Pan

[dropcap]O[/dropcap] todo e o tudo, na palavra grega. Ou Pan, o deus dos bosques, temido por todos aqueles que atravessam as florestas à noite. As trevas e a solidão da travessia predispõem a pavores súbitos sem causa aparente. Ele atemoriza com as suas aparições, provocando o pânico.

E esta pandemia de estar só. Que de solidão nos atravessa a todos. Em diferentes sentidos e maneiras, por diferentes razões e como em certos e outros momentos. E trabalhamos nela ou desesperamos nisso.

Amanhece na casa. Como todos os dias amanhece e da noite ainda esta serenidade urbana e residual a acordar lentamente. Mas hoje será pelo dia fora. Mesmo os pássaros vêm mais seguros à varanda ver coisas de seu interesse. Os pardais do costume e este melro que atravessou do telhado em frente. Este silêncio.
É como um intervalo no tempo.

Como uma pessoa está só quando as vozes da rua se reservam para mais longe e rarefeitas. Mas se estamos sós, não estávamos antes? É a estridente evidência que ressoa da falta do que nos obriga a estar com os outros.

As janelas, abertas para uma dimensão da cidade. A que a mente permite. Como sempre, lembro-me do poeta e sinto-me como aquele que disse. “Da minha aldeia vejo quanto da terra se pode ver do Universo…/Por isso a minha aldeia é tão grande como outra terra qualquer,/ Porque eu sou do tamanho do que vejo/ E não do tamanho da minha altura…”

Mas a cidade é agora das janelas de casa este vazio perfeito de ruídos ausentes e o ar limpo de correrias e compras. Como uma enorme clareira na floresta amazónica. Penso como não nos sentimos árvores, quando estas são decepadas por interesses maiores e fechamos os olhos ao que está ali, tão perto de nós que nos toca. E quanto se empobrece e arruína por cada árvore morre e não de pé. Sabe-se lá porque é que as árvores morrem. Umas de idade, outras de muita idade, outras por pragas e outras por ínfimas e secretas razões encerradas nas longínquas raízes. Que são razão secreta a alimentar ou a destruir. Há as que levam tempo a tornar evidente que se ausentaram. Ficando ali em silêncio e de pálpebras baixas. Mas há as que morrem abatidas. Algumas espécies morrem longe do olhar. Não é o caso das árvores, que não podem fugir.

Os elefantes, sim. Mas tudo se vê na televisão, tudo é próximo da vista, longe do coração. Os humanos, precisam de companhia para morrer, porque até ao último suspiro se ligam ao que muito os ligou ao mundo. Os que amaram. Se não estão à despedida, de que valeu, de que valemos nas contas de fim de mês, de fim de vida. A verdade talvez repouse em Sevilha. Os restos mortais do navegador, ossos que navegaram por tantas paragens. Talvez ali, agora. E nós, aqui. Tanto navegámos, que aqui chegámos. A casa, mas não fechados. Olho pela janela a dar para a Catedral.

Estar só é quando não se imagina o lugar do outro. E o outro fica mais só. Olhamos neste momento mais para longe como um todo de nós. E pela primeira vez parece-me que este mundo é um só. Eu não queria chamar pandemia mas sim pangeia que nos une – de novo a recuar à Pangeia original. A esta doença global, a esta preocupação global, a este egoísmo global. A esta estranha impressão de que há uma razão mesquinha na emergência com que se apresenta, a todos, tudo isto, finalmente como assunto nosso. De todos. Até os conflitos na Síria fazem talvez um intervalo por causa maior, agora. Amarga ironia. Como as guerras do Solnado, mas sem graça.

E sonhamos com a normalidade que virá depois. Vamos voltar iguais. A povoar lojas de roupa, smartphones e coisas inúteis. E cegos de novo, vamos continuar a comprar coisas demais, com embalagens demais, a depender demais, a produzir demais a poluir demais a comer demais a fazer lixo demais e a ambicionar demais. E a ignorar demais tudo o que não nos toca, de novo, directamente. A curto prazo. Tudo o que possa ser adiado, etéreo e indefinível futuro, e batata quente nas mãos, só a que é doce, assada e perfumada de anis-verde. Temos demais.

Mas, como se Cristo na última ceia ao repartir o pão, e sem querer, distraído da natureza humana que o levaria de volta ao Pai, o tivesse partido em partes desiguais. Pela côdea macia nuns pontos e estaladiça noutros a configurar nacos e como se continentes a escapar à unidade inicial. A crosta da terra em tensão a desunir-se e a separar continentes. Egoísmos. Uns em crescendo de ambição, outros em sofrimento. O que é desenvolvimento quando o impacto do que não era imaginado mas imaginável, nos confronta com o pouco valor dado e investido na saúde. Quando na primeira crise, falta tudo aquilo para onde todos apontamos os olhos nesta aldeia global. Mas que já faltava antes. Médicos a menos, meios e vagas a menos, quando cada doente era somente um doente em si, pai ou filho de alguém e não parte deste grande puzzle internacional.

Agora, cada cama que falta para socorrer um doente, é uma cama que sofremos como se para família nossa. Nisto se uniu em parte esta terra de todos. Como uma cadeia. Mesmo se na transmissão de uma doença. Mas depois vamos voltar ao mesmo. A economia pior. E por uns tempos vamos estar pior, mas da mesma forma o que é pouco para muitos, em alguns lugares é perto de nada.

Lavo a casa, lavo a roupa, lavo a alma. Desfaço-me finalmente de algum lixo existencial a que me amarro, sem tempo nos outros dias de alcançar o estado de desnecessidade. Tão necessário. Repetitivos objectos, mesmo de afecto, que são espelho de memória. Mas demais. Não há como estar triste para conseguir largar lastro. Ir largando a solidão do passado nas coisas, para ganhar espaço para viver. Ir deitar o lixo fora e voltar sobre as próprias pegadas porque não há outras. É sempre assim. Mas solidão maior é não amar. E não há maior.

