h | Artes, Letras e IdeiasA armada inglesa no Mar da China José Simões Morais - 27 Mai 201627 Mai 2016 [dropcap style=’circle’]E[/dropcap]m Londres, um dos mais antigos pioneiros do comércio livre britânico em Cantão, o escocês William Jardine, fundador da firma Jardine, Matheson & Co. e que desde 1820 continuamente residiu em Cantão até 31 de Janeiro de 1839, conseguiu do governo britânico o auxílio económico e militar aos grupos de comerciantes ligados ao lucrativo negócio do ópio. Segundo Fernando Correia de Oliveira, “O parlamento inglês, sem declarar a guerra à China, aprovou o envio de uma esquadra de 16 navios para a zona de Guangzhou”. Assim, em Abril de 1840 partiu para o mar da China o Almirante George Elliot comandando os navios de guerra e quatro mil tropas, tendo essa armada chegado a 21 de Junho às costas da província de Guangdong. De referir ser um dos protagonistas desta história, Charles Elliot primo de George Elliot, que de Julho a Novembro de 1840 esteve na China como representante da Coroa Britânica e superintendeu no lugar de Charles, voltando depois este ao cargo de plenipotenciário. Lin Zexu preparara-se para a chegada da armada britânica, mas sem grande frota e moderna como era a inglesa, suportava-se em fortalezas que mandara fazer ou reconstruir pela costa de Guangdong. Os chineses a 9 de Junho de 1840 tentam por meio de jangadas incendiadas, destruir a “esquadra inglesa, surta no rio de Cantão”, como refere Marques Pereira, e a 21 de Junho, “achando-se em número de quinze navios de guerra a esquadra inglesa nas águas da China, Sir Gordon Bremer, chegado na véspera no Wellesley, anuncia o bloqueio de Cantão”. Navegando pelo Zhujiang (Rio da Pérola) estalou a guerra, combatendo os ingleses pelo direito de vender o ópio na China. Segundo Alfredo Gomes Dias, em Junho ocorreu a “Publicação das exigências que a Grã-Bretanha faz à China onde se destaca a abertura de portos e liberalização do comércio internacional, estabelecimento de relações directas com o governo de Pequim e a possibilidade de os ingleses se fixarem nos portos”. Refere ainda este historiador que também de Junho é o “Édito do delegado imperial Lin exortando o povo chinês a aniquilar os demónios estrangeiros”. A esquadra inglesa ruma a Norte Lin Zexu, que tinha tomado medidas de preparação contra a chegada da armada britânica, dispondo de um exército conjugado com a população de Guangzhou e de toda a província, repeliu os ingleses. Estes, a 30 de Junho de 1840 navegaram com a sua esquadra de Cantão para o Norte da China. A 2 de Julho, “Tendo entrado em Amoy (hoje Xiamen, a Sul da província de Fujian) o navio de guerra inglês Blonde, portador de uma carta do comandante da esquadra britânica para o almirante chinês que então ali estacionava, os chineses impedem que chegue a terra o escaler do mesmo navio, e fazem-lhe fogo, não obstante levar bandeira branca. O comandante inglês destrói alguns juncos de guerra e o forte que dera os tiros, e sai do porto”, segundo M. Pereira. Seguiu a esquadra inglesa ao longo da costa marítima que banha as províncias de Fujian e Zhejiang onde, em frente a Ningbo, ocupou Dinghai. Alfredo Dias refere ter sido a 15 de Julho que “as forças navais britânicas atacam certos pontos de Zhoushan ocupando-a em seguida”. Já segundo Marques Pereira, tal aconteceu a 5 de Julho de 1840, sendo Elliot quem pela primeira vez tomou a cidade de Tinghai (Dinghai), na ilha de Chu-san (Zhoushan). Dinghai, a Norte de Ningbo província de Zhejiang, já em 1793 fora pedida à corte do Imperador Qianlong pelo Lorde Macartney, durante a primeira embaixada inglesa à China. Quarenta e sete anos depois, os ingleses tomaram a cidade de Dinghai, onde poderão residir