lê-se ainda que a mulher recebeu aconselhamento de um técnico do Serviço de Acção Social do hospital. O problema dos medicamentos O CHCSJ esclarece ainda que não exigiu aos pais o pagamento imediato das despesas médicas: “Para facilitar o pagamento autorizou os pais do bebé, cidadãos não residentes, a reunir as quantias necessárias para proceder, posteriormente, à liquidação das despesas médicas. Nunca foi exigido o pagamento imediato”. A explicação dada pelos Serviços de Saúde não terá sido suficiente para apaziguar as vozes mais críticas, pelo que, um dia depois, é publicada nova nota à imprensa, em que se explica que “a mãe do bebé doente procedeu ao exame pré-natal”, sendo que fica por se perceber onde é que a cidadã vietnamita realizou o procedimento em questão. “Mas ao bebé foi diagnosticada uma doença genética rara e metabólica que provoca deficiência múltipla de carboxilase congénita. (…) O diagnóstico da doença em causa é obtido através de um exame ao sangue ou teste genético”, continuam os Serviços de Saúde, que salientam que “caso não haja história clínica ou história genética, normalmente esta doença só pode ser diagnosticada após o nascimento”. No novo esclarecimento, são ainda divulgadas novas datas: depois do nascimento, a 6 de Julho, o hospital procedeu “ao tratamento sintomático e ao diagnóstico etiológico”, a 12 de Agosto “estabeleceu o diagnóstico preliminar” e dez dias depois “adquiriu os medicamentos necessários para o bebé doente proceder ao tratamento”. O São Januário adianta que o estado clínico da criança é estável e não correu risco de vida. “Dado que a doença é rara, neste momento não existem medicamentos para tratamento em Macau. Os pais do bebé terão de os adquirir e o CHCSJ está já a planear a compra dos medicamentos para prestar apoio a este caso”, diz ainda o comunicado.
Isabel Castro EventosSubdirector do Rota das Letras fala em Bali da experiência de Macau [dropcap style≠’circle’]F[/dropcap]alou-se de Macau por estes dias em Ubud, onde se realiza um dos mais importantes festivais literários do Sudeste Asiático. Hélder Beja, co-fundador do Rota das Letras, esteve em Bali. Uma viagem que se pode reflectir nas próximas edições do evento do território Sempre que pode, Hélder Beja faz as malas e viaja até à cidade onde está prestes a acontecer um festival literário. Foi assim com o festival literário de Paraty, em 2014, e foi assim também há uns meses, quando viajou até à Colômbia para a Feira do Livro de Bogotá. Desta vez, o destino foi mais próximo, mas há muito desejado. “Era um festival a que queria vir há muito tempo”, conta ao HM, ao telefone a partir de Bali. “Vim à semelhança da forma como estive nos outros festivais. A decisão de vir aos encontros literários é minha, venho por minha conta. Mas como sou um dos organizadores do festival literário de Macau, acabo por ter um tipo de envolvimento diferente nos festivais do que tem um visitante normal”, explica o subdirector do Rota das Letras. “No caso de Ubud, quando entrei em contacto com os organizadores fui convidado para fazer parte de um painel precisamente sobre festivais literários.” Hélder Beja participou, no final da semana passada, numa das muitas sessões que constituem o intenso programa principal do Festival de Escritores e Leitores de Ubud, uma iniciativa organizada na ilha indonésia há já 13 anos. O subdirector do Rota das Letras partilhou a mesa com a directora do festival de Bali, a australiana Janet DeNeefe, a escocesa Jenny Niven, responsável pelo aparecimento do festival literário de Pequim, e com Michael Williams, director do Wheeler Centre na Austrália, para uma sessão sobre “a vida secreta dos festivais” em torno dos livros e da escrita. Das ideias que deixou na sessão acerca do Rota das Letras, Hélder Beja destaca o facto de ter causado muito interesse a particularidade de ser trilingue – em Ubud, apesar de haver tradução para bahasa, a língua mais usada acaba por ser o inglês. “As pessoas ficaram muito curiosas com essa parte, com a parte linguística”, relata, assim como com a duração mais prolongada do festival de Macau, em comparação com outros eventos do género. A ideia da “memória palpável”, com a publicação dos livros de contos no âmbito do Rota das Letras, também foi um aspecto que mereceu atenção: “Acharam muito curioso o convite que lançamos aos escritores, todos os anos, para escreverem sobre Macau e depois traduzirmos tudo”. O festival literário de Macau é ainda diferente da maioria dos certames do género pelo facto de a grande maioria dos conteúdos do programa ser de entrada livre. “Expliquei porquê, porque é de facto bastante diferente do que acontece aqui, em Paraty ou em Bogotá.” O outro universo de escritores Sobre a experiência em Ubud, Hélder Beja refere ainda a possibilidade de conhecer escritores do Sudeste Asiático – e aqui a viagem até Bali poderá ter influência em futuras organizações do Rota das Letras, sobretudo no que toca à lista de autores convidados. Este ano com o tema “Tat Tvam Asi” – qualquer coisa que, em português, poderá ser traduzida como “eu sou tu, tu és eu” – o festival de Ubud juntou centenas de escritores, pensadores, artistas, analistas e activistas. Num dos painéis desta edição, que terminou ontem, esteve em análise o trabalho da jornalista e escritora portuguesa Susana Moreira Marques, autora do livro “Agora e na Hora da Nossa Morte”, uma obra que resulta da experiência ao lado de uma equipa de prestação de cuidados paliativos ao domicílio, em Trás-os-Montes. A diversidade de convidados vai ao encontro do objectivo da organização – reforçar “a identidade colectiva da Indonésia” – num palco que, avalia Hélder Beja, é “o sítio ideal para um festival cultural de qualquer natureza”. “Dizia na sessão que, depois de chegar, um organizador de um festival literário de qualquer parte do mundo fica um bocadinho deprimido com o seu próprio festival, porque a localização é imbatível. São indiscritíveis os espaços, só comparáveis – mas até superiores – aos que vi em Paraty, e não comparáveis a nada do que tenha visto noutros sítios. Ubud é um sítio especialíssimo”, afirma. Macau não tem o mesmo cenário, é “menos idílico”, mas o subdirector do Rota das Letras espera que o festival de cá possa vir a ser também “uma referência no mapa dos festivais literários da Ásia”.
