Pequim, 11 de Novembro de 1978

[dropcap style≠’circle’]O[/dropcap]s chineses são mestres no fabrico e manipulação de todo o tipo de materiais. Hoje foi dia de visita a uma das muitas fábricas de artesanato de Pequim, oportunidade para ver e entender como se criam excepcionais peças artísticas. A fábrica, no sul da cidade, é pequena e os artesãos são maioritariamente mulheres, 56% do total. Têm umas mãos a quem os deuses concederam o privilégio de cerzir e lapidar pequenas e grandes maravilhas. Esculpem o jade e o marfim, mas quando não há marfim trabalham o osso de búfalo ou de iaque. Fiquei a saber que o marfim é raro e muito caro, proveniente da Tanzânia custa entre 400 a 500 yuans por quilo.

Mais acessível e capaz de satisfazer qualquer gosto é o cloisonné, típico de Pequim. Trata-se, no essencial, de jarras de cobre e latão cobertas cuidadosamente de esmalte vidrado, de diferentes cores, segundo o desenho saliente de um rendilhado de flores e figuras que é colado na  jarra e depois cheio com o esmalte, utilizando o artífice uma espécie de pipeta. Em seguida, a jarra vai ao forno e no fim é polida. Uma espectacular obra de arte!

Também as mini-pinturas no interior dos pequenos frescos de vidro, teoricamente para guardar rapé, são um hino ao engenho destes artífices que usam um pequeníssimo pincel dobrado introduzido pelo gargalo do frasco e criam paisagens ou desenhos de animais, dragões, temas mitológicos e beldades de espantar.

Os operários, os artesãos têm apenas o 1º. ou o 2º. ciclo de escolaridade. Os veteranos ensinam os mais jovens e os melhores de todos conseguem uma graduação pelo Instituto Central do Artesanato Industrial. O salário mais baixo é 40 yuans, mas os artesãos veteranos podem ganhar 250 yuans por mês. Há uma creche e uma clínica destinada aos artesãos e suas famílias. Tudo muito pobre, mas funcional.

Pequim, 15 de Novembro de 1978

Há dias, aqui em Pequim, dizia-me o Gonçalo César de Sá, jornalista da Anop a trabalhar em Macau, de visita à China: “Hoje convidaram-me a conhecer a redacção e as oficinas do ‘Diário do Povo’ (Renmin Ribao). Quase tudo aquilo me pareceu velho e desactualizado, a precisar de urgente modernização”.

O Gonçalo tinha razão. Não é apenas o maior diário chinês que precisa de se modernizar, é toda a enorme China que, nos últimos anos, por múltiplas e complexas razões, se deixou atrasar e quase ia perdendo o comboio do progresso.

As gentes desta terra parecem voltadas para o futuro e ninguém lhes poderá levar a mal por pretenderam aproveitar e desenvolver as suas enormes potencialidades.

A China é um país rico. Possui jazidas de petróleo, ferro, carvão, estanho, bauxite, ouro, prata, etc. Com uma população laboriosa de quase mil milhões de pessoas consegue, graças aos esforços gigantescos dos seus camponeses, com 1/17 do solo arável existente no globo alimentar  quase 1/5 da população mundial.

Mas a China é também um país pobre. A população é predominantemente camponesa e continua agarrada à terra onde vai buscar o arroz de cada dia; os recursos naturais estão pouco explorados, a indústria é muitas vezes incipiente, faltam técnicos e pessoal especializado, a mão-de-obra  está muito longe de ser plenamente aproveitada, o rendimento per capita é muito baixo.

Após os enormes sobressaltos da Revolução Cultural, a morte em 1976 dos seus três maiores dirigentes, Mao Zedong, Zhu Enlai e Zhu De, a China, agora com Deng Xiaoping, procura a estabilidade e a modernização.

A estabilidade é sempre relativa num país extremamente diversificado, com uma superfície cento e dez maior do que a de Portugal e com as chagas de vários conflitos políticos ainda não cicatrizadas. Mas os chineses procuram uma acalmia na luta política. O fulcro é hoje a modernização da China.

Um dos aspectos que mais seduzia certos ocidentais que visitavam a China nas décadas de cinquenta e sessenta eram encontrarem um povo com as necessidades primárias quase todas resolvidas, a alimentação, a saúde, a habitação, o ensino, mas que permanecia pobre e aparentemente feliz. Ora o mundo evoluiu. Até há poucos anos atrás, era fácil comparar a Nova China com um passado tenebroso de morte e miséria, anterior a  1949 que estava na retina de tanta gente. Hoje, os chineses, sem esquecer esse passado, fazem sobretudo comparações com os países mais avançados do mundo, reconhecem o seu atraso e vêem que têm muita coisa a aprender com o estrangeiro. Recentemente, no Diário do Povo” fazia-se a seguinte pergunta: “Será que é muito revolucionário viajar de mula enquanto no estrangeiro viajam em jactos supersónicos? Será que enquanto os outros usam computadores, nós vamos continuar a utilizar o ábaco”? Havia muito gente na China que defendia um tipo de vida género “pobrezinho mas honesto”. Ora se as pessoas podem deixar de ser pobres – a honestidade é um conceito muito complexo e relativo, sobretudo no mundo chinês —  o que há de mau em procurar viver melhor?

Socialismo não pode ser sinónimo de pobreza. Socialismo não pode ser  continuarem a viver indefinidamente seis pessoas numa única assoalhada, como ainda acontece em muitas grandes cidades da China. Quando existem neste país meios para se construir uma casa decente para toda a gente, como se compreende que situações como esta não caminhem para uma solução?

Há dias, no Congresso dos Sindicatos da China, Ni Zhifu, membro do Burô Político do Comité Central do Partido Comunista da China, disse, tal como vem no boletim diário da agência Xinhua, a Nova China: “Se o socialismo não permite aos trabalhadores uma vida sossegada e feliz através de um considerável desenvolvimento das forças produtivas, mas se significa que o país deve permanecer pobre e que o povo deve ter uma vida muito difícil, que espécie de socialismo é este?”

Para se modernizar, a China está a recorrer à tecnologia e aos empréstimos estrangeiros. Há quem veja associado a isto a importação de ideias do mundo capitalista e o abandono da política de “contar com as próprias forças”. É capaz de ser verdade.

Em finais de 1977, visitei o complexo petroquímico de Pequim que engloba uma cidade com 110 mil habitantes, situada cinquenta quilómetros a sul da capital. Aí funcionam cinco grandes refinarias, uma delas integralmente importada do Japão. É ultramoderna, controlada por computadores e foi instalada em 1975 e 1976. Em dois anos de laboração já produziu quase o suficiente para pagar a sua instalação e continua a refinar petróleo que se destina principalmente ao Japão.

Existe um provérbio chinês que diz: “Nunca nos devemos meter no casulo como o bicho-da-seda”. A China saiu do “casulo” e trabalha para, modernizando-se, garantir a melhoria das condições de vida deste povo que tanto tem sofrido e bem merece uma existência mais feliz.

Pode experimentar-se simpatia, cepticismo ou receio face à China actual, pode concordar-se ou não com o sistema político chinês, mas é preciso estar atento e tentar conhecer o que de facto vai acontecendo cá pelas bandas do Extremo-Oriente. Porque uma China poderosa e moderna pesará como chumbo nos destinos da Humanidade.

Pequim, 25 de Novembro de 1978

O meu filho Sérgio, de três anos, quase só fala chinês, com o sotaque nasalizado e arredondado de Pequim. O português começa a ser para ele uma língua difícil.

Hoje perguntei-lhe:

“Se não falas português, quando chegares a Portugal como vais falar com a avó?”

Resposta imediata:

“A avó fala chinês.”

Aos três anos de idade, pela língua, o entendimento o mundo chinês plasma-se na mente do menino de Lisboa. E não há nada a fazer, para ele é fácil, toda a gente do mundo fala chinês…

Pequim, 7 de Dezembro de 1978

A lanterna do desânimo acende-se por vezes num dos muitos recantos de mim. Ilumina este sentir azedo de quem anda amiúde pontapeando a lua com sapatos de papelão. Sei de coisas grandes que olhos pequenos raramente vêem, de palavras bonitas e acções bem feias, do desaforo de gente mascarada que traz orquídeas nos dedos e cultiva cardos no coração.

Falo cada vez menos. Acentua-se este pendor para uma quase misantopia, não inata, adquirida ao longo dos sinuosos caminhos que conduziram à decepção e à tristeza diante de tanta vilania humana.

7 Nov 2016

Poluição | UNICEF congratula-se com esforços feitos pela China

É sempre possível fazer mais, mas o Governo Central está no bom caminho no combate à poluição atmosférica. Na semana em que a UNICEF publicou um aterrador relatório sobre os efeitos do ar sujo nas crianças, a delegação em Pequim diz estar satisfeita com os progressos alcançados

[dropcap style≠’circle’]“A[/dropcap] UNICEF louva o Governo chinês pelos passos que foram dados no combate à poluição, ao introduzir sistemas de quantificação do problema, implementando padrões rigorosos para as emissões e prestando atenção às indústrias mais poluentes.” É assim que a delegação de Pequim da agência das Nações Unidas comenta a situação actual do país, em declarações feitas ao HM na sequência da publicação de um relatório, no início desta semana, sobre as consequências da poluição atmosférica para as crianças ao nível mundial.

O estudo – o primeiro do género a ser feito pela UNICEF – indica que cerca de 300 milhões de crianças vivem em locais onde os níveis de poluição são tão elevados que podem ter consequências graves para a saúde. Em termos globais, uma em cada sete crianças respira ar na rua que é, pelo menos, seis vezes mais poluído do que o recomendado nas directrizes internacionais. A poluição atmosférica é, neste momento, um dos principais factores para a mortalidade infantil.

Ao contrário do que tem vindo a ser norma, a China não é retratada no estudo como sendo dos casos mais problemáticos – Shenzhen é, de resto, apontada como uma cidade que soube trabalhar para ter um ar mais puro e que continua empenhada para atingir níveis melhores.

A UNICEF China confirma os progressos alcançados um pouco por todo o país. “As metas definidas no 13o Plano Quinquenal, o compromisso com os Objectivos de Desenvolvimento Sustentável e a ratificação do Acordo de Paris são passos que irão permitir que a China se torne mais saudável.”

De pequenino

A delegação da agência explica que está a colaborar com as entidades governamentais do país para estudar os efeitos da saúde ambiental nas crianças, prometendo ainda apoiar o desenvolvimento de um plano de acção para a saúde ambiental infantil como parte do plano nacional sobre a matéria. A UNICEF participa também em actividades de educação dos jovens, “aumentando a consciência sobre as alterações climáticas, dando assim instrumentos às crianças para que possam ser futuros líderes na resolução dos problemas relacionados com o ambiente”.

Rana Flowers, representante da UNICEF para a China, defende que as autoridades não podem ser as únicas entidades públicas chamadas à colação quando em causa está o combate ao ar difícil de respirar. “É preciso fazer mais para proteger as crianças das consequências da poluição atmosférica, não só pelos governos, mas por todos nós. Reduzir a poluição ao ar livre é um objectivo a longo prazo, mas podem ser dados passos imediatos para diminuir a poluição nos recintos fechados”, sustentou ao HM.

“A utilização de combustíveis limpos, a boa ventilação, a construção de casas e escolas com eficiência energética, e o fim do consumo do tabaco em espaços fechados” são alguns exemplos apontados por Rana Flowers. “Os pais também podem dar passos para proteger as crianças contra os efeitos da poluição, ao evitarem expô-las ao fumo do tabaco e prevenirem a má nutrição”, continua, alertando para os benefícios da amamentação exclusiva dos bebés até aos seis meses de idade, e das vantagens no investimento em vacinação e tratamentos para a pneumonia.

3 Nov 2016

Diário (secreto) de Pequim | Beidaihe, 30 de Julho de 1978

[dropcap style≠’circle’]A[/dropcap]lém da praia, bem agradável, mais uma visita, agora a uma fábrica de vidros, de nome Yao Hua, o que significa “Glória da China”, começada a construir em 1924 por um cidadão belga perdido por estas paragens e por um filho de Yuan Shikai, o tal general que em 1916, após a fundação da república chinesa, se auto-proclamou imperador de uma nova dinastia e, entre os conluios pelos corredores do poder, acabou por ser morto logo a seguir, por envenenamento.