e fazer o seu porto, armazenar mercadorias e reparar os barcos. Após cinco dias de terem tomado Dinghai, os ingleses a 10 de Julho bloqueiam o Rio Yangtzé, chamado de Changjiang, Rio Longo a dividir nas suas direcções a meio a China, e onde Nanjing (a antiga capital do Sul) se encontrava. Para Norte, um mês depois, a 11 de Agosto, seguiam a bordo do vapor Madagascar “os dois plenipotenciários ingleses, Elliot, cujo intento de exigirem comunicação directa com o gabinete de Pequim foi artificiosamente logrado por Ki-chen, então governador da província de Peh-tchi-ly (Zhi Li), com a promessa de que lhes viria dar satisfações a Cantão”, como refere Marques Pereira. Guerra na vizinhança de Macau Pela necessidade do Procurador José Vicente Jorge reclamar providências junto às autoridades chinesas, logo a 29 de Fevereiro, por “cinco ou seis desordeiros chineses terem agredido pessoas que passavam na Rua do Tronco e apedrejado a cadeia”, apontamento de Alfredo Dias, de onde se poderá induzir os distúrbios velados que também dentro da cidade iam ocorrendo, devido à indignação popular chinesa ao ver cair (desmoronar) o Céu. A 19 de Agosto de 1840, Marques Pereira refere que, “as corvetas inglesas Hyacinth e Lane atacam as forças chinesas estacionadas junto da Porta do Cerco, matando-lhes aproximadamente sessenta homens”, apesar de Alfredo Dias dizer que estas duas corvetas inglesas atacaram, nas proximidades de Macau, navios chineses. Gonzaga Gomes conta, “Ao meio dia, uma força britânica, composta dos navios de guerra Lane e Hyacinth, o cutter Louisa, e o vapor Enterprise, rompeu vivo fogo contra uma bateria chinesa, postada na praia, junta do lado norte da barreira ou muro do limite de Macau, e que dispunha de 17 canhões que foram reduzidos ao silêncio bem como outros que havia para aquele lado, num total de 27. Uma hora depois, desembarcaram 380 marinheiros e soldados, comandados pelo capitão Mee, com uma peça, os quais puseram em completa fuga os chineses, continuando o fogo dos navios, que dispararam não menos de 600 tiros. Diziam alguns que as forças chinesas, em diferentes posições, deveriam ser constituídas por cinco a seis mil homens. Os ingleses, tendo encravado a artilharia chinesa e queimado as barracas dos soldados juntas à barreira, voltaram pelas 19 horas, para as suas embarcações”. A 30 de Agosto de 1840 realiza-se a Conferência, perto de Tien-tsin (Tianjin), entre o plenipotenciário inglês Elliot e Ki-chen (Qi Shan), governador da província de Peh-tchi-ly, como refere Marques Pereira, mas, só a 16 de Setembro foi o oficial manchu Qi Shan (1786-1854), até então Governador de Zhi Li (Shandong e Henan), ocupar o lugar de Comissário Imperial, substituindo Lin Zexu, que a 3 de Outubro de 1840 deixou de ser Vice-Rei de Liangguang. Qi Shan substitui Lin Zexu No entanto, ainda em 5 de Setembro de 1840, o Edital do superintendente geral das alfândegas de Cantão, por apelido Iú, ordenou a apreensão de quaisquer mercadorias destinadas aos europeus e prometeu prémio aos apreensores, visto achar-se suspenso o comércio, como refere Marques Pereira. A 16 de Setembro é nomeado comissário imperial Qi Shan (Ki-chen) para tratar, em Cantão, com os europeus. Local onde a 27 de Setembro era recebido um decreto imperial, desautorando o Vice-Rei e Comissário Lin Zexu, nos termos seguintes: Oito dias depois, a 4 de Outubro “Alguns navios da esquadra inglesa, que fora ao norte em Agosto, sobem ao golfo de Liau-tung, e fundeiam neste dia junto à extremidade oriental da Grande Muralha da China. Foi a primeira vez que, dessa parte, se viu o célebre monumento devassado por europeus”, segundo M. Pereira. Liaoning (Liau-tung), província situada no Nordeste da China de onde