Agora, este nada, ínfimo invisível percorre a distância entre nós e os outros. No pior dos sentidos nos sentimos excessivamente próximos. Quando ainda ontem não o sentimos e nos achámos invulneráveis ao invisível dos outros. Cada um no seu quintal.

Tão gasta a verdade e a poesia do poeta. Mas a voz de um poeta não chega ao ouvido da economia. Quando tudo voltar, que não volte igual. Rever prioridades. Da humanidade e dessa mãe terra a que nos une todos iguais, um cordão umbilical. E pensar como o poeta, ser do tamanho da Terra ou do tamanho do umbigo.

23 Mar 2020

Diplomacia | Bloco de Esquerda e PAN de fora da visita de Estado à China

O Bloco de Esquerda e André Silva, deputado do PAN, não vão participar na visita de Estado de Marcelo Rebelo de Sousa à China e a Macau. Bloquistas e PAN justificam a posição com as restrições à liberdade e a violação dos direitos humanos na China

 

Com agência Lusa 

[dropcap]A[/dropcap] comitiva que vai acompanhar o Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, na visita de Estado à China e Macau não vai contar com elementos do Bloco de Esquerda (BE), nem com André Silva, o deputado do Partido Pessoas-Animais-Natureza (PAN).

Em declarações ao HM, fonte oficial do Bloco de Esquerda referiu que “o Bloco não integrará a visita de Estado à China, em coerência com a posição que tem assumido sobre as restrições à liberdade e violação dos direitos humanos”.

Já à altura em que Xi Jinping visitou Portugal, no início de Dezembro do ano passado, o BE recusou participar nas iniciativas para que foi convidado, tais como o jantar oficial e o encontro com o Presidente chinês na Assembleia da República. “As posições do Bloco de Esquerda mantêm-se, nada mudou desde 2010, continua o desrespeito pelos direitos humanos e a repressão e, por isso, o Bloco não estará presente”, disse na altura à Lusa fonte oficial do partido.
O BE já tinha adoptado a mesma posição em 2010, quando o anterior Presidente da China, Hu Jintao, visitou Portugal.

O então líder bloquista, Francisco Louçã, justificou à Lusa a posição do partido considerando que “seria muito hipócrita” aplaudir ou a participar em banquetes com “o representante de um regime político que despreza o direito de greve, o direito de opinião e de liberdade de imprensa”. “Somos muito críticos em relação ao regime chinês”, afirmou Louçã.

A posição do PAN

André Silva, deputado do PAN, também não participou na cerimónia de recepção de Xi Jinping na Assembleia da República.

Em declarações ao HM, fonte oficial do PAN referiu que “André Silva não integra a comitiva da visita de Estado do Presidente da República em coerência com as posições críticas que o PAN tem assumido em relação ao regime autoritário chinês, de partido único, onde são constantes as restrições à liberdade e a violação dos direitos humanos, num país onde não existe liberdade de imprensa”.

A mesma fonte relembrou ainda “a invasão e a violenta ocupação do Tibete pela China, marcada pela repressão, prisão, desaparecimentos, tortura e assassinatos infligidos ao povo tibetano”.

Na sua visita à República Popular da China, Marcelo Rebelo de Sousa estará acompanhado por uma delegação parlamentar composta pelos deputados Adão Silva, do PSD, Filipe Neto Brandão, do PS, Telmo Correia, do CDS-PP, pelo líder parlamentar do PCP, João Oliveira, e por Heloísa Apolónia, do Partido Ecologista “Os Verdes”.

Pela parte do Governo, integram a comitiva oficial do chefe de Estado os ministros dos Negócios Estrangeiros, Augusto Santos Silva, e do Ambiente e da Transição Energética, João Pedro Matos Fernandes, e o secretário de Estado da Internacionalização, Eurico Brilhante Dias.

25 Abr 2019

ANIMA | PAN envia carta a Chui Sai On a pedir resolução para caso dos galgos

[dropcap]A[/dropcap] associação ANIMA tem um novo aliado político em Portugal que se junta à luta pelo salvamento dos 650 galgos do Canídromo de Macau: o PAN, partido que tem na sua plataforma política a defesa dos direitos das pessoas, animais e natureza.

O apoio do partido fez-se na forma de uma carta enviada ao Chefe do Executivo assinada pelo deputado da Assembleia da República, André Silva. O legislador português menciona a mensagem de Ano Novo de Chui Sai On, onde foi referido o “espírito de tolerância e entreajuda” da população que permitiu vencer as “profundas provações” após a passagem pelo território do tufão Hato. André Silva aproveita o raciocínio do Chefe do Executivo para apelar à “tolerância e entreajuda do Governo de Macau para apoiar o salvamento dos 650 galgos do Canídromo de Macau”. O deputado espera que seja evitado o desfecho mais negro, ou seja, que “em Julho de 2018 todos estes animais sejam mortos desnecessariamente visto que existirem pessoas interessadas em adoptar e cuidar de forma humana e responsável” dos galgos.

André Silva garante que está a acompanhar o caso de perto e que, inclusive, entrou em contacto com o Ministro da Agricultura, Florestas e Desenvolvimento Rural, Luís Capoulas Santos, na esperança que seja “encontrada uma solução de compromisso entre os dois países”.

Dessa forma, o deputado português apela ao Executivo de Macau para que permita que os animais sejam entregues a quem lhe possa assegurar as melhores condições de vida.

2 Fev 2018