Ung Vai Meng alerta para negligência de locais históricos no Plano Director

[dropcap]U[/dropcap]ng Vai Meng, ex-presidente do Instituto Cultural (IC), alertou para a necessidade de uma maior preservação de zonas históricas tendo em conta o actual projecto do Plano Director, noticiou o jornal Ou Mun. Segundo Ung Vai Meng, a definição de zonas constante no projecto pode alterar o actual tecido histórico do território, tendo dado como exemplo o desaparecimento do istmo Ferreira do Amaral [que vai da praça das Portas do Cerco, a norte, à Estrada do Arco, a sul] da zona Norte 2. De frisar que este istmo era uma “língua” de terra que ligava a península de Macau à China, sendo “um laço importante” entre Macau e o país e que por isso deve ser mantido, disse Ung Vai Meng. O ex-presidente do IC disse também, numa sessão de consulta pública sobre o projecto, que a proposta de nomeação das zonas também negligencia nomes como Areia Preta, Mong-Há e Nam Van que têm o seu significado histórico e já fazem parte do léxico da população.

Mak Tat Io, chefe do departamento de Planeamento Urbanístico da Direcção dos Serviços de Solos, Obras Públicas e Transportes (DSSOPT), explicou que a divisão territorial proposta foi feita em termos estatísticos, sendo efectuada a divisão do centro histórico em três zonas [Zona Central 1, 2 e 3] que possuem maior ligação entre si. Além disso, a separação pode resultar numa divisão das ruas e zonas, embora o futuro Plano Director tenha em conta o património e o actual tecido urbano. Mak Tat Io disse ainda que a zona do istmo Ferreira do Amaral é mencionada na lista dos 23 corredores visuais.

Consenso, precisa-se

Na mesma sessão de consulta pública, alguns residentes levantaram a questão do futuro crematório. Mak Kim Meng, representante do Instituto para os Assuntos Municipais (IAM), adiantou que a localização será feita com base no consenso da sociedade e que não existem, para já, quaisquer planos. O responsável adiantou ainda que o projecto do Plano Director prevê dez por cento de terrenos para equipamentos de utilização colectiva e 23 por cento para a construção de infra-estruturas públicas, pelo que haverá espaço suficiente para o crematório. Mak Tat Io disse que isso não significa que existe a necessidade de construir o crematório, mas tal assunto será decidido quando houver consenso social.

11 Out 2020

Henrique de Senna Fernandes, o autor que falta traduzir e estudar 

Nam Van – Contos de Macau, livro de Henrique de Senna Fernandes, tem agora uma edição em inglês, mas o caminho não se fica por aqui. David Brookshaw, tradutor da obra do escritor macaense, acredita que seria importante mais traduções em inglês sobretudo a pensar na diáspora macaense que reside nos EUA. Dois académicos defendem que há ainda muito a estudar na obra de Senna Fernandes

[dropcap]N[/dropcap]o ano que marca o décimo aniversário da morte do maior romancista macaense de sempre, a organização do festival literário Rota das Letras decidiu apostar na tradução, para inglês e chinês, de Nam Van – Contos de Macau, de Henrique de Senna Fernandes. No entanto, não só é preciso traduzir mais obras de Senna Fernandes para que se tornem mais globais, como são necessários mais estudos académicos sobre aquilo que escreveu.

Ao HM, David Brookshaw, tradutor oficial da obra de Senna Fernandes para inglês, destaca o facto de este tipo de traduções necessitarem sempre de um grande trabalho de diálogo e de sedução junto das editoras. A literatura macaense pode ser considerada de nicho e o interesse por ela pode dissipar-se com os anos, mas David Brookshaw acredita que fazem falta mais traduções em inglês a pensar na diáspora macaense a residir nos EUA.

“Quando fiz a tradução de ‘A Trança Feiticeira’ para a Hong Kong University Press achava que seria interessante para os leitores de Hong Kong, mas isso não chega para justificar uma tradução em inglês. A Hong Kong University Press tem uma editora parceira nos EUA e acho que esse mercado é importante, porque o país está mais aberto a traduções do que o meu país, por exemplo [Reino Unido].” Além disso, “há uma importante diáspora nos EUA que já não tem ou que nunca teve o português como língua”.