A fábrica, ocupada pelos invasores japoneses em 1936, conta hoje com 4.100 operários, e tem muitas histórias para contar. Está a laborar em pleno, com dois enormes fornos e dezoito complexos de maquinaria. Produz desde berlindes a vidraças de grande dimensão, 9.000 caixas de vidro por dia, cada com 200 quilos, 25% das quais destinadas à exportação. Eu vou aprendendo. A vidraça é fabricada com nove espécies diferentes de materiais, a saber, areia, quartzo, óxido de cálcio, manganésio, óxido de sódio, sulfato de sódio, cal, carvão em pó e fluoreto de cálcio. Fabricam também fibra de vidro para uso electrónico, seda de vidro e tela de fibra para isolamentos. Mas dizem-me que a tecnologia de que dispõem ainda é baixa e atrasada, não corresponde às exigências da indústria moderna.

Pensam produzir vidro estampado, com desenho de flores, automatizar grande parte da maquinaria, utilizando computadores. O salário máximo é de 160 yuan por mês para os engenheiros veteranos, o médio, de 60 yuans e o mínimo é de 37,5 yuans. Os operários que trabalham junto aos fornos recebem um subsídio extra de alimentação.

Muito interessante o complexo vidreiro. Tenho a sorte de poder conhecer na China tanta coisa, tanto lugar onde jamais entraria no meu Portugal.

Pequim, 9 de Agosto de 1978

Na calma do Verão continuo a estudar, a ler tudo o que me chega sobre a China, e não é nada pouco. Estou a organizar um ficheiro “chinês” por temas, autores, personalidades, história. Tenho trabalho para o resto da vida.

Pequim, 29 de Setembro de 1978

Ida à comuna popular de Dong Beiwang, que significa “Prosperidade do Nordeste”, uns quarenta quilómetros a norte de Pequim. Como de costume nestas visitas, logo à chegada somos brindados com uma longa explanação sobre as realidades e virtudes do lugar, desta vez por parte do camarada Wang Chong, um dos vice-directores da comuna.

Aí vai parte do relatório:

A comuna foi fundada em 1958, juntando quatro cooperativas agrícolas. Engloba 3.700 famílias, num total de 14.000 pessoas, 6.000 das quais aptas a trabalhar todos os dias. A cada um segundo o seu trabalho. Contam com uma superfície de 33 km 2  e 1.500 hectares de terra cultivada. Têm uma estação agro-técnica com armazéns para adubos, oficinas para a reparação de tractores e outras alfaias agrícolas. Existe ainda uma policlínica, uma fábrica de papel, outra de ferramentas. Assim se diversifica a economia da comuna popular. Têm 500 vacas, cada uma produz 14 litros de leite por dia, já com ordenha mecânica. Criam 60.000 patos por ano, cevados, alimentados à força para engordarem rapidamente e, depois de bem assados, resultarem no famoso pato lacado de Pequim, uma das delícias da cozinha chinesa. Fui ver como alimentam as aves. É um bocado deprimente olhar para os patos com uns canudos enfiados pelas goelas as abaixo, sendo obrigadas a engolir enormes quantidade de farinha.

Escavaram diversos poços ou tanques largos onde criam milhares de peixes de água doce, outra fonte de rendimento. O trigo, o milho, o arroz são as principais culturas mas não tem sido fácil estender as terras cultivadas. Os terrenos são acidentados, necessitam de ser nivelados, de se unir as parcelas separadas, de se fazerem obras de irrigação, enfim para bem dos homens é preciso alimentar, dar de beber a estas terras.

Parece estarmos numa economia colectiva que se auto-abastece do que necessita, e ainda sobra alguma coisa para vender.

Mais dados:

Têm 27 tractores e 300 moto-cultivadoras, mais 11 ceifeiras-debulhadoras. Só a transplantação do arroz é manual, os outros trabalhos já estão mecanizados. 2/3 das sementes são produto da investigação científica da comuna. A produção tem aumentado, em 1958 era de 2.520 quilos de cereal por hectare e agora é de 7.500 quilos. As máquinas e as pequenas fábricas só surgiram depois da formação da comuna, em 1958.

O salário médio dos camponeses varia entre 380 a 400 yuans, por ano. Eu próprio, como estrangeiro tradutor nas Edições de Pequim em Línguas Estrangeiras, ganho 550 yuans por mês, com casa, água, luz e assistência médica, tudo à borla. Mas os dezanove chineses que comigo trabalham nas Edições auferem quantias entre 45 e 70 yuans por mês, dez vezes menos do que eu, um pouco mais do que estes camponeses. É verdade que esta boa gente da comuna popular não paga renda, nem infantário ou escola para os filhos, e beneficia também de assistência médica gratuita.

Cada família tem direito a uma parcela privada de terra com 66 metros quadrados. Aí cultivam alguns legumes e criam porcos, galinhas, ovelhas e cabras que vendem como muito bem entendem. Na comuna funcionam dez escolas primárias e duas secundárias. Dizem-me que este ano 62 jovens da comuna entraram na universidade.

Cada equipa de produção tem direito a um televisor, a preto e branco.

Na visita à Comuna Dong Beiwang, avanço sozinho pelas humildes casas, pelos campos bem tratados. Um rancho de crianças faz-me companhia, curiosas por verem um estrangeiro na sua aldeia.

Esta é a China rural, ainda carente de quase tudo, centenas de milhões de chineses sobrevivendo em economias de subsistência, gente pobre que hoje já não morre à fome mas merece uma vida melhor.

Pequim, 2 de Outubro de 1978

Outra vez o faustoso banquete no Grande Palácio do Povo nas comemorações dos vinte e nove anos de fundação da República Popular da China. Exactamente igual aos outros dois onde já estive presente, Outubro e Dezembro do ano passado. A única, e parece que decisiva mudança, foi a presença de Deng Xiaoping que no seu discurso surgiu poderoso e confiante quase a subalternizar dentro do Partido o sucessor designado por Mao Zedong, o cada vez mais apagado Hua Guofeng.

Pequim, 4 de Outubro de 1978

Esta tristeza de viver dias solitários,

plenos de gente ecoando na redoma do ser.

Esta surdez capaz de ouvir o espiralar do silêncio

e a música do vento nas florestas.

Esta fome jamais saciada,

à solta por campos de sorgo

e trigais dourados de pão.

Estes olhos serenos, cerrados,

abertos para madrugadas de coral e maresia.

Estes dias, com o sol difuso

a pintar de cinza a labuta dos homens.

Esta corda atada em volta do brilho do olhar

e do prateado da lua.

Estes perfumes de saudade

estendendo-se pelas margens cintilantes do Outono.

Estas mãos gretadas,

puras na certeza de guardar e dar,

Esta voz soluçante, cantando.

Pequim, 21 de Outubro de 1978

Algum dia teria de me calhar a sorte ir trabalhar no campo, com os camponeses de uma comuna popular. A directiva do presidente Mao datada de 7 de Maio de 1966, institucionalizando as “Escolas 7 de Maio” 五七干校 , logo no início da Revolução Cultural, pressupunha reeducar os quadros e os intelectuais lançando-os num contacto intenso com a labuta dura e diária dos camponeses. Vieram-me buscar ao Hotel da Amizade, às cinco da manhã, num mini-bus. Fomos a Adélia Goulart, o Hans que trabalha na secção alemã da revista Beijing Informação e depois, junto à Rádio Pequim, entrou a Angelina Martins, brasileira, a viver e trabalhar na China, na Rádio, com o marido, o Jayme Martins, há mais de dez anos.

Seguimos, numa estirada de quase cem quilómetros, por maus caminhos mas quase sem trânsito madrugador, para a comuna popular de Waiwengu, no distrito de Guhang, já na província de Hebei. Era a nossa “Escola 7 de Maio”, apenas por um dia. Chegados à aldeia, pobre mas organizada, fomos ouvir o relatório do chefe da comuna, o camarada Su Xiangyu.

Começa por nos dizer que o solo da comuna é arenoso e difícil de cultivar. Quase só dá arroz, por isso têm de gerir cuidadosamente a água, as outras culturas  crescem com dificuldade, a produção depende das condições climatéricas e não é estável, produzem 400 quilos de cereais por mu (cada mu são 666,7 m 2) e consideram que apesar da seca são números razoáveis. O trabalho é sobretudo manual, possuem poucas máquinas, quase nenhuns tractores e debulhadoras mesmo assim contam com uma pequena fábrica de parafusos e de sacos de papel onde trabalham os familiares dos quadros do Partido. Têm um autocarro que transporta os alunos para a escola e que também é alugado às outras comunas próximas, o que acrescenta algum dinheiro ao magro pecúlio da terra. Três tardes por semana são dedicadas ao estudo. Aprendem mais chinês e lêem textos escolhidos do presidente Mao.

Concluída a arenga sobre as realidades da comuna de Waiwengu, era tempo de nós arregaçarmos as mãos e trabalhar. Destinaram-nos umas dezenas largas de fardos de palha que estavam alinhados ao longo do campo e nós devíamos agarrar, levantar do chão e colocar cuidadosamente no atrelado de um tractor que circulava a nosso lado. Esta era a labuta inicial dos recém-chegados filhos de uns tantos “diabos estrangeiros”. A minha roupinha, tipo fato-macaco maoista, começou a ficar coberta de fiapos de palha. E eu já suava. Mas em mim gosto do dever cumprido. Às onze e meia foi tempo de almoço, uma pobre vianda camponesa para enganar a fome e às treze horas era tempo de recomeçar o trabalho. Agora tínhamos de descarregar os fardos de palha dos atrelados do tractor e de os empilhar a preceito num dos grandes armazéns da aldeia. Tudo concluído, chegámos ao fim da tarde, exaustos, cansados. Vida de camponês chinês não é fácil, no entanto penso que era capaz de passar aqui um ou dois meses, ia aprender, não me fazia mal nenhum. 75% da população da  China vive no campo, este é o país mais do que real, tão mal conhecido pelos estrangeiros.

Yulan, uma das chinesas jovens que comigo trabalha nas Edições, contou-me que há uns tempos atrás foi mandada para uma comuna a fim de ser “reeducada pelos camponeses”, também numa Escola 7 de Maio. Puseram-na a plantar arroz, afundada na lama de um arrozal. Menina da cidade, de mãos limpas e mimosas, desabituadas a qualquer esforço para além da pena e da caneta, disse-me que tinha tanta a sua falta de jeito que eram mais os molhos de arroz  que arrancava do que os plantava.

Não foi o meu caso, nem o da Adélia, do Hans, da Angelina. Demos o nosso melhor, trabalhámos bem, quase até à exaustão, no meio daqueles calejados camponeses, que sorriam sempre face a tanta dedicação, labor e entusiasmo destes estranhos intelectuais chegados do outro lado do mundo.

Já no regresso a Pequim, a Angelina Martins, brasileira de São Paulo, contou-nos uma interessante história acontecida com o Jayme, o seu marido. Trabalham ambos na Secção Portuguesa da Rádio Pequim e há uns tempos atrás mandaram o Jayme para uma comuna popular, 300 quilómetros a norte de Pequim, para ser “reeducado”. Necessitando cagar, o Jayme dirigiu-se à latrina colectiva da aldeia, um grande buraco ao ar livre onde os camponeses depositavam as suas fezes e urinas que, depois da devida fermentação, eram utilizadas para adubar a terra. O Jayme agachou-se, tirou as calças e ali ficou, de bunda ao vento, tentando evacuar os seus cocós, o que não foi fácil, os seus intestinos estavam algo presos. Face à demora, olhou para trás e, para seu espanto, tinha já ali, do outro lado, quase uma centena de camponeses chineses contemplando curiosos o seu rabo. Rabos há muitos mas uma bunda estrangeira, brasileira, ao léu, numa comuna popular, no nordeste da China, cagando lentamente na brisa da tarde, é raríssima.

五七干校

António Graça de Abreu

31 Out 2016

Encontro entre líderes do PCC e Kuomitang no fim do mês

As reuniões entre representantes dos dois lados do Estreito sucedem-se. O lado chinês apela a uma comunicação honesta para salvaguardar a paz na região

[dropcap style≠’circle’]U[/dropcap]ma reunião entre os líderes do Partido Comunista da China e do partido Kuomintang (KMT) será significativa para salvaguardar o desenvolvimento pacífico das relações através do Estreito, disse um porta-voz da parte continental da China na quarta-feira.

