Andreia Sofia Silva Grande Plano MancheteEnsino | Universidades chinesas sobem em ranking por disciplinas As universidades chinesas subiram no “World University Rankings by Subject 2025” em várias áreas, apesar de em artes e humanidades a Ásia continuar aquém de outros continentes. Em 11 disciplinas analisadas, como Direito, Gestão e Economia, a China e Singapura constam nas 50 melhores, enquanto Hong Kong destaca-se em Estudos de Educação O mais recente ranking mundial do ensino superior por áreas do saber da Times Higher Education, o “World University Rankings by Subject 2025”, conclui que as universidades do Interior da China têm subido para posições de topo, embora a Ásia continue a posicionar-se uns lugares aquém nas áreas das artes e humanidades. Foram analisadas, no total, 11 áreas académicas. “Artes e Humanidades”, “Negócios e Economia”, “Ciências da Computação”, “Estudos de Educação”, “Engenharia”, “Direito”, “Ciências da Vida”, “Medicina e Saúde”, “Ciências Físicas”, “Psicologia” e “Ciências Sociais”. Conclui-se, segundo uma nota oficial do Times Higher Education (THE), que “China e Singapura aparecem entre as 50 melhores em todas as 11 disciplinas”, com destaque para a Universidade de Pequim e Universidade de Tsinghua a subirem, respectivamente, para o quarto e sexo lugares nas disciplinas relacionadas com “Negócios e Economia”. Aliás, “o melhor desempenho da Ásia regista-se nas áreas de gestão e economia”, com “as suas principais universidades a continuar a ter dificuldades em competir a nível mundial no domínio das artes e humanidades”. “As preocupações com a ‘crise’ nas humanidades parecem estar destinadas a continuar este ano, mas a análise do THE revela a contínua importância para as instituições de elite”. Tendo em conta a análise a 11 áreas académicas, a região vizinha de Hong Kong destaca-se em nove, sobretudo na área da Educação, onde também a Universidade de Pequim e Tsinghua obteve bons resultados. “A Universidade Nacional de Singapura ocupa novamente a nona posição em Engenharia, entrando no top 10 das ciências físicas – a primeira instituição da Ásia a consegui-lo – em 10º lugar”, lê-se ainda. Citada pela mesma nota, Simon Marginson, professor na Universidade de Oxford, uma instituição que costuma liderar os rankings a nível mundial, disse que o desempenho da Ásia nesta classificação mostra “o mundo multipolar do ensino superior” existente hoje, com uma maior amplificação “da capacidade académica nacional”. “Neste contexto, ao longo do tempo, a posição relativa dos países da Anglosfera e da Europa Ocidental tem de diminuir, não porque a sua qualidade absoluta esteja a diminuir, mas porque o campo de comparação está mais preenchido com outros países a surgirem”, afirmou. O mesmo responsável apontou ainda que “os sistemas do ensino superior da Ásia Oriental e do Sudeste Asiático melhoraram nas últimas duas décadas devido ao crescimento do número de estudantes, ao aumento do financiamento público, a uma organização e gestão mais orientadas para o desempenho e a políticas de internacionalização selectivas”. Uma das áreas onde se destaca uma melhor posição das universidades asiáticas é nos Estudos de Educação, tendo mostrado “uma força notável, com três universidades no top 10, com a Universidade de Hong Kong em sexto lugar, a Universidade de Tsinghua em sétimo lugar e a Universidade de Pequim em oitavo lugar”. Além disso, o THE mostra que a Universidade Chinesa de Hong Kong fez “progressos significativos”, passando da 19ª para a 11ª posição. Por outro lado, a Universidade Nacional de Ciência e Tecnologia de Taiwan (Taiwan Tech) obteve “a pontuação mais elevada em termos de qualidade da investigação”. Porém, a liderança global vai para a Universidade de Stanford, “ultrapassando a Universidade da Califórnia, Berkeley, demonstrando um desempenho excepcional tanto no ensino como no ambiente de investigação”. China sobe em Direito Olhando para a área do Direito, não existe actualmente, segundo o ranking do THE, melhor lugar para estudar do que a Universidade de Stanford, que alcançou a “excelência no ensino e no ambiente de investigação”, seguindo-se a Universidade de Harvard, com “desempenho excepcional na investigação” e, em terceiro lugar, a Universidade de Nova Iorque, “com a pontuação mais elevada em termos de ambiente de investigação”. Destaque, nesta área, para a entrada da Universidade de Pequim na 14ª posição, em parte devido à boa classificação “no ensino e no ambiente de investigação”. De frisar que, no que respeita ao Direito, foram classificadas 389 instituições de 48 países e territórios, com recurso a 18 “indicadores de desempenho rigorosos”. Na área do Direito, são analisadas especialidades como Direito Constitucional e Administrativo e o exame a estruturas e enquadramentos de governação, ou ainda Direito Internacional, onde se inclui sistemas e tratados jurídicos globais. Conhecimento capital A China também se destaca na área dos Negócios e Economia, liderada pelo MIT (Massachusetts Institute of Technology). A Universidade de Pequim subiu para o quarto lugar, acompanhada por outras 20 universidades chinesas que melhoraram as suas posições na tabela. Nesta área foram analisadas 990 instituições de 85 países e territórios, com a atenção a focar-se na qualidade do ensino e investigação em disciplinas como liderança estratégica, negócios internacionais e desenvolvimento organizacional, bem como finanças empresariais ou econometria. No que diz respeito às ciências sociais, a China surge, de facto, mais abaixo, na lista das 20 melhores, novamente com a Universidade de Pequim em 16º e a Universidade de Tsinghua em 20º. Aqui, a liderança cabe ao MIT, passando a Universidade de Stanford para o terceiro ligar e depois a Universidade de Oxford, com “um desempenho excepcional no ensino e ambiente de investigação”. A London School of Economics and Political Science continua a ser uma instituição integrante do Top 10, ocupando agora o nono lugar. Foram analisadas 1.093 instituições de 100 países e territórios em disciplinas como Comunicação e Estudos dos Media, Política e Estudos Internacionais, incluindo Estudos de Desenvolvimento, Sociologia, Geografia e Antropologia. A China subiu também na disciplina de Ciências da Computação com a Universidade de Pequim a passar do 16º para o 12º lugar. Nesta área, lidera a Universidade de Oxford, atingindo a sua maior pontuação de sempre. MIT lidera em artes O MIT passou a estar à frente da Universidade de Stanford, assumindo o “primeiro lugar nas artes e humanidades, bem como em negócios, economia e ciências sociais”, mesmo que seja reconhecido primeiramente “pela especialização nos domínios da ciência, tecnologia, engenharia e matemática”. Segundo o ranking, é agora “o melhor local para estudar artes – com pontuações elevadas em cada um dos cinco pilares subjacentes à metodologia, em especial a qualidade da investigação e a perspectiva internacional”. Nas 11 disciplinas do ranking THE, “Stanford ficou em primeiro lugar em estudos de Educação, Direito e Psicologia, a Universidade de Harvard ficou em primeiro lugar em Engenharia e Ciências da Vida”. A única instituição local que consta no ranking do THE por disciplinas é a Universidade de Macau (UM), mas em lugares bastante mais abaixo do top 10: na área das ciências computacionais, está no grupo das 126-150 melhores do mundo, posição semelhante ocupada na área da Educação e Engenharia. Na área do Direito, por exemplo, a UM está no grupo das 176-200 melhores, enquanto nas Ciências da Vida está entre as 151-175 melhores.
Andreia Sofia Silva Grande Plano MancheteEstudo | Tratamento digital de insónia pode combater depressão Um estudo inédito desenvolvido por diversas universidades, incluindo a Universidade Chinesa de Hong Kong e Universidade de Pequim, concluiu que a terapia cognitivo-comportamental através de aplicações de telemóvel pode ajudar a combater depressão em jovens através da monitorização de insónias. A taxa de redução da doença é de cerca de 40 por cento O estudo “Eficácia da terapia cognitivo-comportamental baseada em aplicações para a insónia na prevenção da perturbação depressiva major em jovens com insónia e depressão subclínica: Um ensaio clínico aleatório” [Effectiveness of app-based cognitive behavioral therapy for insomnia on preventing major depressive disorder in youth with insomnia and subclinical depression: A randomized clinical trial] promete respostas para o tratamento de casos de depressão nos mais jovens. O trabalho, publicado pela revista “PLOS Medicine” e desenvolvido por académicos de diversas universidades de Hong Kong e da China, onde se incluem a Universidade de Hong Kong, Universidade Chinesa de Hong Kong ou a Universidade de Pequim, conclui que é possível reduzir, em cerca de 40 por cento, casos de depressão em jovens com a utilização de uma aplicação de telemóvel que monitoriza as insónias, um habitual sintoma em quem sofre da doença. Os dados foram apresentados no final da última semana em Hong Kong. Para chegar aos resultados, foi escolhida uma amostra aleatória de mais de 700 jovens chineses do Interior da China e Hong Kong com perturbação de insónia e sintomas depressivos, com idades compreendidas entre 15 e 25 anos, que se submeteram ao teste com a aplicação durante seis semanas. Assim, “este estudo controlado e aleatório avaliou a eficácia da terapia cognitivo-comportamental para a insónia baseada em aplicações (TCC-I) na prevenção do aparecimento futuro de perturbação depressiva major (MDD) em jovens”, pode ler-se. Isto numa altura em que “cada vez mais provas sugerem que a insónia desempenha um papel importante no desenvolvimento da depressão”, ocorrendo nesta investigação “a intervenção na insónia como uma abordagem promissora para prevenir a depressão nos jovens”. Assim, a “TCC-I baseada em aplicações é eficaz na prevenção do aparecimento futuro de depressão major e na melhoria dos resultados da insónia entre jovens com insónia e depressão subclínica”. O estudo conclui também que “estes resultados sublinham a importância de se visar a insónia para prevenir o aparecimento de DMG [um tipo de depressão] e realçam a necessidade de uma maior divulgação da TCC-I digital para promover o sono e a saúde mental na população jovem”. Conclui-se ainda que a TCC-I baseada em aplicações “não só melhorou os sintomas nocturnos de insónia, como também reduziu a fadiga diurna e conduziu a uma maior mudança para a maturidade”. Mais de 700 jovens analisados Depois de se testar a aplicação da TCC-I, foram realizadas entrevistas clínicas de base durante um período de seis a 12 meses para se compreenderem os resultados nos participantes e monitorizar os sintomas. Falamos, no período compreendido entre 9 de Setembro de 2019 e 25 de Novembro de 2022, de 708 participantes, sendo que destes 407 era mulheres (57 por cento), com uma média de idades de 22 anos. O estudo aponta ainda que “37 participantes, 10 por cento, no grupo de intervenção e 62 participantes, 18 por cento, no grupo de controlo desenvolveram novas perturbações do humor ao longo dos 12 meses de seguimento”. Por sua vez, o grupo que foi sujeito à CBT-I baseada na aplicação de telemóvel, ou seja, a terapia cognitivo-comportamental para a insónia, apresentou “taxas de remissão da perturbação da insónia mais elevadas do que os grupos de controlo pós-intervenção” no espaço de um ano. Além disso, o mesmo grupo “relatou uma maior diminuição nos sintomas depressivos do que os controlos na pós-intervenção e ao longo dos seis meses de seguimento”. Os autores do estudo entendem que “a insónia foi um mediador dos efeitos da intervenção na depressão”, não tendo sido “relatados eventos adversos relacionados com as intervenções”. Os autores partiram para este estudo com algumas ideias comprovadas de que a insónia constitui uma das causas principais para a depressão. “Os dados emergentes sobre a intervenção na insónia, especialmente a terapia cognitivo-comportamental para a insónia (TCC-I), têm mostrado resultados promissores no alívio da insónia e dos sintomas depressivos em doentes com insónia”, lê-se. As investigações já existentes centram-se em adultos e idosos, pelo que era importante analisar esta matéria entre os mais jovens. “Além disso, existem poucos estudos com poder estatístico adequado para demonstrar o efeito preventivo da TCC-I na depressão, tanto ao nível dos sintomas como das perturbações”, explicam os autores do estudo, frisando que “pouco se sabe sobre se a intervenção digital da insónia pode potencialmente prevenir a depressão juvenil”. Significados importantes O estudo aponta ainda que a terapia cognitivo-comportamental para a insónia baseada em aplicações “é uma intervenção viável e eficaz para prevenir a depressão futura, tanto ao nível dos sintomas como das perturbações, nos jovens”. Porém, é recomendada a realização de mais estudos que possam explorar “a integração do TCC-I baseado em aplicativos na prática clínica para melhorar a acessibilidade e prevenir a depressão entre a população jovem”. É também referida a necessidade da realização de mais ensaios clínicos “para explorar os potenciais benefícios da adaptação de intervenções digitais sobre o sono no alívio e prevenção da depressão”, a fim de se “avançar em direcção a abordagens de cuidados personalizados e escalonados junto da comunidade”. São referidas limitações neste estudo publicado na “PLOS Medicine”, nomeadamente “a inclusão de uma mistura de indivíduos com e sem depressão prévia, e uma amostra limitada de adolescentes, embora tenha havido uma amostra global adequada”. À imprensa de Hong Kong, os autores do estudo falaram da importância destes resultados e como podem constituir novas ferramentas em futuros tratamentos da doença. Citado pelo The Standard HK, Chen Si-jing, primeiro autor da investigação e bolseiro de pós-doutoramento do Departamento de Psiquiatria da Universidade Chinesa de Hong Kong, disse que o estudo “demonstra que a TCC-I digital é eficaz na prevenção do aparecimento futuro de depressão grave, com uma eficácia satisfatória”. Já Wing Yun-kwok, director da Unidade de Avaliação do Sono da Família Li Chiu Kong, indicou que os estudos futuros irão centrar-se na intervenção digital sobre a insónia na prática clínica. O carácter inédito deste estudo na Ásia confere-lhe ainda uma maior importância. Segundo afirmou Lu Lin, académico da Academia Chinesa de Ciências e presidente do PKU Sixth Hospital, até à data “não tinha sido realizada qualquer investigação na Ásia sobre a eficácia desta terapia”.
Andreia Sofia Silva Grande Plano MancheteDiplomacia | Plataforma de Macau vista no contexto da política externa chinesa Em “Paradiplomacia na China: O papel de Macau nas relações entre os países de língua sino-portuguesa”, Xu Heng Wang conclui que o papel de plataforma com a lusofonia “pode ser visto com extensão da política externa da China”. Porém, a RAEM apresenta as suas próprias ideias, sem uma “completa obediência ao Governo Central”, indica a académica O papel diplomático de Macau no relacionamento com a China e os países de língua portuguesa foi o foco da tese de doutoramento de Xu Heng Wang defendida em Janeiro na Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra (UC). Em “Paradiplomacia na China: O papel de Macau nas relações entre os países de língua sino-portuguesa”, a autora defende que, no tocante ao papel de plataforma económica e comercial da RAEM na ligação de Pequim e os países de língua portuguesa, há uma certa extensão da política externa chinesa, mas, ao mesmo tempo, ideias próprias das autoridades locais. “Embora o papel de Macau como plataforma económica e comercial possa ser visto como uma extensão da política externa da China, tal não significa que Macau esteja num estado de completa obediência ao Governo central”, é referido no trabalho de investigação. Embora seja salientado que “é difícil discernir a vontade de Macau em se desenvolver, deve ser mencionado que Macau tem as suas próprias ideias sobre o rumo do seu desenvolvimento”, nomeadamente em relação ao jogo e toda a estrutura económica. “Há muito que Macau previu que a estrutura da sua economia seria desequilibrada e que o jogo seria dominante. As autoridades e os académicos têm também realizado muitos debates sobre a questão do desenvolvimento insustentável assente na indústria do jogo. Em simultâneo, Macau está também muito consciente das suas vantagens em termos de integração cultural, tendo levado a cabo a construção de uma cidade histórica e cultural, transformando-se numa atracção turística.” Entre as ideias próprias e o que está definido em matéria de política externa por Pequim, existe “uma direcção do desenvolvimento de Macau que, basicamente, é consistente com o papel que o Governo central concebeu para Macau”. Neste contexto, a autora conclui que “os interesses de Macau e do Governo central são basicamente os mesmos”, sendo “um caso especial de paradiplomacia na China”, em virtude da implementação da política “Um País, Dois Sistemas” no território e do elevado grau de autonomia que lhe proporciona em diversas áreas. O papel do Fórum Macau Xu Heng Wang fez uma abordagem diferente sobre esta questão, não recorrendo a teorias tradicionais da área das relações internacionais, pelo facto de “as interacções em Macau envolverem tanto actores estatais como não-estatais”, pelo que essas teorias “não fornecem uma explicação precisa do papel de Macau”. Desta forma, e para compreender o papel de Macau nas relações entre a China e os países de língua portuguesa, foi combinada a ideia de paradiplomacia com a teoria do Guanxi, termo usado para descrever relações sociais, económicas ou políticas que podem potenciar negócios ou outros benefícios. Assim, é referido que “a criação do Fórum Macau pode ser considerada uma das actividades paradiplomáticas em destaque”, com “Macau a desempenhar um papel que mistura o seu desenvolvimento com os objectivos estratégicos do Governo Central chinês, especialmente no que concerne aos países de língua portuguesa”. Entende-se que “Macau tem desempenhado algumas actividades relevantes nas relações entre a China e os países de língua portuguesa”, embora se assuma que “os resultados tenham sido limitados até agora”. A académica refere que estas actividades são “concentradas principalmente nos campos da economia, educação, turismo, cultura e tecnologia, com efeitos políticos que ainda não são tão evidentes”. Além disso, é apontado que “a influência de Macau nas relações entre a China e os diferentes países de língua portuguesa tem variado em intensidade”. Ainda assim, “grande parte da interacção e cooperação entre Macau, China e os países de língua portuguesa ocorreu através do Fórum Macau”. Ajuda com objectivos Em termos gerais, a “paradiplomacia de Macau é um processo complexo e fluído”, sendo que o território “mostra a sua identidade como um centro mundial de turismo e lazer e um centro financeiro característico com actividades internacionais”, com o objectivo de “melhorar a estrutura económica” e fazer uma diversificação além jogo. A autora destaca áreas fundamentais como os serviços para pequenas e médias empresas, intercâmbio-cultural e formação de talentos bilingues. Além disso, é explicado que “o Governo Central presta apoio político a Macau com base nas suas necessidades de política externa, com o reforço da cooperação” com os países de língua portuguesa. Nestas acções, incluem-se o projecto da Grande Baía, bem como a ideia do estabelecimento de Macau como centro de compensação do renminbi (RMB). “Por um lado, o Governo Central proporciona conveniências a Macau e ajuda [o território] a estabelecer a sua identidade, ‘apoiada pelo mercado da China continental’. Por outro, ajuda Macau a desenvolver a actividade de centro de compensação em RMB para as transacções que ocorrem na plataforma de negociação de Macau.” Assim, denota a autora, “o papel de Macau na paradiplomacia, mas como auxiliar da implementação da política externa central, é também evidente”. Porém, “a paradiplomacia de Macau não reflecte apenas o objectivo diplomático de ajudar o Governo chinês a estabelecer relações com os países de língua portuguesa, mas também a melhoria da própria influência internacional de Macau”. A tese de doutoramento apresenta também uma análise de casos práticos do relacionamento de Macau com os países de língua portuguesa mais marcantes na relação económica com a China, nomeadamente Angola e Brasil. “Para Angola, Macau tem desempenhado um papel de aproximação à China”, uma vez que o país africano necessita de “investimento estrangeiro para o sector da energia hidroelétrica, infra-estruturas e agricultura”. Desta forma, o eixo de ligação faz-se no Fórum Macau, onde “Angola pode estabelecer relações com o Governo Central chinês e cooperar em matéria de investimentos, além do sector petrolífero”. Além disso, “a maior parte do investimento da China em Angola provém de grandes empresas, enquanto as pequenas e médias empresas ainda dependem principalmente de Macau para a cooperação comercial”. No caso do Brasil a situação é ligeiramente diferente, pois “nas relações sino-brasileiras, o papel de Macau não é óbvio”, mais “centrada em torno dos BRICS”, grupo de economias emergentes inicialmente fundado pelo Brasil, Rússia, Índia e China, e que hoje conta com dez países membros. “Embora a primeira reunião ministerial do Fórum de Macau (2003) tenha precedido a primeira reunião dos líderes dos BRICS (2009), o impacto do Fórum de Macau nas relações sino-brasileiras não é obviamente tão bom como a influência estabelecida através de reuniões directas. Por conseguinte, nos primeiros tempos do estabelecimento de relações diplomáticas entre a China e o Brasil, as relações entre os dois países desenvolveram-se mais a nível nacional.” É destacado ainda que “embora o papel que Macau tem na abertura de uma porta para o mercado da China continental tenha sido estabelecido aos olhos do Brasil, o impacto de Macau nas relações sino-brasileiras ainda não se tornou óbvio”. É certo, porém, que nos últimos anos “o desenvolvimento contínuo do Fórum de Macau e a melhoria contínua das actividades organizacionais, a sua atracção pelo Brasil tornou-se cada vez mais evidente”. “À medida que o Brasil tenta expandir o comércio, a cooperação comercial e o investimento com a China deixarão de estar concentrados apenas nos gigantes empresariais nacionais e serão cada vez mais direcionados para as empresas privadas”, é ainda concluído. Em relação a Portugal, a “atitude é muito positiva”, à conta da ligação histórica existente. “Em muitos memorandos e declarações assinados com a China, foi afirmado que Macau está a desempenhar um papel cada vez mais importante como elo de ligação entre a China e Portugal. Portugal e a China têm uma grande cooperação técnica nos domínios das novas energias, da indústria aeroespacial e de outras inovações tecnológicas. Existe também uma profunda relação de cooperação no domínio da educação.” Destaca-se ainda que Portugal “não só assinou acordos de cooperação no domínio do ensino com universidades do Interior da China, como também assinou vários acordos de cooperação e intercâmbio com as principais universidades de Macau”.