Hoje Macau EventosFórum do Livro de Macau | Casa cheia em Lisboa para ouvir poetas da terra [dropcap style≠’circle’]«A[/dropcap] poesia é uma grande ligação entre os povos e os homens». As palavras foram ditas pelo ministro da Cultura, Luís Filipe Castro Mendes, na sessão sobre poetas de Macau que teve lugar na Fundação Casa de Macau, no sábado em Lisboa. Parte do programa do Fórum do Livro de Macau, foi o primeiro evento unicamente dedicado à poesia e aos vários poetas, portugueses e chineses, que escreveram e escrevem sobre Macau. A sessão, coordenada por Fernando Sales Lopes, que a abriu com poemas de Camilo Pessanha, passou por vários nomes e várias línguas. Ouviram-se versos em Português, em Mandarim e em Patoá com um poema de Adé. A barreira linguística, sempre a maior, continua a dificultar o conhecimento de poetas chineses e poucos são traduzidos para Português. Mas, e apesar do grande obstáculo linguístico, Fernando Sales Lopes acredita que é importante qualquer passo de aproximação. E o encontro de sábado, organizado pela Associação de Amigos do Livro em Macau e pela Fundação Casa de Macau, realizou-se nesse sentido. A casa estava cheia com muitos amigos a trocarem palavras de reencontro num espaço onde se partilha o amor pelo Oriente. Na sua breve comunicação, o ministro da Cultura fez questão de referir que por ocasião da recente visita do primeiro-ministro à China, pôde testemunhar «o interesse genuíno do governo central chinês em Macau». As marcas da nossa história, disse o ministro Castro Mendes, são fundamentais para a construção do futuro. «Macau é uma charneira entre a grande nação chinesa e o mundo de língua portuguesa», acrescentou. Recordar é dizer Para Fernando Sales Lopes, com a sessão em Lisboa queria igualmente recordar amigos como o poeta Alberto Estima de Oliveira que faleceu em 2008. Presente na sala, foi o jornalista Hélder Fernando quem recordou os versos de Estima de Oliveira. Numa tarde em que o sol quente entrava pelas janelas do icónico edifício em Lisboa, várias foram as palavras de saudade sobre o poeta Estima de Oliveira. A sessão que se estendeu por quase duas horas deixou o “palco” aberto para todos os poetas e, a alguns presentes no público, foram dados sinais a chamá-los para ouvir a poesia dita pelo próprio. Foi o que sucedeu com Jorge Arrimar mas também com Ana Cristina Alves que leu uma tradução chinesa de um poema. António Bondoso, António Graça de Abreu, José Augusto Seabra, Cecília Jorge, Yao Jingming, Fernanda Dias, Alberto Estima de Oliveira, Fernando Sales Lopes, e a lista dos poetas lembrados podia continuar. A poesia encheu a Fundação Casa de Macau numa sessão onde estiveram igualmente presentes o general Garcia Leandro e o general Rocha Vieira, antigos governadores de Macau durante a administração portuguesa. Maria João Belchior
Hoje Macau China / ÁsiaHomem mais rico de Hong Kong continua a desinvestir na China [dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] homem mais rico de Hong Kong, Li Ka-shing, acordou a venda de um complexo de escritórios e espaços comerciais em Xangai, a “capital” económica da China, no seu mais recente desinvestimento no país asiático. O negócio, avaliado em 20.000 milhões de yuan foi anunciado na quinta-feira, num comunicado enviado à bolsa de Hong Kong, mas sem detalhar o nome do comprador. A venda do complexo, que tem uma área total de 269.000 metros quadrados e fica localizado em Pudong, o centro financeiro de Xangai, permitirá ao grupo de Li Cheung Kong Property Holdings Ltd. arrecadar lucros no valor de 802 milhões de dólares, refere o comunicado. Na mesma nota diz-se que o negócio deverá ficar concluído em 2018. Mudança e “ingratidão” Nos últimos anos, Li Ka-shing tem vindo a vender investimentos imobiliários na China – onde o crescimento económico abrandou para o ritmo mais baixo em 25 anos -, após ter investido fortemente no país nos anos 1990. Ao mesmo tempo, o magnata tem reforçado os seus investimentos na Europa, alimentando especulações de que está a perder confiança no mercado chinês. No ano passado, o Diário do Povo, jornal oficial do Partido Comunista Chinês, acusou o magnata de ser ingrato por vender os bens na China continental, numa altura em que o país enfrenta desafios económicos. “Partilhou a prosperidade enquanto estivemos numa boa fase, mas não consegue enfrentar as adversidades connosco, agora que temos dificuldades. Emocionalmente, isto é realmente inaceitável”, escreveu o jornal na sua conta oficial no Wechat (o WhatsApp chinês). A venda dos activos de Li na China continental surge também numa altura de depreciação da moeda chinesa, o yuan, que atingiu na quinta-feira o seu valor mais baixo dos últimos seis anos, face ao dólar norte-americano. Em Outubro de 2015, um grupo controlado por Li Ka-shing pagou mil milhões de euros ao fundo Magnum pela Iberwind, o segundo maior operador eólico em Portugal.
Hoje Macau China / ÁsiaSexto Plenário | PCC declara Xi Jinping líder “central” [dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] Partido Comunista da China (PCC) declarou na quinta-feira o seu secretário-geral, Xi Jinping, líder “central” da organização, confirmando a sua ascensão como o mais forte Presidente que o país conheceu nas duas últimas décadas. Num comunicado difundido pela imprensa oficial, a liderança apela a todos os membros do partido para que “se mantenham fortemente unidos em torno do Comité Central do PCC com o Camarada Xi Jinping no centro”. O anúncio surge após uma reunião entre 400 altos quadros do PCC, que durou quatro dias e abordou as “regras da disciplina interna” na organização e “as directrizes para a vida política” dos seus membros. Desde que ascendeu ao poder em 2012, Xi Jinping conseguiu acumular mais poder do que todos os Presidentes chineses desde Mao Zedong, o fundador da China comunista. Em Dezembro do ano passado, os líderes locais adoptaram a referência a Xi como “líder central”, mas deixou de ser usada pouco depois, sugerindo que o Presidente chinês encontrou resistências na consolidação do seu poder. Analistas ocidentais admitem já que Xi Jinping ficará no poder para além do período previsto de dez anos. Para durar A decisão do Comité Central de elevar Xi a “líder central” é “muito significativa”, afirmou à agência France Presse Willy Law, professor de ciência política na Universidade Chinesa de Hong Kong. Na política chinesa, “o termo ‘central’ refere-se a um nível de autoridade individual sem restrições”, explicou. “Uma liderança central pode durar para sempre”, disse, acrescentando: “Não existe ideia de mandato limitado ou idade para se retirar”. A constituição chinesa define um limite de dois mandatos de cinco anos para o Presidente do país, mas não estabelece um limite para secretário-geral do PCC, o cargo mais importante na China. Deng Xiaoping, o “arquitecto-chefe das reformas económicas” que abriram a China à economia de mercado, e que liderou o país durante os anos 1980 e 1990, era referido como o “centro” da liderança do partido. O seu sucessor, Jiang Zemin (governou entre 1989 e 2002), era apenas designado como “centro” da terceira geração de líderes, enquanto Hu Jintao (2002 a 2012) nunca chegou a atingir aquele estatuto. “Um líder central é necessário para a nação e para o partido”, apontou o Diário do Povo, jornal oficial do PCC, num editorial difundido após a reunião, que decorreu esta semana. Xi “reflecte as aspirações comuns de todo o partido, todo o exército, todo o país e o seu povo”, disse. O sexto plenário do Comité Central foi a última reunião de alto nível antes da liderança do partido ser remodelada no próximo ano. Crime e castigo Após ascender ao poder, Xi lançou uma campanha anti-corrupção, hoje considerada a mais persistente e ampla na história da China comunista, e que resultou já na punição de um milhão de membros do partido. Os alvos incluíram oficiais menores, a que Xi se refere como “moscas”, mas também mais de uma centena de “tigres” – altos quadros do partido, com a categoria de vice-ministro ou superior. Os dois casos mais mediáticos envolveram a prisão do antigo chefe da Segurança Zhou Yongkang e do ex-diretor do Comité Central do PCC e adjunto do antigo presidente Hu Jintao, Ling Jihua. No braço político do exército, a Comissão Militar Central (CMC), que era considerada intocável até então, dois ex-vice-presidentes foram investigados por corrupção. O comunicado difundido na quinta-feira decreta “tolerância zero” para a má conduta entre os membros da organização. O partido deve “construir com perseverança um sistema em que [os seus membros] não se atrevem a ser corruptos, não podem ser corruptos e nem pensam em corrupção”, afirma. A mesma nota apela ao reforço do controlo interno no PCC, incluindo a conformidade ideológica e um sistema de vigilância mais rigoroso sobre os seus membros.
