Manchete SociedadeCerco a ilegais defendido por Ng Kuok Cheong questionado por juristas Sofia Margarida Mota - 26 Out 201627 Out 2016 Após Ng Kuok Cheong ter sugerido na AL a participação dos residentes na detenção de trabalhadores ilegais, as reacções não estão a ser favoráveis. Pedro Coimbra e António Katchi consideram, não só que é uma sugestão anti-democrática como um atentado às verdadeiras vítimas da mão de obra ilegal, os próprios trabalhadores [dropcap style≠’circle’]A[/dropcap]s sugestões apresentadas pelo deputado pró democrata Ng Kuok Cheong na Assembleia Legislativa (AL) que apelavam à participação dos residentes na “detenção” de trabalhadores locais, não tardaram em criar reacções aos juristas locais. “Dá-me a impressão que o que Ng Kuok Cheong disse na AL foi que terá tentado introduzir no ordenamento jurídico da Região Administrativa Especial de Macau um conceito jurídico típico da Common law” diz o jurista Pedro Coimbra ao HM. “Vamos criar grupos que vão controlar trabalhadores ilegais, é essa a ideia?”, questiona, impressionado. Para Pedro Coimbra “esta ala chamada democrática teve, durante anos como cavalo de batalha o sufrágio universal , eram acima de tudo de sufragistas”. No entanto e sem que se entenda porquê, é esta faixa da população que se tem metido “em guerras que não são as deles” até porque, para o jurista, este assunto da emigração ilegal com discursos proteccionistas seria mais aplicável a associações mais tradicionais. “Ver agora estes pró -democratas a entrar neste tipo de discurso populista é uma coisa assustadora. Se os democratas pensam assim, o que pensarão os das alas mais tradicionais?”, questiona, ao mesmo tempo que refere que “só falta dar pancada nas pessoas”. O que Ng Kuok Cheong sugeriu pode ainda configurar na prática de um crime mas, o que mais preocupa Pedro Coimbra é “a loucura que se está a instalar com a história dessa pseudo-protecção da mão de obra local visto que Macau precisa de trabalhadores. Não existe desemprego que atinja a mão de obra local, pelo que não se entende o que se quer proteger aqui”. Existem mecanismos para combater a mão de obra ilegal e cabe às entidades competentes fazê-los cumprir, considera ainda enquanto reitera que talvez fosse mais necessária uma legislação para uma maior inclusão do trabalho estrangeiro de forma a que deixe de ser ilegal, dada a sua necessidade evidente. “Não sei concretamente se é necessária uma revisão legal, mas talvez fosse o melhor, para legalizar essas pessoas porque precisamos efectivamente delas cá e, nesse aspecto, poderá realmente ser alterada a legislação para que haja uma maior facilidade de legalização desta mão de obra fundamental”, remata. Questão jurídica, questão política Também António Katchi, jurista e professor do Instituto Politécnico de Macau, considera que “do ponto de vista jurídico, a “retenção” (na verdade, uma forma de coacção e de sequestro) de um trabalhador “ilegal” por parte de outros trabalhadores pudesse legitimar-se com base nas disposições legais que presentemente definem e regulam as formas de tutela privada permitidas (legítima defesa, acção directa e estado de necessidade, sendo este último o que maior proximidade teria com aquele cenário)”. Para o professor, um trabalhador assim “retido” poderia apresentar junto da PSP ou do Ministério Público uma queixa contra os “justiceiros” por crime de coacção e/ou de sequestro. Ainda no plano jurídico, mas também no plano político, o docente distingue os fenómenos a ter em conta e que são a importação e contratação de mão de obra ilegal. “Reconhecer os efeitos nocivos que a importação e contratação ilegal de mão-de-obra têm sobre os direitos e interesses legítimos dos trabalhadores em situação legal não implica atacar os próprios trabalhadores que se encontra em situação ilegal”, ilustra, sendo que estes últimos “são vítimas da exploração e opressão capitalistas”. Dantes não era assim António Katchi recorda ainda que “há uns anos, o Ng Kuok Cheong dava mais ênfase, no seu discurso, à necessidade de uma melhor regulamentação do trabalho por forma a evitar que os trabalhadores “não residentes” fossem sujeitos a uma sobre-exploração e usados como arma contra os trabalhadores residentes, que sofreriam por consequência uma deterioração das suas condições de trabalho ou o próprio desemprego”. Já o presidente da Associação Novo Macau, Scott Chiang, começa por dizer ao HM que há casos de crime em que as pessoas podem “reter” os criminosos apanhados em flagrante delito e para o feito ilustra com os EUA e uma possível situação de assalto. No entanto, também considera que a medida não se aplica aos casos de trabalhadores ilegais e que neste sentido a “melhor atitude em caso de suspeita é denunciar às autoridades competentes para que elas cumpram a sua função.” Na Reunião Plenária de segunda-feira da AL, Ng Kuok Cheong sugeriu que fosse montado um “cerco” aos trabalhadores ilegais. “Espero que o Governo crie um mecanismo para que os residentes possam apresentar provas in loco dos ilegais. Todos os trabalhadores estão à espera deste mecanismo, e há preocupação de como se pode apresentar provas. Os locais esperam que possa ser cercado o local onde estão ilegais e depois a polícia possa de facto investigar se há trabalhadores ilegais ou não. Esperamos que os residentes possam ajudar o Governo a obter provas.”