Andreia Sofia Silva EventosExposição / 10 de Junho | Monocromático de António Mil-Homens na Casa Garden [dropcap]D[/dropcap]o nada se fez tudo. Este pode ser o mote de António Mil-Homens, fotógrafo há décadas radicado em Macau a quem a crise causada pela pandemia da covid-19 trouxe o enorme desafio de conseguir sobreviver sem trabalho. Tendo realizado apenas dois trabalhos desde Janeiro, António Mil-Homens decidiu pegar nas telas de pequena dimensão que tinha em casa, adquiridas há vários anos, e dar-lhes vida. Assim surgiram os trabalhos que dão agora corpo à exposição “Monochrome”, uma mostra que integra a celebração do 10 de Junho – Dia de Portugal, Camões e das Comunidades Portuguesas, e que pode ser visitada pelo público a partir desta quinta-feira, 18, na Casa Garden. Nesta exposição não há cor. O preto e o branco assumem-se como protagonistas principais por vontade expressa do fotógrafo agora tornado pintor. Os quadros podem inserir-se numa corrente abstraccionista que vai buscar inspiração às imagens captadas, mas a decisão do uso de tons exclusivamente monocromáticos surgiu de forma espontânea. “Gosto muito da fotografia a preto e branco, mas em termos de pintura as coisas começaram a surgir assim e conclui que se calhar em termos de opção, quer queiramos quer não, são as opções iniciais, no sentido de estabelecer um tipo de trabalhos, que determinam a diferença”, contou Mil-Homens ao HM. “Esta é a minha primeira exposição, mas a pintura é para continuar como forma de expressão artística, e sinto que vai ser com cada vez mais força. Portanto é uma opção estética”, frisou. Uma vez que a pandemia da covid-19 obrigou as entidades que organizam as celebrações do 10 de Junho a virarem-se para os talentos de Macau, foi o próprio António Mil-Homens que falou, não só com Paulo Cunha Alves, cônsul-geral de Portugal em Macau, mas com outras pessoas no intuito de mostrar o seu trabalho ao público. Se não fosse através das celebrações oficiais do 10 de Junho, seria de outra forma, garante. Nada é por acaso Pintar surgiu como um instinto para António Mil-Homens, que assume não ter qualquer formação na área. “Esta é das tais coisas que são difíceis de explicar. São coisas que estão cá dentro que, quando saem, saem com esta força toda. De tal maneira que me levou a achar, e as pessoas a quem tenho mostrado os trabalhos concordam comigo, que valia a pena mostrar.” Expor com “Monochrome” é também uma oportunidade para o autor garantir algum sustento financeiro, uma vez que o cancelamento de alguns eventos faz com que continue sem trabalho devido à covid-19. “Isto acontece não só como forma de expressão artística, mas também como uma solução em termos financeiros. Desde Janeiro que fiz apenas dois trabalhos de fotografia e estamos a meio de Junho. Quero acreditar que a pintura seja uma via alternativa mesmo em termos financeiros.” Apesar de esta ser a primeira vez que expõe a título individual, António Mil-Homens foi fazendo pequenas tentativas na área da pintura. A primeira foi em 2010, com uma exposição no bairro de São Lázaro, onde apareceu a pintar o seu próprio retrato em tempo real. Grande e pequeno Há quatro anos, chegou a pensar em pintar quadros de grande dimensão. “Estava em fase de arrancar com um projecto megalómano. Tenho apenas uma peça que nem considero concluída. Entretanto não me renovaram o aluguer do estúdio e a minha ideia era pintar a uma escala que é incomportável em termos de habitação, e isso caiu por terra.” Depois da ideia de pintar grandes quadros, António Mil-Homens decidiu virar-se apenas para quadros pequenos, e por uma razão muito prática, uma vez que a venda será mais fácil, bem como o transporte das obras. “Está a dar-me um prazer incrível, de tal maneira que acabei por preterir alguns dos trabalhos iniciais para incluir a todos os que se seguiram e já tenho mais coisas além daquelas que vão constituir a mostra”, acrescentou. Numa celebração do mês de Junho diferente do habitual, António Mil-Homens recorda que as coisas não acontecem por mero acaso. “A diferença é obrigar-nos a concentrar naquilo que somos enquanto comunidade em Macau. Se calhar isso é o lado bom de entre os aspectos negativos da pandemia e do confinamento. É bom olhar em volta e ver que há valores aos quais, muitas das vezes, não se dá a devida importância. Marca também o arranque da utilização efectiva da Casa de Vidro por parte da Casa de Portugal, portanto nada acontece por acaso”, rematou.