Andreia Sofia Silva Grande Plano MancheteEnsino profissional | Estudo alerta para falhas em recursos humanos na China Um estudo publicado na revista “The China Quarterly” conclui que há ainda muitas questões a resolver para que o ensino técnico-profissional na China consiga responder às necessidades de recursos humanos. O trabalho alerta para a “rápida massificação” deste tipo de ensino, com prioridade para “número de matrículas em detrimento da qualidade” O ensino técnico-profissional na China tem-se popularizado, mas um estudo publicado recentemente na revista “The China Quarterly”, da Cambridge University Press, conclui que há ainda lacunas a colmatar para que os cursos consigam, de facto, dar resposta às necessidades do país em matéria de mão-de-obra no sector industrial. “More graduates, fewer skills? Vocational education expansion and skilled labour shortages in China” [Mais graduados, menos competências? A expansão da educação vocacional e as faltas de mão-de-obra qualificada na China] é o nome do estudo desenvolvido por Xinmiao Song, da Universidade de Lingnan, e Duduo Xu, do departamento de sociologia da Universidade de Hong Kong. O trabalho académico chama atenção para a “tendência perturbadora” da “rápida massificação do ensino profissional, que dá prioridade ao número de matrículas em detrimento da qualidade do ensino” e que “não responde à procura de formação de competências e de mão-de-obra qualificada”. Além disso, os autores acrescentam para as “consequências adversas, tanto para a gestão administrativa como para o ensino”, causadas por este panorama. “O desenvolvimento de competências cabe frequentemente a associações profissionais pós-escolares e a um grupo exclusivo de alunos de elite. Entretanto, as iniciativas de reforma, como a campanha de artes manuais e os concursos de competências, beneficiam apenas alguns, sem melhorar as perspectivas de emprego da população estudantil em geral.” Desta forma, os dois académicos defendem que “se preste mais atenção às tensões inerentes ao sistema de ensino e formação profissional da China”, pois “só quando houver uma compreensão mais profunda das causas subjacentes à formação ineficaz de competências nas escolas profissionais a China poderá atingir o seu objectivo nacional de modernização industrial”. O estudo foi desenvolvido em duas escolas vocacionais, tendo sido feitas entrevistas a 104 estudantes. Além disso, foram utilizados dados etnográficos de quatro projectos de doutoramento na área do ensino profissional, desenvolvidos entre Outubro de 2017 e Dezembro de 2020. É também referido que o país tem necessidade “cada vez mais urgente” de trabalhadores qualificados “devido à concorrência económica mundial”. Porém, “apesar da expansão massiva do sistema de ensino e formação profissional nas últimas duas décadas, continua a existir um défice significativo de mão-de-obra qualificada”, existindo “debates sobre a ineficácia do ensino profissional”. Estes centram-se, sobretudo, “na falta de sinergias institucionais entre o ensino e a indústria, mas ignoram frequentemente os conflitos inerentes ao sistema de ensino profissional e aos processos de formação de competências a nível micro”. Dificuldades práticas Ao “nível micro”, ou seja, nas escolas, os autores denotam a existência de diversas dificuldades no funcionamento efectivo destes cursos em consonância com os resultados pretendidos. No ensino secundário existe “um equilíbrio delicado entre a promoção da igualdade social e o desenvolvimento de competências”. Porém, “a análise indica que, no contexto da rápida expansão do ensino secundário, as escolas têm dificuldade em harmonizar eficazmente estes objectivos”. “A fim de manter um corpo discente adequado, as escolas e os professores vêem-se muitas vezes obrigados a comprometer a qualidade dos candidatos e os padrões de ensino na sala de aula. Esta situação gera uma mudança na pedagogia quotidiana e na administração escolar no sentido de preservar a disciplina e a estabilidade, atribuindo assim o desenvolvimento de competências e a selecção de talentos – idealmente uma missão de toda a escola – a associações profissionais extra-curriculares, prosseguidas apenas por alguns”, é acrescentado. Conclui-se também que “a aquisição de competências é um processo multifacetado, moldado pela interação dinâmica entre educadores e alunos”, pois “a preparação académica dos alunos e as suas motivações para aprender são igualmente pertinentes para a formação de microcompetências, tal como o são os recursos das escolas e as capacidades dos professores”. Desta forma, “a resolução do problema da formação ineficaz de competências exige mais do que iniciativas do topo para a base”, sendo “necessária uma abordagem que reconheça os obstáculos que os estudantes enfrentam na aquisição de competências, bem como as suas apreensões e incertezas na procura de emprego”, é referido. Os autores falam ainda de “elitismo” nalgumas formações relacionados com cursos de trabalhos manuais e “concursos de competências”. “Estas iniciativas podem inadvertidamente sugerir que os trabalhos manuais estão reservados a um número restrito de pessoas, uma vez que os concursos de competências permanecem muitas vezes inacessíveis à maioria dos estudantes do ensino profissional, quer objectiva quer psicologicamente.” Assim, os autores salientam que “existe um desfasamento significativo entre esta abordagem elitista da aquisição de competências e as condições reais enfrentadas pelos estudantes do ensino profissional”. “A promoção superficial do espírito de trabalho manual e a exclusividade de competências não conseguiram resolver verdadeiramente os desafios associados à aquisição de competências, à procura de emprego e ao empenho em seguir profissões técnicas entre os estudantes do ensino profissional”, é também referido. Ainda assim, são referidas limitações no estudo, nomeadamente o facto de se centrar apenas nas escolas profissionais públicas do ensino secundário superior, podendo “os resultados não representar totalmente outros níveis de ensino profissional, como os institutos superiores de formação profissional”. Números da “fábrica do mundo” No estudo é referido o intenso desenvolvimento industrial que a China tem conseguido nos últimos 40 anos, emergindo como a “fábrica do mundo”, conforme descrevem os autores, “tirando partido dos seus dividendos demográficos”. “No entanto, o modelo de crescimento intensivo em mão-de-obra revelou-se insustentável devido ao envelhecimento da população e à intensa concorrência global. Para escapar à ‘armadilha do rendimento médio’, o Governo chinês lançou uma série de acções de modernização industrial nos sectores da indústria transformadora e dos serviços”, mas “apesar das ambiciosas agendas para a próxima década, a persistente escassez de trabalhadores qualificados continua a dificultar estes esforços”, é referido. Em 2020, eram mais de 23 milhões os estudantes do ensino profissional, pelo que “esta escassez de mão-de-obra qualificada constitui uma surpresa”, é referido no estudo, que destaca “os esforços e recursos substanciais que o Governo chinês dedicou à melhoria do ensino profissional nos últimos anos”. Surgiu, por exemplo, “o ensino profissional secundário superior gratuito, a expansão dos estabelecimentos de ensino profissional superior em um milhão de estudantes de 2019 a 2021 e a criação de universidades de tecnologia aplicada”. Além disso, o sistema de ensino profissional assistiu a uma trajectória sem precedentes, com as matrículas nos estabelecimentos de ensino profissional secundário superior a aumentarem de 4,56 milhões em 2004 para 7,11 milhões em 2009″. Em termos de necessidade de recursos humanos, o estudo cita dados do Ministério dos Recursos Humanos e da Segurança Social da China relativos a 80 cidades do país. “Os relatórios trimestrais do ministério revelaram que o rácio entre posto de trabalho/pessoa que procura mão-de-obra qualificada atingiu um pico histórico de 2,0 no início de 2020”, sendo que “os trabalhadores qualificados de nível superior, os técnicos e os técnicos superiores tiveram uma procura particularmente elevada”. É também referido que o Ministério da Educação prevê que o país continue a confrontar-se, este ano, “com um défice de 30 milhões de trabalhadores qualificados, o que representa uma quebra de 48 por cento em domínios como os materiais, a poupança de energia e os veículos movidos a novas energias”.
Hoje Macau Grande Plano MancheteTrabalho | Programa de talentos “Future Ready” lançado em Macau e Hong Kong A Wynn e a seguradora AIA são duas das 14 empresas que fazem parte do projecto “Future Ready”, lançado pelo LinkedIn na quinta-feira em Hong Kong. O programa aposta na formação profissional nas duas regiões administrativas especiais, com especial foco para a inteligência artificial A rede social LinkedIn, virada para o mundo do trabalho, lançou na última semana, em Hong Kong, um programa de formação de talentos que conta com a colaboração de 14 empresas do território e de Macau, nomeadamente a seguradora AIA e a operadora de jogo Wynn. O programa, intitulado “LinkedIn Future Ready”, visa “equipar os profissionais de Hong Kong e Macau com as competências necessárias para prosperar num mercado de trabalho em rápida evolução”, é referido numa nota da organização. As outras empresas ou entidades participantes são a companhia aérea Cathay Pacific, o grupo de joalharia Chow Tai Fook, o grupo CLP, a English Schools Foundation, o grupo FWD, a Hop Lun, a Link Asset Management, a MTR Corporation, empresa que gere o metro de Hong Kong, e a consultora PCCW, sem esquecer a Prudential, a Swire Properties, que opera no mercado imobiliário, e o Jockey Club de Hong Kong. O programa inclui “iniciativas para a actualização de competências, intercâmbio de conhecimentos e [partilha] de informações baseadas em dados”. Essencialmente, o “Future Ready” pretende “equipar empresas com ferramentas e recursos necessários para navegar num cenário de transformação da força de trabalho e promover uma cultura de inovação”. Tendo em conta as últimas projecções da rede social, que publicou, em Janeiro, o relatório “Work Change Report – AI is coming to work” [Relatório da Mudança Laboral – Inteligência Artificial (IA) está a chegar ao trabalho], o programa “Future Ready” pretende disponibilizar mais formação nesta área nos dois territórios. “O programa ‘LinkedIn Future Ready’ é uma iniciativa arrojada que visa apoiar a força laboral em Hong Kong e colmatar lacunas existências em termos de competências, além de desbloquear novas oportunidades numa economia em crescimento”, disse Mei Mei Ng, directora-geral da rede social LinkedIn em Hong Kong. A responsável acrescentou ainda que a rede social vai trabalhar de forma estreita com as 14 empresas participantes, para construir “uma força de trabalho mais resiliente” através do fornecimento de “empresas que desenvolvam e implementem estratégias inovadoras de talento e garantam que os seus funcionários estejam equipados com as competências necessárias para ter sucesso no futuro”. Competências aquém Segundo o mesmo comunicado, antes de se avançar para este programa de formação foi feita uma avaliação dos mercados em ambos os territórios. Conclui-se que “Hong Kong e Macau apresentam um bom desempenho em competências transversais e inovação – ambas essenciais para navegar no dinâmico panorama empresarial actual”, sendo que por competências transversais se entende a “comunicação, trabalho de equipa e liderança”. Em termos de inovação, outro factor analisado, “Hong Kong excede a média da APAC [países da região Ásia-Pacífico] em capacidades de inovação, reforçando o seu papel como centro de negócios com visão de futuro que também promove a transformação na indústria”. Porém, a região vizinha “fica atrás na média da APAC em proficiência em IA”, pelo que os mentores do programa “Future Ready” consideram que existe “uma necessidade urgente de iniciativas de melhoria de competências para ajudar a capacitar a força de trabalho a adaptar-se sem problemas ao avanço tecnológico”. Há, neste domínio, uma “crescente procura de competências relacionadas com a IA”, pois “77 por cento dos líderes empresariais de Hong Kong afirmaram que contratariam um candidato menos experiente com competências em IA em vez de um candidato mais experiente sem essas competências”. Além disso, “embora as competências transversais continuem a ser a área mais forte de Hong Kong, a região continua a situar-se abaixo da média da APAC e está atrasada em quatro dos cinco domínios de competências críticas avaliadas”. Um dos objectivos do programa anunciado na quinta-feira é “melhorar e requalificar a mão-de-obra” dos dois territórios “para um futuro alimentado com a IA”, para que haja “uma combinação certa de competências técnicas e humanas”, constituindo “uma vantagem competitiva para profissionais e organizações”. As 14 empresas parceiras vão ter acesso a mais de 23 mil cursos disponíveis na plataforma “LinkedIn Learning” que se baseiam em 41.000 conjuntos de competências, nomeadamente “percursos de aprendizagem com curadoria, formação com tecnologia, treino com IA e recursos de aprendizagem digital de ponta”, é explicado. O futuro acelera Segundo o mesmo relatório divulgado pela LinkedIn em Janeiro, a crescente adopção da IA em todo o mundo vai levar a uma “procura de novos empregos e competências”. Os dados da rede social revelam que “mais de 10 por cento dos trabalhadores contratados actualmente têm cargos que não existiam em 2000, incluindo funções como Cientista de Dados, Gestor de Redes Sociais, Gestor de Sustentabilidade, Gestor de Sucesso do Cliente e Engenheiro de IA”. No caso concreto de Hong Kong, até 2030, “60 por cento de todas as competências utilizadas para realizar um trabalho terão mudado, com as inovações de IA a acelerarem esta transformação para 80 por cento”, é referido. Assim, conclui-se que “este ritmo acelerado de mudança criou uma lacuna de competências que é difícil de colmatar a curto prazo”. Além da aposta em profissionais, o programa “Future Ready” também quer promover ideias e debates, prometendo, por exemplo, “mesas redondas trimestrais para executivos” e reuniões “com líderes do sector para discutir a evolução dos empregos, das competências e dos requisitos de aprendizagem”. “O programa também proporcionará uma plataforma para a partilha das melhores práticas, influenciando o desenvolvimento mais alargado da força de trabalho em todos os sectores”, é ainda acrescentado. Destaque ainda para o facto de o relatório do LinkedIn sobre alterações nas estruturas de trabalho descrever as formas mais usuais da utilização da IA, nomeadamente na comunicação na área dos recursos humanos ou no marketing. Assim, “os recrutadores que utilizam as mensagens assistidas por IA do LinkedIn para envolver os candidatos estão a registar uma taxa de aceitação 44 por cento superior em comparação com as mensagens sem recurso à IA”. Além disso, “os profissionais de marketing que utilizam a ferramenta de criação de campanhas de anúncios do LinkedIn, o Accelerate, estão a apresentar um custo por acção até 42 por cento mais baixo em comparação com as campanhas clássicas” desta rede social. Para este relatório foram realizados vários inquéritos, nomeadamente a mais de 2,500 empresários de cinco países (Estados Unidos, Reino Unido, França, Alemanha e Índia). O questionário focado em executivos de várias áreas empresariais (recursos humanos, operações ou marketing) foi feito em nove país e teve 19.991 participantes de empresas com mais de 1000 empregados. Este inquérito realizou-se de 26 de Novembro e 13 de Dezembro do ano passado. Em termos mundiais, em 2030 cerca de 70 por cento das ferramentas e capacidades de cada trabalhador vão mudar, com a “IA a emergir como catalisador”, além de que “os investimentos feitos em IA [por parte das empresas] estão a começar a compensar: nos últimos dois anos, 51 por cento dos negócios que adoptaram a IA Generativa reportaram um aumento de receitas de 10 por cento ou mais”. “Sem surpresa, 88 por cento dos executivos com cargos de gestão de topo afirmaram que a adopção da IA para ajudar a acelerar os negócios é algo importante a desenvolver no próximo ano”, lê-se ainda.
Andreia Sofia Silva Grande Plano MancheteCorrupção | Relatório alerta para lacunas em Hong Kong e Singapura O Índice de Percepção da Corrupção 2024 apresenta Singapura como a terceira jurisdição mais limpa de corrupção a nível mundial, de um total de 180 países e regiões. Hong Kong está em 17º lugar no ranking, mas o relatório deixa um alerta: os centros financeiros mundiais continuam vulneráveis à corrupção Foi divulgado, esta terça-feira, o Índice de Percepção da Corrupção (CPI, na sigla inglesa), que analisa a corrupção no sector público de 180 países e regiões, da responsabilidade da organização não-governamental Transparência Internacional. No caso da China, o CPI revela que não houve uma mudança significativa. Se 100 pontos significa um país praticamente isento de corrupção, e 0 pontos um país altamente corrupto, a China registou, no ano passado, 43 pontos em 100, subindo uma posição em relação a 2023, ocupando a 76ª posição do ranking. O CPI olha também para a situação de Hong Kong, que obteve 67 pontos em 100, ocupando a 17ª posição em 180 países e regiões de todo o mundo. Taiwan, está actualmente em 25ª posição no ranking dos 180 países, não se tendo registada qualquer mudança de posicionamento face ao CPI de 2023. De registar a presença de um país asiático na lista dos quatro menos corruptos. É o caso de Singapura, em terceiro lugar com 84 pontos em 100, a seguir à Finlândia (2º) e Dinamarca (1º). A lista dos quatro melhores termina com a Nova Zelândia. Segundo os dados oficiais do CPI, os países e regiões que são considerados “democracias plenas” têm uma média de 73 pontos, enquanto aqueles que têm sistemas políticos em que vigoram as “democracias com falhas” têm 47 pontos. Segundo o índice, os regimes não-democráticos recebem apenas, em média, 33 pontos. O CPI analisa a corrupção em 180 países com base em fontes como estudos ou especialistas, medindo a corrupção apenas no sector público. São, contudo, assumidas limitações nesta contagem, pois o ranking não inclui “a corrupção de empresas privados, o secretismo financeiro ou a corrupção transnacional”. Se a pontuação representa “o nível de percepção da corrupção do sector público numa escala de 0-100”, a posição do país no ranking é apenas a comparação com outros países, sendo que estas listas “podem mudar meramente se o número de países se alterar”. Olhando para o cenário global, o relatório destaca que “mais uma vez que as economias desenvolvidas dominam o top do ranking CPI de 2024”, tratando-se de países que “beneficiam há bastante tempo de um Estado de Direito forte, do funcionamento de instituições governamentais e estabilidade política – factores que contribuem para uma percepção de baixos níveis de corrupção a nível interno”. Porém, “estes atributos fazem destes países alvos principais dos actores corruptos para lavagem de dinheiro e protecção dos ganhos ilícitos”. O rasto do dinheiro Segundo o relatório, o facto de economias desenvolvidas dominarem o CPI pode dar uma falsa ideia de que estes países “estão a combater a corrupção de forma efectiva e que se mantém intocados”. “Esta ideia não podia estar mais longe da verdade. Em particular, as nações que constituem grandes centros financeiros estão mais vulneráveis aos fluxos financeiros da corrupção. Enquanto as suas fortes instituições transmitem uma ideia de integridade, os sectores financeiros e quadros regulatórios providenciam, muitas vezes, oportunidades para explorar lacunas, diminuindo os esforços globais anti-corrupção”, é ainda descrito. A este respeito são apresentados os exemplos de Hong Kong e de outros territórios associados a jurisdições offshore, onde nem sempre é possível determinar o rasto do dinheiro. “Centros financeiros ocidentais como a Suíça, Luxemburgo ou Reino Unido têm um histórico de escrutínio da facilitação das movimentações da lavagem de dinheiro. Contudo, os centros não ocidentais, como Hong Kong, Singapura e os Emirados Árabes Unidos progressivamente têm desempenhado papéis semelhantes e requerem uma análise semelhante.” “Tal como os homólogos ocidentais, eles ostentam a existência de um forte Estado de Direito e instituições com um bom funcionamento, ainda que as leis bancárias, estruturas corporativas e provisões secretas permitem casos de lavagem de fundos e desvio de regulações, evitando-se a detecção” de casos menos legais, é ainda descrito. Refere-se o caso da transferência de fundos africanos para centros financeiros, como é o caso de Carlos São Vicente, antigo CEO de uma empresa estatal angolana que transferiu cerca de 1.2 mil milhões de dólares americanos para empresas registadas nas Bermudas, e que posteriormente transferiu tranches de dinheiro para contas em Singapura e Suíça. Só para uma conta registada em Singapura foram transferidos 558 milhões de dólares americanos. Opacidade aqui ao lado No que diz respeito a Hong Kong, é revelado que em 2023 o território “impôs multas a quatro bancos no total de 3.2 milhões de dólares americanos, uns negligentes 0,0085 por cento dos lucros reportados por esses mesmos bancos nesse ano”. Ainda no tocante à RAEHK, é revelado que “não existe um sistema central de registo sobre a posse de beneficiários – simplesmente é exigido às empresas que mantenham essa informação para si”. “Alguns tipos de fundos de investimento estão ainda isentos de manter registos dos seus proprietários. Com mais de 1,4 milhões de empresas registadas em 2023, manter o cumprimento da monitorização destas regras é um enorme desafio, criando-se lacunas que actores na sombra podem facilmente explorar”, descreve-se ainda. Refere-se também que “a opacidade é ainda pior no que diz respeito a fundos de investimento”, com Hong Kong, Singapura e os Emirados Árabes Unidos “a não terem qualquer forma de registo dos beneficiários dos fundos”. “Como resultado, mesmo as autoridades não têm forma de saber quantos fundos existem e como operam nos seus países, deixando sozinhos os activos adjacentes a esses fundos. Nos casos em que há suspeita de ilegalidades, as autoridades confiam nos beneficiários para providenciarem informação: um processo que consome muito tempo e não é eficiente”, acrescenta-se. Dinheiro e clima Em termos gerais, o relatório do CPI destaca que, na região da Ásia-Pacífico, “os líderes têm falhado em travar a corrupção no meio da escalada de uma crise climática”. Numa nota assinada por Ilham Mohamed, Yuambari Haihuie e Urantsetseg Ulziikhuu, conselheiros regionais da Transparência Internacional, consideram que “os governos em toda a região da Ásia-Pacífico continuam a falhar nas promessas anti-corrupção”, chamando a atenção para o facto da região enfrentar muitos desastres naturais e ser “casa de um terço da população mundial, com o segundo maior número de população jovem” do mundo. “Sem esforços concertados para combater a corrupção agora, a primeira geração que está a enfrentar a extrema alteração climática vai enfrentar consequências desastrosas”, é descrito. “A corrupção obstrui políticas ambientais, trava financiamentos climáticos e impede o avanço em regulamentos e políticas, deixando mais vulneráveis aqueles que têm menos recursos”, descreve-se no relatório, que aponta para o facto de a corrupção travar “o uso efectivo do dinheiro” no combate às alterações climáticas. É mencionado o Paquistão, “que sofreu vulnerabilidades climáticas sem precedentes nos últimos anos, com falhas sistémicas de governação e barreiras na implementação de políticas – incluindo atrasos na implementação de regulações e estabelecimento de instituições no âmbito da ‘Climate Change Act 2017’ – tenham deixado o contexto de financiamento muito aquém dos 348 mil milhões de dólares americanos projectados para finais de 2030”. Destaca-se ainda o caso do Vietname, que teve 32 projectos de energia solar e eólica sob investigação devido a “abuso de poder”. O relatório descreve “que a falta de espaço cívico para uma fiscalização efectiva, bem como um número limitado de mecanismos para um apoio efectivo de sistemas de queixas – como a protecção de informadores – tem ameaçado estes programas fundamentais”.