Traduzir Senna Fernandes para inglês também seria importante “para o campo de estudos sobre literaturas asiáticas”, exemplificou David Brookshaw.

O tradutor, que actualmente se dedica a traduzir Pepetela, escritor angolano, e que também se debruça sobre os escritos de Mia Couto, confessa que chegou a tentar uma tradução, também junto da Hong Kong University Press, de “Amor e Dedinhos de Pé”. “Não consegui nada com esse contacto, porque isso tem a ver com as pessoas que estão nas editoras. E o editor da Hong Kong University Press reformou-se há muito tempo e nunca mais tive esse contacto pessoal. Depois vieram outros projectos”, adiantou.

Quanto a “Nam Van – Contos de Macau”, David Brookshaw já tinha traduzido dois contos para o projecto de uma antologia. Desta vez coube-lhe a tradução dos restantes contos e a revisão do que já tinha traduzido.

“Nestes 20 anos melhorei como tradutor. O meu inglês e português são melhores”, disse. “Pelo que vejo o Ricardo [Pinto] tem interesse em promover a literatura de Macau em língua portuguesa para inglês, para ter um público maior em Macau e até na grande China.”

Uma obra documental

Rogério Miguel Puga, académico da Universidade Nova de Lisboa (UNL) que se dedica a estudar muita da literatura macaense, também defende a aposta na tradução das obras de Henrique de Senna Fernandes, tendo em conta o carácter documental da sua obra. “É de louvar esta iniciativa [de traduzir Nam Van – Contos de Macau] e talvez se pudessem traduzir mais obras dele. Os contos são muito interessantes. Isso iria facilitar o acesso a essa literatura por parte dos investigadores de língua inglesa, para poderem estudar a literatura de Macau em comparação com outras”, defendeu ao HM.

Além da tradução, Rogério Miguel Puga fala da importância da academia olhar mais para os escritos de Senna Fernandes. “Há ainda muita coisa a explorar na sua obra, sobretudo esta dimensão plural dos seus romances. Já há muita coisa estudada e publicada mas há um trabalho [necessário] de sistematização das principais temáticas da literatura macaense, que estão todas, de uma forma mais desenvolvida e substancial, na obra de Senna Fernandes. A obra dele funciona como um repositório representativo das temáticas da literatura macaense. Há muito trabalho ainda por fazer e espero que os novos investigadores o façam”, apontou.

Também Dora Nunes Gago, docente da Universidade de Macau (UM), acredita que continua a ser importante olhar os contos e romances de Henrique de Senna Fernandes do ponto de vista dos estudos comparatistas.

“Apesar das diversas teses e estudos já realizados sobre o autor tanto em Macau como em Portugal ou no Brasil, e outros países, creio que continuam a surgir novas vias de abordagem e de análise, nomeadamente através de perspectivas comparatistas.”

No caso da UM, o departamento de português tem neste momento dois alunos do mestrado de Estudos Literários e Culturais a estudar as obras do autor, além de que Nam Van – Contos de Macau foi também tema de uma tese de mestrado defendidas em Julho do ano passado, também na UM.

“De um modo geral os alunos de mestrado mostram interesse e lêem com muito agrado as obras do autor. Os alunos da China sentem-se seduzidos pela representação de um universo social e cultural que é distinto deles, apesar da proximidade. Já os alunos de Macau revelam curiosidade relativamente ao passado da sua terra”, frisou Dora Nunes Gago.

Um “natural contador de histórias”

Traduzir Henrique de Senna Fernandes é trazê-lo para o século XXI e fazer com que ele perdure no tempo. Mas é também um meio para que chegue a novas gerações, apesar de David Brookshaw o considerar “um escritor um pouco do século XIX”. Mas, datas à parte, o que os leitores querem são boas histórias, aponta o tradutor.