An Fengshan, porta-voz do Departamento dos Assuntos de Taiwan do Conselho de Estado, o gabinete chinês, fez o comentário referindo-se à visita de Hung Hsiu-chu, líder do KMT em Taiwan.

Hung deve chefiar uma delegação em visita à parte continental entre 30 de Outubro e 3 de Novembro, disse o departamento na segunda-feira.

Sinal mais

Sob a situação actual, a interacção entre os dois partidos e os esforços para consolidar o fundamento político comum terão um impacto positivo para salvaguardar a paz e a estabilidade através do Estreito de Taiwan, disse An.

Em 2005, quando os laços através do Estreito atravessaram um momento crítico, os líderes dos dois partidos realizaram um “encontro histórico” confirmando adesão ao Consenso de 1992, que afirma o princípio da Uma Só China e se opõe à “independência de Taiwan”.

An disse que o acordo alcançado naquela reunião apontou um “caminho brilhante” para os laços através do Estreito e para o seu desenvolvimento.

Desde então, os dois partidos têm comunicado, o que tem contribuído para as relações pacíficas, disse o porta-voz.

An disse que os dois partidos e também os dois lados através do Estreito abriram um novo capítulo no desenvolvimento pacífico das relações e alcançaram uma série de êxitos desde 2008.

Os êxitos foram viáveis porque os dois lados estabeleceram o fundamento político comum de defender o Consenso de 1992 e opor-se à “independência de Taiwan”.

An indicou que é importante para os dois partidos manterem uma comunicação honesta para garantir o desenvolvimento das relações pacíficas através do Estreito.

28 Out 2016

Comércio entre a China e PLP cai 11,22%

As trocas comerciais entre o Império do Meio e os países de língua portuguesa continuam em queda. O Brasil mantém-se como o principal parceiro comercial

[dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] comércio entre a China e os países de língua portuguesa caiu 11,22% nos primeiros oito meses do ano, face ao período homólogo de 2015, indicam dados oficiais ontem divulgados.

Segundo estatísticas dos Serviços da Alfândega da China, publicadas no portal do Fórum para a Cooperação Económica e Comercial entre os Países de Língua Portuguesa (Fórum Macau), o comércio entre a China e os países lusófonos foi 60,23 mil milhões de dólares  entre Janeiro e Agosto.

Pequim comprou aos países de língua portuguesa bens avaliados em 41,68 mil milhões de dólares  – menos 0,74% – e vendeu produtos no valor de 18,54 mil milhões de dólares– menos 28,24% face aos primeiros oito meses de 2015.

O Brasil manteve-se como o principal parceiro económico da China, com trocas comerciais bilaterais de 45,16 mil milhões de dólares, uma queda de 7,69% em termos anuais homólogos.

As exportações da China para o Brasil atingiram 13,85 mil milhões de dólares, menos 30,14%, enquanto as importações chinesas totalizaram 31,30 mil milhões de dólares, uma subida de 7,62%.

Com Angola, o segundo parceiro comercial da China no universo da lusofonia, as trocas comerciais caíram 28,34%, para 10,19 mil milhões de dólares.

Pequim vendeu a Luanda produtos avaliados em 10,60 mil milhões de dólares – menos 60,27% face aos primeiros oito meses de 2015 – e comprou 9,13 mil milhões de dólares, menos 20,96%.

Vantagem de cá

Com Portugal, terceiro parceiro lusófono da China, o comércio bilateral ascendeu a 3,57 mil milhões de dólares  – mais 19,19% –, numa balança comercial favorável a Pequim, que vendeu a Lisboa 2,61 mil milhões de dólares – mais 32,91% – e comprou produtos avaliados em 966 milhões de dólares, menos 6,78%.

Em 2015, o comércio entre a China e os países de língua portuguesa caiu 25,73%, a primeira queda desde 2009.

Os dados divulgados incluem São Tomé e Príncipe, apesar de o país manter relações diplomáticas com Taiwan e não participar no Fórum Macau.

China estabeleceu a Região Administrativa Especial de Macau como a sua plataforma para o reforço da cooperação económica e comercial com os países de língua portuguesa em 2003, ano em que criou o Fórum Macau, que reúne a nível ministerial de três em três anos.

A quinta conferência decorreu em Macau entre 11 e 12 de Outubro com a presença de cinco primeiros-ministros (da China, Portugal, Cabo Verde, Guiné-Bissau e Moçambique), naquela que foi a representação de mais alto nível de sempre. Angola, Brasil e Timor-Leste fizeram-se representar por ministros.

28 Out 2016

Maioria dos chineses quer Xi Jinping como “líder central”

Uma sondagem da Tribuna do Povo revela que as qualidades do secretário-geral devem levar a que este possa ganhar o estatuto de “líder central”, a exemplo de Mao Zedong. Alguns analistas ocidentais admitem já que o actual Presidente possa ficar no poder mais do que os dez anos previstos

[dropcap style≠’circle’]”A[/dropcap] maioria dos chineses” deseja que o actual secretário-geral do Partido Comunista (PCC), Xi Jinping, seja um “líder central”, com o estatuto do antigo Presidente Mao Zedong, revelou uma sondagem publicada ontem na imprensa oficial.

As referências a um estilo de governação centrada no líder têm-se multiplicado, numa altura em que cerca de 400 altos quadros do PCC estão reunidos em Pequim para discutir o futuro da organização.

A referida sondagem, com uma amostra de 15.000 pessoas, foi difundida pela Tribuna do Povo, revista do grupo do Diário do Povo, o jornal oficial do partido.

O estudo revela que a “maioria” dos inquiridos concorda “que a ascensão de uma grande nação necessita de um líder forte e central”.

“As qualidades especiais do secretário-geral Xi Jinping, como líder de uma grande nação, conquistaram a aprovação da grande maioria dos inquiridos”, escreveu a revista.

Todos os sectores da sociedade “aguardam com enorme expectativa” a ascensão de Xi Jinping, acrescenta.

O artigo que acompanha os resultados da sondagem compara ainda Xi a Mao Zedong, o fundador da República Popular, e a Deng Xiaoping, o “arquitecto-chefe das reformas económicas” que abriram a China à economia de mercado.

“Foi o Presidente Mao que ergueu o povo [chinês], ou de outra forma andaríamos perdidos na escuridão”, refere, acrescentando que Deng converteu a China num país rico.

“Agora, a China deve fortalecer-se, o cidadão comum sabe disso. E para atingir esse objectivo devemos confiar no secretário Xi”, aponta.

Regras e virtudes

Formalmente, Xi Jinping acumula já mais poder do que todos os anteriores Presidentes chineses, desde o fim do “reinado” de Mao Zedong.

Cimentado pelos líderes chineses desde finais dos anos 1970, o sistema de “liderança colectiva” parece ter sido também desmantelado desde que Xi chegou ao poder.

Analistas ocidentais admitem já que este poderá ficar no poder para além do período previsto de dez anos.

O sexto plenário do Comité Central, o último antes da liderança do partido ser remodelada no próximo ano, aborda as “regras da disciplina interna” no PCC e “as directrizes para a vida política” dos seus membros, segundo a agência oficial Xinhua.

Os inquiridos pelo Tribuna do Povo dizem admirar o pensamento estratégico de Xi, a coragem com que enfrenta os problemas e o seu “carisma pessoal”.

O enfraquecimento da “liderança central” pode “facilmente causar guerra civil, a invasão por inimigos estrangeiros e pôr o povo na miséria”, lê-se no artigo.

“Isto é uma dura lição que aprendemos com os 100 anos de sangue e lágrimas na recente história da China”, conclui, numa referência ao “século de humilhação”, um período que se refere à ocupação estrangeira e vai desde a primeira guerra do ópio (1839 – 1842) ao fim da ocupação japonesa durante a Segunda Guerra Mundial.

27 Out 2016

As mulheres mais odiadas da China 让解放军踮起足尖的女人

[dropcap style≠’circle’]“E[/dropcap]m Xangai, Wang Guangmei (mulher do então presidente, J O’y) proferiu um discurso de 70.000 palavras…[na] mesma semana em que Jiang discursou no Festival da Ópera de Pequim. Enquanto Wang explicava a agrónomos qual o fertilizante que ela achava mais adequado para as difíceis condições da Província de Hebei, Jiang ensinava os actores a usar uma pistola de forma a evitarem danificar o pénis.”

Comrade Chiang Ch’ing por Roxane Witke, 1977

Querida Humanidade, ups, a Mestre de Artes, Jiang Qing江青.

A reforma da arte tradicional começou após a fundação da República Popular da China, em 1949; esta reforma também abrangeu a Ópera. No início dos anos 60, Mao Tsé Tung queixava-se que os palcos chineses ainda eram dominados por “imperadores, reis, generais, chanceleres, literatos e beldades” (风花雪夜才子佳人, ao invés de heróis proletários da classe trabalhadora. Houve uma mulher que o compreendeu. Acabaria por entrar na História como a mulher malvada do Secretário Geral – uma mulher que arcou com a as consequências do desagrado nacional, devido às marcas deixadas pelo líder da revolução de massas.

Liu Haisu, um dos grandes nomes da história da Arte chinesa, que deu início à utilização de modelos nus nas Academias, escreveu sobre Lan Ping: “Tinha regressado da Europa no Verão de 1935. [Ela] já era famosa em Xangai por causa do seu desempenho de Nora, na peça de de Ibsen. Era uma artista talentosa, qualquer coisa que se lhe dissesse, ela compreendia à primeira.”   Nos anos 60, quando Mao apelou à criação de uma nova arte revolucionária, foi como se lhe tivesse insuflado vida nova. Deu início a uma cruzada para controlar o mundo das artes, pelo que foi condenada para todo o sempre, mas através da qual deixou marcas inesquecíveis. Os chineses costumam dizer: “8 biliões de pessoas a admirar 8 personagens modelo do palco” (八亿人看八个样板戏). Porquê? Porque os heróis e as heroínas são gao (, sublimes), da (, gloriosos) e quan (, completos). É a versão chinesa do Übermensch (super-homem de Nietzsche), embora duvide que Jiang alguma vez tenha estudado Riefenstahl.

Pelos vistos, os efeitos das oito personagens modelo da camarada Jiang Qing na memória colectiva dos chineses, foram muito incrementados pela publicação de diversíssimos cartazes que reproduziam momentos chave das suas peças. Tornaram-se imediatamente clássicos, ousados e inovadores usando sem complexos elementos característicos da arte ocidental. Por exemplo, os instrumentos que compõem as orquestras ocidentais foram todos introduzidos na Ópera tradicional de Pequim, bem como elegantes bailarinas de sapatilhas de cetim, que volteavam e saltavam em torno de soldados agitando armas e espadas, enquanto realizavam proezas de Kungfu.  O colorido dos cenários chegava a ter um magnetismo à la Warhol.    

As oito personagens modelo continuam vivas hoje em dia, justiça lhes seja feita, embora o apreço do público seja já desprovido de significado político. O que resta tem mais a ver com nostalgia, já não existem conotações negativas. São o manifesto de uma mulher no mundo masculino da política.

26 Out 2016

6º Plenário do PCC | Analistas falam na consolidação do poder de Xi Jinping

Começou ontem em Pequim o encontro do movimento político com mais poder no mundo. O Sexto Plenário do Partido Comunista Chinês pode mudar a história do país, dizem os analistas. É que começa agora a luta pelos cargos mais importantes da estrutura

[dropcap style≠’circle’]S[/dropcap]ão reuniões que acontecem no Hotel Jinxi, na capital chinesa, longe do olhar do público. Ao todo, participam quase 400 membros do Partido Comunista Chinês (PCC). Até à próxima quinta-feira, discutem mudanças em relação ao modo como o partido deverá ser gerido. O conclave, diz a Xinhua, “está focado nas questões da disciplina partidária”. A lacónica retórica oficial esconde o que está efectivamente em causa: jogam-se posições políticas e relações de força na segunda maior economia do mundo.

O Sexto Plenário, como o encontro é conhecido, acontece numa altura em que o PCC enfrenta mudanças significativas. Desde que assumiu os comandos do partido em 2012, o secretário-geral Xi Jinping tem tentado moldá-lo de acordo com os seus desígnios e tem controlado mais alavancas de poder do que qualquer outro líder desde Mao Zedong, escreve a France-Presse.

Depois, enquadra ainda a agência, a campanha de luta contra a corrupção dos últimos quatro anos alterou profundamente a composição do PCC, ao derrubar bastiões de poder que se julgava serem invencíveis – como o caso de Zhou Yongkang, antigo chefe da segurança –, e criando um receio generalizado por todo o país, que se traduz na dificuldade na tomada de decisões.