Hoje Macau Grande PlanoDefesa | Despesa mundial aumentou 7,4% em 2024 A despesa mundial com o sector da defesa aumentou 7,4 por cento em 2024, mas é improvável que os países europeus consigam manter o ritmo devido às pressões orçamentais internas, segundo um estudo publicado ontem. De acordo com o Balanço Militar 2025, produzido pelo Instituto Internacional de Estudos Estratégicos (IISS), a despesa pública com a defesa atingiu 2,46 biliões de dólares no ano passado, aumentando em todas as regiões do mundo, excepto na África Subsaariana. O investimento europeu cresceu em particular, com destaque para o aumento de 23,2 por cento da Alemanha, que terá ultrapassado o Reino Unido em gastos militares no segundo lugar na NATO, atrás dos EUA. O IISS estima que, no conjunto, os membros europeus da NATO gastaram 442 mil milhões de dólares no sector da defesa em 2024, menos de um terço do total da despesa Aliança Atlântica, que ascende a 1,44 biliões de dólares. “Com a persistência das pressões orçamentais na maioria dos países europeus, é provável que seja difícil manter o aumento das despesas. O fardo não é partilhado de forma generalizada, com alguns países da NATO a gastarem mais de 3 por cento do Produto Interno Bruto (PIB), enquanto outros permanecem abaixo da linha de base de 2 por cento”, refere o IISS, num comunicado. Em termos reais, a despesa europeia com a defesa cresceu 50 por cento em termos nominais na última década, segundo o Balanço Militar 2025, que todos os anos faz uma avaliação das capacidades militares e da economia da defesa a nível mundial. O estudo inclui dados actualizados sobre as estruturas militares, os inventários de equipamento e os orçamentos de defesa de mais de 170 países. O IISS estima que um aumento para 3 por cento do PIB de todos os membros europeus da NATO faria o montante crescer mais de 250 mil milhões de dólares e quase 750 mil milhões de dólares se fosse atingido o valor de 5 por cento, como chegou a sugerir o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump. “No entanto, estes valores são inatingíveis neste momento, com alguns países a recorrerem a instrumentos extra-orçamentais para reforçar os orçamentos”, reconhece o centro de estudos britânico. Quanto aos EUA, embora este país gaste em defesa 3,39 por cento do PIB, “as limitações são evidentes na sua base industrial de defesa” devido à necessidade de investimento e modernização, refere. Contas complicadas O IISS calcula que as despesas militares da Rússia aumentaram 41,9 por cento em 2024, sobrecarregando o orçamento para o equivalente a 6,7 por cento do PIB, o que é superior ao total da despesa europeia com a defesa em termos de paridade do poder de compra. No entanto, afirma que a economia russa continua resiliente graças às receitas provenientes de fontes não energéticas, que permitem manter um défice orçamental reduzido, e a medidas do banco central. Segundo o Balanço Militar, é cada vez mais difícil quantificar a despesa russa com a defesa devido ao financiamento por parte de entidades regionais, de empresas privadas e até de famílias, que pagam equipamento e provisões básicas. Sobre a China, o IISS dá conta de uma reorganização e reformas internas para tornar a estrutura militar mais eficiente, nomeadamente através do combate à corrupção, investigação e aumento de capacidades, nomeadamente em equipamento. O orçamento chinês em 2024 foi estimado em cerca de 235 mil milhões de dólares, um aumento de 7 por cento em relação a 2023 e um montante equivalente a 44 por cento da despesa total na Ásia.
Andreia Sofia Silva Grande Plano MancheteCheques pecuniários | Um “conforto” económico que tem gerado debate O programa de comparticipação pecuniária arrancou em 2008 para distribuir os frutos do desenvolvimento da RAEM pelos residentes. Porém, voltou à ordem do dia a possibilidade de deixar de fora quem não vive em Macau. Sonny Lo descreve a medida como um “conforto” económico, enquanto José Félix Pontes diz que alterar a política acarreta “coragem” Todos os anos os residentes permanentes e não-permanentes, quer tenham muitas ou poucas posses económicas, recebem, respectivamente, dez mil patacas e seis mil patacas do Governo. Um cheque que se obtém apenas por se ser portador do BIR – Bilhete de Identidade de Residente, quer o residente more ou não em Macau. De acordo com o Governo, o objectivo do programa de comparticipação pecuniária sempre foi a partilha do sucesso económico do território com a população, obtido em grande parte com os impostos cobrados sobre o jogo. Porém, nas últimas semanas não faltam vozes, sobretudo na Assembleia Legislativa (AL), a pedir que quem vive fora de Macau deixe de receber o cheque. O assunto voltou a ser discutido ontem no programa matinal Fórum Macau, do canal chinês da Rádio Macau, com Nelson Kot, presidente da Associação de Estudos Sintético Social de Macau, a defender que os cheques deveriam ser atribuídos mediante o rendimento das diversas classes sociais. Assim, os valores seriam diferentes. “Alguns idosos não têm muitos rendimentos e dependem da reforma para viver. Se este grupo de pessoas receber um cheque de maior valor, a sua vida pode melhorar. Se considerar o princípio da justiça social, o Governo deve considerar a forma de distribuição dos cheques pecuniários consoante as diversas classes sociais, aproveitando formas de aumentar os direitos de alguns grupos”, disse. Lei Chun Kwok, vice-presidente da Associação Económica de Macau também participou no programa, recordando que aquando do lançamento dos cheques, em 2008, a economia local sofria com o impacto da crise mundial desse ano, pelo que a concessão dos cheques visava apoiar a população a lidar com o aumento da inflação. Depois, na pandemia, lembrou Lei Chun Kwok, acabou por constituir mais um apoio, dada a atribuição dos cheques com antecedência. O também académico da Universidade de Macau lembrou que para os residentes que não moram em Macau, o potencial destes cheques para estimular o consumo é limitado. “Tendo em conta a perspectiva económica, se os titulares dos cheques que moram no exterior só os depositam nas contas bancárias, poupando todo o dinheiro, tal não beneficia os interesses gerais de Macau, porque o dinheiro não entra no sistema económico nem ajuda a criar actividades económicas.” Leong In Pong, subchefe do conselho de assuntos sociais da União Geral das Associações de Moradores de Macau (UGAMM), também defendeu no mesmo programa que os residentes, para receberem os cheques, devem viver em Macau pelo menos 183 dias por ano, regra também imposta aos beneficiários do regime de previdência central não-obrigatório, assim como para renovar os BIR não-permanentes. 50 por cento em vouchers Para o economista José Félix Pontes, não deverá haver alterações a curto prazo da política. “Para os anos futuros, e no pressuposto de que o Governo manterá a medida (que defendo), dever-se-ia restringir [a atribuição] a quem resida na RAEM, pelo menos, 183 dias em cada ano, seguindo-se o critério de ‘residente fiscal’ da RAEM”, sugeriu ao HM. Porém, o economista entende que devem ser criadas excepções, caso a limitação avance, nomeadamente para “estudantes de Macau que estudem no exterior, ou residentes permanentes tratados em estabelecimentos hospitalares da China ou no estrangeiro por períodos longos, ou professores que leccionem em instituições de ensino fora de Macau”. É também sugerido por este economista que o montante de cada cheque deveria ser atribuído em duas componentes, nomeadamente metade em cheque e metade em formato “voucher”, “para poderem ser utilizados exclusivamente em estabelecimentos comerciais na RAEM”. Porém, José Félix Pontes considera que “será difícil alterar a situação e será sempre uma medida em que o Governo da RAEM terá de revelar determinação e coragem políticas”. Para o analista Sonny Lo, os cheques deixam “uma sensação de conforto entre os residentes e, idealmente, deveriam continuar, ainda que o montante possa ser reduzido um pouco em termos anuais”. Os cheques representam, assim, “um factor de bem-estar que tem levado à satisfação política e social em Macau”. Caso haja mudanças, Sonny Lo não prevê perturbação social, dado que “em Macau as pessoas são politicamente muito calmas e dão relativo apoio ao Governo”. Focar os objectivos Olhemos para os números: em 2008, primeiro ano de lançamento do programa de comparticipação pecuniária, foram dados cheques a 534,672 residentes, no valor global de 2.545 milhões de patacas; sendo que actualmente os beneficiários são cerca de 750 mil, o que acarreta uma despesa anual para a Administração de 7,5 mil milhões de patacas. Para José Félix Pontes, a questão dos beneficiários não é nova, pois “desde o início da distribuição destes cheques que se tem questionado se esta se deveria limitar apenas a quem, na realidade, esteja a viver permanentemente na RAEM, ou se deveria incluir, independentemente do local efectivo de residência, todo e qualquer portador de bilhete de residente permanente ou residente não-permanente”. “Também a questão do ‘nível dos rendimentos’ de cada residente tem sido colocada em causa, havendo quem defenda que estes cheques deveriam ter como beneficiários residentes com menores rendimentos, ou, então, que fossem de montantes escalonados consoante os rendimentos de cada um. Finalmente, a eventual atribuição dos cheques aos trabalhadores portadores de ‘blue card’ (trabalhadores não-residentes), tem sido, de forma muito ‘soft’, referida de tempos a tempos, já que os mesmos também contribuem, em diversos sectores, para o desenvolvimento da economia de Macau”, lembrou. A verdade é que, no ressurgir deste debate, a possível inclusão dos TNR, por exemplo, nunca foi directamente considerada. O deputado Ron Lam tem sido um dos defensores de alterações ao programa de comparticipação pecuniária, devendo o Governo esclarecer se a medida é um apoio financeiro ou distribuição de dividendos. O deputado disse que, actualmente, há cerca de 100 mil residentes a viver fora de Macau. Ron Lam referiu ainda que, segundo os dados das propostas orçamentais para o ano económico de 2025, o Governo poupou 79,32 milhões de patacas com cheques que não foram depositados dentro do prazo de três anos. O deputado defendeu um levantamento das razões para que esses cheques não tenham sido depositados ou levantados. Também a deputada Lo Choi In defendeu o fim dos cheques para quem está fora de Macau. José Félix Pontes entende que está na hora de pensar no verdadeiro objectivo desta política. “Tem de se ter presente o objectivo definido para a distribuição dos cheques pecuniários, que consistiu em partilhar com a população residente na RAEM o sucesso financeiro na evolução da economia, que está, indissoluvelmente, ligado às receitas auferidas pelo Governo no imposto sobre o jogo. Daí falar-se na distribuição dos dividendos do jogo. Porém, a medida tem de ser vista não só como uma partilha de ganhos económicos, mas também, e em certa medida, como um reforço da segurança social dos residentes da RAEM ou de promoção da economia local.” O HM questionou uma residente de Macau, de nacionalidade portuguesa, que não quis ser identificada, e que deixou o território há cerca de um ano, vivendo actualmente em Portugal. Porém a residente já ponderou um eventual regresso ao território. Sobre os cheques, diz que é importante analisar as intenções do Executivo. “Se a ideia dos cheques é distribuir a riqueza dos casinos pelas gentes de Macau, para as pessoas que são residentes, não faz sentido acabarem com eles, porque as pessoas continuam a ter uma ‘costela’ de Macau de alguma forma. Se a perspectiva for esse altruísmo, aí não faz sentido pararem com os cheques para quem está fora. Se a questão é haver uma recompensa, aí é diferente. Os cheques são o quê, afinal? Não são a distribuição da riqueza pelas pessoas de Macau? Ou se contribuíres para Macau recebes uma recompensa? Essa é a questão central. Se for para distribuir a riqueza dos casinos todos têm direito.” A residente destaca o exemplo de uma pessoa que toda a vida viveu em Macau, reformou-se e foi para outro país por “vários motivos, até de saúde”. “É importante saber esse tipo de casos. Mas o fundamental é mesmo saber o que é o cheque pecuniário e para que serve. A mim sempre me foi dito que era a distribuição da riqueza”, rematou.
Andreia Sofia Silva Grande Plano MancheteEstudo | Governo relutante em legislar testamento vital Um estudo de Man Teng Iong, docente da Faculdade de Direito da Universidade de Macau, e Vera Lúcia Raposo chama a atenção para a ausência da “Directiva Antecipada de Vontade”, ou testamento vital, do ordenamento jurídico da RAEM. O documento permite que uma pessoa decida previamente se quer ou não receber tratamentos médicos na fase terminal da vida Há vários anos que em Portugal qualquer cidadão pode assinar uma Directiva Antecipada de Vontade (DAV), também conhecida como testamento vital, que permite a decisão consciente sobre o tipo de tratamentos médicos a receber em determinado contexto de saúde. Estando longe de constituir uma forma legal de eutanásia, o documento permite conhecer a vontade do paciente quando este, por motivos de saúde, não o poder fazer. Em Macau, o DAV não está legislado e as autoridades têm revelado sinais de relutância em avançar no processo. É o que conclui o estudo “Advance Directives in Macao: Not Legally Recognised, but. . .” [DAV em Macau: Sem Reconhecimento Legal, mas…”, assinado por Man Teng Iong, docente da Faculdade de Direito da Universidade de Macau (UM), e Vera Lúcia Raposo, ex-docente da mesma faculdade e actualmente professora na Faculdade de Direito da Universidade Nova de Lisboa. O estudo foi publicado recentemente pela Cambridge University Press, embora tenha sido o tema da tese de mestrado de Man Teng Iong defendida há uns anos. Os autores analisam o enquadramento jurídico da questão em Macau, concluindo que “até à data, o Executivo de Macau assumiu uma atitude de precaução em relação às DAV, aceitando (ou tolerando) estes instrumentos, mas não investigando este assunto com a força necessária”. “Tem sido reportado que, devido ao envelhecimento da população de Macau, e à luz da adopção da legislação sobre DAV nos últimos vinte anos em países como os Estados Unidos, Austrália, Canadá e Singapura, o Executivo reconheceu a necessidade de legislar as DAV”, é acrescentado. Os autores indicam que as autoridades locais até reconhecem os factores positivos de ter acesso a este tipo de documento legal. “Tais instrumentos legais de vontade não vão apenas aumentar a qualidade de vida e proteger a dignidade dos pacientes no fim das suas vidas, mas também reduzir despesas médicas desnecessárias. A 3 de Dezembro de 2019, os Serviços de Saúde (SS), e a sub-entidade da Comissão de Ética para as Ciências da Vida, introduziram as ‘Directrizes para Questões e Política Futura das DAV’ em Macau, concordando em legitimar [a matéria]. Porém, apesar da concordância em torno da implementação das DAV, o Executivo insiste em manter numa fase preliminar as discussões em torno das DAV.” Desta forma, os autores consideram que a “hesitação pode reflectir o receio da entidade [SS] em enfrentar dificuldades e controvérsias em torno dos planos para a sua implementação”. Consenso como argumento Os autores destacam que as “barreiras para a implementação” do quadro jurídico das DAV em Macau surgem “de uma baixa consciência por parte do público face à legislação das DAV e a possibilidade dos pacientes poderem mudar a forma de encarar o fim de vida, bem como a disposição dos familiares do paciente em cumprir com as vontades do paciente”. O estudo salienta que os SS sempre argumentaram que “tem sido feita uma extensiva e profunda acção de sensibilização e educação junto do público, nas áreas académicas, sociais e jurídicas sempre que necessário, e que a lei que regulamenta as DAV apenas pode ser implementada depois de obtido o consenso de todos os sectores”. Porém, o estudo refere que “é possível argumentar que a posição do Executivo carece de justificação adequada”, pois “este tipo de consenso invocado para adiar a regulação das DAV não é possível de atingir, devido à multiplicidade de visões legais, éticas e até religiosas sobre a matéria”. Além disso, os autores salientam que “mesmo que um consenso desse género pudesse ser atingido, o Executivo não tomou os passos necessários para encorajar ou facilitar a discussão, ou a consciencialização, junto da população”. São mesmo referidos dados sobre um estudo feito acerca das noções da população de Macau sobre a matéria, concluindo-se que “a falta de informação sobre as DAV foram o principal factor determinante na decisão das pessoas em fazerem a DAV”. “O estudo também descobriu que 73,6 por cento da amostra (724 pessoas) estavam dispostas a completar uma DAV caso o documento tivesse reconhecimento legal”. “Resistência” social e política Assim, os autores do estudo alertam para a existência de “uma grande resistência – da parte de certos grupos de residentes de Macau e do Executivo – para a implementação de uma regulamentação adequada das DAV”. “Uma possível razão para esta hesitação passa pelo medo de que legislar formalmente as DAV pode levar à eutanásia, uma prática proibida em Macau, mesmo que as duas situações sejam claramente diferentes”, denotam os autores, que entendem ser “imperativo que o Executivo regule as DAV”. Neste ponto concreto, uma nova lei deveria “clarificar alguns aspectos legais, como os requisitos para a realização [das DAV] e para ficarem legalmente operacionais”, garantindo a autonomia de decisão do paciente e assegurando “uma solução mais adequada do ponto de vista dos direitos humanos”. Os autores chamam a atenção para a influência da lei portuguesa de 2012 na legislação das DAV em Macau, chamando-se a atenção para o facto de as DAV terem uma maior compatibilidade com o que consta actualmente no Código Civil local. Porém, legislar as DAV acarreta também uma discussão do ponto de vista cultural, é apontado. “Não é claro se a regulamentação das DAV estaria em concordância com os valores generalizados da comunidade chinesa predominante, que tem ainda uma grande ligação à família. São necessários mais estudos para clarificar esta e outras matérias, uma vez que, por exemplo, não existem dados sobre as estimativas dos números e implementação das DAV na jurisdição de Macau”, além de existir “uma necessidade urgente de mais investigações que explorem as perspectivas dos médicos em torno das DAV”. É referido o caso do Hospital Kiang Wu, que no centro de cuidados paliativos “The Hospice & Palliative Care Centre” disponibiliza tratamento para doentes terminais com cancro. Porém, antes da admissão destes doentes, é exigida a assinatura do documento “Consent for the Hospice & Palliative Care Centre”, uma espécie de consentimento que acaba por ser, na maior parte das vezes, assinada pelos familiares e não pelo próprio doente. Além disso, “não é um documento de autorização, por parte dos pacientes, da atribuição, ou não, de procedimentos médicos, mas uma aceitação dos termos e condições do hospital”. O que a lei actual permite Em termos gerais, as DAV em Macau têm algum enquadramento jurídico, nomeadamente no Código Civil, apesar de não estarem legisladas com uma lei própria. Os autores concluem, porém, que “subsiste alguma incerteza sobre até que ponto as DAV seriam efectivas, em particular tendo em conta que os médicos tendem a rejeitar qualquer documento que rejeite um tratamento de suporte e manutenção de vida”. “Em Macau a discussão em torno das DAV é quase inexistente. Sem um debate claro e transparente que inclua especialistas e estudos com argumentos jurídicos, não haverá desenvolvimentos jurídicos relacionados com a natureza, conteúdo e utilização das DAV num futuro próximo”, descreve-se.