“Ele foi um natural contador de histórias. São histórias empolgantes em que a juventude contrasta com a velha geração conservadora. É o liberalismo contra o conservadorismo com a qual os jovens podem sempre identificar-se. Embora chame o autor de um ficcionista do século XIX era também a juventude que ele conhecia. Ele cresceu no tempo dos grandes filmes de Hollywood e portanto as histórias dele também funcionam um pouco como filmes.”

Além disso, traduzir Henrique de Senna Fernandes tem a tradução primordial de contribuir para a manutenção da comunidade macaense, tema onde perdura “um certo pessimismo”. “Talvez por essa razão seja preciso dar a conhecer a vida da comunidade. E mesmo que o futuro seja outro é preciso conhecer a história, sobretudo durante a vida e juventude do Henrique”, disse.

É esse ponto que é tão importante e que “fascina” Rogério Miguel Puga: o facto de estarmos perante obras que são verdadeiros retratos documentais de uma época, sociedade ou comunidade. “Os romances de Senna Fernandes funcionam quase como crónicas ou documentários da vida de Macau em termos da acção dos romances e da interacção entre a cidadela cristã e a comunidade chinesa, as especificidades da comunidade macaense. Ele utiliza inclusivamente diálogos e termos em patuá e isso torna a obra de Henrique de Senna Fernandes muito interessante, assim como os contos.”

Uma forma de reflexão

Para Dora Nunes Gago, há um “indiscutível valor cultural, social e histórico da obra de Henrique de Senna Fernandes que se mantém, pois é intemporal”. “Através da leitura dos seus romances, revisitamos o passado de Macau, e, através dessa revisitação, colhemos lições para o nosso presente e futuro. Assim, no mundo globalizado do século XXI, marcado em certa medida pelo individualismo, extremismos e rejeição de diferenças, a obra de Senna Fernandes convida-nos a reflectir sobre as mais variadas formas de tolerância, de aceitação do ‘outro’ distinto e diverso, sobre os modos de ultrapassar barreiras, aparentemente quase intransponíveis, entre diferentes comunidades , línguas e culturas”, acrescenta a académica.

Mais do que isso, os escritos de Senna Fernandes são uma “voz que se ergue a relembrar os complexos e ricos meandros da identidade macaense, contribuindo para um sentido de pertença, no caso dos leitores de Macau, e que parece que se esbate, ao longo do tempo, devido a uma descaracterização que afecta continuamente Macau”, conclui Dora Nunes Gago.

11 Out 2020

Pandemia aumentou poder de negociação a empregadas domésticas 

Melody Lu, docente da Universidade de Macau, disse ontem num debate promovido pela Fundação Rui Cunha e pela Macau Business que as empregadas domésticas ganharam poder para negociar melhores condições laborais com a crise da pandemia. A falta de mão-de-obra foi a razão apontada

 

[dropcap]N[/dropcap]em todos os sectores económicos de Macau ficaram a perder com a pandemia da covid-19. Melody Lu, docente da Universidade de Macau (UM), disse ontem no debate “Blue Card Holders: The Unlovers?” que as empregadas domésticas passaram a poder negociar melhores salários e condições laborais, uma vez que muitos trabalhadores não residentes (TNR) deixaram o território.

“Muitos dos TNR que ficaram em Macau perderam o emprego, mas em alguns sectores, como o do trabalho doméstico, houve muita procura. Penso que os que ficaram em Macau puderam discutir um melhor salário ou até escolher patrões. Em alguns sectores registou-se falta de trabalhadores”, disse.

Esta situação foi confirmada ao HM por Nedie Taberdo, presidente da Green Philippines Migrant Workers Union. “É verdade. Nas últimas semanas alguns amigos chineses e portugueses pediram-me recomendações. Muitas empregadas domésticas escolhem os seus trabalhos e as condições, e pedem melhores salários porque não há muitos trabalhadores para contratar.”

Apesar disso, os salários continuam a ser baixos, muitos deles abaixo das quatro mil patacas. “Muitos trabalhadores estão à procura de trabalhos com salários melhores”, assegurou Nedie Taberdo.