“Do ponto de vista histórico, é sempre uma reunião importante no PCC porque se definem ou clarificam-se políticas”, explica ao HM Arnaldo Gonçalves, especialista em relações internacionais. “Acontece, normalmente, a meio do mandato do secretário-geral e por isso é importante”, vinca, recordando que foi numa reunião deste género que foram definidas mudanças importantes na vida política da China, como “o encerramento da Revolução Cultural”.

O conclave que acontece por estes dias em Pequim “é importante porque estamos num período de transição”. A situação é, por ora, uma incógnita, mas como se sabe são sete membros [no Comité Permanente do Politburo] e há um grande falatório sobre a substituição daqueles que atingem os 70 anos – são cinco destes sete”, contextualiza Arnaldo Gonçalves.

O especialista faz alusão à “regra não escrita instituída por Deng Xiaoping, no pós-maoismo”, que determina que os dirigentes da primeira linha do PCC não devem ultrapassar o limite dos 70 anos, “porque é eternizarem-se no poder e é uma repetição da síndrome do Mao”. Até agora, a regra foi aceite por todas as lideranças, “mas não se sabe se vai ser alterada ou não”, continua o analista. “Este é um dos pontos importantes deste conclave.”

Uma vez que os políticos mais importantes do país estão no encontro de Pequim – “todo o poder central está lá” – e atendendo ao timing em que acontece, “é um tempo em que as pessoas que têm ambições de subir ao Politburo [ao grupo dos 25 membros] também se começam a posicionar”. Começa também “a corrida para o congresso do ano que vem, que vai ser um congresso decisivo em que se vai jogar quem vai ser o comité central, o comité permanente do Comité Central, e quem vai estar no futuro Governo da China, porque é provável que haja também mudanças a esse nível”.

Arnaldo Gonçalves sublinha, no entanto, que “há que esperar” – no final desta semana “Xi Jinping deve dar, nas entrelinhas, algumas directivas” do que será a vida política chinesa até ao próximo ano.

Um homem só

Xi Jinping descreveu o Partido como “a arma mágica” que pode ser usada para implementar reformas necessárias para atingir o objecto do “Grande Rejuvenescimento” da nação, uma ideia que diz, com frequência, ser o “sonho chinês”. Mas tem encontrado uma forte resistência nas tentativas de alteração do modo de funcionamento das empresas estatais, que controlam sectores estratégicos da economia e servem de apoio a políticos com importância na China.

“Estas reformas não foram a lado algum nos últimos três anos”, aponta à AFP Anthony Saich, especialista em política chinesa da Universidade de Harvard. “Claramente, Xi Jinping vê o PCC como o único motor para as reformas. Não acredita na sociedade ou no Estado como meios para levar por diante as reformas que deseja.”

No encontro de Pequim, acrescenta Saich, há um confronto entre “aqueles que são apoiados pelo secretário-geral e aqueles que são negativamente afectados pela campanha de luta contra a corrupção e pelas reformas que possam vir a ser feitas no sector empresarial detido pelo Estado”.

Para Xi Jinping, as melhorias ao nível da disciplina do partido são mais do que uma redução do mau comportamento dos elementos do PCC. “Tem sido muito ambicioso na conquista do poder, no modo como se apropria de poderes”, defende Willy Lam, académico da Universidade Chinesa de Hong Kong.

O analista considera que “a maior motivação” de quaisquer novas regras a serem aprovadas durante o plenário servirão para “consolidar a posição de Xi Jinping como grande líder”, destacando que várias medidas foram sendo introduzidas para garantir que os membros do Partido estão de acordo com a linha de pensamento de Xi Jinping, incluindo a “proibição de críticas sem fundamento”. “Só há uma pessoa no PCC que tem o direito a definir as regras políticas – chama-se Xi Jinping”, nota ainda.

Ao HM, Arnaldo Gonçalves recorda as dúvidas que tinha sobre o líder do Partido Comunista Chinês quando este passou a ser o homem mais importante da China, já lá vão quatro anos, até porque Xi “não abriu muito o jogo” na altura. O modo como tem desempenhado os cargos que ocupa – na liderança do Partido e como Presidente – levam o analista a considerar que “claramente é um homem de poder, com ambição de poder, com uma perspectiva para o exercer extremamente solitária, que não gosta muito das direcções colectivas – que foram a tradição desde Deng Xiaoping –, e prefere ser o tipo de Presidente com alguns adjuntos que o coadjuvam”. Para o analista, é importante ver “o que vai acontecer agora”.

O conclave acontece ainda numa fase em que aumenta a especulação em torno da possibilidade de Xi se manter no poder depois de 2022, altura em que deveria sair, por estarem cumpridos dois mandatos. Para o presidente do Mercator Institute for China Studies, Sebastian Heilmann, trata-se de uma possibilidade “extremamente arriscada, porque iria criar grandes fricções entre a elite política chinesa”.

Outro especialista ouvido pela AFP, Mao Shoulong, entende que o Sexto Plenário vai ser aproveitado como uma oportunidade de fortalecer a posição do secretário-geral na liderança e a base de poder”. Mao Shoulong repara também que a campanha contra a corrupção interferiu em áreas que não tinham sido afectadas.

Bondade ou jogo político

A eficácia da grande luta desencadeada por Xi Jinping é o tema de um editorial do jornal “Procura pela Verdade”, uma publicação importante do PCC. Na sexta-feira passada, na antecipação do Sexto Plenário, o jornal escrevia que a campanha contra a corrupção pode ter enfraquecido o partido que Xi pretende salvar, ao destacar a “universalidade e a gravidade da corrupção dentro do Partido Comunista Chinês”. Os castigos aplicados a milhares de membros e funcionários “enfraqueceram seriamente as fundações do Partido e a sua capacidade para governar”.

Há críticos do regime que entendem a campanha é uma forma interna de luta entre facções e, uma vez que não existem reformas sistémicas dentro da estrutura, não são eliminadas as causas da corrupção.

Arnaldo Gonçalves foca precisamente estas várias leituras em torno do principal cavalo de batalha de Xi Jinping. “Há quem diga que é importante a campanha anticorrupção para limpar o partido, para o dignificar, para o legitimar de novo, limpá-lo dos corruptos que a máquina tem criado”, diz. “Há quem diga que é um pretexto, como tem acontecido nalguns regimes mais ou menos musculados da Ásia, para aproveitar a campanha anticorrupção para se libertar de alguns adversários políticos, que foram adversários dele à medida que foi subindo no partido.”

Ressalvando que não tem “certezas destas avaliações”, o especialista sublinha que a composição do próximo Comité Central vai ser esclarecedora. “Perante este [Comité Central], acho que tem uma relação de grande respeito por Li Keqiang, que se irá manter, de certeza; por Wang Qishan, que é o homem da comissão de disciplina do Comité Central, uma área importante, e por Zhang Dejiang. Tem uma relação de respeito por estes três homens, os dois últimos mais velhos”, aponta, recordando que tanto Wang Qishan, como Zhang Dejiang deverão abandonar os cargos que detêm por atingirem a tal regra não escrita do limite de idade.

À AFP, e ainda sobre a questão da corrupção, Hu Xingdou, analista do Instituto de Tecnologia de Pequim, espera que da reunião de Pequim saiam novas regras para garantir a transparência de acção dos membros do Partido, dando o exemplo do registo de propriedades. “No passado, foram produzidas regulamentações que acabaram por não ser implementadas”, recorda. Desta vez, “espero que possa passar a haver a divulgação pública de bens”. Para o especialista, “só assim é que podem conquistar o respeito de toda a nação”.

25 Out 2016

Fundador do China Minsheng Bank compra seguradora dos EUA

O grupo que acordou a compra da seguradora norte-americana Genworth Financials quer também 50% do Novo Banco

[dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] maior accionista e fundador do China Minsheng Bank, que em Portugal apresentou uma oferta não vinculativa por 50% das acções do Novo Banco, chegou a acordo para adquirir a seguradora norte-americana Genworth Financials.

O China Oceanwide Holdings ofereceu 5,43 dólares por cada acção do Genworth, numa transacção em dinheiro e avaliada em 2,7 mil milhões de dólares, de acordo com um comunicado emitido pelas duas empresas no domingo.

Fundado em 1871, o Genworth tem quase quatro milhões de clientes no sector dos seguros de vida e oferece também seguros hipotecários, segundo o seu ‘site’ oficial.

“Vamos fornecer um apoio financeiro crucial nos esforços do Genworth para reestruturar o seu negócio no ramo dos seguros de vida”, afirmou o presidente executivo do Oceanwide, Lu Zhiqiang, em comunicado.

Senhor milhões

Lu é o nono homem mais rico da China, com um património líquido avaliado em 85 mil milhões de yuan, de acordo com a unidade de investigação chinesa Hurun Report.

A Oceanwide, que tem sede em Pequim, prometeu ainda disponibilizar 600 milhões de dólares  à Genworth, para liquidar as suas dívidas que vencem em 2018, e realizar uma injecção de capital de 525 milhões de dólares no ramo de seguros de vida da empresa.

Tom Mclnerney, presidente e chefe executivo da Genworth, considerou o grupo chinês um “proprietário ideal”, afirmando que o investimento será do interesse dos accionistas da empresa, que tem sede no Estado norte-americano da Virgínia.

A Oceanwide controla várias entidades financeiras, incluído o Minsheng Bank, que segundo o jornal Público fez uma proposta não vinculativa de aquisição da maioria de capital do Novo Banco.

Segundo o seu ‘site’ oficial, a Oceanwide investiu em vários empreendimentos imobiliários na costa oeste dos Estados Unidos da América, incluindo uma torre que será em breve a segunda mais alta de São Francisco e um condomínio de mil milhões de dólares em Los Angeles.

O negócio, que precisa ainda da aprovação dos accionistas, deverá ser concluído em meados de 2017.

De acordo com o Ministério do Comércio chinês, em 2015, a China investiu 145.000 milhões de dólares fora do país, um valor que representa um crescimento homólogo de 18% e ultrapassa o valor do investimento directo estrangeiro no país – 135,6 mil milhões de dólares.

25 Out 2016

Aniversário | Pequim celebra 80 anos desde o fim da Longa Marcha

A China celebra este mês, com séries de televisão, documentários ou exibições, 80 anos desde o fim da Longa Marcha, a epopeia que consagrou o Partido Comunista Chinês (PCC) e o seu líder Mao Tse-Tung

[dropcap style≠’circle’]P[/dropcap]erante o cerco do exército da República da China, então controlada pelo Partido Nacionalista Kuomintang (KMT), os guerrilheiros comunistas empreenderam, a partir de Outubro de 1934, uma travessia de 6.000 quilómetros.

Durante essa retirada, que começou no sul da China e terminou em Yanan, aldeia do norte onde os comunistas estabeleceram uma base a partir da qual conquistariam o país, morreram mais de 90% dos combatentes.

O aniversário tem sido celebrado ao longo deste mês, com a difusão diária de notícias e artigos assinados, séries de televisão, programas de rádio, concertos ou exibições, que exaltam o heroísmo dos fundadores do PCC e a necessidade de o país realizar uma “nova Longa Marcha”.

“A China está no início de uma nova Longa Marcha, rumo ao rejuvenescimento da nação chinesa”, proclamou o jornal oficial do PCC, o Diário do Povo, num editorial assinado no início deste mês.

A agência oficial Xinhua destacou ainda a “inteligência e vontade” daquela epopeia como inspiração para o mundo e a China de que se pode “tornar possível o impossível”.

Deixem-me sonhar

O Presidente chinês, Xi Jinping, celebrou a ocasião com visitas a museus na região de Ningxia, noroeste da China, e em Pequim.

O líder chinês afirmou que o partido tem de adoptar o espírito daquela marcha, para alcançar o “sonho chinês” de rejuvenescimento da nação e o objectivo de construir uma “sociedade moderadamente confortável”, até 2021, quando o PCC celebra 100 anos desde a fundação.

“Nós, a nova geração, devemos concretizar a nossa Longa Marcha”, disse.

Evocar a lenda é “uma lembrança para todos de que o partido, de facto, significou e significa algo”, apesar de ter perdido o “propósito e legitimidade”, afirmou à agência France Presse Trey McArver, analista político na Trusted Sources, em Londres.