Andreia Sofia Silva Grande Plano MancheteInteligência Artificial | Estudo destaca meta de liderança da China A China pretende liderar o mercado global da inteligência artificial, “tanto em termos de teoria, como de aplicações”, procurando auto-suficiência neste domínio. Esta é uma das conclusões da tese de doutoramento de Muhammed Can, “A inteligência artificial como recurso: Uma Avaliação das Estratégias de Mobilização e Extração da China”, defendida na Universidade do Minho Poucos meses antes do lançamento da plataforma “DeepSeek” na China, que revolucionou o mercado da Inteligência Artificial (IA) em concorrência com o “ChatGPT”, foi defendida na Universidade do Minho (UM) uma tese de doutoramento que conclui, precisamente, os passos que Pequim está a dar para buscar a liderança global nessa área. O trabalho, de Muhammed Can, intitula-se “Artificial Intelligence as a Resource: An Appraisal of China’s Mobilization and Extraction Strategies” [A inteligência artificial como recurso: Uma Avaliação das Estratégias de Mobilização e Extração da China], e analisa a conexão da IA às relações internacionais, bem como a estratégia que o país tem adoptado neste domínio nos últimos anos. A tese, na área da ciência política e relações internacionais, foi defendida na Escola de Economia e Gestão da UM. Assim, conclui-se que o Partido Comunista Chinês (PCC) “tem como objectivo tornar-se líder mundial tanto em termos de teoria como de aplicações de IA”, tendo sido delineados alguns objectivos principais para “o processo de mobilização de recursos e desenvolvimento da IA”. Segundo o autor, estes passam pela “busca da auto-suficiência, uma visão concretizada na estratégia de 2015, ‘Made in China 2025′”, assim como “a transformação económica, com vista a integrar perfeitamente a IA e a automatização na economia nacional”. De resto, o autor considera que Pequim procura tornar-se um concorrente e líder na área da IA com vista a combater os avanços noutros mercados, nomeadamente nos Estados Unidos, recorrendo a iniciativas como a “Rota da Seda Digital da China e esforços de definição de padrões como caminho para a validação externa”. Desta forma, “as estratégias de extração de recursos externos da China são facilitadas pelos vários mecanismos económicos, visando a transferência de conhecimento e aquisição de talentos, com o objectivo de preencher a lacuna de recursos com os Estados Unidos”. O “tecno-nacionalismo” A tese fala ainda da noção de “tecno-nacionalismo”, ligada à área das relações internacionais, como “a variável mais importante no quadro da política de IA da China”, podendo também “ser visto como uma continuação e manifestação da estratégia de ‘dois mercados, dois recursos’ do PCC”. Com esta abordagem, a China pretende “proteger o mercado interno e, simultaneamente, expandir-se para o estrangeiro, promover a venda de produtos fabricados na China e extrair recursos como dados, talento, ‘know-how’ e muitos outros”. Além disso, “as implicações do tecno-nacionalismo também se estendem às empresas tecnológicas estrangeiras que operam na China”, uma vez que, “no contexto das empresas comuns, a China utiliza várias barreiras e tira partido do seu quadro jurídico nacional como instrumento para a transferência estratégica de tecnologia e conhecimentos especializados”. O trabalho académico tem em conta as políticas e leis implementadas entre 2012 e 2023, concluindo que após o lançamento do “Plano de Desenvolvimento da Nova Geração de Inteligência Artificial” [NAIDP, na sigla inglesa], em 2017, a estratégia chinesa para a IA ganhou um novo rumo. “A tese demonstra que o ritmo a que os recursos foram mobilizados aumentou acentuadamente após o anúncio do NAIDP em 2017”, tendo sido revelado um conjunto “de iniciativas e planos relacionados com a IA, destinados à mobilização sistemática de recursos essenciais para o desenvolvimento da IA”. Nos anos a que se refere o estudo, “o PCC promulgou uma série de políticas e legislações relacionadas com os dados, incluindo leis relativas à privacidade dos dados individuais”, introduzindo “quadros jurídicos especificamente relacionados com segurança nacional, que têm implicações directas na governação e regulamentação dos dados”. O autor descreve ainda a forma que Pequim tem adoptado para mobilizar todos os recursos disponíveis em torno da política da IA, com o Conselho de Estado “a promulgar planos estratégicos abrangentes pertinentes para a IA ou assuntos relacionados com a IA – como o Plano de Acção Trienal Internet + Inteligência Artificial”. São estes documentos que vão “articular objectivos e normas a curto e longo prazo, servindo de percurso para um desenvolvimento coordenado neste domínio”. Os recursos essenciais no desenvolvimento de projectos e políticas de IA são “dados, algoritmos e capacidade de computação”. De frisar que existe uma “estratégia de mobilização de recursos do PCC” que tem a “abordagem de ‘toda a sociedade’ e ‘todo o Governo'”. Tal “implica que todos os segmentos da sociedade, incluindo instituições governamentais, empresas privadas e indivíduos, podem ser envolvidos no esforço de desenvolvimento da IA, se tal for considerado necessário”. Trata-se, segundo a tese, de “uma abordagem integrada que permite uma estratégia mais coesa e abrangente para a mobilização de recursos no contexto do desenvolvimento da IA”. Após “a introdução de estratégias globais”, o PCC “inicia o processo de mobilização de recursos através de instituições governamentais designadas”, nomeadamente ministérios, o Gabinete de Promoção da IA e a Administração do Ciberespaço da China”. “Para melhorar a sua estratégia de mobilização de recursos, o PCC incorpora activamente actores privados no ecossistema de desenvolvimento da IA. Ao designar certas grandes empresas tecnológicas como campeãs nacionais da IA, o Governo não só mobiliza estas empresas, como também as incentiva a mobilizar mais recursos de acordo com os objectivos estratégicos do Estado”, lê-se ainda. Importância dos governos locais Tal como noutros campos, a China percebeu desde cedo que a IA constituía uma área importante para investir e que teria de fazer parte das estratégias económicas e políticas. Assim, a tese de Muhammed Can “demonstra que as mudanças do PCC na política tecnológica alinham-se de forma estreita com o ambiente estratégico”, pois o partido “percebeu as oportunidades e ameaças em desenvolvimentos globais significativos”. Ainda no tocante à mobilização de recursos para o desenvolvimento da IA, o autor fala de um processo “complexo e distribuído em vez de uma abordagem singular, de cima para baixo, liderada apenas pelo PCC ou pelo Conselho de Estado”. “Embora o PCC estabeleça as normas e directrizes gerais, envolve activamente um vasto leque de partes interessadas – incluindo empresas, universidades e organismos ministeriais – no processo de mobilização. Essa estratégia distribuída pode ser entendida no contexto do tamanho da China, tanto em termos de população quanto de extensão geográfica, que exige uma abordagem mais dispersa.” O autor destaca o “papel preponderante que os governos locais desempenham no desenvolvimento da IA”, pois “funcionam como extensões da autoridade central, e o seu envolvimento activo implica a mobilização directa de recursos”, nomeadamente ao nível de algoritmos e capacidade de computação. “A tese conclui que os governos locais também instituíram diversas estratégias para melhorar as políticas associadas a dados, algoritmos e capacidade de computação”, pode ler-se. “Alguns governos locais tomaram a iniciativa de formular as suas próprias estratégias de IA antes das autoridades centrais terem emitido directrizes oficiais. Posteriormente, estas estratégias locais foram revistas para se conformarem com as directivas centrais”. Para analisar as políticas locais de IA, o autor analisou os casos de Xangai e Shenzhen. De resto, a ideia de mobilização em torno da área da IA prende-se com questões históricas, pois Pequim sempre buscou a vanguarda na área da tecnologia, nomeadamente desde os tempos da Guerra Fria. Conforme se lê na tese, “a China começou por confiar fortemente na tecnologia exportados da União Soviética após a criação da República Popular da China”, mas “o ambiente estratégico restritivo começou a evoluir com a visita histórica do Presidente norte-americano, Richard Nixon, em 1972”, tendo representado “uma oportunidade inestimável para a China e os EUA contrabalançarem a ameaça soviética”. Graças a pesquisa de arquivo, o autor conclui que “o ambiente estratégico da China transitou para um estado parcialmente permissivo por volta de 1978, coincidindo com o início das políticas de reforma e abertura do líder Deng Xiaoping”. A partir desse ano decorreu “uma expansão dramática das oportunidades para o PCC no domínio do desenvolvimento tecnológico”. Em termos gerais, “o conceito de mobilização está intrinsecamente ligado ao papel de vanguarda de longa data do PCC, um papel que facilitou a rápida mobilização de recursos durante momentos-chave de sua história”. Nem de propósito, a China participa desde ontem na cimeira sobre IA que decorre em Paris, a Cimeira de Acção sobre IA, tendo enviado o vice-primeiro-ministro Zhang Quoqing. Nesta cimeira, que termina hoje, estão presentes “chefes de Estado, investigadores e líderes de empresas tecnológicas que vão debater a forma como os governos devem responder aos rápidos avanços neste domínio”, segundo a Lusa.
Andreia Sofia Silva Grande Plano MancheteTurismo | Análise diz que Macau é cada vez mais um destino de lazer Os académicos Pedro Steenhagen e Sofia Xiaoying Hou analisaram a indústria do turismo de Macau, concluindo que, cada vez mais, o território é encarado como um destino de lazer e não tanto como uma terra de jogo. Os autores alertam para o “longo caminho a percorrer no que respeita à promoção do turismo sustentável” O sector do turismo em Macau tem mudado nos últimos anos e as visões dos próprios turistas também, encarando cada vez mais o território como um local onde se pode passear e desfrutar de zonas de lazer, e não tanto como uma terra de jogo. Esta é uma das conclusões da análise “Tourism as a Driver of China’s Cultural Soft Power: The Role of Macau and the Convergences Between the New Silk Road and the Greater Bay Area” [O Turismo como Motor do Soft Power Cultural da China: O Papel de Macau e as Convergências entre a Nova Rota da Seda e a Área da Grande Baía], da autoria de Pedro Steenhagen, da Universidade de Fudan, e Sofia Xiaoying Hou, ligada à Universidade de Estudos Internacionais de Xi’an. A análise à indústria do turismo na RAEM é um dos capítulos do livro “The Palgrave Handbook on China-Europe-Africa Relations”, recentemente editado. Desta forma, conclui-se que “a percepção da imagem de Macau por parte dos turistas tem vindo a mudar nos últimos 10 anos, sendo a RAEM cada vez mais vista como um local de lazer e férias em geral, e não especificamente ou puramente como um centro de jogo”. Acrescenta-se ainda que “a imagem da RAEM como destino turístico está em transição, e as pessoas que visitam Macau têm valorizado muito as suas atracções culturais únicas, incluindo a sua arquitectura e gastronomia, resultado da mistura das culturas e heranças chinesa e portuguesa”. Porém, os autores consideram que “Macau tem ainda um longo caminho a percorrer no que respeita à promoção de um turismo sustentável efectivo”. Entende-se que o turismo sustentável “deve ter plenamente em conta os seus impactos económicos, sociais e ambientais, abordando as necessidades dos visitantes, do sector, do ambiente e das comunidades relacionadas”. Neste campo, os autores destacam, citando outro autor, que “Macau tem feito esforços para alcançar boas notas nestas e noutras matérias, pois a indústria do turismo da RAEM tem vindo a passar por uma ‘revolução silenciosa’ desde o início da pandemia”. Destaca-se também que, a nível mundial, a Organização Internacional do Turismo criou algumas directrizes sobre sustentabilidade, criando “um importante quadro de turismo sustentável”. Para tal foram propostos “cinco pilares fundamentais para avaliar a sustentabilidade do sector turístico de um Estado”, tais como “política e governação do turismo; comércio, investimento, dados e competitividade; emprego, trabalho digno e capacitação; redução da pobreza e inclusão social; e sustentabilidade dos ambientes naturais e culturais”. A Rota da Seda Os académicos analisam também o papel do sector turístico de Macau na estratégia de “Uma Faixa, Uma Rota”, destacando que o território “tem vindo a ganhar um papel de destaque nas políticas locais, regionais e externas, sendo um actor capaz de melhorar a Rota da Seda do Turismo e dinamizar o turismo na região da Grande Baía”. Entende-se que Macau traz novos contributos à forma como a China apresenta a sua cultura, pois “devido ao património e produtos turísticos existentes, apresenta a cultura chinesa aos visitantes estrangeiros através de uma nova lente, mais diversificada, que vai além da tradicional”. Desta forma, permite-se que os turistas, “em especial do mundo lusófono, [criem] uma melhor ligação e compreensão do país através de laços históricos e culturais comuns”. No que diz respeito ao projecto da Grande Baía, considera-se também que tanto essa região como o próprio território de Macau têm “integrado activamente as estratégias de desenvolvimento turístico no quadro da BRI”, ou seja, a “Belt and Road Initiative”, designação inglesa para “Uma Faixa, Uma Rota”. Macau possui “um leque diversificado e distinto de recursos turísticos, tais como as artes, a história, as construções e tradições religiosas, a gastronomia, o desporto, os museus, entre outros”, e as autoridades locais têm procurado, segundo os autores, “marcar a sua indústria turística, promovendo o ‘Turismo+’ com a cooperação transfronteiriça no âmbito da BRI”. A ideia é “criar uma imagem de Macau como uma cidade com culturas diversificadas, integrando os sectores do turismo, entretenimento, cultura, desporto, negócios, convenções e exposições, cuidados de saúde, recreação, tecnologia e grandes eventos”. Melhorias em curso Pedro Steenhagen e Sofia Xiaoying Hou entendem que o Governo de Macau “tem tentado melhorar o soft power cultural e aumentar a atractividade turística através do desenvolvimento de produtos, da melhoria das instalações e de propaganda”, além de que têm sido realizados “projectos para melhorar as instalações, como hotéis, restaurantes, transportes e passeios digitais”. Dá-se o exemplo de dois percursos em formato digital criados pelo Instituto Cultural, nomeadamente, em 2021, “A Casa da Família de Zheng Guanying” e também “Fortaleza da Guia”. De resto, as autoridades têm criado diversas plataformas interactivas com recurso à realidade virtual aumentada. Apesar de todos os esforços apontados às autoridades locais, entende-se que “a RAEM tem ainda um potencial inexplorado para reforçar os laços culturais entre a China e os países de língua portuguesa, podendo esta década apresentar grandes oportunidades nesse sentido”. A aposta turística Neste capítulo, os autores olham também para o posicionamento do turismo na iniciativa “Uma Faixa, Uma Rota” por parte de Pequim, tendo em conta que “a China tem vindo a prestar cada vez mais atenção à necessidade de expandir o seu soft power cultural, tanto a nível regional como global”. Desta forma, o país “tem formulado vários planos de desenvolvimento cultural associados a “Uma Faixa, Uma Rota” e à área da Grande Baía, e o turismo tem aparecido constantemente como um elemento essencial da sua estratégia global”. No próprio país “o turismo ganhou relevância, quer como meio de melhorar a imagem internacional, quer como fonte de receitas”. Só em 2018 “cerca de 159 milhões de visitantes viajaram para o país, que investiu 155 mil milhões de dólares em infra-estruturas turísticas – um valor que só fica atrás do dos Estados Unidos, mas que deverá tornar-se o primeiro até 2028 -, uma vez que viu o sector representar 11 por cento do seu produto interno bruto total”. Os autores defendem que “ao ligar e aumentar a dinâmica entre a BRI [Belt and Road Initiative] e a área da Grande Baía, com um esforço interessante na diversificação da economia de Macau e no fortalecimento do seu sector turístico, bem como entre os objectivos nacionais e regionais, a China parece estar a encontrar uma forma de impulsionar o turismo e colher os frutos em termos de soft power cultural”. Assim, e a longo prazo, considera-se que o país “poderá não só fazer crescer o poder das suas narrativas e da sua cultura, mas também melhorar o poder normativo e o posicionamento institucional na cena mundial, sobretudo no que diz respeito às questões de governação”. De referir que o livro “The Palgrave Handbook on China-Europe-Africa Relations” é editado por Yichao Li, Jorge Tavares da Silva, Carlos Rodrigues e Francisco José Leandro, da Universidade de Macau. A edição está a cargo da Palgrave Macmillan.