Uma lei negativa

Melody Lu falou também dos efeitos negativos da nova lei dos TNR, que proíbe aos turistas a procura de trabalho, o que obriga o processo de recrutamento a passar por uma agência de emprego. Segundo a académica, tal pode afastar TNR do território.

“As trabalhadoras domésticas têm de pagar, em média, o dobro do seu salário, e os trabalhadores da indústria hoteleira pagam cerca de três meses de salário às agências. A intenção do Governo [com a lei] é boa, porque estabelece uma percentagem, não querem que as cauções sejam muito elevadas. Mas isso vai aumentar os custos para virem trabalhar para Macau, o que torna o território num lugar menos desejável. Como residentes, temos de perguntar se queremos mesmo isto.”

Nedie Taberdo também acredita que a situação não será fácil para os TNR nos próximos meses devido à lei. “Ninguém vem para Macau procurar trabalho. Algumas empregadas domésticas querem mudar para um patrão melhor, mas têm de candidatar-se através de uma agência e pagar as cauções, que são muito elevadas.”

Melody Lu pediu também que o Governo faça uma análise global das necessidades do mercado laboral para os próximos tempos. “Quando as fronteiras abrirem, a vinda destes trabalhadores não será igual, haverá algumas restrições. Esta é a altura de o Governo olhar para o panorama do mercado laboral. Se Macau quer ser um destino internacional de turismo não pode contar apenas com os locais, ou com os trabalhadores da China.”

A docente da UM criticou ainda o facto de, após o período de confinamento, o Governo ter aberto a fronteira a apenas turistas ou trabalhadores não residentes (TNR) oriundos da China. “Temos de perguntar se é por uma questão de saúde pública ou de quarentena que temos esta política. O Governo não deu as devidas explicações sobre isso.”

9 Out 2020

World Press Photo | Falta de esclarecimentos gera suspeitas de interferência política

O encerramento antecipado da exposição de fotojornalismo, que estava patente na Casa Garden, gerou confusão e suspeitas de pressões políticas. Enquanto a Fundação do World Press Photo tenta perceber o encerramento, há fotógrafos locais a defender a legitimidade do Governo Central para encerrar o evento

 

[dropcap]S[/dropcap]em qualquer aviso prévio a exposição World Press Photo foi encerrada no passado fim-de-semana, quando deveria ter permanecido patente ao público até 18 de Outubro. Oficialmente, a entidade organizadora, a Casa de Portugal, explicou o fecho prematuro com “um problema de gestão interna”.

Também a Fundação Macau, um dos patrocinadores do evento, recusou ter feito qualquer pressão para encerrar a exposição que tinha fotografias das manifestações de Hong Kong.

Até ao final do dia de ontem, a Fundação da World Press Photo não obteve respostas concretas sobre o sucedido: “Infelizmente, não conseguimos confirmar as razões que levaram ao encerramento prematuro da exposição”, foi reconhecido pela entidade, em comunicado. “O apoio às condições para a liberdade de expressão, de investigação e de imprensa é uma parte fundamental do nosso trabalho. Lamentamos o encerramento prematuro da nossa exposição anual em Macau. A nossa colaboração com a Associação Casa de Portugal foi sempre positiva e esperamos poder regressar a Macau”, foi acrescentado por Laurens Korteweg, director da área de Exposições da Fundação da World Press Photo.

Contudo, as explicações conhecidas ficaram longe de convencer a comunidade de fotógrafos locais, que entendem ser benéfico esclarecimentos adicionais. No entanto, há mesmo quem não afaste a hipótese de o encerramento ter partido do Executivo de Macau ou dos representantes directos do Governo Central, face à existência de fotografias de Hong Kong.

Para acabar com o “mundo pantanoso da especulação”, o fotógrafo e advogado João Miguel Barros defendeu a necessidade de esclarecimentos. “As explicações públicas que li nos jornais não esclarecem as razões do fecho antecipado. Mas houve, seguramente, razões preponderantes para que tal tivesse acontecido; de contrário a exposição estaria aberta até ao fim”, começou por indicar.