As referências de Xi à Longa Marcha reflectem o seu desejo de canalizar a autoridade de Mao, disse à AFP Liu Tong, historiador na Universidade de Jiaotong, em Xangai.

A administração da China tornou-se mais centrada na figura do líder, desde que Xi ascendeu ao poder, um estilo que se “assemelha ao de Mao em muitos aspectos”, afirmou o historiador, acrescentando que celebrar a Longa Marcha relaciona Xi com o “símbolo de triunfo dos comunistas”.

19 Out 2016

Corrupção | Televisão chinesa divulga pormenores de processos

[dropcap style≠’circle’]A[/dropcap] estação de televisão estatal da China começou esta semana a transmitir um documentário que revela ao público os detalhes de alguns dos casos de corrupção mais dramáticos do país. A série – dividida em oito episódios – foi para o ar pela primeira vez na noite da passada segunda-feira e, escreve a agência Reuters, promete uma abordagem em que não ficam de fora os defeitos dos protagonistas das histórias de subornos e de vidas extravagantes, desvendadas pelo Partido Comunista Chinês (PCC) nos últimos anos.

O Presidente Xi Jinping lançou uma campanha contra a corrupção mal chegou ao poder, há quase quatro anos, tendo então prometido que ninguém – independentemente da posição – ficaria de fora do combate a um dos principais problemas da política nacional. A promessa foi cumprida, com homens outrora poderosos a caírem em desgraça.

Três destes “tigres” estão em destaque no primeiro episódio da série: Bai Enpei, o antigo chefe do PCC na província de Yunnan; Zhou Benshun, que liderou o partido em Hebei; e Li Chuncheng, vice-secretário da estrutura política em Sichuan.  Bai Enpei e Li Chuncheng já foram condenados, mas Zhou Benshun continua a aguardar julgamento – os detalhes mais curiosos são precisamente os que dizem respeito ao político de Hebei.

O enterro da tartaruga

Com um fundo de imagens de um templo budista e ao som de cânticos de monges, os autores do documentário descrevem Zhou como estando envolvido em “práticas supersticiosas”. “Tinha expectativas contando com a protecção de seres sobrenaturais”, conta o narrador. “Depois de uma tartaruga ter morrido em sua casa, transcreveu escrituras e enterrou-as com o animal.” O ex-alto funcionário do Partido Comunista Chinês até tinha um tratador para os animais de estimação, conta um investigador.

Os funcionários do PCC não devem ter qualquer envolvimento em actos religiosos e a acusação de superstição é frequentemente utilizada contra os suspeitos de corrupção como forma de denegrir, ainda mais, a imagem dos arguidos.

Os três políticos caídos em desgraça admitem a culpa durante o programa – a Reuters vinca que não foi possível confirmar com os protagonistas se a participação foi feita de forma voluntária. No entanto, o PCC vê com bons olhos as confissões e os actos de contrição: há funcionários que conseguiram evitar a pena de morte porque mostraram remorsos e cooperaram com as investigações.

Ao assumir a culpa, Li Chuncheng, condenado em 2015 a 13 anos de prisão, não conseguiu conter as lágrimas. “Comecei a achar, desde novo, que sob a liderança do Partido conseguiria contribuir para o progresso da sociedade, fazer as pessoas felizes. Mas, no fim, por minha causa, não alcancei os meus objectivos. Desiludi o Partido. Desiludi as pessoas”, admitiu.

O documentário chama-se, numa tradução livre, “Sempre na estrada”, uma referência ao desejo que o PCC tem em não abrandar o combate à corrupção. Estão prometidas novas revelações para o final desta semana.

O primeiro episódio da série foi de imediato alvo de muito debate nas redes sociais chinesas, com algumas pessoas a considerarem as lágrimas de Li Chuncheng, o antigo político de Sichuan, pouco convincentes e muito teatrais.

19 Out 2016

A nova ordem económica internacional (I)

“As the Chinese economic transformation is unprecedented in human history, there are no successful models from which the Chinese can learn in order to smoothly and effectively transform their planned economy to a market economy. Nonetheless, the so-called Socialist Market Economy, or Economic Taoism approach, appears to have been remarkably successful. Although there is no agreement in the literature on whether a coherent Chinese model of economic growth exists, it seems clear that the approaches of Taoism, combined with its traditional guanxi relationships, have helped China in “groping for stones to cross the river.” It may be too early to say that the Chinese Economic Taoism paradigm has come of age; however, it is indisputable that China has found a unique way to develop its economy and that this has enabled it to respond effectively to the recent financial crises.”

“China in the International Economic Order: New Directions and Changing Paradigms” – Lisa Toohey, Colin B. Picker and Jonathan Greenacre

[dropcap style≠’circle’]O[/dropcap]s mercados emergentes que cresciam a grande rapidez e a brecha que sempre os tinha separado dos países industrializados, começava a fechar-se no inicio do século XXI. A convergência realizava-se num ambiente de liberalização económica, em que se acreditava, que os sistemas financeiros de todos os países, formariam uma rede uniforme, mas esse período terminou. Os países emergentes já não crescem à velocidade de antes, especialmente, em comparação com os países desenvolvidos, e as fissuras entre os diferentes sistemas tornam-se mais evidentes.

A última sondagem anual aos executivos de empresas pela “PricewaterhouseCoopers (PwC)” designado por “19th Annual Global CEO Survey”, mostra que apenas 35 por cento dos inquiridos crêem que o mundo caminha para uma maior unidade económica, e cerca de 59 por cento dos inquiridos acreditam que vários modelos económicos irão coexistir e competir entre si. A confirmar essa análise, apenas basta observar quão diferente é o investimento público e privado nos Estados Unidos, China, Japão e União Europeia (UE). Esses países e região operam com premissas fundamentalmente diferentes, acerca da forma como a economia se deve organizar.

A tensão entre esses diferentes pressupostos aumenta de forma gradual, indicando que uma nova ordem económica mundial está a surgir para substituir a que existiu desde o final da II Guerra Mundial. A economia global, num futuro próximo, será definida por um conjunto complexo de relações económicas em permanente mudança. As economias continuarão interligadas, mas com regras em constante mudança no comércio internacional. A forma mais eficaz para o líder de uma empresa gerir esta complexidade, ou atravessar a entrada para a próxima ordem económica com confiança e habilidade, é concentrar a atenção em três tendências base, como a dispersão do poder económico, a contínua evolução de modelos de crescimento dirigidos pelo Estado e a aceleração da ruptura que sofrem as empresas, como consequência da alteração tecnológica.

Essas tendências podem parecer evidentes, mas nenhuma à primeira vista é na realidade. Além disso, continuarão a evoluir em direcção incerta. Se forem analisadas cuidadosamente, os empresários poderão ajudar as suas organizações a tomar as medidas necessárias para avançar na nova ordem económica mundial. A dispersão do poder económico está a produzir uma alteração fundamental. O dólar está a perder a sua posição exclusiva como moeda de reserva mundial e nas próximas décadas, nenhum país poderá dominar a balança de pagamentos, como fez os Estados Unidos durante mais de setenta anos. O último acontecimento idêntico foi no final da II Guerra Mundial, e o catalisador foi a Conferência de Bretton Woods, em 1944. Após a Conferência, os Estados Unidos converteram-se no país que negociava os acordos internacionais para que as actividades financeiras fossem realizadas com ordem, adoptando dessa forma, a posição de líder mundial até ao presente.

As instituições multilaterais que surgiram então, como o Banco Mundial, a Organização Mundial de Comércio (OMC) e o Fundo Monetário Internacional (FMI), estavam sujeitas à forte influência dos Estados Unidos e funcionaram bastante bem, durante muito tempo, o que não quer dizer que não tenham existido conflitos. Quando unilateralmente os Estados Unidos abandonaram o padrão ouro, em 1971, por exemplo o “Choque Nixon” provocou dois anos de negociações, até que as grandes economias aceitassem que as suas moedas flutuassem face ao dólar. Os Estados Unidos durante o período do pós-guerra, negociaram com as grandes economias para tomar as decisões mais importantes.

A intenção foi quase sempre favorecer países amigos, quase todos com economias democráticas e liberais. Durante as sete décadas após a Conferência de Bretton Woods, a superioridade económica dos Estados Unidos baseou-se em quatro pilares. Os dois primeiros foram a sua possante importância económica em expansão, e as redes comerciais que estabeleceu e dominou e que eram também, os motores do crescimento global. Os outros dois pilares foram o estatuto do dólar como moeda global de reserva e a sua influência nas instituições multilaterais. Assim, trouxe estabilidade à economia global, e uma plataforma para a cooperação internacional. As economias emergentes estão a pôr em causa os quatro pilares.

O país desafiador mais notável é a China, cuja influência económica global surgiu rapidamente na última década. A China, em 2014, converteu-se na maior economia do mundo, em termos de poder aquisitivo. Era até então a de maior crescimento entre os países que constituem o G20. A indicação da importante influência económica chinesa é importante, como se pode ver pela sua recente desaceleração, que teve repercussões nos mercados mundiais. Essa influência enfraqueceu o primeiro pilar, ou seja, a força da economia dos Estados Unidos após a II Guerra Mundial.

A China é também o maior exportador mundial. A rápida adopção desse papel deu-lhe uma enorme influência nas redes comerciais, enfraquecendo o segundo pilar. Por outro lado, está-se a deteriorar a eficácia dos acordos comerciais multilaterais, sendo substituídos por acordos regionais que começam a preponderar. Os acordos regionais representam uma erosão da capacidade americana para definir as regras a nível global. O progresso da China em estabelecer o renminbi (RMB) como moeda para acordos internacionais, enfraquece o terceiro pilar velozmente. Quanto ao quarto pilar a China está a tentar alargar a sua presença nas actuais instituições multilaterais e a criar novas. A sua contribuição para o orçamento da ONU, duplicou entre 2010 e 2015, e presentemente representa 5 por cento do total das suas contribuições. Tem uma participação cada vez maior nos esforços de paz, controlo das alterações climáticas e redução da pobreza.

A criação de uma nova ordem económica global é inevitável. Ainda que a China não vá substituir os Estados Unidos, tornar-se-á cada vez mais difícil a estes, recuperarem a sua posição de domínio económico global, porque existem outras economias a aumentar o seu poder de influência. O FMI prevê que a Índia, terceira economia mundial, seja até ao final de 2016, a de maior crescimento do G20. Surgirá como um actor económico influente com interesses próprios. Em um mundo de poder económico em dispersão, a estabilidade será mais considerada que nunca. Pela natureza dessa estabilidade, não será estabelecida por nenhuma das grandes potências, pois dependerá da qualidade das relações económicas entre os principais países, incluindo aqueles que tenham sistemas económicos diferentes.

A actual alteração no poder económico global será distinta da última grande mudança em 1944, pois o poder de influência na economia em termos globais passou do Reino Unido para os Estados Unidos, que são dois países com uma visão do mundo semelhante, mas mesmo assim, o processo de transferência da polaridade de um lado ao outro do Atlântico levou quarenta anos, pois tinha-se dado nos começos do século XX. Actualmente, assistimos a um reequilíbrio muito mais rápido, entre os diferentes sistemas económicos e políticos, cada um, com distintivo nível de confiança nos mercados e no papel do Estado.

O modelo de Estado da China tem criado um crescimento significativo na última década. É evidente que este modelo não será suplantado por uma forma tradicional de capitalismo, em um futuro previsível. O modelo de Estado mantém a popularidade porque está associado a um forte crescimento nas economias emergentes. Os governos dos países da América do Sul e Rússia, entre países de outras áreas, mantiveram-no nos últimos anos. A dispersão do poder económico e as incompatibilidades consequentes estiveram mais em evidência nas áreas da logística, telecomunicações, suporte lógico e infra-estrutura. É de considerar que a existência de sistemas paralelos em esferas competitivas de influência, o movimento de provimentos, bens, serviços, capital e talentos de uma esfera de influência a outra é menos alinhado.

As empresas não estarão isentas de sofrer interrupções periódicas, como atrasos na obtenção da acreditação dos pagamentos ou nas taxas alfandegárias. Um possível exemplo envolve o sistema global de pagamentos. A denominada de “The Society for Worldwide Interbank Financial Telecommunication (SWIFT)” é uma cooperativa que fornece uma plataforma de comunicação, produtos e serviços para ligar mais de dez mil e oitocentos bancos, distribuidoras de valores e clientes corporativos em mais de duzentos países e territórios. O SWIFT permite aos seus utilizados a troca de informações financeiras de forma automatizada e padronizada, com segurança e confiança total, o que reduz os custos, diminui o risco operacional e elimina as ineficiências operacionais. Além disso, também une a comunidade financeira no sentido de melhorar a colaboração na adaptação das práticas de mercado, definição de normas e debater questões de interesse comum. O seu grande mal é de estar sujeita à influência dos bancos americanos e europeus.