Hoje Macau China / ÁsiaMilhares de pessoas fazem fila para visitar o caixão do rei da Tailândia [dropcap style≠’circle’]D[/dropcap]ezenas de milhares de tailandeses deslocaram-se sábado ao Grande Palácio de Banguecoque, onde a população foi autorizada a entrar, pela primeira vez, na sala do trono, onde se encontra o corpo do rei Bhumibol Adulyadej. Bhumibol, que morreu há duas semanas, era adorado por muitos dos seus súbitos e visto como uma âncora de estabilidade num país frequentemente abalado por uma política turbulenta. A sua morte, aos 88 anos, fez o país entrar num ano de luto oficial, com a maioria dos tailandeses a vestirem apenas roupas pretas e brancas. Nas duas últimas semanas, multidões juntaram-se no exterior do Grande Palácio, um complexo de templos e pavilhões sumptuosos na zona antiga de Banguecoque, para prestarem homenagem junto do retrato do monarca. No entanto, sábado foi a primeira vez que o público pôde entrar na sala do trono, onde o seu corpo descansa deitado num caixão. “Estou à espera desde a 1:00”, disse Saman Daoruang, de 84 anos, enquanto esperava na fila em ‘s’ que ocupava um vasto terreno junto ao palácio. Segundo as autoridades, cerca de 10 mil pessoas vão poder entrar na sala por dia, em pequenos grupos. Tal como muitos outros, Saman tem dormido numa tenda desde que chegou a Banguecoque de comboio, vindo da província de Nakhon Sawan, no norte do país. “Não tenho sido capaz de dormir porque estava tão entusiasmado e orgulhoso de aqui vir”, disse à AFP, enquanto segurava vários retratos do monarca. Cimento da nação Bhumibol Adulyadej era considerado o único “cimento” de uma nação muito dividida politicamente e tinha um estatuto de semideus. Subiu ao trono em 1946 após a inexplicável morte de seu irmão e muitos tailandeses nunca conheceram outro soberano. Após a sua morte, o chefe da junta militar, que tomou o poder em 2014, anunciou um período de luto de um ano e uma redução de todas as actividades de divertimento durante 30 dias. As televisões com emissões difundidas na Tailândia apenas poderão apresentar programas relacionados com a casa real, também no decurso de 30 dias. Intensificou também a aplicação das leis de lesa-majestade, que punem as críticas à monarquia com até 15 anos de prisão por ofensa. Esta lei reprimiu a discussão pública sobre o herdeiro ao trono, o príncipe Maha Vajiralongkorn. Ao contrário de todas as expectativas, algumas horas depois da morte de Bhumibol, o príncipe herdeiro, de 64 anos, disse necessitar de tempo antes ocupar o lugar de seu pai.
Hoje Macau Diário (secreto) de Pequim h | Artes, Letras e IdeiasDiário (secreto) de Pequim | Beidaihe, 30 de Julho de 1978 [dropcap style≠’circle’]A[/dropcap]lém da praia, bem agradável, mais uma visita, agora a uma fábrica de vidros, de nome Yao Hua, o que significa “Glória da China”, começada a construir em 1924 por um cidadão belga perdido por estas paragens e por um filho de Yuan Shikai, o tal general que em 1916, após a fundação da república chinesa, se auto-proclamou imperador de uma nova dinastia e, entre os conluios pelos corredores do poder, acabou por ser morto logo a seguir, por envenenamento. A fábrica, ocupada pelos invasores japoneses em 1936, conta hoje com 4.100 operários, e tem muitas histórias para contar. Está a laborar em pleno, com dois enormes fornos e dezoito complexos de maquinaria. Produz desde berlindes a vidraças de grande dimensão, 9.000 caixas de vidro por dia, cada com 200 quilos, 25% das quais destinadas à exportação. Eu vou aprendendo. A vidraça é fabricada com nove espécies diferentes de materiais, a saber, areia, quartzo, óxido de cálcio, manganésio, óxido de sódio, sulfato de sódio, cal, carvão em pó e fluoreto de cálcio. Fabricam também fibra de vidro para uso electrónico, seda de vidro e tela de fibra para isolamentos. Mas dizem-me que a tecnologia de que dispõem ainda é baixa e atrasada, não corresponde às exigências da indústria moderna. Pensam produzir vidro estampado, com desenho de flores, automatizar grande parte da maquinaria, utilizando computadores. O salário máximo é de 160 yuan por mês para os engenheiros veteranos, o médio, de 60 yuans e o mínimo é de 37,5 yuans. Os operários que trabalham junto aos fornos recebem um subsídio extra de alimentação. Muito interessante o complexo vidreiro. Tenho a sorte de poder conhecer na China tanta coisa, tanto lugar onde jamais entraria no meu Portugal. Pequim, 9 de Agosto de 1978 Na calma do Verão continuo a estudar, a ler tudo o que me chega sobre a China, e não é nada pouco. Estou a organizar um ficheiro “chinês” por temas, autores, personalidades, história. Tenho trabalho para o resto da vida. Pequim, 29 de Setembro de 1978 Ida à comuna popular de Dong Beiwang, que significa “Prosperidade do Nordeste”, uns quarenta quilómetros a norte de Pequim. Como de costume nestas visitas, logo à chegada somos brindados com uma longa explanação sobre as realidades e virtudes do lugar, desta vez por parte do camarada Wang Chong, um dos vice-directores da comuna. Aí vai parte do relatório: A comuna foi fundada em 1958, juntando quatro cooperativas agrícolas. Engloba 3.700 famílias, num total de 14.000 pessoas, 6.000 das quais aptas a trabalhar todos os dias. A cada um segundo o seu trabalho. Contam com uma superfície de 33 km 2 e 1.500 hectares de terra cultivada. Têm uma estação agro-técnica com armazéns para adubos, oficinas para a reparação de tractores e outras alfaias agrícolas. Existe ainda uma policlínica, uma fábrica de papel, outra de ferramentas. Assim se diversifica a economia da comuna popular. Têm 500 vacas, cada uma produz 14 litros de leite por dia, já com ordenha mecânica. Criam 60.000 patos por ano, cevados, alimentados à força para engordarem rapidamente e, depois de bem assados, resultarem no famoso pato lacado de Pequim, uma das delícias da cozinha chinesa. Fui ver como alimentam as aves. É um bocado deprimente olhar para os patos com uns canudos enfiados pelas goelas as abaixo, sendo obrigadas a engolir enormes quantidade de farinha. Escavaram diversos poços ou tanques largos onde criam milhares de peixes de água doce, outra fonte de rendimento. O trigo, o milho, o arroz são as principais culturas mas não tem sido fácil estender as terras cultivadas. Os terrenos são acidentados, necessitam de ser nivelados, de se unir as parcelas separadas, de se fazerem obras de irrigação, enfim para bem dos homens é preciso alimentar, dar de beber a estas terras. Parece estarmos numa economia colectiva que se auto-abastece do que necessita, e ainda sobra alguma coisa para vender. Mais dados: Têm 27 tractores e 300 moto-cultivadoras, mais 11 ceifeiras-debulhadoras. Só a transplantação do arroz é manual, os outros trabalhos já estão mecanizados. 