Andreia Sofia Silva Grande Plano ManchetePortuguês | Estudo aponta falta de foco do Brasil em Macau e na China “Brazilian foreign policy and the quest to promote portuguese: building bridges through Macau”, estudo da autoria de João Simões, da Universidade Cidade de Macau, e de Daniel Veras, chama a atenção para a necessidade de o Brasil apostar mais nas vantagens de Macau na promoção do português, assim como na China Um estudo publicado recentemente na revista Janus, da Universidade Autónoma de Lisboa, chama a atenção para o facto de o Brasil não estar a aproveitar devidamente as vantagens que Macau pode oferecer na promoção da língua portuguesa, integrada na política externa do país. “Brazilian foreign policy and the quest to promote portuguese: building bridges through Macau” [A política externa brasileira e a questão da promoção do português: construir pontes através de Macau] tem autoria de João Simões, professor assistente da Universidade Cidade de Macau (UCM) e Daniel Veras, docente na Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, no Brasil. “É tempo de o Brasil ter uma presença mais significativa em Macau, não só através dos canais diplomáticos, mas também estimulando o envolvimento de vários actores não estatais, como câmaras de comércio e investimento, associações profissionais, centros culturais brasileiros, órgãos de comunicação social, fundações artísticas e culturais, entre outros”, lê-se no artigo. Desta forma, os autores consideram que este conjunto de parceiros poderia ajudar o Brasil “a alavancar o papel de Macau como gerador de oportunidades, algo que o Brasil ainda não aproveitou plenamente”, uma vez que essa “presença reforçada em Macau permitiria a consolidação das parcerias existentes entre universidades brasileiras e da China continental”. Além disso, ao nível dos alunos, uma presença mais robusta do Brasil na RAEM poderia “aproximar os estudantes chineses que aprendem português das empresas brasileiras, reforçando a ligação entre a educação e o ecossistema empresarial da Grande Baía”, bem como potenciar a produção de “materiais didácticos adaptados localmente ao contexto chinês e, em última análise, aproximando o Brasil e a China através do ambiente único que Macau oferece”. Baseando-se em documentos oficiais e demais estudos sobre esta temática, os autores consideram que, em termos gerais, existe “a necessidade de o Brasil aproveitar efectivamente a posição estratégica de Macau para capitalizar estas oportunidades”. Destaca-se entre os pontos principais desta posição o facto de, em Macau, vigorar a política de “Um País, Dois Sistemas”, ser “um porto franco internacional, uma zona aduaneira autónoma” e possuir “um regime fiscal simples e reduzido”, sem esquecer o papel de plataforma comercial. Os académicos referem também o “Plano de Desenvolvimento para a Diversificação Económica Adequada da RAEM (2024-2028)” que “também oferece oportunidades, com destaque para a promoção do desenvolvimento de indústrias-chave como a medicina tradicional chinesa, a indústria financeira moderna, a tecnologia de ponta e os sectores MICE (reuniões, incentivos, conferências e exposições) e da cultura e desporto”. Uma fraca aposta Em relação à China, o Brasil também não está a explorar todas as oportunidades, destacam João Simões e Daniel Veras. “A política externa do Brasil tem promovido activamente a língua portuguesa em determinadas geografias, mas não tem dado prioridade à China, apesar da importância da relação bilateral entre os dois países”. É referido que “a língua portuguesa está a expandir-se na China, mas a participação do Brasil não está à altura da sua magnitude enquanto maior país de língua portuguesa do mundo”. Defende-se que essa “discrepância é ainda mais surpreendente se considerarmos que a China é o maior parceiro comercial do Brasil desde 2009”. O estudo destaca a posição de Victoria Almeida sobre a origem dos professores de português na China, que “historicamente o ensino de português na China teve como referência professores de Portugal”. Assim, “só recentemente os professores do Brasil se tornaram mais predominantes”, e uma das explicações apontadas para esse facto é a criação do Programa de Leitorado, que envia docentes para ensinar português em todo o mundo. É referida a situação desse programa em 2010, quando “foram selecionados 13 leitores, dois dos quais colocados na China: um no BISU e outro na Guangdong University of Foreign Studies”. Ainda assim, “os materiais didácticos do Brasil são escassos e, embora haja estudantes chineses que queiram ir para o Brasil, essas oportunidades são limitadas e os custos são elevados”. Entende-se que o Brasil “poderia tirar partido do que está a acontecer com o ensino do português na China continental”, pois “após anos de rápido crescimento do número de aprendizes de português, estamos agora numa fase de investimento nos chamados estudos de área ou regionais”. Assim, “as instituições de ensino superior e de investigação brasileiras podem contribuir para o reforço dos estudos de área da China sobre os países lusófonos e a América Latina, através da investigação e análise das dinâmicas sociais, económicas, políticas e culturais das regiões-alvo”, sobretudo tendo em conta a iniciativa “Uma Faixa, Uma Rota”, é salientado pelos autores. Portugal faz melhor O estudo denota que, apesar dos diversos intercâmbios entre o ensino superior brasileiro e chinês, a verdade é que “muito mais estudantes chineses retornam de intercâmbios em Portugal, cujas melhores universidades oferecem intercâmbios com estudantes chineses”, considerando-se que “demorará muito até que o Brasil construa uma cultura de ensino na China”. Desta forma, “em comparação com o Brasil, Portugal tem um maior enquadramento no ensino do português no estrangeiro”, disponibilizando “programas de ensino e bolsas de estudo para estudantes chineses”, de nível de mestrado e doutoramento, sem esquecer “a parceria com o Instituto Camões”. “Portugal também facilita a aquisição de títulos, além de promover a tradução de romances portugueses na China. Em contrapartida, o Brasil não faz um esforço tão estruturado. Como resultado, actualmente, a maioria dos estudantes chineses de língua portuguesa tende a usar o português europeu como base ou, pelo menos, como referência”, destaca-se. Assim, João Simões e Daniel Veras consideram que “o Brasil pode capitalizar o contexto actual, que engloba vários factores favoráveis, para adoptar uma abordagem mais colaborativa na promoção da língua portuguesa na China”. O estudo refere que, actualmente, o português é falado por mais de 264 milhões de pessoas nos cinco continentes, prevendo-se que este número suba para quase 400 milhões de pessoas em 2050, com “o continente africano responsável pelo maior aumento”, reforçando a preponderância do português como uma das línguas mais faladas no hemisfério sul. Além disso, o português é uma língua oficial ou de trabalho em 32 organizações internacionais. Com a chegada de Lula da Silva à Presidência do Brasil pela segunda vez, os autores consideram que este “tem tentado uma aproximação à China”, nomeadamente no compromisso de adesão à iniciativa “Uma Faixa, Uma Rota” e na nomeação “de um representante permanente no Fórum Macau”. Os académicos citam a ideia de outro autor quanto à existência de “desconfiança e reserva que o Brasil tem demonstrado ao longo dos anos em relação ao Fórum Macau”. Um maior envolvimento “pode ajudar a garantir à China o acesso a recursos e mercados vitais no Brasil e em África, contribuindo potencialmente para a segurança alimentar e energética interna da China”, bem como potenciar Macau enquanto “canal cultural entre a China e o mundo lusófono”. Porém, “embora exista vontade política e um ambiente favorável em Macau, serão necessários esforços mais concertados por parte do Brasil para materializar estas oportunidades”, é referido.
Hoje Macau Grande PlanoAno Novo Chinês | Turismo e viagens impulsionaram consumo Chegado ao fim o período de feriados do Ano Novo Chinês, os números oficiais não mentem: a China atravessou um intenso período de consumo, sobretudo relacionado com viagens e turismo. Entre os dias 28 de Janeiro e esta terça-feira, alguns destinos no país quebraram recordes de visitantes É no início de cada ano que a economia espera por aquele que é um dos momentos altos para o turismo e consumo na China. O Ano Novo Chinês representa não apenas um momento de convívio familiar, mas também a oportunidade para muitos chineses viajarem. Este ano, para celebrar o Ano da Serpente, milhões de pessoas viajaram internamente e também para fora do país entre 28 de Janeiro e terça-feira, e segundo a Xinhua os números são impressionantes no que diz respeito a compras ou número de visitantes em alguns destinos. A prefeitura de Altay, na região autónoma de Xinjiang, é referida como um dos grandes destinos de esqui no país, tendo recebido entre 28 e 31 de Janeiro 191.900 visitantes, fluxo turístico que gerou 225 milhões de yuan em receitas. A agência destaca que “esquiar se tornou definitivamente a actividade mais popular em Altay durante as férias”, levando a “um número recorde de praticantes, mais de 10.000, a visitarem a estância de esqui de Jiangjunshan no dia 2 de Fevereiro”. Tal representou “um aumento de 23 por cento em relação ao ano anterior”. A zona de Altay é famosa por registar entre 170 e 180 dias de neve por ano, sendo que nas zonas montanhosas a profundidade média da neve chega a atingir entre um e dois metros. Outra região da China que atingiu números consideráveis nos feriados do Ano Novo Chinês foi o condado de Yangshuo, na região autónoma de Guangxi Zhuang, graças “às paisagens naturais únicas e ricas actividades culturais”. Entre 28 e 30 de Janeiro, esta zona recebeu cerca de 410.600 turistas, gerando receitas turísticas de 589 milhões de yuan. Por sua vez, Lhasa (no Tibete) também registou um aumento do número de visitantes. Entre 28 de Janeiro e segunda-feira, a cidade recebeu 1,95 milhões de turistas, representando um aumento de 20,6 por cento em relação ao ano anterior, e apurou em receitas turísticas quase 1,76 mil milhões de yuan. Trata-se de um aumento de 14,75 por cento em relação ao ano anterior, de acordo com o gabinete municipal de cultura e turismo de Lhasa. Dados positivos das agências Ainda segundo a Xinhua, os números do Ano Novo Chinês também se revelaram nas plataformas de reservas de viagens. No caso da Fliggy, uma das principais agências online, foi registado “um aumento de reservas, especialmente para cidades como Xangai, Pequim e Guangzhou”. Por outro lado, “as encomendas de viagens internacionais aumentaram de forma significativa, com as reservas de cruzeiros internacionais a aumentarem mais de seis vezes em comparação com o ano anterior”. Relativamente ao tráfego aéreo, o Shanghai Airport Group informou que o tráfego de passageiros no domingo atingiu um novo recorde histórico de 404.000 pessoas, com o aeroporto de Pudong, em Xangai, a registar 259.000 passageiros e o aeroporto de Hongqiao 145.000 passageiros. Houve ainda uma “coordenação reforçada dos serviços de metro, autocarros e táxis para garantir o transporte sem problemas” com a chegada do fim dos feriados, disse o grupo. Na segunda-feira, o China State Railway Group Co., Ltd. registou “um marco histórico”, pois foram transportadas em todas as linhas de caminhos-de-ferro um total de 16,45 milhões de pessoas. Trata-se do “maior tráfego de passageiros num único dia na história da corrida às viagens da Festa da primavera”. Só esta terça-feira, último dia dos feriados, terão viajado de comboio 16,9 milhões de passageiros, número que realça “ainda mais o pico de viagens, uma vez que centenas de milhões de pessoas regressaram aos seus destinos após as reuniões familiares”. Comes e bebes No que ao turismo diz respeito, verificou-se “um número crescente de pessoas que procuraram conhecer o património da China, motivados pela inscrição do Festival da Primavera na Lista Representativa do Património Cultural Imaterial da Humanidade da UNESCO, em Dezembro de 2024”, indica a agência estatal. Dados do Ministério do Comércio mostram que as vendas nas principais empresas de retalho e restauração em toda a China, durante os primeiros quatro dias dos feriados, aumentaram 5,4 por cento em comparação com o mesmo período do ano passado. Verificou-se um aumento de consumo de alimentos e bebidas importadas, como lagostas, cerveja e vinho. “Devido ao aumento da procura durante o Festival da Primavera, as importações da nossa empresa aumentaram quase 50 por cento no último mês”, disse Yang Xinyu, que representa uma empresa da cadeia de abastecimento internacional sediada em Guangzhou. Desde Janeiro que as autoridades aduaneiras do Aeroporto Internacional de Guangzhou Baiyun registaram um aumento na importação de produtos alimentares como lagostas e caranguejos, de 31,8 por cento em relação a 2024, traduzindo-se no valor total de 14,3 milhões de yuan. Muitas compras online E se o Ano Novo Chinês é sinónimo de reunião familiar, os feriados foram mais uma vez uma época para fazer compras online. A Meituan, uma das principais plataformas de comércio electrónico de serviços do país, registou um “aumento impressionante” de 300 por cento em relação ao ano anterior nas reservas online para os jantares da véspera do Ano Novo Lunar. De destacar que “as encomendas de grupos para pacotes com o tema ‘património cultural intangível’ aumentaram mais de 12 vezes desde Janeiro, ano após ano, reflectindo o crescente interesse dos consumidores em experiências culturais”. Sun Jiashan, investigador associado da Academia Central da Administração da Cultura e do Turismo, referiu, segundo a Xinhua, uma mudança no comportamento dos consumidores, sobretudo por parte dos mais jovens e famílias. “As famílias jovens estão a tornar-se cada vez mais a força motriz do consumo, com uma tendência para experiências diversificadas, de alta qualidade e culturalmente ricas”, afirmou. Os dados da Meituan Travel corroboram a observação do analista de que os jovens optam cada vez mais por celebrar o Festival da Primavera em cidades mais pequenas, mergulhando no património cultural intangível e nos marcos históricos. O aumento do turismo e do consumo cultural, desde experiências patrimoniais a filmes de grande sucesso, indicam uma procura crescente por actividades culturais tradicionais e contemporâneas. “Esta tendência também levou ao aumento da procura de produtos e serviços culturais e turísticos, originando a introdução de novos modelos e formatos de negócio que se adaptam melhor aos padrões contemporâneos de consumo cultural”, afirmou Sun, salientando o potencial do mercado de consumo chinês e as forças motrizes internas da economia. Mas nem só de compras se fez este Ano Novo Chinês, pois “a indústria cinematográfica do país provou ser um dos maiores vencedores durante a onda de consumo do Festival da primavera”. Entre os dias 29 de Janeiro e 3 de Fevereiro as receitas diárias de bilheteira ultrapassaram mil milhões de yuans durante seis dias consecutivos, elevando as receitas de bilheteira do Festival da Primavera deste ano para 8,02 mil milhões de yuans, De acordo com os dados da Administração Cinematográfica da China, a bilheteira total da China nos feriados deste ano, incluindo as pré-vendas em tempo real, ultrapassaram dez mil milhões de yuan.
Hoje Macau Grande PlanoDinamarca | PM recusa vender Gronelândia A primeira-ministra da Dinamarca, Mette Frederiksen, mostrou-se ontem disponível para dialogar com os Estados Unidos sobre a Gronelândia, frisando que o território autónomo “não está à venda”. “Temos sido muito claros: todos temos de respeitar a soberania de todos os Estados no mundo – e a Gronelândia é hoje uma parte do reino da Dinamarca – não está à venda”, referiu. A líder dinamarquesa, falava à entrada do primeiro retiro de líderes da UE, iniciativa criada pelo presidente do Conselho Europeu, António Costa, para debates mais informais. Concordo totalmente com os americanos que a região do Extremo Norte, a região do Ártico, é cada vez mais importante quando falamos de defesa e segurança e de dissuasão, e é possível encontrar uma forma de assegurar uma pegada mais forte [dos Estados Unidos] na Gronelândia, onde já estão”, referiu ainda Mette Frederiksen. A chefe do governo de Copenhaga lembrou ainda que as tropas dinamarquesas combateram ao lado dos EUA durante muitas décadas. O Presidente dos EUA, Donald Trump, tem reivindicado um maior acesso ao Ártico e manifestou o interesse de adquirir a Gronelândia, um território autónomo gerido pela Dinamarca.
Hoje Macau Grande PlanoEUA | Trump vai impor taxas sobre produtos europeus “muito em breve” O Presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, afirmou que os produtos europeus vão ser sujeitos a taxas aduaneiras “muito em breve”, na sequência da imposição de tarifas à importação de produtos do Canadá, México e China. “Estão realmente a aproveitar-se de nós, temos um défice de 300 mil milhões de dólares. Não levam os nossos automóveis nem os nossos produtos agrícolas, praticamente nada, e todos nós compramos, milhões de automóveis, níveis enormes de produtos agrícolas”, disse no domingo à imprensa. A União Europeia lamentou no mesmo dia o aumento das taxas aduaneiras pelos Estados Unidos da América sobre produtos do Canadá, do México e da China, e disse que vai retaliar fortemente se for alvo de tarifas injustas. “A UE acredita firmemente que direitos aduaneiros baixos promovem o crescimento e a estabilidade económica”, disse a Comissão Europeia em comunicado, através do qual considerou a imposição de mais tarifas pelos EUA como “nocivas para todas as partes”. Já, se o bloco europeu for também alvo dessas medidas, o executivo comunitário vai “retaliar fortemente”. Donald Trump assinou no sábado a ordem executiva para a aplicação de taxas aduaneiras aos produtos provenientes do Canadá, do México e da China. A assinatura, que oficializa a decisão que já tinha sido anunciada, determina a imposição de tarifas de 10 por cento à China, de 25 por cento ao México e de 25 por cento ao Canadá, excepto no petróleo canadiano, que terá tarifa de 10 por cento. Trump tinha vindo a ameaçar a imposição de tarifas para garantir uma maior cooperação dos países para impedir a imigração ilegal e o contrabando de produtos químicos, como o fentanil, um opioide que está a provocar vagas de adição importantes nos Estados Unidos. Os três países prometem tomar medidas. Sacrifício (des)necessário Já no caso da União Europeia, ainda não foi tomada uma decisão, mas a preocupação é geral e a França defendeu no domingo uma “resposta mordaz” da Europa face às ameaças de novas tarifas aduaneiras pelo Presidente norte-americano. Trump admitiu que as novas tarifas podem causar sofrimento ao povo norte-americano, mas garantiu que “tudo valerá a pena” porque vai “tornar a América grande de novo”. “Haverá sofrimento? Sim, talvez (e talvez não). Mas vamos tornar a América grande de novo, e tudo valerá a pena”, escreveu Donald Trump, em letras maiúsculas, no perfil da rede social que fundou, a Truth Social, citado pela agência de notícias France-Presse.
Andreia Sofia Silva Grande Plano MancheteEstudo | Maior satisfação de vida associada a relações e dinheiro Um estudo que avalia a satisfação de vida em 65 países e regiões, incluindo China, Taiwan e Hong Kong, conclui que em todos os países a segurança financeira e ter uma relação amorosa são factores chave para a felicidade. Porém, durante a pandemia houve uma “grande variabilidade na satisfação global” O que é necessário para ter uma vida plena e com felicidade? A questão, que pode ter várias conotações e tendências espiritais, procurou ser respondida e quantificada pelos autores do estudo “Life satisfaction around the world: Measurement invariance of the Satisfaction With Life Scale (SWLS) across 65 nations, 40 languages, gender identities, and age groups” [Satisfação com a vida em todo o mundo: Invariância de medição da Escala de Satisfação com a Vida (SWLS) em 65 países, 40 línguas, identidades de género e grupos etários]. O estudo, editado recentemente pela revista académica “PLOS One”, partiu de análises feitas por dezenas de académicos e contribuidores em 65 países e regiões, incluindo a China, Taiwan e Hong Kong, o que perfaz 57 mil pessoas analisadas. Em termos gerais, os autores concluem que “em todos os países uma maior satisfação com a vida foi significativamente associada à segurança financeira e à existência de uma relação de compromisso ou casamento”. Desta forma, os resultados apontam que “uma maior satisfação com a vida está significativamente associada a uma maior segurança financeira e a qualificações educacionais mais elevadas (o que pode ser um indicador do estatuto socioeconómico, embora a dimensão do efeito desta relação específica fosse insignificante)”. Em termos gerais, “estes resultados são consistentes com as provas que indicam que a satisfação das necessidades humanas básicas e o bem-estar material é um forte – possivelmente o mais forte – preditor do bem-estar psicológico em geral e da satisfação com a vida especificamente”. É certo que os autores chamam a atenção para o facto de a ideia de bem-estar poder variar de país para país consoante a cultura das populações, mas os resultados “sugerem que, quando considerada ao nível do indivíduo, a associação entre a satisfação com a vida e os indicadores de bem-estar material parece ser relativamente robusta entre nações”. No tocante aos relacionamentos, as respostas penderam mais para a importância de não se estar só. “Verificámos que o estado civil estava significativamente associado à satisfação com a vida. Mais especificamente, verificámos que os inquiridos em relações de compromisso tinham maior probabilidade de relatar mais satisfação com a vida do que os não casados. Este resultado é consistente com a literatura mais alargada que mostra que o estado civil é um correlato robusto do bem-estar psicológico.” Porém, uma vida satisfatória não está directamente ligada exclusivamente a relações amorosas, podendo também ocorrer quando a pessoa tem uma vida social activa. “Tem sido sugerido que a formação e manutenção de relações sociais é fundamental para a promoção da satisfação com a vida, particularmente em culturas ou comunidades que enfatizam os valores familiares, porque satisfazem uma necessidade humana básica de pertença e são uma fonte de afirmação positiva”. Além disso, “reforçam comportamentos saudáveis e protegem contra o impacto de acontecimentos negativos”. Assim, o estudo considera ser “provável que as pessoas que vivem em relações de compromisso possam reportar um maior apoio emocional e integração social, o que, por sua vez, contribui de forma independente para a satisfação com a vida”. Os tempos covid-19 Se a socialização é tida como muito importante para uma vida satisfatória, como terá sido em tempos de covid-19, que obrigou a longos períodos de confinamento e isolamento? O estudo recorreu a critérios específicos e estatísticas para avaliar a questão, concluindo que houve “uma grande variabilidade na satisfação global com a vida no contexto da pandemia de covid-19. Os inquiridos no Canadá (francófono) e de Israel apresentaram as médias SWLS mais elevadas e os inquiridos no Japão e na Ucrânia a apresentarem as médias mais baixas”. Tendo em conta a grande dimensão da amostra, os resultados permitem concluir “que a satisfação com a vida variou substancialmente entre os grupos nacionais na altura da pandemia da covid-19″, embora, destacam os autores, “seja necessário ter cuidado ao interpretar as médias latentes” referidas no trabalho para não se avançarem com conclusões definitivas. Ainda assim, os académicos entendem que estes dados podem ser importantes para quando “profissionais e os decisores políticos tentarem compreender as diferenças na satisfação com a vida entre as nações”, além de ser uma “forma de apoiar melhor o bem-estar subjectivo na era pós-pandémica”. Destaque ainda para a menor satisfação de vida por parte dos grupos populacionais minoritários. “Verificámos que a identificação como parte de uma minoria racializada estava associada à menor satisfação com a vida. Embora este facto seja consistente com alguns trabalhos anteriores e reflicta provavelmente o efeito deletério das experiências de racismo na satisfação com a vida, é de notar que a dimensão do efeito desta relação foi insignificante.” Além disso, os autores destacam que “a urbanidade estava associada à satisfação com a vida de forma pouco significativa”, tendo sido avaliada se viver numa cidade ou outro contexto urbano mudava o nível de satisfação com a vida. Meios e fins Para se atingirem os dados da escala SWLS acima descritos, foi feito o “Inquérito sobre a Imagem Corporal na Natureza” (BINS, na sigla inglesa) por parte de 253 cientistas ou académicos dos 65 países envolvidos, que recolheram dados entre Novembro de 2020 e Fevereiro de 2022. No total, foram entrevistadas 56.968 pessoas, 58,9 por cento eram mulheres, 40,5 por cento homens e 0,6 por cento eram de outra identidade de género. Em termos de raça e etnia, a maioria, 74,2 por cento, “identificou-se como fazendo parte de uma maioria racializada”, enquanto 11,3 por cento “se identificou como fazendo parte de um grupo racializado ou étnico minoritário”. Em relação ao sítio onde vivem os participantes, 27 por cento disse viver numa capital, 13,7 por cento no subúrbio de uma capital, 25,1 por cento numa cidade de província, ou seja, com mais de 100 mil habitantes; enquanto 18,7 por cento disse residir numa cidade de província com mais de 10 mil habitantes. Apenas 15,5 por cento dos inquiridos vivia numa zona rural. Quanto às habilitações literárias, 33,5 por cento terminou o ensino superior, sendo que 42 por cento estavam solteiros e 19,5 por cento estavam numa “relação de compromisso, mas não eram casados”. Por sua vez, 33,5 por cento eram casados. Relativamente à segurança financeira, 24,9 por cento dos participantes referiram sentir-se menos seguros do que outros da sua idade no seu país de residência, enquanto 49,6 por cento disseram sentir-se “igualmente seguros” e 25,5 por cento consideraram estar “mais seguros”. Os dados do inquérito permitiram aos autores do estudo “examinar as associações entre a satisfação com a vida e as principais variáveis sociodemográficas ao nível do indivíduo”. Foram avaliados factores como “satisfação com a vida”, “segurança financeira” e “urbanidade”, em que os participantes preencheram a SWLS utilizando uma escala de resposta de 7 pontos, em que 1 ponto representava a opinião “discordo totalmente” e 7 pontos “concordo totalmente”. Foram também avaliados dados demográficos como a idade, educação, estado civil ou a raça. No que respeita à China, o país é dividido entre “China – Cantonês”, “China – Inglês” e “China – Mandarim”. No caso da “China – Cantonês”, respeitante a Hong Kong, responderam 409 pessoas, com 58 por cento de mulheres e apenas dois por cento dos inquiridos pertencentes a uma minoria racial. A totalidade dos participantes vive em contexto urbano, enquanto 96 por cento terminou o ensino secundário ou superior. Dos inquiridos, apenas dois por cento diz estar num relacionamento, seja ou não casamento. No caso da “China – Mandarim” participaram 1,231 pessoas, 69 por cento das quais mulheres, em que 95 por cento reside em zonas urbanas. 86 por cento dos inquiridos tem um compromisso ou relacionamento.