O advogado pediu que as entidades assumam as responsabilidades das acções que tomam. “Não acredito que a Casa de Portugal ou a Fundação Oriente tenham motivos para antecipar o fecho. O que se espera é que as verdadeiras razões sejam assumidas por quem as tomou, de modo a sairmos deste mundo pantanoso da especulação.”

Intervenção natural

Por sua vez, Yau Tin Kwai, presidente do Clube Foto-Artístico de Macau, admitiu a hipótese do encerramento ter partido das indicações do Governo de Ho Iat Seng. “Se a exposição tinha fotografias sobre Hong Kong, então foi melhor encerrar antecipadamente. Há sempre a preocupação que estas fotos possam influenciar as perspectivas das pessoas, fazendo com que fiquem confusas”, declarou ao HM.

O fotógrafo apontou ainda que é muito fácil manipular as imagens: “As fotos são mais fortes que as palavras, mas podem ser tiradas através de ângulos diferentes, que fazem com que o conteúdo seja diferente do que aconteceu”, explicou o presidente da associação. Nesse sentido, deixou críticas a trabalhos feitos em Hong Kong: “Alguns fotógrafos não tiraram as fotografias quando os manifestantes atacaram os polícias. Só tiraram quando os polícias usaram a força, ou seja, essas imagens não são um retrato rigoroso do que aconteceu” sustentou.

Quanto a eventuais pressões por parte do Governo, Yan Tin Kwai considerou naturais e deu o exemplo de uma exposição que organizou recentemente, onde constava erradamente que a covid-19 tinha chegada a Macau através dos Estados Unidos. “Na minha exposição enganei-me na data de chegada da primeira pessoa infectada a Macau, por isso a Direcção de Serviços de Turismo [entidade responsável pelo espaço da exposição] ligou-me para corrigir o erro. Acho possível que possa ter havido um pedido para que a exposição encerrasse antecipadamente porque envolve os problemas de Hong Kong”, confessou.

Yau Tin Kwai não afastou ainda o cenário da Casa de Portugal ter cedido: “Se calhar o Governo informou os organizadores que a exposição tinha de acabar mais cedo. E o organizador cedeu, porque pode ter achado que no futuro corria o risco de não ser autorizado a realizar mais eventos”, traçou como cenário.

O presidente do Clube Foto-Artístico de Macau observou igualmente a hipótese de ter sido a Fundação Oriente, proprietária da Casa Garden, a pressionar para que a exposição fosse encerrada. O HM tentou contactar a Fundação Oriente, mas sem sucesso até à hora de fecho da edição.

Ataques externos

Embora sem conhecer os detalhes que levaram ao encerramento da exposição, também o fotógrafo António Mil-Homens considerou que a existência de fotografias das manifestações de Hong Kong torna legítima uma eventual intervenção do Governo Central. Numa opinião que frisou ser pessoal, António Mil-Homens apontou que as autoridades de Pequim têm de se defender dos ataques externos, muitas vezes promovidos por entidades americanas.

“Pessoalmente, reservo-me o direito de considerar que estão a ser utilizadas todas as formas possíveis e imagináveis para atacar a China, e esta [atribuição de prémios a fotografias sobre Hong Kong] é mais uma, para simplesmente promover o anticomunismo primário e atacar o Governo chinês”, afirmou Mil-Homens. “Se foram premiadas determinadas imagens por razões políticas, do meu ponto de vista, é também correcto politicamente que, se for o caso, o Governo da República Popular da China pressione para que não seja feita publicidade a essas imagens em Macau”, acrescentou. “Macau é China”, rematou.

Enquanto fotógrafo, António Mil-Homens não tem dúvidas que a imagem pode ser mesmo uma forma de ataque. “Claramente que as fotografias podem servir como forma de ataque ao Governo da China. A força de uma imagem é incrível”, apontou.