eram provenientes os manchus, então a reinar na China como dinastia Qing, é banhada pelos golfos da Coreia e de Liaodong. Apesar disso, os manchus não sentem ligações ao mar, sendo na altura deles que os ingleses descobriram as anteparas aos barcos chineses e ao passar a usá-las nos seus, chegavam agora com um enorme avanço no poderio tecnológico, aliado à psicologia do fogo. Se os primeiros imperadores da dinastia Qing mostraram interesse pelas novas invenções europeias do século XVI e trazidas à Corte pelos Jesuítas, os seguintes governantes manchus, alheados do mundo científico que então na Europa se reorganizava, artisticamente descoraram estar a par desses conhecimentos, sem os brados dos eruditos da Corte se fazerem ouvir. Pelo lado britânico, e numa curiosidade investida em interesses mercantis, conseguiam-se os segredos dos produtos, esses que os tinha levado ao Extremo Oriente. De salientar ser Lin Zexu conhecido como o primeiro chinês na História Moderna da China “a abrir os seus olhos para ver o mundo”, sendo um dos primeiros a opor-se à política de fechar a China em si mesmo. Procurando conhecer o pensamento e as tecnologias Ocidentais, mandou traduzir os tratados estrangeiros sobre a produção de armas e barcos e para melhor resistir às incursões britânicas, saber o que escreviam nos jornais tanto de Londres, como da Austrália, de Singapura, da Índia, assim como os de Macau. É de 23 de Outubro de 1840 o “Memorial de Lin ao imperador justificando as suas acções e o pouco êxito alcançado na repressão ao tráfico do ópio e onde solicita a rejeição às exigências britânicas”, como refere Alfredo Dias. Marques Pereira dá para 1 de Novembro de 1840 a “Proclamação do comissário imperial chinês, I, aos habitantes da cidade de Ting-hai, sobre a ocupação da ilha de Chu-san pelas tropas inglesas. Dinghai, na ilha de Zhoushan, ficava assim oficialmente reconhecida como na dependência inglesa. Armistício de dois meses A 5 de Novembro de 1840 os chineses pedem um armistício ao Almirante Elliot, que foi concedido no dia seguinte e prolongou-se até 6 de Janeiro de 1841. Alfredo Dias escreve para a data de 6 de Novembro de 1840, “Memorando do contra-almirante e comandante em chefe George Elliot noticiando, pela primeira vez desde o início da guerra, uma trégua entre os dois países, enquanto ele e o delegado imperial se mantêm em negociações” e com ele continuando, a 20 de Novembro “os britânicos regressam a Macau”. No dia seguinte, “Os fortes chineses de Tchuen-pi fazem fogo sobre o vapor inglês Queen e o almirante Elliot exigiu e obteve imediata satisfação por essa ofensa”, segundo Marques Pereira, que diz ter a 28 de Novembro, o comissário Qi Shan chegado a Cantão, mas no dia seguinte, “o Almirante Elliot resigna o comando da esquadra inglesa na China”. A 6 de Dezembro, segundo Alfredo Dias, “Ofício do comissário imperial Ke Shen (Qi Shan) ao Tao-tai onde se adverte que a vinda dos ingleses para a província onde Macau se encontra situada não deve ser hostilizada pelas guarnições chinesas sem que para isso haja motivo”. Uma semana depois, datada de 13 de Dezembro de 1840 a “Carta do comissário Ki-chen ao imperador, declarando o procedimento que entendia dever ter com os ingleses. – Diz assim: “, como refere Marques Pereira. Mas percebe-se que tal não trouxe frutos pois as autoridades de Cantão pelo Édito de 6 de Janeiro de 1841, ordenam “que todos os ingleses fossem mortos e os seus navios destruídos em toda a parte onde se vissem. Esta medida, decretada em meio do armistício que o almirante Elliot concedera desde 6 de Novembro anterior, deu lugar à imediata continuação da guerra e à tomada, logo no dia seguinte, dos fortes de Tchuen-pi e Tai-cok-tau”.