Andreia Sofia Silva Grande Plano MancheteEstudo | Académicos destacam lado “egocêntrico” do Natal em oposição ao Ano Lunar Um estudo de três académicos chineses afirma que enquanto o Ano Novo Chinês tem um menor cariz menor e “é claramente representativo da sociedade chinesa contemporânea”, o “Natal no Ocidente é egocêntrico, exalta a individualidade e mostra mais interactividade”. Porém, o trabalho, publicado numa revista da Universidade do Estado da Bahia, aponta para a maior convergência de características culturais Natal e Ano Novo Chinês: como são, o que representam para o Ocidente e Oriente, e quais os pontos de convergência? É a estas perguntas que o estudo “Comparações das culturas entre o Ano Novo Chinês e o Natal Ocidental”, da autoria de Zhen Zhao, Yin Xuelu e Qiao Jianzhen pretende responder. O trabalho académico foi publicado recentemente na revista “Pontos de Interrogação – Revista de Crítica Cultural”, da Universidade do Estado da Bahia, no Brasil. Os autores destacam, em termos gerais, que “o Natal no Ocidente é egocêntrico, exalta a individualidade e mostra maior interactividade”, nomeadamente com a “participação da multidão” e demonstração de “emoções carnavalescas apaixonadas das pessoas”. Por outro lado, o Ano Novo Chinês “é um festival nacional, claramente representativo da sociedade chinesa contemporânea”. Em termos gerais, este tipo de celebrações surge descrito como tendo “um significado sociocultural especial que se intercala com as rotinas diárias”, sendo “uma exibição concentrada da vida colorida das pessoas” bem como “um resumo e extensão da política, economia, cultura e religião de várias regiões, grupos étnicos e países”. Descrevem ainda os autores que o Ano Novo Chinês, que também pode ser denominado de Ano Novo Lunar ou Festival da Primavera, tem raízes “numa pequena economia camponesa e baseia-se frequentemente no confucionismo, com uma mistura de cultura budista e taoista”, estando ligado a “rituais religiosos feudais”. Por sua vez, o Natal é apresentado como tendo uma maior componente religiosa, estando “enraizado na cultura cristã ocidental e encarna os valores da liberdade e igualdade, do pecado original e do individualismo em toda a parte”. Interligações inevitáveis Porém, o estudo descreve como inevitável o futuro intercâmbio de demonstrações culturais nestas épocas do ano: no caso do Natal, no mês de Dezembro; no caso do Ano Novo Chinês, durante os meses de Janeiro e Fevereiro de cada ano, consoante o calendário. “O futuro intercâmbio das culturas chinesa e ocidental, incluindo a cultura do festival, é uma parte inevitável do desenvolvimento social e histórico”, é descrito, bem como “um processo evolutivo de complementaridade entre as culturas chinesa e ocidental”. Desta forma, afirmam os autores, deve descobrir-se pontos de contacto de ambas as culturas “a partir das diferenças entre o Ano Novo Chinês e o Natal, para que possam ser promovidos” e para que haja uma maior preservação “das respectivas culturas nacionais”. Os autores dizem notar “a aceleração do intercâmbio cultural entre o Oriente e Ocidente” neste campo, uma vez que os “chineses celebram os festivais ocidentais e os estrangeiros celebram os festivais chineses”. “Na era da globalização, e devido ao desenvolvimento e aprofundamento da economia e da cultura, as festas tradicionais chinesas e ocidentais têm sido gradualmente aceites por ambos os povos numa tolerância mútua”, pode ler-se. Pontos diferenciadores Os três autores do estudo recordam que, na China, os festivais mais tradicionais têm uma ligação à agricultura, com costumes tradicionais baseados na comida e na bebida. “A principal razão disso é a busca do povo chinês na ida ser orientada para uma vida longa e saudável”. Enquanto isso, “as festas tradicionais ocidentais têm principalmente origem na religião e eventos relacionados”, tendo, por isso, “fortes conotações religiosas”. Acrescenta-se que, no Ocidente, “os costumes tradicionais no período de férias baseiam-se principalmente no tema da diversão”, sendo a principal razão o facto de “a busca dos ocidentais na vida ter como objectivo a saúde e felicidade”. Em termos comparativos, “tanto o Ano Novo Chinês como o Natal são uma época de reunião familiar e uma época maravilhosa para as pessoas olharem para trás e também para o futuro”, embora “com conotações diferentes nas culturas chinesa e ocidental”. Uma das diferenças apontadas no estudo é a forma como se celebram os dias anteriores a estas datas. “A passagem do ano [no Ano Novo Chinês] é o momento em que as pessoas tentam ir para casa dos seus entes queridos, não importa onde estejam. O jantar de Ano Novo é o ponto alto, também conhecido como o jantar de reencontro, sendo a refeição mais importante do ano.” Um dos rituais passa por, a partir do pôr-do-sol, “as famílias começarem a acender os foguetes”, começando-se a preparar as refeições com esse ambiente. “Embora os pratos de jantar do Ano Novo variem de lugar para lugar, cada prato tem um certo significado simbólico. Os chineses gostam de usar os harmónicos para atrair boa sorte, e, por exemplo, os harmónicos de frango ‘Ji’ significam ‘auspicioso'”, enquanto “os harmónicos de peixe ‘Yu’ significam ‘ano após ano'”. “A véspera do Ano Novo é um costume do povo chinês Han. Depois de comer a refeição do Ano Novo, as pessoas reúnem-se em família a fim de esperar pela chegada do Ano Novo à meia noite”, apontam os autores, descrevendo também que “em muitas partes da China, na noite de Ano Novo, as pessoas preparam sumptuosas oferendas, acendem incenso e velas, despejam vinho e queimam dinheiro de papel, prestando homenagem aos antepassados em família para expressar a nostalgia por eles”, além de esperarem bençãos “para os filhos e netos do céu, inspirando os descendentes a trabalharem mais e a viverem à altura dos desejos dos seus antepassados”. No caso do Natal, celebrado a 25 de Dezembro, a véspera é marcada por um jantar em família que também conta com pratos e doces tradicionais, como o bolo-rei, o bacalhau ou o peru assado. “Ao contrário da vigília chinesa de Ano Novo, os ocidentais celebram o Natal como uma festa única de fantasia na véspera de Natal que se prolonga ao longo da noite. Na festa não há um código de vestuário rigoroso, bastando ser natural e informal, subir para dizer ‘olá’ e enviar desejos sinceros [de boas festas]”, é referido. Outro ponto diferenciador apontado é as ofertas. Se no Ano Novo Chinês é habitual a oferta de dinheiro nos envelopes “lai si”, no Natal Ocidental distribuem-se presentes entre família e amigos. A distribuição de dinheiro no Ano Novo Chinês tem diversas conotações, existindo um tipo de dinheiro para os mais velhos, servindo “para lhes desejar uma longa vida”; enquanto que há depois o dinheiro dado dos mais velhos aos mais novos, representando uma transmissão de cuidado da parte dos mais séniores. Por sua vez, “as primeiras lendas sobre presentes de Natal referem-se ao nascimento de Jesus”, com as oferendas dos reis magos. “Actualmente tornou-se costume dar presentes entre familiares e amigos no Natal”, é referido, existindo também a ideia de que é o Pai Natal a distribuir os presentes. “Por vezes as pessoas fingem ser o Pai Natal para dar presentes às crianças, a fim de acrescentar o espírito festivo”, refere-se. Outra grande diferença apontada pelo estudo é o facto de, no Ocidente, o Natal não ter a mesma conotação dos antepassados. “No Ocidente as pessoas não adoram os seus antepassados, sendo que as pessoas vão à igreja para celebrar o nascimento de Jesus. As pessoas não se limitam a estar nas reuniões familiares, mas convidam [outros] de forma calorosa para as suas casas, e não é considerado rude festejar juntos. Durante as férias muitas pessoas participam em actividades comunitárias para ajudar os pobres e dar presentes, reflectindo a ideia de busca de igualdade.” Pontos de semelhança Segundo o estudo, as duas celebrações têm como ponto em comum servir para “manter a estabilidade social”. “Na China antiga a produção agrícola era fortemente influenciada pelo clima. Os trabalhadores pobres que pertenciam às classes mais baixas tinham muitas vezes de trabalhar todo o ano, o que inevitavelmente levava à insatisfação com a realidade da situação”. Neste sentido, a chegada do Ano Novo Chinês é “um bom momento para libertar emoções”, decorando-se a casa e acendendo-se foguetes na criação “da esperança de que o próximo ano seja bom, com boas colheitas e melhores dias”. No tocante ao Natal, é descrito que as pessoas “vão à igreja adorar [os santos], cantar canções de Natal e rezar a Deus, esperando que este as ajude a sair das dificuldades quando estão em apuros ou quando estão doentes e enfrentam a morte. Esperam que Deus as perdoe pelos pecados para que possam ascender ao céu depois da morte”, existindo aqui um paralelismo com a “libertação de emoções” acima descrita. Além disso, ambas as celebrações constituem formas de transmissão de cultura, segundo os autores do estudo. “A cultura do Ano Novo é uma acumulação da cultura tradicional chinesa, sendo a cristalização do trabalho e da sabedoria do povo chinês, expressando as aspirações do povo trabalhador que anseia por coisas boas.” Além disso, estas celebrações “transportam e transmitem a cultura tradicional de forma subtil”, nomeadamente com pinturas e demais decorações das casas, ou ainda eventos como as danças do dragão e do leão ou ainda sessões de caligrafia. “Através destas actividades transmite-se o património cultural extremamente valioso às gerações mais jovens”, é referido. Por sua vez, no Natal existem as decorações próprias da época, com a árvore, as luzes ou o presépio, em cores verde, vermelho e demais tons brilhantes. “As pessoas que estiveram ocupadas todo o ano a trabalhar regressam para reviver o calor da família. As pessoas vão à igreja celebrar o nascimento de Jesus, sendo este um acontecimento regular e uma herança da cultura religiosa. Tornou-se costume enviar um cartão de Natal a amigos e familiares, e todos estes costumes carregam profundas conotações culturais que são transmitidas.”
Andreia Sofia Silva Grande Plano MancheteTrabalho | Ásia Oriental com baixa satisfação laboral e desmotivação O relatório mundial sobre o panorama laboral, da Associação Internacional Gallup, concluiu que em países e regiões da Ásia Oriental, como a China, Taiwan ou Hong Kong, a maioria dos trabalhadores procura um novo emprego. Em Hong Kong, apenas seis por cento dos inquiridos estão empenhados com os seus empregos Perceber como se sentem os trabalhadores de todo o mundo no local de trabalho, e em relação ao emprego que têm, é o objectivo do relatório da Associação Internacional Gallup, intitulado “State of the Global Workplace 2024”. Se no panorama mundial e regional a Ásia Oriental se sai bem em alguns indicadores, o cenário não é nada favorável no que diz respeito ao compromisso ou empenho que os trabalhadores têm pela empresa a que estão vinculados ou pelas funções que desempenham. Dentro da Ásia Oriental incluem-se países e regiões como a China, Hong Kong, Japão, Mongólia, Coreia do Sul e Taiwan. Esta zona do globo tem “a mais baixa percentagem, a nível regional, de empregados que sentem tristeza diária”, mas tem “a terceira percentagem mais elevada, a nível regional, de empregados que dizem estar à procura, e de forma activa, de um novo trabalho”. Além disso, a Ásia Oriental tem “a terceira percentagem mais baixa a nível regional de empregados comprometidos” com o trabalho que têm (18 por cento, o que ainda assim representa uma subida de 1 por cento face ao período correspondente entre 2022 e 2023). Bem pelo contrário, 67 por cento dos inquiridos não estão, de todo, comprometidos ou empenhados com o trabalho, mais cinco por cento face a igual período. Além disso, 14 por cento diz estar totalmente descomprometida com a empresa para onde trabalham, menos seis por cento. Quanto a emoções negativas vividas diariamente, e com maior frequência, o factor “stress” lidera, com 46 por cento de respostas, menos seis por cento face ao período entre 2022 a 2023. Destaque para a entrada do sentimento “raiva”, com 17 por cento de respostas, e que não gerou quaisquer respostas no último inquérito. “Tristeza” foi um sentimento revelado por 12 por cento dos inquiridos, mais 1 por cento face ao inquérito anterior, e “solidão”, que tem também entrada directa para esta lista de sentimentos menos bons vividos no trabalho, com 18 por cento. Se a insatisfação com o trabalho se demonstra nos números anteriores, as certezas sobem de tom na categoria “ambiente de trabalho – boa altura para encontrar um trabalho”, com 51 por cento a responder afirmativamente, mais 11 por cento de respostas face ao inquérito anterior. Além disso, a categoria “Intenção de deixar – Olhando ou procurando de forma activa por um novo trabalho” foi escolhida por 54 por cento dos inquiridos, menos dois por cento face aos anos de 2022 a 2023. Na categoria “Avaliação de Vida”, os que dizem ter uma vida próspera são 32 por cento, menos sete por cento, em contraste com os 62 por cento de inquiridos que diz estar a sofrer algum tipo de dificuldades, mais sete por cento em relação ao último inquérito. A categoria “sofrimento” relacionado com o posto de trabalho foi escolhida por seis por cento dos participantes no inquérito, uma entrada directa neste estudo. Tristeza em baixo Para o estudo da Gallup, foram entrevistadas 40.428 pessoas em 41 países, sendo que a amostra por país contém cerca de 1.000 homens e mulheres. A margem de erro da sondagem “está entre +3-5 por cento com um nível de confiança de 95 por cento”, é referido. O estudo compara ainda os dados registados pelos trabalhadores da Ásia Oriental com os restantes países. E mais uma vez se denota a falta de compromisso e da sensação de “vestir a camisola” que persiste em muitas empresas. Em termos mundiais, 62 por cento das respostas apontam para a ausência de compromisso, quando na Ásia Oriental essa percentagem sobre para os 67 por cento. No tocante à “Avaliação de Vida”, se a nível mundial 58 por cento dos inquiridos diz estar a passar dificuldades, a percentagem da Ásia Oriental é de 62 por cento. Porém, o sofrimento sentido está apenas em seis por cento das respostas, enquanto a nível mundial a fasquia fica nos oito por cento. Em relação a este factor destaca-se ainda a baixa percentagem do sentimento de “tristeza diária”, com 12 por cento de respostas, quando a nível mundial a fasquia sobe para os 22 por cento. A sensação de “stress” é também superior, com 46 por cento de respostas, quando a nível global é de 41 por cento. China: raiva e dificuldades Olhando para os critérios em cada país, 19 por cento dos trabalhadores da China disseram estar comprometidos com o trabalho, mais dois por cento em termos anuais, enquanto em Hong Kong apenas seis por cento de pessoas estão comprometidas e que gostam do que fazem, o que constitui uma quebra de um por cento. Na “Avaliação de Vida”, 36 por cento dos trabalhadores da China dizem estar a enfrentar dificuldades, mais 1 por cento, enquanto em Taiwan 41 por cento diz enfrentar momentos menos bons, representando uma entrada directa na classificação, sem pontuação anterior para comparar. Já no caso de Hong Kong, 17 por cento de inquiridos assumem atravessar dificuldades, mais 1 por cento face ao inquérito anterior. Quanto ao sentimento de “stress diário”, a China sobe ao primeiro lugar do ranking com 53 por cento de respostas, ainda assim menos 2 por cento em termos anuais, com Hong Kong a seguir-lhe as pisadas, com 49 por cento de respostas. O Japão está em terceiro lugar com 41 por cento de pessoas a sentirem stress diariamente. Em resposta à pergunta se sentiu raiva no dia anterior, a China lidera novamente com 18 por cento de respostas, apesar da quebra anual de 2 por cento; seguindo-se a Coreia do Sul, com 17 por cento de respostas afirmativas, e depois Hong Kong com 16 por cento. Na China apenas 12 por cento dos trabalhadores disseram sentir tristeza, colocando, assim, o país em terceiro lugar. Já em relação a Hong Kong houve 11 por cento de respostas afirmativas neste domínio. Jon Clinfton, CEO da Gallup, deixa um alerta sobre o aumento dos problemas de saúde mental em todo o mundo, sobretudo relacionados com o meio laboral e a forma de relacionamento no meio empresarial. Cerca de 20 por cento dos trabalhadores de todo o mundo “experienciam solidão diária”, sendo que este sentimento “é maior entre trabalhadores em teletrabalho total”. “No relatório deste ano, 41 por cento dos trabalhadores afirmam sentir ‘muito stress’. No entanto, o stress varia significativamente em função da forma como as organizações são geridas. Quem trabalha em empresas com más práticas de gestão (activamente desmotivadas) têm quase 60 por cento mais probabilidades de estar stressadas do que as pessoas que trabalham em ambientes com boas práticas de gestão (empenhadas). De facto, a experiência de ‘muito stress’ é referida cerca de 30 por cento mais frequentemente pelos empregados que trabalham sob má gestão do que pelos desempregados”, disse o CEO da Gallup. Para o responsável, “os líderes sabem que o stress no local de trabalho é um problema – viram os dados, ouviram colegas e sentiram-no eles próprios”. “Um quarto dos líderes sente-se esgotado frequentemente ou sempre, e dois terços sentem-no, pelo menos, algumas vezes. Muitos estão a tentar resolver o problema, mas muitas vezes de forma ineficaz”, conclui-se.