2/3 das sementes são produto da investigação científica da comuna. A produção tem aumentado, em 1958 era de 2.520 quilos de cereal por hectare e agora é de 7.500 quilos. As máquinas e as pequenas fábricas só surgiram depois da formação da comuna, em 1958. O salário médio dos camponeses varia entre 380 a 400 yuans, por ano. Eu próprio, como estrangeiro tradutor nas Edições de Pequim em Línguas Estrangeiras, ganho 550 yuans por mês, com casa, água, luz e assistência médica, tudo à borla. Mas os dezanove chineses que comigo trabalham nas Edições auferem quantias entre 45 e 70 yuans por mês, dez vezes menos do que eu, um pouco mais do que estes camponeses. É verdade que esta boa gente da comuna popular não paga renda, nem infantário ou escola para os filhos, e beneficia também de assistência médica gratuita. Cada família tem direito a uma parcela privada de terra com 66 metros quadrados. Aí cultivam alguns legumes e criam porcos, galinhas, ovelhas e cabras que vendem como muito bem entendem. Na comuna funcionam dez escolas primárias e duas secundárias. Dizem-me que este ano 62 jovens da comuna entraram na universidade. Cada equipa de produção tem direito a um televisor, a preto e branco. Na visita à Comuna Dong Beiwang, avanço sozinho pelas humildes casas, pelos campos bem tratados. Um rancho de crianças faz-me companhia, curiosas por verem um estrangeiro na sua aldeia. Esta é a China rural, ainda carente de quase tudo, centenas de milhões de chineses sobrevivendo em economias de subsistência, gente pobre que hoje já não morre à fome mas merece uma vida melhor. Pequim, 2 de Outubro de 1978 Outra vez o faustoso banquete no Grande Palácio do Povo nas comemorações dos vinte e nove anos de fundação da República Popular da China. Exactamente igual aos outros dois onde já estive presente, Outubro e Dezembro do ano passado. A única, e parece que decisiva mudança, foi a presença de Deng Xiaoping que no seu discurso surgiu poderoso e confiante quase a subalternizar dentro do Partido o sucessor designado por Mao Zedong, o cada vez mais apagado Hua Guofeng. Pequim, 4 de Outubro de 1978 Esta tristeza de viver dias solitários, plenos de gente ecoando na redoma do ser. Esta surdez capaz de ouvir o espiralar do silêncio e a música do vento nas florestas. Esta fome jamais saciada, à solta por campos de sorgo e trigais dourados de pão. Estes olhos serenos, cerrados, abertos para madrugadas de coral e maresia. Estes dias, com o sol difuso a pintar de cinza a labuta dos homens. Esta corda atada em volta do brilho do olhar e do prateado da lua. Estes perfumes de saudade estendendo-se pelas margens cintilantes do Outono. Estas mãos gretadas, puras na certeza de guardar e dar, Esta voz soluçante, cantando. Pequim, 21 de Outubro de 1978 Algum dia teria de me calhar a sorte ir trabalhar no campo, com os camponeses de uma comuna popular. A directiva do presidente Mao datada de 7 de Maio de 1966, institucionalizando as “Escolas 7 de Maio” 五七干校 , logo no início da Revolução Cultural, pressupunha reeducar os quadros e os intelectuais lançando-os num contacto intenso com a labuta dura e diária dos camponeses. Vieram-me buscar ao Hotel da Amizade, às cinco da manhã, num mini-bus. Fomos a Adélia Goulart, o Hans que trabalha na secção alemã da revista Beijing Informação e depois, junto à Rádio Pequim, entrou a Angelina Martins, brasileira, a viver e trabalhar na China, na Rádio, com o marido, o Jayme Martins, há mais de dez anos. Seguimos, numa estirada de quase cem quilómetros, por maus caminhos mas quase sem trânsito madrugador, para a comuna popular de Waiwengu, no distrito de Guhang, já na província de Hebei. Era a nossa “Escola 7 de Maio”, apenas por um dia. Chegados à aldeia, pobre mas organizada, fomos ouvir o relatório do chefe da comuna, o camarada Su Xiangyu. Começa por nos dizer que o solo da comuna é arenoso e difícil de cultivar. Quase só dá arroz, por isso têm de gerir cuidadosamente a água, as outras culturas crescem com dificuldade, a produção depende das condições climatéricas e não é estável, produzem 400 quilos de cereais por mu (cada mu são 666,7 m 2) e consideram que apesar da seca são números razoáveis. O trabalho é sobretudo manual, possuem poucas máquinas, quase nenhuns tractores e debulhadoras mesmo assim contam com uma pequena fábrica de parafusos e de sacos de papel onde trabalham os familiares dos quadros do Partido. Têm um autocarro que transporta os alunos para a escola e que também é alugado às outras comunas próximas, o que acrescenta algum dinheiro ao magro pecúlio da terra. Três tardes por semana são dedicadas ao estudo. Aprendem mais chinês e lêem textos escolhidos do presidente Mao. Concluída a arenga sobre as realidades da comuna de Waiwengu, era tempo de nós arregaçarmos as mãos e trabalhar. Destinaram-nos umas dezenas largas de fardos de palha que estavam alinhados ao longo do campo e nós devíamos agarrar, levantar do chão e colocar cuidadosamente no atrelado de um tractor que circulava a nosso lado. Esta era a labuta inicial dos recém-chegados filhos de uns tantos “diabos estrangeiros”. A minha roupinha, tipo fato-macaco maoista, começou a ficar coberta de fiapos de palha. E eu já suava. Mas em mim gosto do dever cumprido. Às onze e meia foi tempo de almoço, uma pobre vianda camponesa para enganar a fome e às treze horas era tempo de recomeçar o trabalho. Agora tínhamos de descarregar os fardos de palha dos atrelados do tractor e de os empilhar a preceito num dos grandes armazéns da aldeia. Tudo concluído, chegámos ao fim da tarde, exaustos, cansados. Vida de camponês chinês não é fácil, no entanto penso que era capaz de passar aqui um ou dois meses, ia aprender, não me fazia mal nenhum. 