No mesmo sentido, o fotógrafo achou normal a decisão para o encerrar prematuramente a exposição. “Não nos podemos esquecer que Macau é China e não nos podemos esquecer que o papel da direcção da Casa de Portugal é proteger, de forma geral e lata, os interesses da Casa e daqueles que representa, a comunidade portuguesa em Macau”, indicou. “Nessa medida, é perfeitamente entendível, do meu ponto de vista, a decisão de cancelar a exibição do World Press Photo”, declarou.

A melhor publicidade

A repórter Carmo Correia afirma não ter compreendido as razões da Casa de Portugal para fechar a exposição. Porém, no cenário do encerramento ter partido de pressões políticas para que não se falasse do tema, considera que os resultados alcançados vão ser opostos.

“Se alguma coisa não estava bem na exposição, ou se era suposto ser criticável, então esta decisão de encerrar antecipadamente só vai levantar mais problemas. Temos de ser realistas e perceber que a World Press Photo é vista por meia dúzia de pessoas… Se estivessem sossegados isto teria passado despercebido”, disse Carmo Correia, ao HM.

Sobre o conteúdo da exposição, Carmo Correia, que esteve na inauguração do evento, referiu não ter visto nada nos materiais exibidos que lhe parecesse profissionalmente reprovável. “Nas fotografias não vi nenhuma falha ética ou problemas com os trabalhos apresentados. Claro que havia fotografias de Hong Kong…. Mas aquilo foi um mero registo do que se passou nas ruas de Hong Kong durante quase um ano”, opinou. “Para ser franca, já vi fotografias sobre Hong Kong muito mais fortes do que aquelas que estava expostas”, vincou.

Em relação a um eventual impacto do encerramento na actividade dos repórteres fotográficos em Macau, Carmo Correia relativizou: “Obviamente, que pode haver um condicionamento [para os repórteres], mas se olharmos para Macau pode não ter efeitos práticos. É um território muito pacífico, onde não se passa muita coisa”, explicou.

A fotógrafa traça um cenário de liberdade do exercício da profissão. “Nunca senti que houvesse qualquer tipo de pressão, ou fotografias que não se pudessem tirar. Aliás, quando andávamos nas manifestações, e em todos esses eventos, nunca houve qualquer restrição. Sempre tive toda a liberdade para fazer a fotografia que entendia”, partilhou.

Lamentos de Jornalistas

Após a notícia ter sido avançada na quarta-feira pela Rádio Macau, também a Associação de Imprensa em Português e Inglês de Macau (AIPIM) tomou uma posição para lamentar o encerramento do evento que considerou promover o jornalismo na RAEM.

“A Associação de Imprensa em Português e Inglês de Macau (AIPIM) lamenta o encerramento antecipado da exposição da World Press Photo em Macau por motivos ainda por esclarecer. […] Salientamos que a exposição da World Press Photo reúne o melhor fotojornalismo a nível mundial e que a presença desta exposição em Macau ao longo dos últimos anos tem sido prestigiante para a cidade, valorizando a projecção  do fotojornalismo de qualidade e da liberdade de imprensa”, consta no comunicado partilhado ontem de manhã.

Por outro lado, a associação mostrou-se preocupada face à possibilidade de o encerramento ter sido motivado pelo conteúdo das imagens. “Se o encerramento estiver relacionado com pressões em torno de algumas fotografias da exposição, a AIPIM considera que estaremos perante algo de grave e um episódio preocupante que sinaliza uma erosão do espaço de liberdade de expressão”.

Cunha Alves: encerramento político não seria “positivo”

O cônsul-geral de Portugal em Macau e Hong Kong, Paulo Cunha Alves, considera que caso se comprove que o encerramento da exposição World Press Photo se deveu a pressões políticas, que haverá impacto na liberdade de expressão.

Quando questionado pelo HM, o representante diplomático de Portugal sublinhou ainda que tem havido liberdade de expressão artística o território. “Macau tem vindo a gozar, ao longo dos anos, um espaço de liberdade de expressão artística e, neste momento, nada nos indica que esse espaço se encontre comprometido. Desconheço os detalhes do episódio, mas, na eventualidade de se confirmar o que a imprensa refere, tal não seria certamente positivo para a liberdade de expressão na RAEM”, respondeu.

