Jorge Rodrigues Simão Perspectivas VozesO Ocidente dividido “Make no mistake, the normative authority of the United States of America lies in ruins. The decision to go to war in Iraq, without the explicit backing of a Security Council Resolution, opened up a deep fissure in the West which continues to divide erstwhile allies and to hinder the attempt to develop a coordinated response to the new threats posed by international terrorism”. The Divided West – Jürgen Habermas (continuação) Revela também a perplexidade dos dirigentes israelitas, que não imaginavam que os terroristas palestinianos fossem tecnicamente capazes de uma tal operação. Como disse o general israelita Giora Eiland, a coligação de direita e de ultra-direita no poder prejudicou gravemente a imagem e a credibilidade de Israel ao lançar a represália de dois meses no interior de Gaza, em vez de se limitar a controlar o “Corredor de Filadelfia” (o corredor Filadelfia é uma zona limite entre a Faixa de Gaza e Egipto. Este corredor, de 100 metros de largura e 14 km de comprimento, poderia ser a única via de passagem para centenas de milhares de palestinianos no caso de um grande ataque do exército israelita em Rafah) e isolar a “Faixa” para obrigar o inimigo a render-se, pelo que “Sentimo-nos vítimas do 7 de Outubro, um ataque frio e impiedoso e agora toda a gente nos considera carniceiros”. Abriu-se um novo capítulo na disputa secular entre judeus e árabes palestinianos. Ninguém sabe nem pode saber onde vai acabar. Depois de se ter afastado a quimera dos dois Estados, uma hipótese que nunca existiu mas que era conveniente para todos, restam três possibilidades, a de um Estado, nenhum ou “cem mil”. No primeiro caso, Israel formalizaria o facto de que, entre o rio Jordão e o Mar Mediterrâneo, existe apenas um Estado, o seu. O resto são territórios ocupados, corroídos todos os dias pelo impulso dos colonos. É suposto estabelecer-se assim a quota de palestinianos que é tolerável no Estado-nação do povo judeu. Os restantes terão de emigrar, espontaneamente ou não. A 28 de Janeiro de 2024, realizou-se em Jerusalém uma manifestação festiva, com a presença de doze ministros, para anunciar a recolonização de Gaza. Com um mapa detalhado dos colonatos. O ministro das Comunicações, Shlomo Karhi, criou para a ocasião o conceito de “emigração voluntária imposta”. O resultado de com a acção desencadeada pelo Hamas deve, portanto, consistir num grau de limpeza étnica determinado por meras relações de poder. Os “Estados Zero” seriam, em vez disso, a consequência de um conflito alargado com a Cisjordânia, o Líbano e a Síria, mas também para o Irão e os Estados Unidos com os seus respectivos associados. Sem excluir a utilização da “bomba atómica”. Todos os conflitos do Médio Oriente seriam perturbados e redesenhados ou ficariam fora do alcance de qualquer entidade estatal. Israel e os “Territórios”, tal como são actualmente, deixariam de existir. Improvável, mas não impossível. Por “cem mil” entende-se a tribalização paroxística que afecta as populações de Israel, profeticamente denunciada pelo antigo Presidente Reuven Rivlin em 2015. Nos meses que antecederam a guerra, multiplicaram-se os projectos de federalização, de cantonização e de parcelizações diversas, talhados a bisturi no espaço exíguo do Estado judaico. Desde os panfletos da Cisjordânia aos de Israel. A homogeneidade étnico-cultural-religiosa determinaria a divisão de territórios considerados heterogéneos. Um gosto pela escultura que sempre animou os projectos de reconfiguração de espaços estreitos e disputados. Tal como no “Plano Eiland” para Gaza, que na versão de 2008, previa o alargamento da “Faixa de Gaza” a uma fatia do Sinai Egipto em troca de uma parte do Negev (região de Paran) atribuída ao Cairo e 12 por cento da Cisjordânia anexada a Israel. Ou os oito emirados palestinianos entre Gaza e a Cisjordânia, fruto da acrimónia de Mordechai Kedar, antigo oficial dos serviços secretos. A tentativa de resolver o insolúvel convida à auto-destruição. Mas nesta altura a “Caixa de Pandora” já foi aberta. A responsabilidade recai sobre todos os actores envolvidos na região. Deixar às armas a imposição de projectos geopolíticos que serão sempre contestados pelos adversários do momento significa resvalar para a guerra permanente. Potencialmente suicida. Tudo menos uma vitória decisiva. Poder-se-ia estabelecer neste contexto dez dogmas da guerra de Israel contra o Hamas num conflito de longa data que resultou em inúmeras baixas e destruição de ambos os lados em