A “China International Payment Service (CIPS)” é um sistema de pagamento que oferece serviços de compensação e de liquidação para os seus participantes nos pagamentos RMB, transfronteiriços e de comércio. É uma infra-estrutura do mercado financeiro na China. O CIPS foi planeado para ser desenvolvido em duas fases. A primeira designada por, CIPS (Fase I), teve lugar a 8 de Outubro de 2015. O primeiro grupo de participantes directos é constituído por dezanove bancos chineses e estrangeiros, que foram criados na China e cento e setenta e seis participantes indirectos que abrangem seis continentes e quarenta e sete países e regiões.

O CIPS assinou um memorando de entendimento com a SWIFT, para a sua implantação como um canal de comunicação seguro, eficiente e confiável para a ligação do CIPS com os membros da SWIFT, o que proporcionaria uma rede que permite que as instituições financeiras em todo o mundo, possam enviar e receber informações sobre transacções financeiras em um ambiente seguro, padronizado e confiável. O CIPS é por vezes referido como o “Sistema de Pagamentos Internacional da China”.

Tendo sido apresentado primeiramente como alternativa ao SWIFT, com vista a processar pagamentos internacionais denominados em RMB, nunca irá substituir o SWIFT, porque 45 por cento das transacções internacionais são denominadas em dólares e todos os bancos internacionais terão a necessidade de aceder ao sistema bancário americano. Todavia, com o CIPS a funcionar bem, alguns bancos internacionais poderiam decidir operar sem a licença da banca americana e os Estados Unidos teriam menor autoridade para impor regras a bancos não americanos.

19 Out 2016

China | Livro Branco destaca combate à miséria

A constatação é oficial: a redução da pobreza é a grande prova dos progressos da China em matéria de direitos humanos. Em termos globais, 70 por cento das pessoas que saíram da miséria são chinesas, aponta um livro branco publicado ontem em Pequim

[dropcap style]D[/dropcap]esde a abertura da China ao mundo e o início das reformas do país, mais de 700 milhões de pessoas saíram da pobreza. O número faz parte de um livro branco publicado ontem pelo Gabinete de Informação do Conselho de Estado. “Depois de anos de tentativas e testes, a China acumulou muita experiência na promoção dos direitos humanos através do desenvolvimento orientado para a redução da pobreza”, lê-se no documento, que fala de “um novo modelo de alívio da pobreza de características chinesas”.

Para combater um dos principais problemas sociais do país, o Governo Central criou fundos especiais que, entre 2011 e 2015, chegaram aos 189,84 mil milhões de yuan, com um aumento anual médio de 14,5 por cento. “As autoridades vão continuar a destinar mais fundos para que seja possível o combate à pobreza nos próximos cinco anos”, assinala o livro branco, amplamente divulgado pela agência oficial Xinhua.

No final do ano passado, a China continuava a ter 55,75 milhões de pessoas que viviam na pobreza – o equivalente à população de um país de dimensão média. Pequim pretende acabar com o flagelo até 2020.

A educação primeiro

O relatório indica que, entre 2011 e 2015, o Governo Central deu prioridade à educação como forma de erradicar a pobreza. Para assegurar o acesso dos cidadãos ao sistema de ensino, as autoridades adoptaram medidas para promover a educação obrigatória, diminuir o fosso entre as zonas rurais e urbanas e melhorar as infra-estruturas ligadas à educação nas áreas mais carenciadas. Foram ainda criados mais subsídios e bolsas para estudantes.

Nos últimos três anos, Pequim gastou 83,1 mil milhões de yuan na renovação de escolas, para viabilizar o programa de ensino obrigatório, e destinou 14 mil milhões de yuan para a construção de dormitórios que albergam cerca de 300 mil professores em zonas rurais remotas.

Nas áreas rurais menos desenvolvidas – sobretudo no centro e no oeste do país –, o número de crianças a frequentar jardins-de-infância aumentou cerca de 30 por cento, de 21,53 milhões, em 2011, para 27,89 milhões, no ano passado.

Foram atribuídos subsídios para professores que leccionam nas províncias mais pobres, beneficiando um milhão de docentes em 600 condados.

Há mais números: um programa de educação específico para as áreas que lutam contra a pobreza envolveu 183 mil alunos em 832 condados, entre 2012 e 2015. Já nos últimos dois anos, o crescimento médio do número de estudantes das zonas rurais a entrar no sistema universitário foi superior a 10 por cento.

Menores protegidos

“Para garantir que o direito das crianças à segurança social, à educação e a outros serviços públicos é efectivamente salvaguardado nos esforços de combate à pobreza, a China introduziu um sistema e serviços inclusivos de segurança social, e levou a cabo trabalhos para o encorajamento da protecção de menores”, aponta ainda o livro branco.

“O país também promoveu o estabelecimento de um sistema de resgate e protecção de crianças ao nível dos condados, vilas e aldeias”, refere o documento. Os números oficiais reconhecem que cerca de 10 mil menores desaparecem todos os anos, mas há organizações internacionais de defesa dos direitos humanos que falam em 70 mil sequestros.

O relatório explica que, desde 2011, mais de metade dos condados chineses implementaram um programa de melhorias da alimentação para os estudantes das zonas rurais que frequentam o ensino obrigatório. O projecto implicou um investimento público de 67 mil milhões de yuan, beneficiando 33,6 milhões de alunos.

Em 2012, o Governo tinha já apresentado um programa de nutrição de crianças para as zonas mais carenciadas, disponibilizando gratuitamente bens alimentares para bebés entre os seis e os 24 meses. Só no ano passado, Pequim atribuiu 500 mil milhões de yuan para este programa, que beneficia 2,11 milhões de crianças em 341 condados.

Lá fora também

Não é só dentro de casa que a China tem estado a combater a pobreza, assinala o livro branco ontem publicado sobre a matéria da autoria do Gabinete de Informação do Conselho de Estado. Num texto publicado pela agência Xinhua, destaca-se que Pequim tem ajudado activamente outros países em desenvolvimento na resolução dos problemas relacionados com a miséria.

Durante as mais de seis décadas desde o estabelecimento da República Popular da China em 1949, Pequim disponibilizou quase 400 mil milhões de yuan a 166 países e organizações internacionais, enviou mais de 600 mil trabalhadores humanitários, prestou assistência médica a 69 países e ajudou mais de 120 países em desenvolvimento a atingir os Objectivos de Desenvolvimento do Milénio, enumera o relatório. Além disso, em várias ocasiões a China perdoou os juros de empréstimos a nações fortemente endividadas e menos desenvolvidas.

O livro branco sublinha que a China pretende aumentar a cooperação com países em vias de desenvolvimento e organizações internacionais em matéria de combate à pobreza e direitos humanos: Pequim vai “partilhar conceitos avançados e a experiência acumulada nesses campos através da ajuda externa, projectos de cooperação, transferência tecnológica e intercâmbio entre gabinetes de estudo”.

O Gabinete de Informação do Conselho de Estado assegura que o compromisso da China em relação ao combate à pobreza “representa o sentido de responsabilidade no mundo”. Assim sendo, o Governo Central vai “continuar a honrar as obrigações internacionais atendendo ao estado do seu próprio desenvolvimento”.

O relatório de 2015 dos Objectivos de Desenvolvimento do Milénio indica que a proporção de pessoas que vivem na extrema pobreza na China caiu para metade, de 61 por cento, em 1990, para 30 por cento, em 2002 – em 2014, o número tinha baixado para 4,2 por cento, recorda o livro branco.


O que diz a Human Rights Watch

Os números do livro branco ontem publicado por Pequim mostram uma redução efectiva da pobreza, mas os problemas em termos de direitos humanos do país ensombram a conquista das últimas décadas, considera a analista Maya Wang, investigadora da Human Rights Watch.

Numa reacção ao documento da autoria do Gabinete de Informação do Conselho de Estado, Maya Wang começa por dizer que “é inegável que as pessoas na China ganharam muito em termos materiais ao longo dos últimos anos”, mas salienta que se trata do resultado de um trabalho conjunto. “Considero que é justo dizer-se que a melhoria das condições de vida se deve à acção do Governo Central, mas não só: é também o resultado do trabalho muito árduo das pessoas que viviam na miséria e que conseguiram sair da pobreza. Portanto, é uma combinação entre a acção do Governo e os esforços da própria população”, destaca a investigadora.

Wang ressalva que “continua a haver muita pobreza na China e o nível de desenvolvimento do país é muito desequilibrado”, e diz também que “o esforço contínuo de luta contra a pobreza acaba por ser manchado pelo facto de o Governo Central continuar a restringir direitos humanos essenciais, como a liberdade de informação e de expressão”. A analista dá o exemplo de cidadãos das zonas rurais a quem são, de forma indevida, expropriadas as terras e que, “se se queixarem, são detidos ou punidos de outra forma pelas autoridades”. “Existem poucos canais para que as vítimas deste tipo de injustiças possam apresentar queixa e obter justiça de forma pública”, nota.

ISABEL CASTRO

18 Out 2016

China | Lançada com êxito missão ao Espaço com dois astronautas

Com o lançamento da nave tripulada “Longa Marcha 2F”, esta segunda-feira, a China continua a tentar aproximar-se da Europa e dos Estados Unidos nas conquistas espaciais

[dropcap style≠’circle’]A[/dropcap] China lançou ontem com êxito a missão espacial tripulada Shenzhou-11, com dois astronautas a bordo, que deverão passar um mês no espaço, no laboratório Tiangong-2.

O foguetão “Longa Marcha 2F” foi lançado sem problemas às 07:30 locais, a partir do centro de Jiuquan, na província de Gansu, no deserto de Gobi, segundo os responsáveis pela missão.

Uma câmara colocada dentro da cápsula permitiu ver os dois astronautas, Jing Haipeng e Chen Dong, durante todo o lançamento e chegada à órbita terrestre.

Esta é a sexta missão que a China envia para o espaço com astronautas a bordo e será a mais longa, se tudo correr como planeado.

Os dois tripulantes da nave Shenzhou-11 permanecerão 33 dias em órbita. A missão anterior demorou 15 dias.

Jing Haipeng, de 50 anos, faz a sua terceira viagem espacial e comanda a nave, levando consigo o estreante Chen Dong, de 37 anos.

O principal objectivo da missão Shenzhou-11 é verificar o correcto funcionamento dos sistemas do laboratório Tiangong-2 e começar os preparativos para a futura estação espacial chinesa, que as autoridades de Pequim esperam ter a funcionar até 2022.

Os dois astronautas farão ainda experiências científicas, que incluem projectos em colaboração com instituições académicas e outros propostos por estudantes do ensino secundário de Hong Kong sobre medicina, física espacial ou botânica.

Pequim tem vindo a investir no seu programa espacial, na tentativa de acompanhar os progressos dos Estados Unidos da América e da Europa.

Anunciou em Abril que quer enviar uma nave espacial “perto de 2020” para orbitar Marte, aterrar e colocar um ‘rover’ para explorar a superfície do Planeta Vermelho.

Pequim vê o programa espacial como um símbolo do progresso da China e da sua emergência como potência mundial.

No entanto, até agora, tem reproduzido apenas actividades em que os Estados Unidos e a União Soviética foram pioneiros há várias décadas.

Parabéns presidenciais

O presidente chinês Xi Jinping enviou uma mensagem de felicitações pelo lançamento bem-sucedido da nave espacial tripulada.

Xi expressou enviou mensagens de parabéns a todos os investigadores e funcionários envolvidos na missão assim como aos astronautas.

Pediu que os funcionários da missão garantam a boa realização das metas planeadas, encorajando-os a “abrir novos caminhos de forma constante para o programa espacial tripulado, para que o povo chinês dê maiores passos e avance mais na pesquisa do espaço, e faça novas contribuições para construir a China numa potência espacial”, relata a Xinhua.

O Presidente chinês enviou a mensagem de Goa, onde participou na 8º Cimeira dos BRICS.