Andreia Sofia Silva Grande PlanoÓbito | Morreu Rocha Vieira aos 85 anos Vasco Rocha Vieira, o último Governador português de Macau, morreu ontem aos 85 anos. O general encontrava-se doente há bastante tempo. Marcelo Rebelo de Sousa recordou-o como “um dos mais ilustres oficiais” do Exército, mas, para Macau, Rocha Vieira fica para a história como o grande obreiro das medidas decididas na Declaração Conjunta de 1987 Há muito que se encontrava doente, falhando mesmo alguns eventos recentes em Lisboa sobre Macau e a transição. Vasco Rocha Vieira, general, antigo Chefe do Estado-Maior do Exército, e último Governador português de Macau, morreu na madrugada de ontem com 85 anos de idade. Nascido a 16 de Agosto de 1939, exerceu o cargo de Governador de Macau entre 1991 e 1999, quando se processou a transferência do território para a China. Porém, Rocha Vieira já tinha uma ligação a Macau, pois esteve no território após o 25 de Abril. Além disso, foi ainda ministro da República dos Açores entre os anos de 1986 e 1991. Uma das primeiras personalidades a reagir à sua morte, em Portugal, foi o Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, que manifestou, numa nota oficial, o “profundo pesar” pela morte de Vasco Rocha Vieira, recordando-o como “um dos mais ilustres oficiais” do Exército e enaltecendo o seu “marcado patriotismo”. Numa nota publicada no sítio oficial da Presidência da República na Internet, o chefe de Estado recorda Rocha Vieira como “um dos mais ilustres oficiais do Exército Português na transição para a Democracia e nas primeiras décadas da sua afirmação”. “Desde sempre muito ligado aos Comandos, exerceu ainda funções políticas como as de Ministro da República para a Região Autónoma dos Açores”, é recordado na nota. Marcelo Rebelo de Sousa destaca ainda que Rocha Vieira foi “muito próximo do Presidente António Ramalho Eanes”, tendo sido por ele “designado Chanceler das Antigas Ordens Militares”. “O simbolismo do momento da transferência da administração portuguesa para a chinesa permanecerá na memória de muitos portugueses como um exemplo de sentido de Estado, sentido de serviço da causa pública e de marcado patriotismo”, lê-se na nota de pesar. O Presidente da República, que afirma ter acompanhado “de perto os últimos meses” da vida de Rocha Vieira, “apresenta à sua família, e, muito em especial, à sua viúva e filhos, o testemunho de gratidão de Portugal, com muito saudosa amizade”. Na sua biografia, intitulada “A todos os portos a que cheguei”, descreve-se o momento em que Mário Soares, então Presidente da República, disse a Rocha Vieira: “Preciso de si. Vá para Macau e veja se põe aquilo na ordem”, numa referência ao caso do fax de Macau, relacionado com a construção do Aeroporto Internacional de Macau, que tantas dores de cabeça deu ao seu antecessor, Carlos Melancia, também já falecido. O general terá então respondido que nada exigiu para ir para Macau. “Não lhe perguntei nada, nem lhe pus condições. Fui para Macau com o mesmo espírito com que fui para os Açores. Não era um cargo político inerente a uma carreira. Era, de facto, uma missão”, descreve-se. Coube então a Rocha Vieira e à sua equipa a concretização de todos os objectivos e ideais para o futuro de Macau presentes na Declaração Conjunta que tinha sido assinada entre Portugal e a China em 1987. O Governo liderado por Rocha Vieira viu nasceu o aeroporto, construiu todo o quadro legislativo bilingue que ainda hoje está em vigor e ergueu o Centro Cultural de Macau, inaugurado já por Jorge Sampaio a 19 de Março de 1999, entre tantas outras iniciativas, inclusivamente na área do urbanismo. Um “grande amigo” Rocha Vieira chegou, aliás, a pôr o lugar à disposição à frente do Executivo de Macau quando Jorge Sampaio foi eleito Presidente da República, na viragem de 1995 para 1996. “Quando fui para Macau não sabia como as coisas iam correr e quanto tempo ia lá ficar”, recordou na sua biografia. Porém, e apesar de uma inicial hesitação de Sampaio numa mudança, a verdade é que Rocha Vieira acabou por ficar, pois “a sua substituição iria afectar a regular sequência do processo” de transição, numa altura em que “já estava à vista a passagem da administração do território para a China”, descreve-se em “A todos os Portos a que cheguei”. Em declarações à RTP, Chito Rodrigues, general que foi governador de Macau em exercício, deixou palavras de pesar pelo falecimento daquele que foi um amigo. “Recordo-o como grande amigo e sócio honorário da Liga dos Combatentes. Sempre se relacionou connosco e é uma referência nossa. Sabíamos que estava mal e não fomos, de certo modo, surpreendidos [com a notícia da morte], mas é sempre uma surpresa desagradável.” Chito Rodrigues recorda-o no exercício de funções em Macau como alguém que contribuiu “para que Macau fosse um lugar tranquilo para que a descolonização fosse feita de forma ‘exemplar'”. “Estive com ele na abertura do aeroporto e tive relações próximas com ele na qualidade de Governador. Foi alguém que substituiu os seus antecessores com êxito e humildade, repondo a tradição de Governadores militares em Macau”, acrescentou. No livro “Macau entre dois mundos”, de Fernando Lima e Eduardo Cintra Torres, o antigo Governador de Hong Kong, Chris Patten, recordou Rocha Vieira como “um homem corajoso e judicioso, com enorme integridade e um excelente servidor do seu país”. “Acho que Portugal teve muita sorte em ter um homem tão bom como último Governador, um lugar tão difícil”, apontou. As polémicas O nome de Rocha Vieira esteve, no entanto, envolto em algumas polémicas, nomeadamente com a criação da Fundação Jorge Álvares e Fundação Oriente, sobretudo no tocante aos fundos alocados para estas duas entidades. “O grosso da opinião pública do território e as autoridades de Pequim contestavam a legitimidade de um contrato nos termos do qual uma entidade com sede em Lisboa era alimentada com recursos gerados em Macau”, lê-se na biografia de Rocha Vieira. Este apenas pretendia que a fundação “desempenhasse um papel útil para Macau”, tendo a polémica sido diluída com o tempo. Nas redes sociais, o jornalista e antigo director do Macau Hoje, João Severino disse “lamentar muito” o desaparecimento de Rocha Vieira. “O General Vasco Rocha Vieira deixou-nos, após várias semanas internado no hospital. O último Governador de Macau foi um homem bom para muita gente e discriminatório para muitos. De todo o modo a sua carreira militar foi exemplar e deixou marcas na administração de Macau. Mantive com o ilustre Governador alguns momentos controversos, sempre dentro da maior cordialidade e consideração pelo representante máximo do meu país em Macau. Apresento à sua esposa dra. Leonor e aos seus filhos as minhas condolências e que descanse em paz”, escreveu. Uma entidade que reagiu ao desaparecimento de Rocha Vieira foi a Câmara de Comércio e Indústria Luso-Chinesa (CCILC), que nas redes sociais divulgou uma nota de pesar sobre a morte daquele que foi o 138.º Governador português de Macau e que presidia ao conselho estratégico da CCILC. “O General Rocha Vieira desempenhou um papel marcante e exemplar ao longo de toda a sua vida, destacando-se pelo compromisso com o serviço à nação, pela dedicação às relações entre Portugal e a China, e pelo papel histórico no encerramento do ciclo da administração portuguesa em Macau.” A mesma nota refere ainda que “na liderança do conselho estratégico da CCILC, a sua visão estratégica, sabedoria e valores humanos foram sempre fonte de inspiração para toda a Direção e equipa executiva”. Também a Câmara Municipal de Lisboa reagiu oficialmente ao seu desaparecimento. “Rocha Vieira dedicou a sua vida à defesa do interesse nacional, servindo notavelmente Portugal como Chefe do Estado-Maior do Exército e como último Governador de Macau. Estadista de visão, assegurou uma transferência pacífica da soberania de Macau para China. Homem de coragem, contribuiu para a consolidação do processo democrático, sendo peça fundamental do 25 de Novembro de 1975. Foi uma honra contar com o seu depoimento na primeira cerimónia de evocação do 25 de novembro nos Paços do Concelho, em 2023.” O adeus a Macau São célebres as imagens de Rocha Vieira a segurar a bandeira portuguesa ao peito no dia 19 de Dezembro de 1999, com o rosto visivelmente emocionado, como quem diz adeus à “missão” que aceitou desempenhar em Macau. Terminada a sua função de Governador, Rocha Vieira foi mantendo laços estreitos com o território, sendo que a última vez que esteve em Macau foi em 2023, para receber a distinção de doutoramento honoris causa da Universidade de Ciências e Tecnologia de Macau. Aí, destacou que as “boas relações históricas” com a China são “um trunfo para Portugal” e que hoje o país é “uma superpotência em afirmação”. O general disse que “um outro grande trunfo” para Portugal é o interesse na China pela língua portuguesa, sublinhando o número crescente de universidades chinesas que ensinam português. No final de 2020, o Coordenador do Centro Pedagógico e Científico da Língua Portuguesa da Universidade Politécnica de Macau, Gaspar Zhang Yunfeng, disse que havia cerca de 50 instituições de ensino superior com cursos de português na China continental. “A China está interessada em que o português se desenvolva (…) também para poder ter, através de Portugal, uma relação mais estreita com os países de língua portuguesa”, salientou Rocha Vieira. Numa última entrevista concedida à agência Lusa, em 2019, Rocha Vieira recordou os tempos em Macau e as suas vicissitudes, sobretudo no tocante ao processo de transição. “Tive mais problemas com a parte portuguesa do que com a parte chinesa (…) muitas vezes, por falta de percepção. Normalmente, as pessoas estão longe, em Lisboa – isso é uma coisa histórica, que não é só de agora – e acham que sabem melhor as soluções do que aqueles que estão em Macau”, afirmou. Rocha Vieira assegurou que, quando foi necessário definir “o rumo, os objectivos fundamentais das políticas para Macau, foram discutidos pelo Governo de Macau, em Lisboa, com quem deviam ser discutidos, com o Presidente da República e com o primeiro-ministro”, havendo “sempre” sobre isso “uma grande compreensão por parte dos órgãos de soberania portugueses e uma grande prova de confiança em relação a quem estava no território”.
Hoje Macau Grande PlanoEUA | Trump diz que tarifas são “a única forma” do país ser “tratado como deve” Os países europeus vão ser sujeitos a tarifas aduaneiras, “a única forma” de os Estados Unidos “serem tratados como devem ser”, afirmou esta terça-feira o Presidente norte-americano, Donald Trump. “A União Europeia (UE) é muito má para nós. Tratam-nos muito mal. Não aceitam os nossos automóveis nem os nossos produtos agrícolas. De facto, não aceitam muita coisa”, disse o Presidente dos Estados Unidos, acrescentando que, por isso, serão alvos de tarifas. Questionado pela imprensa na Casa Branca, Trump garantiu ainda que a sua administração está a discutir “tarifas de 10 por cento sobre os produtos chineses, porque eles enviam [o opióide] fentanil para o México e Canadá”, que acaba por ser consumido nos Estados Unidos. “É provavelmente para 1 de Fevereiro”, acrescentou Donald Trump, dia que corresponde à data anunciada na véspera para a aplicação de tarifas de 25 por cento sobre os produtos mexicanos e canadianos. A China reagiu ontem, afirmando estar “firmemente determinada” a “defender os seus interesses nacionais”. “Sempre acreditámos que não há vencedores numa guerra comercial ou numa guerra tarifária”, declarou Mao Ning, porta-voz do Ministério dos Negócios Estrangeiros chinês, numa conferência de imprensa. A Presidente da Comissão Europeia (CE), Ursula von der Leyen, que participou no Fórum Económico de Davos, na Suíça, na terça-feira, garantiu que a Europa está pronta para falar com o governo dos Estados Unidos, lembrando que Washington é um importante parceiro comercial. A nossa primeira prioridade é iniciar rapidamente as conversações sobre os nossos interesses comuns e estarmos prontos para negociar”, afirmou: “Seremos pragmáticos, mas manter-nos-emos firmes nos nossos princípios: defender os nossos interesses e respeitar os nossos valores”, afirmou a líder europeia. “A Europa continuará a defender a cooperação, não só com os nossos amigos de longa data (…) mas também com todos os países com os quais temos interesses comuns”, acrescentou von der Leyen. “A nossa mensagem para o resto do mundo é simples: estamos prontos para dialogar convosco, se isso puder conduzir a benefícios mútuos”, acrescentou, assegurando que pretende “aprofundar” as relações entre Bruxelas e Pequim. Nada de novo Durante a sua campanha presidencial, Trump já tinha denunciado o défice comercial dos Estados Unidos em relação à UE, comparando o bloco a “uma pequena China” e acusando-o de se aproveitar da primeira potência económica mundial. “Temos um défice comercial com a UE de 350 mil milhões de dólares”, insistiu na terça-feira, referindo que “a China é agressiva, mas não é só a China, outros países também são grandes agressores”. O défice comercial dos EUA com a UE ascenderá a 131 mil milhões de dólares em 2023, de acordo com dados do Representante Comercial da Casa Branca (USTR), e está concentrado principalmente em quatro países: Alemanha, França, Irlanda e Itália. Antes de ser reeleito, Donald Trump já tinha ameaçado a UE com a imposição de direitos aduaneiros sobre os produtos europeus, a menos que o bloco aumentasse as suas compras de petróleo e gás americanos. O Comissário Europeu para a Economia, Valdis Dombrovskis, garantiu na segunda-feira, após a tomada de posse de Trump, que a UE está “pronta a defender os seus interesses económicos”, como já fez “durante a primeira administração Trump, quando introduziu tarifas sobre o aço e o alumínio”.
Hoje Macau Grande Plano MancheteÓbito / Rocha Vieira: Macau recorda último Governador português O último governador de Macau, Vasco Rocha Vieira, que morreu aos 85 anos, lançou as bases do sucesso da região chinesa e defendeu os direitos dos funcionários públicos, embora com “alguns desencontros”, disseram à Lusa dirigentes locais. Vasco Rocha Vieira, antigo Chefe do Estado-Maior do Exército entre 1976 e 1978, morreu na madrugada desta segunda-feira aos 85 anos, confirmou à Lusa fonte oficial daquele ramo militar. “É uma figura ilustre, fundamental na história da transição de Macau, mas também, em certa medida, do presente e do futuro”, disse José Sales Marques, presidente do Leal Senado, antiga câmara municipal, entre 1993 e 1999. “Há muita coisa que foi feita durante esse período e que hoje em dia continua. As bases da Região Administrativa Especial de Macau têm muito a ver também com a obra do tenente-general Rocha Vieira”, defendeu Sales Marques. Rocha Vieira exerceu o cargo de governador de Macau entre 1991 e 1999, quando se processou a transferência do território para a China. Foi no seu mandato que foi concluída a construção do aeroporto da cidade. A Macau que Rocha Vieira encontrou e a que deixou “não se compara. Aquilo que se fez naqueles anos todos é qualquer coisa que a história já tem registado”, defendeu Sales Marques. também membro do então Conselho Consultivo de Rocha Vieira. O antigo deputado António Ng Kuok Cheong disse à Lusa que, apesar da desconfiança dos chineses, a administração “tentou fazer alguma coisa para incentivar o crescimento económico da cidade, que era muito pobre nessa altura, antes de devolver Macau”. António Ng, eleito para a Assembleia Legislativa cinco meses depois da nomeação de Rocha Vieira, sublinhou que o principal obstáculo foi a resistência da China à liberalização do setor do jogo, que acabaria por só ser lançada em 2002. Algo que obrigou a administração portuguesa a vender terrenos para financiar os projetos de infraestruturas, inadvertidamente plantando as raízes do problema de habitação que Macau enfrenta atualmente, referiu. “Eles tentaram vender a terra de forma aberta, mas o Governo chinês impediu-os. Assim, a maior parte das terras foi vendida a pessoas poderosas da China por um preço muito baixo, porque a economia de Macau estava muito fraca”, recordou Ng. Estava criada uma classe de senhorios que, após Macau se tornar a capital mundial dos casinos, enriqueceu ao controlar a oferta e manter os preços da habitação elevados, lamentou o antigo deputado. O trabalho nos funcionários públicos Jorge Fão, um dos fundadores da Associação dos Trabalhadores da Função Pública de Macau (ATFMP), em 1987, notou que Rocha Vieira “cumpriu a missão como governador” e “dignificou o seu país”. O ex-presidente da ATFPM, à frente da associação “por mais de dez anos”, lembrou à Lusa que foi “sindicalista antes de ser político” e “teve alguns desencontros” com o tenente-general. Fão explicou que foi “um dos protagonistas” que trabalhou para que, após a transição de Macau para a China, “os funcionários públicos [da administração portuguesa] tivessem direito a uma pensão” paga por Portugal. “Nenhum funcionário das outras colónias teve direito (…) Quando se começou a falar de discutir a entrega de Macau para a China, ficámos muito preocupados. Encetámos as nossas lutas sindicais e tivemos vários encontros com a governança de Portugal e de Macau (…). Nós tivemos uns encontros e também nesses encontros tivemos desencontros”, lembrou. No final, resumiu o atual presidente da Assembleia Geral da Associação dos Aposentados, Reformados e Pensionistas de Macau, “o desfecho não foi mau”. “Todo o mundo deve estar satisfeito, também eu que tomei parte nessa luta e vivo dessa pensão já há mais de 30 anos”, defendeu. Na passagem da administração, contavam-se cerca de 3.600 aposentados com pensões transferidas para Portugal, concluiu. Em 2022, Jorge Fão disse à Lusa acreditar que viviam na região chinesa cerca de dois mil reformados da antiga administração portuguesa de Macau. PS enaltece vida “inteiramente dedicada ao serviço de Portugal” O PS manifestou pesar pela morte do último governador português de Macau, enaltecendo uma vida “inteiramente dedicada ao serviço de Portugal” de um “militar prestigiado” e de um dos “melhores intérpretes da importância de Macau”. Através de um comunicado, o partido liderado por Pedro Nuno Santos lamenta a morte de Vasco Rocha Vieira, “militar prestigiado e último Governador de Macau sob a administração portuguesa”. “A sua vida foi inteiramente dedicada ao serviço de Portugal, quer na sua carreira militar, quer na participação política a seguir ao 25 de abril, como membro do Conselho da Revolução (por inerência de funções enquanto Chefe de Estado Maior do Exército), Ministro da República nos Açores, Secretário Adjunto do Governo de Macau e Governador de Macau”, refere a mesma nota. Referindo que “a sua vida ficou para sempre ligada a Macau”, para o PS este “foi um dos melhores intérpretes da importância” daquele território “para a relação entre Portugal e a República Popular da China”, bem como da singularidade da agora região administrativa especial. “Os últimos anos da administração portuguesa do Território de Macau, sob a liderança do general Rocha Vieira, são marcados pela concretização de várias obras públicas infraestruturais importantes de suporte ao desenvolvimento subsequente de Macau, bem como de reformas na administração para a sua preparação para o período subsequente”, enaltece. Os socialistas referem ainda a cerimónia de transferência de soberania do Território de Macau para a República Popular da China, na qual foi inegável a forma como Rocha Vieira “personificou e simbolizou a dignidade e o tributo à presença portuguesa ao longo de séculos em Macau”. “E marcou a amizade e o respeito que os portugueses mantêm com Macau e com a República Popular da China, e que permite, ao fim de 25 anos de transição, preservar a singularidade de Macau que continua a ser ponto de encontro entre culturas”, acrescentou. O PS dá assim “nota pública do seu profundo respeito pelos serviços ao país” e “endereça à sua família e aos seus amigos as suas mais sentidas condolências”. Palavras de Eanes Já o antigo Presidente da República Ramalho Eanes classificou Rocha Vieira como “um homem de exceção” e “um dos melhores” entre as maiores figuras de Portugal. “O general Rocha Vieira era um homem de exceção pela sua ação de excelência e pela sua responsabilidade social assumida, merecendo ser, justamente, considerado ‘um dos melhores dos nossos maiores’”, escreveu António Ramalho Eanes numa nota enviada à agência Lusa. O primeiro chefe de Estado eleito da democracia portuguesa lembra Vasco Rocha Vieira como “um homem extraordinário”, sobretudo “a três níveis: pela sua personalidade distintiva, pelo seu desempenho militar relevante e pelos serviços prestados ao País a nível político”. A nível pessoal, Eanes considera que Rocha Vieira, que morreu hoje com 85 anos, “possuía qualidades de espírito superiores”, tinha “uma inteligência excecional”, “um bom temperamento” e “dispunha de uma personalidade forte”. Ao nível militar, “foi um dos militares mais distintos da sua geração, prestando, ao Exército, serviços relevantes, em tempos difíceis, nomeadamente, no estertor do regime político anterior ao 25 de Abril, no decurso do 25 de Abril e, mesmo, no 25 de Novembro, tendo, ainda, desempenhado um importante papel enquanto representante das Forças Armadas portuguesas junto da NATO”. Quanto ao nível político, Eanes conclui que Rocha Vieira teve uma atividade de “grande qualidade e grande importância para o país, quer como ministro da República para os Açores, quer ainda, como governador de Macau, colocando todo o seu empenho no desenho e execução, com sucesso, de uma política de transformação bem-sucedida de Macau, participando, igualmente, com o sucesso que é conhecido, na transferência da administração do território de Macau para a República Popular da China”. Recordações dos Açores O presidente do parlamento açoriano, Luís Garcia, manifestou também pesar pela morte de Vasco Rocha Vieira, recordando a “exemplar dedicação à causa pública” e o “contributo inestimável” para o país e para os Açores. “Ao longo da sua notável carreira militar e política, Rocha Vieira revelou um inabalável sentido de Estado, exemplar dedicação à causa pública e um profundo patriotismo, que marcaram de forma indelével o serviço prestado a Portugal”, afirma Luís Garcia numa nota de pesar. O presidente da Assembleia Legislativa da Região Autónoma dos Açores (ALRAA) refere que tomou conhecimento da morte do tenente-general, uma “figura ímpar e um dos mais ilustres oficiais do Exército português”, com “profunda consternação”. Segundo a nota, Luís Garcia “expressa as mais sentidas condolências à família enlutada, deixando um profundo testemunho de gratidão pelo seu contributo inestimável para o país e para os Açores”. “Enquanto ministro da República para a Região Autónoma dos Açores, entre 1986 e 1991, Vasco Rocha Vieira desempenhou as suas funções com elevado compromisso, contribuindo significativamente para o fortalecimento das relações institucionais e para a valorização da autonomia regional”, refere. O líder da ALRAA também salienta que o período em que Rocha Vieira esteve ao serviço dos Açores “é recordado como um tempo de dedicação ao diálogo e à construção de pontes entre os órgãos de soberania nacional e os órgãos de governo próprio da Região”. “Será também recordado pelo simbolismo da sua ação como último Governador de Macau, cargo que exerceu entre 1991 e 1999, momento em que liderou a transferência da administração portuguesa para a chinesa, num exemplo de sentido de responsabilidade e lealdade ao serviço público que ficará gravado na memória coletiva de Portugal”, concluiu. PM português manifesta-se O primeiro-ministro, Luís Montenegro, recordou hoje Rocha Vieira como “um dos mais brilhantes militares a dar corpo ao sentido patriótico de ser português”, destacando a sua ligação “histórica e marcante e Macau”. O tenente-general Vasco Rocha Vieira, último governador português de Macau e antigo Chefe do Estado-Maior do Exército, morreu hoje de madrugada aos 85 anos, confirmou à Lusa fonte oficial daquele ramo militar. “O general Vasco Rocha Vieira foi um dos mais brilhantes militares a dar corpo ao sentido patriótico de ser português, com especiais serviços na consolidação da nossa democracia e na ligação histórica e marcante a Macau, onde foi o último governador”, escreveu Luís Montenegro, numa publicação na rede social X. O primeiro-ministro apresentou ainda condolências à família e amigos e disse guardar de Rocha Vieira “gestos de amabilidade e palavras de responsabilidade cívica e política”.