75% da população da China vive no campo, este é o país mais do que real, tão mal conhecido pelos estrangeiros. Yulan, uma das chinesas jovens que comigo trabalha nas Edições, contou-me que há uns tempos atrás foi mandada para uma comuna a fim de ser “reeducada pelos camponeses”, também numa Escola 7 de Maio. Puseram-na a plantar arroz, afundada na lama de um arrozal. Menina da cidade, de mãos limpas e mimosas, desabituadas a qualquer esforço para além da pena e da caneta, disse-me que tinha tanta a sua falta de jeito que eram mais os molhos de arroz que arrancava do que os plantava. Não foi o meu caso, nem o da Adélia, do Hans, da Angelina. Demos o nosso melhor, trabalhámos bem, quase até à exaustão, no meio daqueles calejados camponeses, que sorriam sempre face a tanta dedicação, labor e entusiasmo destes estranhos intelectuais chegados do outro lado do mundo. Já no regresso a Pequim, a Angelina Martins, brasileira de São Paulo, contou-nos uma interessante história acontecida com o Jayme, o seu marido. Trabalham ambos na Secção Portuguesa da Rádio Pequim e há uns tempos atrás mandaram o Jayme para uma comuna popular, 300 quilómetros a norte de Pequim, para ser “reeducado”. Necessitando cagar, o Jayme dirigiu-se à latrina colectiva da aldeia, um grande buraco ao ar livre onde os camponeses depositavam as suas fezes e urinas que, depois da devida fermentação, eram utilizadas para adubar a terra. O Jayme agachou-se, tirou as calças e ali ficou, de bunda ao vento, tentando evacuar os seus cocós, o que não foi fácil, os seus intestinos estavam algo presos. Face à demora, olhou para trás e, para seu espanto, tinha já ali, do outro lado, quase uma centena de camponeses chineses contemplando curiosos o seu rabo. Rabos há muitos mas uma bunda estrangeira, brasileira, ao léu, numa comuna popular, no nordeste da China, cagando lentamente na brisa da tarde, é raríssima. 五七干校 António Graça de Abreu
Hoje Macau VozesDireito de resposta do candidato à presidência da Associação de Pais da EPM [dropcap style≠’circle’]E[/dropcap]xm.º Senhor Director do Jornal Hoje Macau (Att Exm.ª Senhora Sofia Mota) Em nome da lista candidata aos órgãos associativos da Associação de Pais e Encarregados de Educação da Escola Portuguesa de Macau (APEP) agradecia a publicação, ao abrigo do direito de resposta, da seguinte posição da Lista admitida : 1. Saudar a deliberação da Direcção da APEP de admissão da nossa lista, após terem dado prazo para a mesma ser completada e que permitiu, desde já, renovar e aumentar o efectivo de associados da APEP em mais de uma dezena. Revelou boa fé e “fair play democrático”. Sendo certo que já tinham declarado não desejar continuar o possibilitar o aperfeiçoamento da lista está conforme com o principio democrático sendo sempre, em nosso entendimento, preferível esta mera irregularidade do que obrigar quem não tem vontade e/ou força anímica a continuar. 2. Saudar o empenho associativo de quem impugnou o acto eleitoral, na expectativa de que possa aproveitar a oportunidade impar de promover uma lista com propostas alternativas em saudável ambiente democrático. 3. Saudar a douta deliberação da mesa da Assembleia Geral, a qual permite duplamente sanar a irregularidade e promover uma estimulante e genuína eleição, caso se venha a verificar a constituição e admissão de outra lista, com outra equipa e outras prioridades de acção. 4. Exortar todos os associados da APEP a contribuírem com ideias e a participarem na vida associativa, designadamente no acto eleitoral que, previsivelmente, decorrerá no próximo dia 24 de Novembro. Macau, aos 28 de Outubro de 2016 Pela Lista Candidata aos Órgãos Associativos da APEP Manuel Gouveia manuelggouveia@gmail.com Candidato a Presidente da Direcção da APEP
Rui Flores VozesA válvula de escape [dropcap style≠’circle’]A[/dropcap] libra esterlina encontra-se em mínimos históricos. Os bancos internacionais que durante anos tiveram as suas sedes europeias em Londres estão a anunciar a saída do Reino Unido até ao final do ano, não esperando pela invocação do artigo 50.° do Tratado da União Europeia pelo governo britânico. A responsável pelo governo escocês já anunciou que a Escócia vai preparar-se para um novo referendo sobre a independência. As consequências iniciais da recuperação da soberania nacional britânica em relação a Bruxelas parecem ser desastrosas. As perspectivas de dias mais risonhos não parecem convencer muitos. Pelo menos por ora, enquanto as consequências financeiras continuarem a afectar o bolso dos britânicos que estão a ver o seu poder de comprar diminuir ao ritmo da desvalorização da sua divisa. As sondagens mostram que o número de eleitores que se encontram arrependidos por terem votado “leave” no referendo de 23 de Junho seria suficiente para ter dado a vitória ao campo do “remain”. Isto tudo além do “vox populi”, dito por vários britânicos, meio a sério, meio a brincar, de que nunca o termo “União Europeia” foi tão pesquisado quanto na noite em que foram anunciados os resultados do referendo. Que ninguém parece ter alguma vez pensado em todas as consequências do Brexit é um dado adquirido. Havia umas suposições. Supunha-se que a libra pudesse flutuar mais do que quando a Grã-Bretanha estava dentro da União Europeia, embora nunca tenha adoptado o euro como divisa nem tenha aderido ao espaço Schengen, expressão máxima da livre circulação de pessoas no interior das fronteiras da União Europeia. Mas a possibilidade da desvalorização da libra seria algo, pois, que precisaria de ser confirmado pela realidade dos factos. Supunha-se que a União Europeia não aceitaria que um futuro acordo de comércio livre entre o Reino Unido e a União não contemplasse a livre circulação de pessoas. Mas isso poderia ser discutido. Negociado. Em política nada é certo, embora o acordo que existe entre a União e a EFTA (Associação Europeia de Comércio Livre, composto pelo Islândia, Liechtenstein, Noruega e Suíça), tenha como uma das suas premissas a livre circulação de pessoas entre os quatro estados e a União. Alias, a intransigência dos suíços em relação à circulação de pessoas levou a que as negociações com a União Europeia se prolongasse por 20 anos. E só foi desbloqueado depois de as autoridades helvéticas terem aberto as portas à entrada de estrangeiros sem restrições. Ainda assim, supunha-se que a Grã-Bretanha conseguiria travar a imigração de europeus. E isso seria um dado positivo, pois os britânicos haveriam de ter recuperado a sua soberania. Quatro meses passados sob o referendo que ditou a saída do Reino Unido da União Europeia, os vários sinais que saem de Londres apontam num só sentido. Ninguém sabe muito bem como se vai processar a retirada do Reino Unido. À cabeça de todos os responsáveis britânicos, Theresa May – para quem Brexit alegadamente “significa Brexit”, como ela disse quando substituiu David Cameron na chefia do governo – não parece estar particularmente empenhada numa solução rápida. Anunciou para Março a invocação do artigo 50.