18 Out 2016

Homicídio | Autoridades chinesas condenam homem por crime em Macau

[dropcap style=’circle’]U[/dropcap]m homem que cometeu um homicídio em Macau foi preso e condenado na China continental pelo crime. O anúncio de que o caso, que aconteceu há oito anos, tinha sido “resolvido” foi feito pela Polícia Judiciária (PJ) no fim-de-semana.
De acordo com a TDM, que cita as autoridades, o caso ocorreu em 2008, quando uma mulher de 20 anos apareceu morta numa pensão ilegal do território. A mulher, de Hubei, estava nua e de mãos atadas num edifício na Rua de Pequim e o homem que a assassinou teve relações sexuais com ela antes de a matar.
A PJ diz que o homem perdeu todo o dinheiro no jogo e roubou a vítima antes de fugir para o continente. Recentemente, foi detido na província de Henan e foi sentenciado à morte, com pena suspensa de dois anos.
Questionada pelo HM sobre a possibilidade de cidadãos da China serem julgados e condenados no continente por crimes que cometeram na RAEM, a PJ diz que tal é possível graças às leis nacionais. policia chinesa
“Como o suspeito é cidadão chinês e foi preso na China continental, as autoridades da China podem acusá-lo e condená-lo de acordo com a legislação da China continental”, indicou uma porta-voz das autoridades ao HM.
Também o advogado local Pedro Leal explica ao HM que a lei de Macau não permite que tal aconteça, mas que a forma como os diplomas da China são interpretados permite que casos como este – que não é o primeiro – continuem a acontecer.
“Esse caso não é [único], isso tem acontecido muitas vezes. A China entende – presumo eu, que não conheço este caso em específico – que crimes cometidos por chineses podem ser julgados na China. Por outro lado, eles entendem que Macau é China. O que acontece é que não se pode ser julgado nos dois sítios pelo mesmo crime”, explica ao HM, ressalvando, contudo, que tal também já aconteceu, até com um cliente seu.
“Foi um caso menos grave, de uns sujeitos que assaltaram aqui um banco. (…) O que era meu cliente apanhou 12 anos de cadeia e eles aqui em Macau não sabiam que ele já tinha sido condenado”, exemplifica o advogado, dizendo que a justificação para o julgamento na China era de que o banco era chinês. O caso acabou por se resolver, mas mostra que, muitas vezes, as autoridades locais não sabem se pessoas que cometeram crimes no território estão ou não a ser julgadas.
De acordo com a PJ, este homem – que por cá apanharia um máximo 25 anos de cadeia, mas que foi condenado a pena de prisão no continente – estaria a ser julgado há já mais de um ano, mas as autoridades locais não detalharam se sabiam que o suspeito estava a ser julgado.
De acordo com a TDM, a PJ “foi avisada” que o caso foi encerrado depois do homem ter admitido o caso ao Ministério Público de Henan e sentenciado em Agosto deste ano pelo tribunal da província, que também lhe “retirou todos os direitos políticos”.

11 Out 2016

Oferta de Putin dispara importação de gelados

[dropcap style≠’circle’]A[/dropcap]s exportações de alimentos são equivalentes a 30% de todas as exportações russas para a China. Os lacticínios estão-se a tornar cada vez mais populares porque os chineses estão a adoptar cada vez mais um estilo de vida saudável, afirmou a analista Sofia Pale na publicação New Eastern Outlook. O leite russo, ao contrário do leite de soja, “é considerado na China como um dos produtos mais saudáveis”, disse a especialista do Centro para o Sudeste Asiático, Austrália e Oceania do Instituto de Estudos Orientais da Academia de Ciências da Rússia, acrescentando que, quem tem hábitos de comida saudável, não se sente desencorajado pelos preços altos.
O leite importado aumenta de popularidade na China porque as pessoas desconfiam dos produtores locais, que estiveram envolvidos num escândalo em 2008 quando se revelou que mais de 20 empresas acrescentaram melamina aos seus produtos, o que levou à morte de 6 crianças e cerca de 300 mil pessoas ficaram doentes. “Entre 2010 e 2013 o volume de vendas de leite importado cresceu de 15 mil para 195 mil toneladas, conforme informou a associação de produtores de lacticínios chinesa”.
O sorvete russo também se deve tornar num sucesso de vendas na China, depois do presidente russo ter trazido este ano uma embalagem de gelado como presente para o presidente chinês Xi Jinping. Esta sobremesa já começou a ganhar popularidade na China, mas a acção de Putin do líder russo provocou uma loucura. Segundo o relatório mais recente do jornal China Daily, mais de 271 toneladas de sorvete russo no valor de US$ 863 mil foram importadas pela China nos primeiros oito meses de 2016.
“O gelado russo é caracterizado pelos seus ingredientes e um sabor incrível”, disse ao jornal Wang Xianzhe, funcionário da Manzhouli Ange Import & Export Company, o maior importador de sorvete russo para a China. Pale notou também que entre outros produtos alimentícios exportados para a China estão a carne e o peixe, bem como chocolate, óleo de girassol, cerveja e mel. “A grande procura por estes produtos pode ser explicada pelo facto de que contêm ingredientes mais naturais que os mesmos produtos feitos na China”, disse a analista.

7 Out 2016

Taiwan vai enviar delegação para cimeira climática apesar da oposição da China

[dropcap style≠’circle’]T[/dropcap]aiwan vai enviar uma delegação para a 22.ª Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas, em Novembro, em Marrocos, informou ontem o Ministério de Negócios Estrangeiros, citado pela agência de notícias Efe. Depois de ter sido excluída da reunião trienal da Organização de Aviação Civil Internacional (OACI) celebrada em Montreal (Canadá), Taiwan vai enviar uma delegação sob a bandeira do Instituto de Investigação em Tecnologia Industrial (IITI), como organização não-governamental, informaram as autoridades diplomáticas da ilha Formosa.
A COP22 terá lugar em Marraquexe, entre 7 e 18 de Novembro, e a representação não oficial de Taiwan já tinha sido excluída de participar em actividades complementares da conferência, devido à pressão da China, disseram funcionários sob anonimato.
Taiwan pretende participar como observador no encontro, mas devido à oposição da China e à deterioração das relações com Pequim desde a tomada de posse da actual presidente, Tsai Ing-wen, do Partido Democrata Progresista (PDP), não avança no pedido de adesão, apesar do apoio dos Estados Unidos e de outros países.
A ilha Formosa foi excluída da reunião da OACI, celebrada entre 27 de Setembro e 7 de Outubro, devido à frontal oposição da China. Taiwan foi convidada para anterior reunião trienal da OACI, em 2013, quando as suas relações com Pequim eram melhores e o então presidente, Ma Ying-jeou, aceitava o “Consenso 1992”, ao abrigo do qual as duas partes reconhecem que existe apenas uma China, mas cada uma delas faz a sua interpretação desse princípio.
Num evento académico realizado no sábado, a Presidente taiwanesa, Tsai Ing-wen disse que a ilha não vai abandonar o objectivo de ampliar a sua presença internacional, apesar das dificuldades por parte da China.

5 Out 2016

Rússia e China desafiam supremacia aérea militar dos EUA

[dropcap style≠’circle’]A[/dropcap] Rússia e a China estão a gastar elevados recursos financeiros na criação de novas tecnologias militares, desafiando os Estados Unidos e os seus aliados europeus no ar e estimulando uma corrida armamentista, escreve The Wall Street Journal.
“O desafio mais actual para a Força Aérea dos EUA é o surgimento de forças adversárias iguais, com potencial militar desenvolvido e que não são inferiores às nossas capacidades”, disse o Chefe de Estado-Maior da Força Aérea dos Estados Unidos general David Goldfein.
Nos próximos anos, Moscovo e Pequim podem obter novos modelos de tecnologia aeronáutica, bem como de defesas anti-aéreas, disse o jornal. A modernização é realizada num momento em que a Rússia e a China demonstram a sua força em pontos quentes do Médio Oriente e do mar do Sul da China, por isso os estrategistas militares ocidentais também começam a insistir activamente na construção da nova geração de aviões de combate.
A Força Aérea dos EUA tem o caça F-35 e o caça-bombardeiro F-22, que também é capaz de recolher informações sobre o território do inimigo. No entanto, 76% dos aviões de combate dos EUA são aviões ultrapassados: o F-15 está activo na Força Aérea dos EUA desde 1975, o F-16 desde 1979 e o caça F/A-18 da Marinha dos EUA foi entregue pela primeira ao serviço em 1978. Estes aviões bastante velhos também formam a base da Força Aérea de muitos dos aliados dos EUA na Europa e na Ásia, acrescentou o WSJ.
A Rússia planeia adoptar o seu próprio caça invisível T-50 em 2018, diz o artigo. A China, por sua vez, aposta há muito tempo em modelos russos, usando projectos antigos ou criando novos usando licenças, mas o país também tem novos projectos – o J-20 e o FC-31, que têm um aspecto semelhante aos F-22 e F-35 americanos.
A comunidade militar dos EUA não está apenas preocupada com os meios aéreos da Rússia e da China, lê-se no artigo. Moscovo e Pequim estão a adoptar sistemas de mísseis anti-aéreos mais modernos, como o S-400, que é capaz de abater aviões inimigos a uma distância de 380 quilómetros, o que é duas vezes mais do que anteriormente. “São desafios muito sérios para a realização de quaisquer operações militares”, disse o tenente-general na reserva da Força Aérea dos EUA David Deptula.

29 Set 2016

Estratégia de globalidade dá bons resultados

[dropcap style≠’circle’]A[/dropcap] aposta da China em investir além-fronteiras superou, em 2015, pela primeira vez, o valor investido por outros países na China, numa altura em que Pequim encoraja as aquisições no estrangeiro, como parte da transição para um novo modelo económico.
A China investiu no total 145.000 milhões de dólares fora do país, no ano passado, um valor que representa um crescimento homólogo de 18% e ultrapassa o valor do investimento directo estrangeiro no país, 135.6 mil milhões de dólares, segundo dados do ministério do Comércio chinês.
O marco surge como resultado da “melhoria da capacidade nacional da China”, aprofundamento da cooperação e a estratégia de Pequim de encorajar empresas chinesas a “tornarem-se globais”, lê-se no relatório do ministério. As empresas chinesas “têm de usar os recursos e mercados internacionais para se transformarem e actualizarem”, afirmou Zhang Xiangchen, porta-voz do ministério do Comércio. “Sentimos que as empresas estão agora interessadas em se internacionalizarem e procurarem activamente a integração na inovação, manufactura e mercados globais”, acrescentou.
A economia chinesa registou no ano passado o ritmo de crescimento mais baixo dos últimos 25 anos e tem continuado a abrandar à medida que Pequim enceta uma transformação do modelo económico, apostando no consumo e serviços como novos motores de crescimento.

23 Set 2016

Pequim pronto para ajudar Moçambique a ultrapassar crise

[dropcap style=’circle’]O[/dropcap]Governo da China manifestou ontem em Maputo disponibilidade para ajudar Moçambique a atravessar a actual crise económica e financeira, anunciando planos para o cancelamento de dívidas e a construção de um parque industrial.
Em declarações aos jornalistas no final de um encontro com o primeiro-ministro moçambicano, Carlos Agostinho do Rosário, o embaixador da China em Maputo, Su Jian, afirmou que Pequim estuda o cancelamento de empréstimos sem juros contraídos por Moçambique, como parte do seu compromisso de apoiar o país a ultrapassar a actual crise.
“Desde 2001, a China já perdoou a Moçambique 10 verbas de empréstimos sem juros, recentemente perdoamos cinco milhões de dólares e agora as duas partes estão a preparar mais perdões de dívida”, declarou Su.
No âmbito da cooperação bilateral, prosseguiu o embaixador chinês, os dois países estão a preparar a instalação de um parque industrial que vai permitir que empresas chinesas transfiram para Moçambique as suas linhas de produção.
“O Governo chinês vai enviar um grupo de especialistas para preparar o planeamento e a localização do parque industrial, para podemos convidar empresas chinesas e moçambicanas”, afirmou Su Jian.
Su acrescentou que a implantação do parque irá permitir a criação de mais empregos, aumento de exportações e de receitas e contribuir para a diversificação da economia moçambicana.
No encontro com o primeiro-ministro moçambicano, o diplomata chinês endereçou um convite do Governo de Pequim a Carlos Agostinho do Rosário, para participar na Cimeira do Fórum da Cooperação Económica e Comercial entre a China e os Países Lusófonos, agendada para Outubro próximo em Macau.
“A presença de uma delegação oficial de alto nível de Moçambique será muito importante para o sucesso dessa cimeira”, declarou Su Jian.
A China é um importante parceiro de Moçambique, mantendo uma forte cooperação em vários domínios, incluindo no campo económico e empresarial.
Moçambique atravessa uma crise económica e financeira, provocada pela queda do preço das matérias-primas e dos investimentos, calamidades naturais, derrapagem da moeda nacional, subida galopante da inflação e aumento exponencial da dívida pública.
Em paralelo com a crise económica e financeira, o país é igualmente assolado por violência militar, com confrontos entre as Forças de Defesa e Segurança (FDS) e o braço armado da Renamo (Resistência Nacional Moçambicana), principal partido de oposição, na sequência da recusa do movimento de aceitar os resultados das eleições gerais de 2014.