Andreia Sofia Silva Grande Plano MancheteToponímia | Estudo relaciona ruas com nomes lusos com colonialismo Na dissertação de mestrado “Cultura Sino-portuguesa em Macau – História nas Ruas”, Zhao Zhen defende que a Administração portuguesa diluiu “a identidade nacional” da população chinesa, ao colocar nomes com referência a Portugal nas ruas, nomeadamente de escritores, navegadores, governadores e funcionários públicos Zhao Zhen, autor da dissertação de mestrado “Cultura Sino-portuguesa em Macau – História nas Ruas (História e Cultura Sino-portuguesa sob perspectiva dos nomes das ruas de Macau)”, defende que a escolha de nomes de ruas com referência a Portugal durante os anos da Administração portuguesa foi uma forma eficaz de colonização e de criação do sentimento de pertença à nação colonizadora, sobretudo no que diz respeito à comunidade chinesa. Na dissertação, defendida na Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro (UTAD), conclui-se que “antes do regresso de Macau à China o Governo português levou a cabo uma prática política e cultural através da atribuição de nomes de ruas à maneira portuguesa”. Assim, os nomes das ruas de Macau serviram “como meio de transmissão de uma memória colectiva, começando com a construção da imagem do Governo português em Macau e a orientação dos seus principais valores”, com recurso a “figuras e acontecimentos históricos icónicos para reforçar a identificação dos colonizados com a sua identidade colonizadora”. Zhao Zhen acrescentou ainda que “durante os 400 anos da colonização de Macau pelo Estado português foram aplicados símbolos linguísticos aos habitantes de Macau através da nomeação das ruas, diluindo a identidade nacional tradicional dos chineses e implantando a dos colonizadores, alcançando assim o objectivo de remodelar a identidade nacional dos habitantes locais”. Para o autor do estudo, a questão da toponímia muito particular do território trouxe consequências no que diz respeito à identidade nacional. “Os nomes das ruas de Macau são diferentes dos de outras cidades chinesas, e isto teve impacto na identidade cultural da população local, que cresceu com a história e cultura chinesa e portuguesa e que não tem um forte sentido de identidade cultural. Dilui, assim, a sua missão de transmitir a sua cultura nacional.” Uma forma de domínio É certo que o trabalho académico de Zhao Zhen, na área das Ciências da Cultura, chama a atenção para o facto de a toponímia de Macau ser reflexo de uma mistura de culturas. Porém, o autor vai mais longe, analisando quantas ruas existem em português e chinês com nomes de personalidades importantes, destacando-se o facto de a cultura portuguesa ser dominante. O facto de existirem em Macau ruas com nomes de militares, de antigos governadores ou de políticos portugueses, como Mário Soares, Sidónio Pais ou Ramalho Eanes, é apontado como sinónimo de que os portugueses apostaram “num processo eficaz” de transmitir “uma visão materializada do mundo que influencia e transmite as relações sociais entre pessoas e diferentes classes sociais”. Assim, o que ocorreu foi “um acto que não utiliza a violência como forma de controlo forçado das mentes e da consciência da população”, em que não foi aplicado “um meio de coerção”. Zhao Zhen refere que “no total existem 26 ruas com o nome de funcionários governamentais portugueses em Macau que se distinguiram pelo contributo que deram à cidade, não havendo qualquer rua com o nome de um funcionário chinês em Macau”. Tal mostra “a distinção feita pelos colonizadores portugueses enquanto classe dominante e os chineses como classe dominada”, é indicado. Porém, o autor ressalva que “a colonização portuguesa de Macau não foi uma agressão ou domínio absolutos”, pois “os colonizadores tentaram alcançar a liderança a partir de uma variedade de perspectivas, incluindo ideológicas”, em que “o processo de alcançar esta liderança foi intercalado com uma existência cinzenta racial e cultural mais complexa”. Segundo o autor, “a primeira delimitação sistemática de ruas e o estabelecimento de nomes pelo Governo português de Macau foi em 1869”, sendo que foram usados bastantes nomes com ligação aos Descobrimentos e ao antigo Império português. Zhao Zhen dá o exemplo da Rua de João de Almeida, que “tem o nome de um general que se destacou nas campanhas de afirmação do poder colonial em Angola, África, no princípio do século XX”. No total, há 26 ruas com referências aos Descobrimentos e antigos navegadores portugueses, mostrando-se que “a Administração colonial [portuguesa] utilizou forças políticas externas para doutrinar os habitantes de Macau com a intenção de alcançar a liderança, guiando a sociedade através da manipulação espiritual, moral e cultural”. Além disso, o autor considera que foi utilizado “um vocabulário colonial para criar um sentido de identidade e subordinação entre os habitantes, a fim de alcançar uma colonização permanente”. Destaque para a existência de nove ruas em Macau com o nome de macaenses, como é o caso da Rua Francisco H. Fernandes, que nasceu no território a 13 de Fevereiro de 1863, filho de pais portugueses, e que foi amigo próximo de Sun Yat-sen, pai da Revolução Republicana na China, em 1911. O lugar dos chineses Na mesma dissertação lê-se que, em contraste com a primazia das referências à cultura e história portuguesas, existem apenas 12 ruas em Macau “com o nome de chineses”, sendo que a maioria “eram mercadores da península e todos tinham ligações com o Governo português da região”. Por sua vez, “a Avenida Dr. Sun Yat-sen é a única rua com o nome de uma figura política chinesa”. Citando outro académico, de apelido Kuan, Zhao Zhen refere que “no caso das denominações com nomes de celebridades chinesas, além de serem inferiores em número, foram figuras não políticas”. “O Governo português de Macau, quando baptizava as vias públicas, teve intencionalmente em conta factores políticos, querendo transmitir a mensagem de que Macau se encontrava sob domínio português e que, politicamente falando, era uma colónia portuguesa”, referiu este mesmo académico. Destaque para duas ruas nomeadas após o regresso de Macau à China, nomeadamente a Avenida Doutor Henry Fok e Avenida Doutor Ma Man Kei. “Estas personalidades distinguiram-se pelas contribuições notáveis para a reunificação de Hong Kong e Macau e para o desenvolvimento da China, pelo que a atribuição do nome da rua a estas personalidades reflecte a influência de factores políticos após o fim da longa história colonial de Macau e a reunificação suave com a China. A adição da palavra ‘doutor’ aos seus nomes mostra ainda mais respeito por eles”, pode ler-se. Destaque ainda para a existência de 140 ruas em Macau cujos nomes são traduzidos foneticamente do chinês, destacando-se a Avenida de Ip Heng, Avenida de Lok Koi, Pátio de Iong Loc, Pátio Fu Van ou Rua de San Lei. “Todas estas palavras chinesas expressam o desejo do povo numa vida melhor e a procura de qualidade de vida. Outras nomeações estão relacionadas com a religião chinesa, como o Largo de Pao Cong Mio, Rua de Kun Iam Tong”, é referido, sem esquecer as 69 ruas com nomes parafraseados em chinês com ligação a crenças chinesas. “A fim de viver uma vida melhor e de a encaminhar na direcção que se espera, a nomeação das ruas reflecte elementos geográficos, bem como as esperanças das pessoas para as suas vidas futuras. Os nomes das ruas são mencionados e usados com tanta frequência que as pessoas tendem a dar-lhes bons significados para satisfazerem as suas próprias intenções de uma vida melhor. Influenciados por conceitos culturais tradicionais chineses, muitos dos nomes das ruas em Macau têm significados auspiciosos e de sorte, com as palavras ‘Harmonia, Tranquilidade, Amizade, Benevolência, Concórdia'”. Há ainda ruas cujos nomes “mostram o desejo dos comerciantes de ter um negócio próspero e de conseguirem todos os lucros que advém da realização dos negócios”. Em termos gerais, Zhao Zhen conclui que “a experiência de Macau prova a possibilidade de coexistência harmoniosa de diversas comunidades e culturas”, sendo que a toponímia “reflecte a coexistência e mistura do Oriente e do Ocidente, a harmonia e diferença entre eles, que hoje é espelho da cultura e dos valores fundamentais da sociedade”.
Hoje Macau Grande Plano MancheteEUA | Trump toma posse e lança farpas à China sobre Canal do Panamá O novo Presidente norte-americano, Donald Trump, prometeu esta segunda-feira assumir o controlo do Canal do Panamá, rebatizar o Golfo do México e reforçar a tributação dos países estrangeiros, confirmando intenções já expressadas para o segundo mandato na Casa Branca. No seu discurso na cerimónia de tomada de posse como 47.º Presidente dos Estados Unidos Donald Trump sublinhou que o objectivo do acordo e o espírito do tratado em relação ao Canal do Panamá “foram totalmente violados”, prometendo assumir controlo desta infraestrutura marítima vital para o comércio global. “E o mais importante, a China opera o Canal do Panamá, e nós não o demos à China, demos ao Panamá. E vamos tomá-lo de volta”, justificou no seu discurso realizado no Capitólio (sede do Congresso norte-americano), em Washington. Noutra intenção já anteriormente expressada, Trump confirmou também que, em breve, vai mudar o nome do Golfo do México para “Golfo da América”. Mais impostos No seu regresso à Casa Branca (presidência norte-americana), depois de um primeiro mandato entre 2017 e 2021, o político republicano afirmou ainda que pretende reforçar a tributação dos países estrangeiros em favor dos cidadãos norte-americanos. “Começarei imediatamente a reformar o nosso sistema comercial para proteger as famílias e os trabalhadores americanos. Em vez de taxar os nossos cidadãos para enriquecer outros países, vamos impor tarifas e impostos aos países estrangeiros para enriquecer os nossos cidadãos”, declarou. Expulsar ilegais Donald Trump garantiu ainda que irá expulsar “milhões e milhões” de imigrantes ilegais, um dos principais focos da sua campanha eleitoral. “Primeiro, declararei o estado de emergência na nossa fronteira sul” com o México, disse o Presidente, acrescentando que vai enviar o Exército para patrulhar essa região. “Todas as entradas ilegais serão imediatamente bloqueadas e iniciaremos o processo de devolução de milhões e milhões de estrangeiros criminosos para onde vieram”, acrescentou o Presidente republicano. O juramento do novo líder norte-americano foi realizado logo após a posse do seu futuro vice-presidente, JD Vance, com o qual liderou a nomeação do Partido Republicano, que, em 05 de novembro de 2024, venceu as eleições presidenciais contra a candidatura democrata encabeçada por Kamala Harris. A cerimónia em Washington decorreu às 17h, hora de Lisboa (madrugada em Macau) e foi marcada pela presença de políticos internacionais populistas e de extrema-direita, mas com escassos responsáveis governamentais e sem líderes da União Europeia (UE), à excepção da primeira-ministra italiana, Giorgia Meloni.
Andreia Sofia Silva Grande PlanoOxfam | Relatório diz que fortunas dos mais ricos aumentaram em 2024 Um relatório divulgado ontem pela Oxfam indica que as fortunas dos mais ricos do mundo aumentaram dois biliões de dólares no ano passado, o equivalente a 5,7 mil milhões de dólares por dia. A organização não governamental sugere medidas que favoreçam a igualdade e alerta para os riscos da concentração de riqueza e poder Chama-se “Takers not Makers – The unjust poverty and unearned wealth of colonialism” [Os que recebem e não criam – A injusta pobreza e a riqueza não merecida do colonialismo] e é o mais recente relatório da Oxfam, organização não governamental (ONG) que reúne 19 países. O documento chama atenção para a pobreza no mundo e para as desigualdades na distribuição da riqueza. O relatório divulgado ontem conclui que a desigualdade não dá sinais de abrandar. Isto porque, no ano passado, a riqueza combinada de multimilionários, a nível global, aumentou dois biliões de dólares, o equivalente a 5,7 mil milhões de dólares por dia, segundo a Oxfam. Tal significa que cresceu a um ritmo três vezes superior ao do ano anterior, de acordo com a ONG. Esta foi a principal conclusão do relatório divulgado ontem por ocasião do início do Fórum Económico Mundial de Davos, que todos os anos reúne os principais líderes políticos e económicos do mundo na cidade alpina. Só no último ano, refere o relatório, surgiram em média quase quatro novos multimilionários por semana, dado que a Oxfam põe em contraste com os dados da pobreza do Banco Mundial, que estima que o número de pessoas que vivem com menos de 6,85 dólares por dia quase não se alterou desde 1990. Em 2024, havia em todo o mundo 2.769 multimilionários, em vez de 2.565 no ano anterior, e a sua riqueza combinada aumentou de 13 para 15 biliões de dólares em apenas 12 meses. É o segundo maior aumento da riqueza combinada dos multimilionários num único ano desde que há registo. Mais 100 milhões A riqueza conjunta dos dez homens mais ricos do mundo aumentou, em média, quase 100 milhões de dólares por dia, indica o estudo. Mesmo que perdessem 99 por cento da sua riqueza de um dia para o outro, “continuariam a ser multimilionários”. A ONG prevê que, em menos de uma década, surja o primeiro “bilionário” do planeta e não exclui a possibilidade de haver pelo menos cinco. A nível mundial, o relatório revela que 36 por cento da riqueza dos mais ricos é herdada e 61 por cento é também marcada pelo clientelismo e/ou ligada ao poder monopolista. A Oxfam baseia-se nos dados do ‘ranking’ de riqueza da revista Forbes, que mostram que todos os multimilionários com menos de 30 anos herdaram a sua riqueza e, segundo dados do banco suíço UBS, nos próximos 20 a 30 anos, mil dos multimilionários actuais deixarão aos seus herdeiros mais de 5,2 biliões de dólares. Dinheiro do Sul Para a Oxfam, o sistema “faz com que se movam grandes fluxos de dinheiro do Sul global para o Norte, beneficiando a população mais rica”, numa espécie de “colonialismo moderno”. Só em 2023, através do sistema financeiro, terão sido retirados 30 milhões de dólares por hora dos países do Sul global para o 1 por cento mais rico dos países do Norte global, como o Reino Unido, os Estados Unidos e França. Deste modo, os “super-ricos” dos países do Norte global controlam 69 por cento da riqueza mundial, concentram 77 por cento da riqueza conjunta de todos os multimilionários e representam cerca de 68 por cento do total, embora constituam apenas 21 por cento da população mundial.Para contextualizar esta desigualdade, a Oxfam refere o problema da habitação em Espanha e estima que “os cinco futuros bilionários do planeta terão tanto dinheiro que poderão comprar todas as casas do país”. Em contraste, é chamada a atenção para o facto de a “classe trabalhadora lutar para sobreviver.” “Quem vive em pobreza em todo o mundo continua a enfrentar múltiplas crises, pois as cicatrizes da pandemia ainda estão connosco sob forma de dívidas impagáveis, salários mais baixos e preços de géneros alimentícios muito mais elevados”. Além disso, “os conflitos também estão a aumentar, o que contribui para a pobreza, fome e desigualdade”, sem esquecer “o enorme impacto humano da degradação climática que aumenta todos os anos, com mortes causadas por calor excessivo, condições climáticas extremas e fome”. A Oxfam diz mesmo que a reeleição de Donald Trump como Presidente dos Estados Unidos, em Novembro último, “deu um enorme impulso às fortunas dos bilionários, enquanto as suas políticas estão preparadas para atiçar ainda mais as chamas da desigualdade”. A ONG destaca também dados do Banco Mundial no seu mais recente relatório sobre pobreza, onde é referido que “se as actuais taxas de crescimento se mantiverem e a desigualdade não diminuir, será necessário mais de um século para acabar com a pobreza”. O documento mostra que “se reduzirmos a desigualdade, a pobreza poderia ser eliminada três vezes mais depressa”. Um dos destaques vai para a contribuição das mulheres para a riqueza de poucos. “As mulheres racializadas que vivem na pobreza, especialmente as que estão no ‘Sul Global’, continuam a subsidiar a economia global. Estima-se que todos os dias as mulheres contribuem com 12,5 biliões de horas de trabalho não remunerado, acrescentando pelo menos 10,8 triliões de dólares em valor à economia global”. Nesse contexto, “a contribuição económica do seu trabalho de prestação de cuidados é três vezes superior ao valor financeiro da indústria tecnológica mundial”. Um novo colonialismo É certo que a descolonização de regiões colonizadas por potências europeias começou a ocorrer com mais força a partir da Conferência de Bandung, em 1955, mas persistem sinais de desequilíbrio de poder entre povos e países que explicam, em parte, a desigualdade de riqueza que ocorre hoje. A ideia de um novo colonialismo, no sentido em que regiões como a Europa ou América do Norte continuam a explorar os países do Sul, sobretudo os menos desenvolvidos, está bem patente no relatório da Oxfam. “A ascensão de uma nova oligarquia em que a herança, o clientelismo e o poder de monopólio geram riqueza extrema. Sem controlo, estamos prestes a ver a maior transferência da maior riqueza geracional da história da humanidade, dificilmente ganha, dificilmente tributada”. O que se passa hoje é um panorama de “colonialismo bilionário”, descreve a Oxfam, com a “transferência de riqueza não apenas para os ultra-ricos, mas desproporcionadamente para os ultra-ricos do Norte Global”. Há um “acerto de contas com o colonialismo não só como uma história de extração brutal de riqueza, mas também como uma força poderosa que conduz a níveis extremos de desigualdade hoje”. A Oxfam chama também atenção para uma nova onda de colonialismo patente nas acções das grandes instituições económicas e financeiras que decidem o rumo da economia global, como o Fundo Monetário Internacional (FMI), a Organização das Nações Unidas (ONU) e o Banco Mundial. “As instituições globais, os mercados financeiros e as empresas multinacionais, todas elas moldadas pelo colonialismo e domínio dos países ricos, continuam a facilitar a transferência sul-norte de triliões de dólares todos os anos.” Para a Oxfam, a ONU, FMI e Banco Mundial “foram criados há 80 anos, perto do fim do período colonial histórico, e a sua governação desigual pouco se alterou desde então”. “Os países do G7 continuam a deter 41 por cento dos votos no FMI e Banco Mundial, apesar de terem menos de dez por cento da população mundial. Os líderes do Banco Mundial e do FMI continuam a ser decididos pelos Estados Unidos e Europa, respectivamente. De igual modo, os países europeus e outras nações do Norte Global detêm 47 por cento do total de assentos no Conselho de Segurança da ONU, apesar de representarem apenas 17 por cento da população mundial”. De referir que “o FMI e o Banco Mundial continuam a ter uma enorme influência no sistema económico global e, em particular, nas políticas económicas dos países de baixo e médio-baixo rendimento”. Estas entidades, segundo a Oxfam, “insistem sistematicamente na implementação de cortes em despesas críticas”. Um dos exemplos apresentados é do FMI, que “exige que os países devedores priorizem o pagamento das dívidas a credores acima de tudo e que implementem políticas que incluam a privatização, liberalização do comércio e redução dos défices públicos para obter novos empréstimos”. “Estas políticas prejudicam o acesso a uma educação de qualidade e a preços acessíveis e cuidados de saúde, com um impacto negativo na saúde pública”, acrescenta-se. O que fazer? A Oxfam propõe uma série de medidas para mitigar a crescente desigualdade entre os mais ricos e o resto do planeta, sugerindo, entre outras, que os Governos se comprometam a garantir que o rendimento dos dez por cento mais ricos da população não excederá o dos 40 por cento mais pobres, tanto a nível nacional como mundial. O relatório insta também a um aumento dos impostos sobre as grandes fortunas, através de um sistema fiscal internacional concebido pela ONU, e a eliminação dos paraísos fiscais. Com Lusa