° do Tratado da União Europeia, mas o conteúdo da proposta da futura relação com o bloco europeu não é nada clara. Aliás, caso não cumpra a promessa de iniciar formalmente negociações com Bruxelas até Março qual será a consequência desse incumprimento? Se do ponto de vista politico, tudo indica que Theresa May está longe de ter definido o que será o conteúdo da proposta da futura relação do Reino Unido com a União Europeia, do ponto de vista institucional sucedem-se as vozes que pedem que seja o parlamento britânico a ter a palavra final no conteúdo do novo acordo a estabelecer com Bruxelas. A justiça britânica já foi chamada a tomar posição, determinando qual deverá ser o papel destinado ao parlamento em todo este processo. Enquanto o caso aguarda superior decisão pela justiça britânica, durante este fim-de-semana o ex-primeiro-ministro britânico Tony Blair veio contribuir um pouco mais para a confusão. Segundo Blair, a Grã-Bretanha deve manter as suas opções abertas sobre o Brexit, o que é como quem diz “devemos considerar a possibilidade de não avançar com a saída do bloco europeu”. Como o parlamento britânico deve ser soberano em matéria de relações externas, dizem muitos juristas, estaria encontrada uma porta de saída para o imbróglio do Brexit. Blair veio dizer o que muitos pensam. A angústia sobre a futura relação da Grã-Bretanha agravou-se esta semana com as dificuldades colocadas pela Valónia, região belga com pouco mais de três milhões de habitantes, governo e parlamentos próprios, em aceitar o acordo de comércio livre com o Canadá – um documento com mais de 1600 páginas negociado entre Bruxelas e Otava nos últimos sete anos. As dificuldades colocadas pela Valónia estão a ser interpretadas em Londres como um sinal dos inúmeros trabalhos que o Reino Unido ainda vai ter de superar para consumar o seu divórcio com o clube dos 28. É que a seguir a qualquer acordo estabelecido com Bruxelas, os termos da relação futura entre britânicos e a Europa a 27 vão ter de ser ratificados por pelo menos 38 dos parlamentos nacionais e regionais da Europa. E poderão nessa altura surgir outras Valónias. E depois há outras feridas pelas quais poderá ainda brotar muito sangue. Feridas anunciadas como o novo referendo sobre a independência da Escócia. Tudo consequências muito pesadas para quem queria ver restaurada a sua soberania nacional.
Sofia Margarida Mota Manchete SociedadeEPM | Irregularidades levam a adiamento de eleições na associação de pais As eleições para a associação de pais da Escola Portuguesa foram adiadas um mês devido a irregularidades no processo. A actual direcção não vai ter continuidade e há uma nova lista [dropcap style≠’circle’]A[/dropcap]s eleições para os órgãos sociais da Associação de Pais da Escola Portuguesa de Macau (APEP) foram ontem impugnadas. A informação foi avançada ao HM pelo actual presidente da direcção, Fernando Silva, que explica que “houve um impugnação do acto eleitoral e a mesa da assembleia decidiu adiar as eleições por mais um mês”. As eleições estavam inicialmente marcadas para o passado dia 20. No entanto, e de acordo com Fernando Silva, a lista então apresentada “apenas indicava elementos para a constituição da direcção e não tinha membros para integrar a assembleia ou o conselho fiscal, o que não é permitido pelos estatutos”. “Como só havia essa lista e os membros [dos actuais órgãos sociais] não estavam na disposição de continuar, a direcção decidiu dar mais dois dias úteis para que a lista fosse completada”, continua. Com efeito, a lista que ontem iria ser apreciada apresentou a totalidade dos membros, mas “a direcção actual não tinha o direito de prorrogação e quem teria essa competência seria a mesa da assembleia”. Fernando Silva admite a irregularidade da actual direcção com esta “falha”. “Na nossa boa vontade cometemos um acto ilegal”, concede. Com o adiamento de um mês, estão abertas as candidaturas aos interessados em avançar com o processo, sendo que a lista que iria ontem a votos já se encontra formalizada. A falta de pais a contribuir activamente para a APEP deve-se ao facto de ser “um trabalho voluntário que nem sempre interessa, porque ninguém se candidata a ser voluntário”, afirma, enquanto lamenta que “criticar toda a gente critica, mas produzir qualquer coisa em prol da comunidade já é mais difícil”. Males que vêm por bem O HM falou com Ana, mãe de dois filhos que estudam na EPM. Confrontada com a alteração eleitoral, considera que “pode ser um factor positivo”. “Desta forma há tempo para que se possa dar a conhecer as listas candidatas, sejam elas quantas forem, bem como os seus programas de acção”, explica. Para esta mãe, o adiamento das eleições pode permitir que haja mais interessados, o que vai promover o debate de ideias e criar algum dinamismo nos pais e na associação. Por outro lado, “vai dar a possibilidade às pessoas para conhecerem, a tempo e horas, as ideias que possam constar dos programas das listas”, afirma. A encarregada de educação explica que, até agora, não houve tempo para os associados conhecerem a lista candidata e o que esta se propõe fazer: “Assim as coisas podem ser feitas como devem ser, até porque a lista candidata foi afixada na quarta-feira, para eleições que se realizariam ontem”. Lufada de esperança Enquanto mãe, Ana considera que as prioridades a ter em conta para os candidatos à Associação de Pais da EPM “começam pela questão dos uniformes, que foi muito contestada”. O ensino do mandarim e do cantonês também são aspectos que devem ser ponderados pelas listas que se venham a candidatar. “O cantonês é a língua que se fala cá e por isso poderia ser uma opção de ensino”, ilustra Ana. “O mandarim que já é leccionado deveria incluir mecanismos capazes de motivar os miúdos para a aprendizagem da língua e assegurar que os professores estejam numa base contínua, por um lado, e por outro que pudessem conseguir comunicar e explicar às crianças a matéria numa língua comum e que elas entendessem”, diz. “Há professores de mandarim na EPM que não falam mais nenhuma língua e, como tal, não conseguem comunicar com as crianças”, ilustra. A questão dos manuais escolares também deve merecer atenção. “Só esta semana é que o meu filho teve acesso a todos os livros, que foram pedidos em Julho”, comenta, sendo que, até agora, “tem andado com fotocópias de um lado para o outro.” Ainda em relação ao processo eleitoral, Ana está surpreendida com a existência de uma lista “nova”. “Normalmente há uma lista única que é a da associação vigente e, agora, há uma formação completamente nova, o que acontece pela primeira vez”, afirma, curiosa e agradavelmente surpreendida.