que Primeiro, o Hamas é uma organização terrorista: Um dos dogmas centrais da guerra de Israel contra o Hamas é a rotulagem do grupo como uma organização terrorista. O Hamas tem sido responsável por numerosos actos de terrorismo, incluindo ataques com foguetes contra civis israelitas e a utilização de bombistas suicidas. Este dogma justifica as acções militares de Israel contra o Hamas, enquadrando-as como medidas necessárias para proteger os seus cidadãos da violência. Segundo, Israel tem o direito à auto-defesa: Outro dogma fundamental da guerra de Israel contra o Hamas é a crença no direito do país à auto-defesa. Israel argumenta que as suas acções militares são necessárias para proteger os seus cidadãos dos ataques do Hamas e de outros grupos militantes da região. Este dogma constitui a base das operações militares de Israel em Gaza, incluindo os ataques aéreos e as incursões terrestres. Terceiro, o Hamas utiliza escudos humanos: Israel acusa o Hamas de utilizar escudos humanos, uma táctica em que os militantes se escondem entre os civis para dissuadir os ataques das forças inimigas. Este dogma é utilizado para justificar o ataque de Israel a áreas civis em Gaza, uma vez que os militares israelitas afirmam que o Hamas está deliberadamente a pôr em risco vidas inocentes ao utilizá-las como escudos. Os críticos argumentam que esta justificação constitui uma violação do direito humanitário internacional, que proíbe o ataque intencional a civis durante um conflito armado. Quarto, o bloqueio de Gaza é necessário para a segurança: Israel mantém um bloqueio a Gaza, controlando o fluxo de bens e pessoas que entram e saem do território. Este dogma afirma que o bloqueio é necessário para a segurança de Israel, uma vez que restringe o movimento de armas e militantes para Gaza. Os críticos argumentam que o bloqueio é uma forma de punição colectiva contra a população civil de Gaza, uma vez que restringe o acesso a bens e serviços essenciais. Quinto, a solução de dois Estados é a única via para a paz: Muitos apoiantes da guerra de Israel contra o Hamas argumentam que a solução dos dois Estados é o único caminho viável para a paz na região. Este dogma afirma que a criação de um Estado palestiniano ao lado de Israel é a melhor forma de resolver o conflito e de responder às aspirações de ambos os povos. Os críticos argumentam que a solução dos dois Estados já não é viável devido à expansão contínua dos colonatos israelitas na Cisjordânia e à falta de vontade política de ambas as partes para negociar um acordo de paz duradouro. Sexto, o direito internacional apoia as acções de Israel: Israel afirma que as suas operações militares em Gaza estão em conformidade com o direito internacional, nomeadamente com as leis dos conflitos armados. Este dogma afirma que as acções de Israel são respostas proporcionais e necessárias às ameaças colocadas pelo Hamas e por outros grupos militantes na região. Os críticos argumentam que Israel violou o direito internacional ao visar zonas civis em Gaza, ao utilizar força excessiva e ao ignorar os princípios da distinção e da proporcionalidade. Sétimo, o Hamas rejeita o direito de Israel à existência: Outro dogma central da guerra de Israel contra o Hamas é a rejeição, por parte do grupo, do direito de Israel a existir. O ideário do Hamas apela à destruição de Israel e à criação de um Estado palestiniano no seu lugar. Este dogma é utilizado para justificar as acções militares de Israel contra o Hamas, enquadrando-as como medidas defensivas contra uma ameaça existencial. Os críticos argumentam que a rejeição pelo Hamas do direito de Israel a existir é uma posição política que deve ser abordada através da diplomacia e das negociações, e não da força militar. Oitavo, o papel dos actores externos no conflito: a guerra de Israel contra o Hamas não é apenas um conflito localizado entre duas partes, mas uma luta geopolítica complexa que envolve múltiplos actores externos. Este dogma reconhece a influência de países como o Irão e o Qatar no apoio ao Hamas e a outros grupos militantes na região. Reconhece também o papel dos Estados Unidos e de outras potências ocidentais no apoio militar e diplomático a Israel. Este dogma salienta a necessidade de cooperação e empenhamento internacionais para abordar as causas profundas do conflito e promover uma resolução pacífica. Nono, o impacto do conflito na população civil: O actual conflito entre Israel e o Hamas tem tido um impacto devastador na população civil de ambos os lados. Este dogma reconhece o sofrimento e