22 Set 2016

Economia | Engenheiro electrónico passa a guru de investimentos

Um dos analistas de investimentos mais famosos da China é um economista de 52 anos da Yingda Securities Co., uma corretora estatal de porte médio localizada em Shenzhen, no sul da China

[dropcap style≠’circle’]L[/dropcap]i Daxiao, ou “Almirante Li” como é chamado por alguns fãs, não estudou finanças, começou como engenheiro electrónico, e nunca trabalhou em empresas importantes como a Goldman Sachs Group Inc. ou mesmo num grande banco de investimento chinês como o Citic Securities Co.
Mesmo assim, Li transformou-se num dos analistas mais populares do mercado de acções da China, com 2,4 milhões de seguidores no Weibo, um site de microblogs chinês e um dos nomes mais procurados por homens e mulheres de negócios no motor de busca chinês Baidu. O segredo para tanto sucesso são dicas pitorescas e informais colocadas nas redes sociais, junto com fotos e vídeos em que Li aparece a fazer palhaçadas tais como posar com estátuas de touros ou fazer malabarismos com laranjas.
Os reguladores de valores mobiliários da China têm tentado controlar estas brincadeiras numa tentativa de reduzir a especulação do mercado e cultivar um estilo de investimento mais sóbrio entre a comunidade de investidores individuais. Muitos outros analistas populares de mercado na China pararam de produzir vídeos chamativos e comentários incisivos, e Li diz que pensou em apagar a sua conta no Weibo em Maio, quando o governo elevou a pressão sobre economistas e analistas para serem optimistas. Mas Li, cujos comentários já eram optimistas, decidiu manter o curso e diz que as autoridades chinesas não pediram que parasse. “A maioria das pessoas não têm graça e a vida precisa de um tempero”, diz.
Li estima que faz cerca de 500 aparições nos media nacionais por ano e tem dezenas de milhares de posts na internet. Embora não tenha referido o preço das suas palestras, um gerente de eventos a par do assunto disse que pode cobrar até 15 mil dólares por palestra.

São diamantes

Em 2015, quando o índice da bolsa de acções de Xangai estava entre 4 mil e 5 mil pontos, disse que o ‘topo do mundo” tinha sido atingido; meses depois, as acções caíram, e alguns investidores queixaram-se que tinha anunciado o topo cedo demais. Quando o índice caiu para cerca de 2.100 em 2012, ele mencionou a frase “piso de diamante” para indicar que algumas acções com fundamentos fortes tinham-se tornado tão valiosas quanto diamantes.
Numa questão de dois meses, o mercado de Xangai recuperou 15%. Li disse que outro “piso de diamante” tinha sido atingido em 16 de Janeiro, mas este ano a indicação não funcionou tão bem: as acções em Xangai continuaram a recuar outros 8,5%.
Depois do colapso do mercado de acções no ano passado e no início deste ano, os reguladores chineses começaram a prestar mais atenção aos métodos dos analistas. Desde então, Li parou de produzir vídeos mas continua firme e forte. “Eu sempre fui bom a interpretar as políticas”, disse. “Por que as autoridades iriam querer que eu parasse de falar?”

Wall Street Journal

19 Set 2016

China |Mãe desesperada mata três filhos menores e suicida-se

Eram um dos casais mais pobres da aldeia onde viviam, mas ainda assim foi-lhes negado o apoio dado pelo Estado a famílias carenciadas. Familiares e vizinhos acreditam que foi o desespero aliado à pobreza que levou esta a mãe a cometer este acto

[dropcap style≠’circle’]A[/dropcap] incidência de pobreza extrema na China, voltou esta semana a ser tema de debate por uma mãe ter morto os seus três filhos depois de lhe ter sido negado o rendimento mínimo. Yang Gailian, de 28 anos, utilizou um machado para matar os filhos, de seis, cinco e três anos, na província de Gansu, no noroeste da China, noticiou na terça-feira a imprensa chinesa A mulher suicidou-se a seguir, ingerindo pesticida. O marido, Li Keying, acabou também por pôr fim â vida, depois de realizado o funeral.
Eram um dos casais mais pobres na aldeia de Agushan, segundo escreveram os jornais, mas foi-lhes negado o subsídio destinado pelo Governo às famílias com rendimentos baixos. O comité da aldeia justificou a decisão apontando que o seu rendimento anual era superior a 2.300 yuan, por pessoa.
Testemunhos de familiares difundidos na imprensa, contudo, garantem que o apoio foi anulado porque o casal rejeitou subornar os funcionários locais.
“Olhem agora para a exuberância que foi o G20”, ironizou um internauta no Sina Weibo, o Twitter chinês, aludindo à renovação da cidade de Hangzhou, na costa leste da China, visando receber a cimeira de dois dias. Os trabalhos demoraram seis meses e envolveram milhares de operários, ilustrando os esforços de Pequim para promover a imagem da China no exterior. Outro internauta reagiu assim: “Somos uma sociedade brutal, em que as pessoas se comem umas às outras”.

Pobres e Ricos

Ao jornal Global Times, o especialista em problemas sociais Hu Xingdou disse que o caso “serve para alertar o público e o Governo de que, enquanto alguns gozam de uma boa vida nas cidades, a China continua a ser um país em desenvolvimento, com grandes desequilíbrios”. Xiang Songzuo, economista-chefe no Agricultural Bank of China, considerou na sua conta oficial nas redes sociais que a “situação reflecte exactamente a dura realidade da pobreza na China”, acrescentando que “por um lado, temos funcionários corruptos a desviar centenas de milhões a cada instante e os ricos que gastam aos milhares por dia, competindo para ver quem compra mais, enquanto do outro lado estão os que vivem numa pobreza tão extrema que perdem a vontade de viver”.
Yang e Li e os três filhos viviam com a avó e o pai de Yang numa pequena casa de tijolo, com chão de terra batida. As suas “mais valiosas possessões eram três vacas e 12 galinhas”, segundo o jornal China Youth Daily.
A mulher lavrava a terra, enquanto Li era um dos milhões de rurais chineses que ocorrem às cidades em busca de todo o tipo de trabalho. Segundo o Global Times, o homem tinha um vencimento anual de 7.000 yuan, quase metade enviado para casa, visando garantir a subsistência da família. A desigualdade social é uma das principais fontes de descontentamento popular no “gigante” asiático, onde um terço da riqueza está concentrado em apenas 1% da população. O rendimento ‘per capita’ em Pequim ou Xangai, as cidades mais prósperas do país, é dez vezes superior ao das áreas rurais, onde quase metade dos 1.350 milhões de chineses continua a viver.
Segundo o Gabinete Nacional de Estatísticas chinês, 70 milhões de chineses continuam a viver abaixo da linha de pobreza, fixada pelo país num rendimento anual inferior a 2.800 yuan.
A mesma fonte detalha que o rendimento anual ‘per capita’ dos residentes rurais na China fixou-se em 10.772 yuan em 2015, menos do que muitos países africanos. No mesmo ano, a China ultrapassou os Estados Unidos da América em número de bilionários.

15 Set 2016

China | EUA questionam subsídios atribuídos a produtores de cereais

[dropcap style≠’circle’]O[/dropcap]s apoios atribuídos pela China aos produtores de milho, trigo e arroz “respeitam” as regras da Organização Mundial do Comércio (OMC), garantiu ontem Pequim, após Washington ter apresentado queixa sobre o que considera incentivos comerciais “injustos”. Os Estados Unidos da América alegam que a China, o maior produtor mundial de trigo e arroz, distribuiu “apoios aos preços de mercado”, no total de 100.000 milhões de dólares, um valor superior ao permitido pela OMC. O apoio estatal “torna os produtores chineses mais competitivos nos mercados internacionais”, acusou Washington.
O Ministério do Comércio chinês disse entretanto, que já recebeu o pedido de consulta por parte dos EUA, através do mecanismo de resolução de litígios da OMC, mas insistiu que os apoios são “legais”, avançando ainda que, “agricultura é uma indústria essencial em qualquer país e é fundamental para os interesses económicos dos produtores agrícolas”, segundo comunicado difundido na terça-feira. O apoio dado pelo Governo ao sector é uma “prática internacional comum”, refere.
Segundo as autoridades norte-americanas, a China tem atribuído subsídios ao sector acima do valor de 8,5% dos preços de referência dos grãos, definido pela OMC. O Secretário da Agricultura dos EUA, Tom Vilsack, afirmou que “se a China estivesse disposta a operar segundo o regime estipulado pela OMC”, as exportações norte-americanas para o país no sector agrícola estariam acima do nível actual, de 20.000 milhões de dólares por ano, que correspondem a 200.000 postos de trabalho.
Muitos destes empregos são em Estados como Iowa ou Kansas, que devido às particularidades do sistema eleitoral norte-americano têm um papel muito importante nas eleições presidenciais do país.
Tanto Donald Trump como Hillary Clinton, ambos candidatos, dos partidos Republicano e Democrata respectivamente, coincidem na opinião de que os EUA devem rever a sua política comercial com a China, mostrando-se favoráveis a um maior proteccionismo.
A queixa contra alegados subsídios atribuídos aos produtores de grãos é a 14.ª iniciada pelos EUA contra a China, desde que o Presidente Barack Obama assumiu funções, sendo que Washington ganhou todos os casos durante este período. Mas a China garante que “irá sempre proteger activamente os seus interesses industriais e comerciais”, aponta o comunicado do ministério do Comércio chinês.

15 Set 2016

Inflação imobiliária e empréstimos a empresas geram preocupação

[dropcap style≠’circle’]A[/dropcap] bolha imobiliária está a afectar a economia chinesa e as empresas que não produzem devem ser fechadas. É esta a conclusão e o alerta feito por um executivo do Banco do Povo, que teme consequências maiores numa economia que já se encontra em fase de abrandamento. O economista-chefe do Banco do Povo da China (PBOC, banco central do país), Ma Jun, pediu ontem medidas para travar a “bolha” imobiliária do país e reduzir o financiamento às empresas públicas improdutivas. “Deveriam ser tomadas medidas para travar o excessivo aumento da bolha no sector imobiliário” afirmou Ma, numa entrevista publicada ontem na revista China Business News.
Desde há vários meses que as grandes cidades chinesas, como Pequim, Xangai, Cantão e Shenzhen, têm vindo a registar um aumento do preço do imobiliário superior a 10%, em termos homólogos. Na maioria das restantes principais cidades chinesas, o sector tem vindo também a recuperar, mas a um ritmo mais lento. A situação global do mercado é, porém, desconhecida, visto que os dados oficiais incluem apenas as 70 maiores cidades.
Ma Jun apelou ainda ao fim do fluxo de “dinheiro barato”, de que beneficiam as empresas estatais menos competitivas, e que se admita a falência de algumas delas, permitindo que o mercado determine os custos do financiamento no país. O responsável alertou para a necessidade de travar o ritmo do endividamento das empresas e procurar formas para reduzir a dívida, reflectindo as últimas recomendações do Fundo Monetário Internacional (FMI) para a economia chinesa.

Redução suave

No entanto, Ma advertiu que o país deve reduzir o endividamento de forma progressiva ou arrisca perder muitos postos de trabalho, caso se registe um abrandamento brusco na economia, que cresceu em 2015 ao ritmo mais lento dos últimos 25 anos.
Entre Novembro de 2014 e Outubro de 2015, o PBOC baixou por seis vezes as taxas de juro e reduziu consecutivamente os rácios das reservas obrigatórias dos bancos. Desde então, optou por injecções de liquidez para estimular o crédito e revitalizar a economia.

14 Set 2016