Isabel Castro Entrevista MancheteRogério Miguel Puga, académico: “Há muita investigação ainda por fazer” São histórias de mulheres com olhares muito diferentes, que completam o vazio sobre o quotidiano da Macau do século XVIII. O investigador Rogério Puga voltou ao território para participar na conferência internacional “Discursos memorialistas e a construção da história”, que termina hoje na Universidade de Macau. E explica-nos o que se descobre sobre o passado desta cidade quando se vai de Boston a Filadélfia. [dropcap]T[/dropcap]rouxe a Macau o caso do diário de Caroline H. Butler Laing, uma norte-americana, escritora, uma mulher de família também, que passou por cá no século XIX em viagem com o marido. Que diário é este? Que escritas femininas são estas? São escritas protestantes, um olhar protestante sobre Macau, que estranha quer o chinês, quer o português católico. É uma mulher que vem de Nova Iorque, muitas vinham de Boston, e nunca tinham visto católicos. O português católico é tão exótico para estas mulheres quanto o chinês. Elas têm de descodificar esses dois outros que encontram em Macau. São exercícios religiosos: os católicos confessam-se, os protestantes não, pelo que escreviam diários como exames de consciência para ver o que tinham feito bem e o que tinham feito mal. Estas mulheres passam o ano todo em Macau, os maridos estão em Cantão seis meses, elas ficam sozinhas aqui com os empregados e os filhos, aborrecidas até à morte, rodeadas de católicos e de chineses, e descrevem desde o cão que está a latir aos cortinados e às cadeiras. Para se reconstituir a história do quotidiano da Macau do século XIX estas fontes são riquíssimas, são muito melhores do que as fontes portuguesas. Elas eram tradutoras culturais, porque tinham de explicar tudo ao mínimo pormenor sobre a China. Estes diários eram epistolares, em forma de carta, eram enviados para os Estados Unidos, e a rua e o bairro inteiro liam aqueles diários. Foram também responsáveis pelas primeiras imagens americanas sobre a China. São quase ferramentas da sinologia norte-americana. Porquê esta mulher? O que tem de especial Caroline H. Butler Laing? Tem o que todas as outras têm, mas há neste diário uma coisa muito interessante: o dia-a-dia da mulher protestante em Macau. Ela no fim faz uma espécie de um esquema do quotidiano de uma mulher norte-americana: as orações, a hora a que se levanta… Há outro diário, da Rebecca Kinsman, que enviuvou cá em Macau – o marido, Nathaniel Kinsman, está enterrado no cemitério protestante. Eles, por exemplo, trouxeram uma vaca dos Estados Unidos da América. Como os chineses não bebiam leite, as vacas não eram leiteiras. Se traziam crianças, traziam uma vaca. Quem ia embora deixava a vaca leiteira aos amigos que cá ficavam, assim como mobília – ofereciam ou faziam leilões. Este diário tem isso de especial: ela descreve o quotidiano da mulher de língua inglesa, protestante, em Macau: se ia visitar as amigas, se ia passear a pé até às Portas do Cerco, se ia visitar uma aldeia chinesa. Há todo este ponto de vista dos estrangeiros que chegam a Macau. Por exemplo, estranham o repicar dos sinos de hora a hora, que é uma coisa que não acontece nos países protestantes. É um olhar muito diferente do de uma mulher portuguesa que visitasse a Macau católica do século XIX: não estranharia o repicar dos sinos porque em Portugal também soam para dar as horas. É muito interessante esta focalização protestante sobre um território simultaneamente português e chinês. Porque observa pormenores que seriam dados adquiridos para portugueses e chineses. É, portanto, uma fotografia mais completa. É. Muitas vezes permite encontrar os vazios das fontes portuguesas, certas práticas que não estão descritas nas nossas fontes e que eles descrevem. Acontece muito, nas fontes oficiais, aquilo que interessava aos portugueses esconder do Rei de Portugal, os americanos ou os ingleses falarem abertamente, e vice-versa – o que interessava aos ingleses esconder, as fontes portuguesas muitas vezes revelam. Esse cruzamento das fontes de línguas diferentes permite encontrar vazios quer numas fontes, quer noutras. Destacou o facto de serem fontes de religiões diferentes também, num contraste com os escritos de residentes e viajantes católicos. Existe uma diferença muito grande na abordagem do mundo, certo? Existe, a cosmovisão é diferente. Estas mulheres americanas, quando vão para festas portuguesas até às quatro da manhã, sentem-se culpadas, há o peso da seriedade protestante. Os hábitos são diferentes, quase que se sentem forçadas a justificar porque é que ficaram até às três da manhã numa festa na casa do Governador. Há esse peso religioso. Há as práticas dos quakers e dos unitarianos em Macau, que casavam entre primos. Os próprios americanos espantam-se com os hábitos uns dos outros, o que não deixa de ser curioso. Existiam várias Macau – não eram só a portuguesa e a chinesa, havia também uma norte-americana, uma britânica. Esta visão caleidoscópica de um território tão cosmopolita como Macau era e continua a ser muito importante no cruzamento destas fontes. Era uma Macau interessante, esta que a Caroline H. Butler Laing descreve? Era. Sobretudo até à fundação de Hong Kong, era a única porta de entrada para a China e foi esse o segredo de Macau. Por isso é que ficamos tantos anos aqui: também era útil para as autoridades chinesas manterem os estrangeiros todos em Macau, delegando nos portugueses a responsabilidade de os administrar. Nenhum estrangeiro estava mesmo na China – ia de Macau para o complexo das feitorias de Cantão, que também era fechado como Macau, que funcionou um pouco como tubo de ensaio, desde o século XVI, para o comércio da China, nos séculos XVIII e XIX. Replicou-se o formato encerrado de Macau com as Portas do Cerco nas feitorias de Cantão. E daí a utilidade: manter os estrangeiros com um pé fora e outro dentro da China, encerrando-se