as perdas sofridas por pessoas inocentes apanhadas no fogo cruzado do conflito, incluindo crianças, mulheres e idosos. Sublinha a necessidade de assistência humanitária, de protecção dos civis e de respeito pelos direitos humanos no meio de um conflito armado. Este dogma apela a uma maior atenção às dimensões humanitárias do conflito e a um empenhamento na defesa dos princípios do direito internacional humanitário. Décimo, a necessidade de diálogo político e de negociação: Apesar da profunda animosidade e desconfiança entre Israel e o Hamas, reconhece-se a necessidade de diálogo político e de negociação para resolver o conflito. Este dogma sublinha a importância da diplomacia, do compromisso e do reconhecimento mútuo na abordagem das causas profundas do conflito e na obtenção de um acordo de paz sustentável. Apela ao reinício das conversações de paz, à implementação de medidas de confiança e ao envolvimento de mediadores externos para facilitar uma resolução pacífica do conflito. Os dogmas da guerra de Israel contra o Hamas reflectem a natureza complexa e multifacetada do conflito em curso entre as duas partes. Embora cada dogma apresente uma perspectiva diferente sobre as causas e as consequências do conflito, todos eles apontam para a necessidade urgente de uma solução abrangente e sustentável para alcançar a paz e a segurança para o povo de Israel e de Gaza. Só através do diálogo, da negociação e de um verdadeiro empenhamento na defesa dos direitos humanos e do direito internacional será possível quebrar o ciclo de violência e alcançar uma paz duradoura na região.
Hoje Macau EntrevistaKishore Mahbubani diz que Joe Biden está “de mãos atadas” devido à crescente hostilidade de Washington face à China A crescente hostilidade da classe política norte-americana face à China vai “atar as mãos” do Presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, na relação com Pequim, previu à Lusa um proeminente diplomata e autor de Singapura. “Acho que é bastante claro que Joe Biden vai ter uma tarefa sinuosa”, afirmou Kishore Mahbubani, autor do livro “A China Já Ganhou?”. “Há um consenso anti-China muito forte em Washington”, apontou. “Os republicanos vão destruí-lo caso ele seja brando com a China (…), mas, por outro lado, penso que ele vai ter uma química muito boa com [o Presidente chinês], Xi Jinping”, acrescentou. Investigador do Instituto de Pesquisa sobre a Ásia, na Universidade Nacional de Singapura, Mahbubani foi durante mais de 30 anos diplomata, tendo assumido a presidência do Conselho de Segurança das Nações Unidas entre 2001 e 2002. O autor considerou que a política de confrontação adoptada pelo anterior governo norte-americano de Donald Trump não conseguiu conter a ascensão do país asiático. “O resultado, após quatro anos, é uma China mais forte e uma América mais fraca”, resumiu. E, embora tenha parado com ataques retóricos e anúncios quase diários de novas sanções contra a China, a administração de Joe Biden ainda não anulou nenhuma das medidas do executivo anterior. “Graves erros” Mahbubani advertiu, porém, que os EUA estão a cometer “graves erros estratégicos” e a “subestimar” a China, ao avaliar o país de uma “perspetiva ideológica”. “Isto não é uma disputa entre uma democracia dinâmica nos Estados Unidos e um sistema comunista rígido na China”, apontou. “Na verdade, os EUA tornaram-se uma plutocracia e a China uma meritocracia.” O autor lembrou que o Partido Comunista Chinês “recruta para os seus quadros as melhores mentes da China”, enquanto as doações privadas desvirtuaram o sistema político norte-americano, ao constituírem um “suborno legalizado”, que impede a execução de reformas e retira influência ao voto popular. Mahbubani notou que o Ocidente – em particular, os Estados Unidos – tem vindo a cometer “erros estratégicos” que permitiram a ascensão da China. “A guerra no Iraque foi um presente geopolítico para a China: durante a década que a China mais cresceu, os EUA estiveram atolados a travar uma guerra completamente desnecessária.” “O mundo está a tornar-se multicivilizacional, onde a civilização ocidental não tem mais o monopólio, seja em termos de inteligência, conhecimento ou superioridade moral”, descreveu. “É um mundo muito, muito diferente”. A adaptação do Ocidente O Ocidente vai ter de adaptar-se a um mundo onde não é mais a força dominante, defendeu Kishore Mabubani, observando que os últimos 200 anos foram uma “aberração” histórica. “O Ocidente tem que parar de ser arrogante e começar a ouvir também.” “O Ocidente há muito tempo habitou-se a que o resto do mundo se adapte à sua visão, sem ter que esforçar-se por se adaptar a outros contextos”, acrescentou. Mahbubani argumentou que a ascensão de países como a China e a Índia significam que Estados Unidos e Europa não são mais a força dominante na política mundial, e que devem agora aprender a compartilhar, ou até mesmo abandonar, a sua posição hegemónica. “Até 1820, as duas maiores economias do mundo eram a China e a Índia”, observou. “O facto mais importante é que os últimos 200 anos de dominação ocidental constituem uma aberração histórica”. “No século XIX, a Europa dominou o mundo, no século XX, os EUA dominaram o mundo. Muitos nos Estados Unidos e na Europa presumem que este é o estado natural das coisas e desejam que o seu domínio se prolongue no século XXI”, disse. “No entanto, todas as aberrações têm um fim natural”, acrescentou, vincando que “a ascensão da Ásia é natural e teria que acontecer algum dia”. Em paridade de poder de compra, a China é já a maior economia do mundo, seguida pelos Estados Unidos. Japão e Índia ocupam o terceiro e o quarto lugar, respetivamente. Mahbubani notou que o Ocidente – em particular, os Estados Unidos – tem vindo a cometer “erros estratégicos”, incluindo “guerras desnecessárias” no Médio Oriente. A crise financeira de 2008, causada por hipotecas de alto risco do mercado imobiliário, constituiu outra falha de governação. Desde então, enquanto as economias desenvolvidas estagnaram, a China construiu a maior rede ferroviária de alta velocidade do mundo, mais de oitenta aeroportos ou dezenas de cidades de raiz, alargando a classe média chinesa em centenas de milhões de pessoas. A pandemia de covid-19, que causou quase 1,5 milhão de mortos nos Estados Unidos e Europa, em contraste com o leste da Ásia, onde a maioria dos países conseguiu suprimir a doença nos primeiros meses, constitui outro exemplo de um Ocidente em declínio, apontou. Os países ocidentais devem preparar assim as próximas gerações para diferentes escolas de filosofia e aprofundar os seus conhecimentos sobre a História e valores da Ásia, onde vivem hoje cerca de dois terços da população mundial. “Devemos aprender a entender como pessoas de outras civilizações sentem, agem e pensam”, afirmou. “Os chineses entendem os sistemas e a forma de pensar ocidentais, mas o Ocidente desconhece a cultura, História e processos de pensamento chineses”, descreveu.
João Romão VozesManga ocidental? [dropcap]R[/dropcap]egresso ao tema da manga japonesa, que tratei em crónica anterior para dar conta da minha decepção enquanto aficcionado ao constatar que no Japão há ainda uma profunda segregação de género relacionada com este tipo de literatura, que se traduz em recorrentes estereotipadas representações do corpo feminino de acordo com supostos padrões de beleza masculinos, na reprodução sistemática de tradicionais papéis sociais supostamente inerentes ao género sexual e até na existência de publicações diferentes para os públicos masculino e feminino. Há excepções, no entanto, e uma delas tornou-se recentemente um sucesso comercial nacional e internacional. Traduzido à letra, o título em português seria “Sou teu” ou “Sou tua” (“Kimi no na wa”), ainda que o título da edição internacional em inglês tenha sido adaptado para “O teu nome” (Your name). Começou por ser um filme de animação (anime) dirigido por Makoto Shinkai, tendo depois sido publicado como novela pelo mesmo autor e finalmente como banda desenhada (manga) em três preciosos volumes com a colaboração do ilustrador Ranmaru Kotone. O enredo contradiz ao máximo as ideias da representação tradicional dos papéis de género: um rapaz com uma vida cosmopolita numa grande cidade e uma rapariga de uma pequena vila em ambiente rural trocam sistematicamente de identidade e vivem temporariamente no papel do outro, sem saberem quando isso vai acontecer e em que momento vai acabar. Explorando as limitações das representações tradicionais de género, o enredo aborda também os limites entre o sonho e a realidade ou as contradições entre a vida quotidiana e as possibilidades de um futuro diferente. O sucesso da obra acabou por atrair uma produtora cinematográfica de Hollywood, disposta a produzir uma nova versão, com actores, actrizes e cenários “reais”, o que foi anunciado em finais de 2017. No entanto, mais de um ano passou sem que se conhecessem desenvolvimentos do projecto, tendo o previsível argumentista desta nova versão (Eric Heisserer) adiantado alguma explicação em entrevista recente: segunda afirma, os detentores (japoneses) dos direitos de utilização da obra exigem que o filme tenha um ponto de vista “ocidental”. A razão que adiantam é aparentemente simples (para ter uma perspectiva “oriental” podiam fazer o filme no Japão), mas acaba por remeter para uma questão maior e mais complexa: o que é uma perspectiva “ocidental” e em que se traduz essa dicotomia “oriental” vs “ocidental”, sobretudo quando se trata de uma história de dois adolescentes que tem características bastante universais (no sentido em que nada do que na história é essencial é particularmente específico do Japão)? Vivo com essa questão de forma recorrente desde que me instalei quase em permanência no Japão. É frequente usar-se essa dicotomia “oriental” vs “ocidental” em conversas informais, em notícias da imprensa ou em discussões científicas em ambientes académicos. Reconheço a minha dificuldade: não percebo o que é “ocidental”, nem o que é “oriental”, e muito menos onde está a fronteira entre esses dois supostos universos. Ficando pelo caso do cinema, que é o assunto da crónica e serve como exemplo suficiente: terá a mesma “perspectiva ocidental” um filme produzido em Portugal, em França, na Alemanha, no Brasil, na Argentina, no México ou nos Estados Unidos? Ou de outra forma, ficando pelo mesmo país: será a mesma “perspectiva ocidental” a que é transmitida num filme realizado por, digamos, Quentin Tarantino, Steven Spielberg, Martin Scorsese, David Fincher Fincher ou Spike Lee? Talvez sejam muito maiores as diferenças que as semelhanças entre as abordagens destes realizadores, ainda que todos sejam, não só “ocidentais”, como da mesma nacionalidade. O mesmo se passa, naturalmente, em relação à suposta “perspectiva oriental”. Serão assim tão semelhantes as abordagens cinematográficas no Japão, na China, no Vietname ou nas Filipinas? Haverá uma linguagem ou um fundamento comum que as distinga de uma qualquer “perspectiva ocidental”? Não há diferenças significativas de abordagens dentro de cada um destes países? Pela parte que me toca, confesso o meu limitado (ou nulo) entendimento do que me querem dizer quando no Japão me falam em “perspectiva ocidental”, o que acontece com frequência e em contextos muito diferentes. Espero, em todo o caso, que com estas singelas crónicas não esteja a representar toda uma perspectiva civilizacional “ocidental” e me responsabilize apenas a mim próprio.
Hoje Macau China / ÁsiaPCC acusa ocidente de “dor de cotovelo” face ao papel da China [dropcap style=’circle’]U[/dropcap]m jornal oficial chinês afirmou ontem que o ocidente sente “dor de cotovelo” face ao papel cada vez mais proeminente da China em África, ilustrando a insistência de Pequim de refutar acusações de neocolonialismo no continente. O editorial do Global Times, jornal em inglês do grupo do Diário do Povo, o órgão central do Partido Comunista da Chinês, surge numa altura em que o Fórum de Cooperação China/África junta, em Pequim, dezenas de chefes de Estado e de Governo do continente africano. O jornal denuncia a “retórica” na imprensa e por parte de políticos ocidentais, de que a China está a pilhar os recursos naturais do continente e a conduzir estes países para a armadilha do endividamento. “Preferem revelar dor de cotovelo, ao invés de reflectirem por que é que a colaboração de África com os Estados Unidos e a Europa ficou para trás”, acusa o jornal. O “problema fundamental” é que o ocidente menospreza África e “trata o continente como se fosse o seu quintal”, acrescenta. Num discurso proferido ontem perante líderes e empresários chineses e africanos, também o Presidente chinês, Xi Jinping, garantiu que o investimento de Pequim não acarreta “condições políticas”, apoiando a inclusão de África no projecto de infra-estruturas internacional lançado pela China, a Nova Rota da Seda. Mundos e fundos “A China não interfere nos assuntos internos de África e não impõe a sua vontade sobre África”, afirmou Xi, notando que “os projectos desenvolvidos no continente visam resolver obstáculos ao desenvolvimento”. “Os recursos para a nossa cooperação não são para ser gastos em projectos fúteis, mas nos sítios em que mais são necessários”, disse. Segundo a unidade de investigação China AidData, desde 2000, Pequim concedeu mais de 110.000 milhões de dólares em financiamento aos países africanos. O país asiático é, desde 2009, o maior parceiro comercial de África. Pelas estatísticas chinesas, nos primeiros seis meses deste ano, o comércio bilateral aumentou 16 por cento, em termos homólogos, para 98.800 milhões de dólares.