as Portas do Cerco quando os portugueses e os outros estrangeiros não respeitavam o desejo das autoridades chinesas. Na outra intervenção nesta conferência, que faz hoje, traz uma descoberta que revelou em 2012, que tem que ver com o primeiro museu da China e que foi criado precisamente aqui em Macau. Foram exactamente estes diários que me permitiram fazer esta descoberta. Parece impossível como é que só em 2012 é que se faz esta descoberta, mas deve-se ao facto de ter sido uma iniciativa completamente anglófona, de língua inglesa. Este museu foi fundado por funcionários da Companhia das Índias inglesa e por missionários protestantes, e era sobretudo frequentado pelos visitantes estrangeiros e pela comunidade anglófona. Por isso, não aparece muito nas fontes portuguesas – quase ninguém lhe fez referência. Quando começo a ler estes diários de mulheres norte-americanas, aqui e ali encontrei frases como ‘Fui ao museu britânico de Macau’, ‘Fui ao museu de Macau’. Comecei a juntar uma linha ou duas, em vários diários, o que depois me permitiu, com o tempo, ir chegando à conclusão de que aquilo, para a época, era um museu representativo. Juntei várias referências, investiguei em revistas da época, e cheguei à conclusão de que entre 1829 e 1834 tinha sido inaugurado o ‘British Museum of Macau’ e que, ao contrário do que toda a gente dizia e do que a história da museologia da China defendia, foi o primeiro museu que abriu portas, e não um museu fundado por um jesuíta francês, Pierre Heude, em 1868. Portanto, o primeiro museu da China de cariz ocidental não abriu as portas em 1868, em Xangai, mas em 1829, em Macau, e fecha depois com o final do monopólio da Companhia das Índias em 1834. Sabe-se qual era a localização? Não. Foi uma das coisas que me perguntaram, quando a revista da Cambridge University Press avaliou o meu trabalho. Também queria saber. Penso que seria na zona onde hoje é o Palácio do Governo, porque era na Praia Grande que estava a sede da Companhia das Índias. Penso que seria algures entre a Penha e o actual Palácio do Governo mas, até à data, não encontrei ainda nada. Era uma casa arrendada e os comerciantes ingleses e chineses traziam peças para esse museu, havia um guarda, e as peças estavam legendadas. Dois anos depois desta descoberta, escreveu sobre a primeira biblioteca de língua inglesa na China. Que biblioteca é esta? É uma biblioteca itinerante. Todos os estrangeiros que vinham para Macau traziam livros – da América, de Inglaterra, da Irlanda –, deixam-nos ficar, trocam-nos. Esses livros vão sendo depositados na sede da Companhia das Índias em Macau e na feitoria inglesa e norte-americana em Cantão. Os livros viajavam Rio das Pérolas acima, Rio das Pérolas abaixo, com os comerciantes ingleses, que passavam o Verão e a Primavera em Macau, e o Outono e o Inverno a comprar chá, porcelana e outras mercadorias nas feitorias de Cantão. Alguns livros ficavam lá, outros voltavam, e a maioria, com o final do monopólio da Companhia das Índias, foi para a biblioteca que é hoje a Biblioteca Robert Morrison na Universidade de Hong Kong. A Companhia das Índias tinha também de defender o seu bom nome – o museu e a biblioteca [aparecem nesse contexto], até porque em Inglaterra eram cada vez mais acesas as críticas ao monopólio. A Companhia das Índias tinha de se preocupar com a sua imagem pública e provar que também se preocupava com o local onde fazia negócios. Essa era uma forma de o fazer e depois não houve nenhuma estrutura que substituísse a Companhia das Índias – as firmas norte-americanas já cá estavam – e isso acabou por influenciar o tipo de presença britânica aqui. Esse desregulamento da presença britânica vai dar lugar mais tarde à Guerra do Ópio. Mas estas duas actividades relacionam-se com as diaristas femininas de Macau. É necessário também estudar esta presença, não apenas a presença portuguesa, mas de todas estas comunidades que contribuíram em larga escala, no século XIX, para a vida cultural de Macau. Havia peças de teatro organizadas pela comunidade de língua inglesa, os cenários eram pintados pelo George Chinnery, que ainda chegou a fazer algumas personagens. Como é que decidiu dedicar-se ao estudo das fontes em língua inglesa e não ao estudo das tradicionais fontes portuguesas? Percebi que havia um vazio enorme que era não só o estudo dessas fontes americanas e inglesas, como também o cruzamento com as fontes portuguesas. Tendo estudado Estudos Portugueses e Ingleses, poderia fazê-lo, casar as duas línguas e culturas que estudei. Fiz o doutoramento em Estudos Anglo-Portugueses exactamente sobre um romance inglês cuja acção se passa em Macau: ‘City of Broken Promises’, de Austin Coates. Apercebi-me de que havia muita coisa a fazer e que estas fontes eram importantíssimas para o estudo do quotidiano da Macau portuguesa. Uma das razões pelas quais pude fazer essa descoberta e ajudar a reescrever a história da museologia na China foi porque os estudiosos estrangeiros não dominam, a maioria deles, o português, e fogem de Macau – estudam Hong Kong, Xangai, são fontes francesas e inglesas. Os historiadores portugueses, até há bem pouco tempo, também não se debruçavam sobre as fontes em língua estrangeira, porque estavam manuscritas, era preciso ir para Inglaterra e para os Estados Unidos. Tive de correr a costa toda, desde Boston até Filadélfia, em busca de diários de mulheres, não publicados. Contactei com familiares. A relação dos norte-americanos com este tipo de fontes é completamente diferente: emprestam tudo, fotocopiam, enviam-nos livros, criei em certa medida uma relação com os descendentes destas diaristas. Adoram ver estes estudos publicados. Há depois o medo em relação à referência ao tráfico de ópio – digo sempre que me interessa a história cultural, não a do comércio nem do tráfico, e aí ficam mais descansados e o tipo de relação é outro. Mas há muita investigação ainda por fazer.