Quanto à possibilidade de o encerramento da exposição marcar o início de uma fase em que as actividades da comunidade portuguesa vão ter menos liberdade, o cônsul-geral deixou o desejo que tal não aconteça.

“Não posso antecipar o futuro nem fazer conjecturas, mas espero que não sejam impostas limitações a actividades futuras de quaisquer associações empenhadas em promover na RAEM a cultura, as artes e a língua portuguesa”, desejou.

Vozes de deputados

Para Sulu Sou a importância do encerramento vai muito além do valor das fotografias expostas. No caso de se confirmarem pressões políticas, o democrata alerta para a redução de várias liberdades. “A importância desta exposição não se esgota nas fotografias exibidas, está também ligada às liberdades de expressão e de informação. Por isso, este é um aspecto que deve preocupar a população. As liberdades e os direitos humanos são como o ar que respiramos. Se perdermos o ar, morremos”, alertou. José Pereira Coutinho, disse em declarações à Lusa, que “é evidente que a presidente da Casa de Portugal sofreu pressões para acabar com a exibição” e “é evidente que foi por causa das imagens dos protestos de Hong Kong”. Au Kam San disse que “o Governo tem a responsabilidade de esclarecer o público” e que, tendo em conta o princípio ‘Um País, Dois Sistemas’ que vigora no território, “isso vai afectar a imagem de Macau”.

9 Out 2020

Poder do Povo | Associação pede fim do abate de animais

[dropcap]A[/dropcap] Associação Poder do Povo entregou ontem uma carta ao Governo exigindo a manutenção do programa de comparticipação pecuniária e o fim dos abates dos animais por parte do Instituto para os Assuntos Municipais (IAM). Iam Weng Hong, presidente da associação, defendeu que só o Governo tem capacidade para abrigar e cuidar dos animais abandonados.

Alguns voluntários acompanharam a acção da Poder do Povo e disseram aos jornalistas que a lei de protecção dos animais deveria prever excepções sobre o abandono, uma vez que há pessoas que apenas alimentam os animais que vivem na rua. Além disso, a Poder do Povo pede a redução das multas aplicadas nestes casos, que variam entre as 20 e 100 mil patacas, alegando que esses montantes podem levar os donos dos animais a abatê-los em casa ao invés de os abandonarem.

Gritando “José Tavares [presidente do IAM], demita-se!”, os voluntários que acompanharam a Poder do Povo criticaram as multas que são aplicadas aos voluntários, acusando Tavares de falar sem conhecimento de causa.

Em Setembro, o presidente do IAM disse que alimentar animais abandonados pode ser equiparado ao crime de abandono, numa resposta a uma interpelação escrita do deputado Sulu Sou.

7 Out 2020

Billy Chan, presidente da ANIMA: “Ter patrocínios vai ser cada vez mais difícil”

Com a saída de Albano Martins da presidência da ANIMA, Billy Chan, engenheiro civil, assume agora as rédeas da associação de defesa dos direitos dos animais. Até ao final do ano a ANIMA precisa de 1.5 milhões de patacas para se manter à tona, mas Billy Chan mantém um discurso optimista em relação à obtenção de apoios. O novo presidente da ANIMA quer promover a cooperação com outras associações para que juntos possam dialogar melhor com o Governo

 

[dropcap]C[/dropcap]omo nasceu a sua paixão pelos animais?

Há cerca de 12 ou 13 anos recebi um e-mail a pedir ajuda por causa de um cão que não conseguia andar. Senti uma mudança porque nunca tinha recebido nada do género, nem por parte de amigos. Fiquei curioso e liguei a um amigo que é fisioterapeuta, e naquela altura fomos a casa da pessoa que me pediu ajuda e descobrimos que tinha entre 10 a 20 cães em casa. Estava tudo uma confusão e os animais estavam muito magros. Nessa noite fizemos um tratamento ao animal. Repetimos o tratamento durante cinco noites e o dono depois disse-nos que o cão já conseguia andar. Senti-me muito bem com isso. Aí percebi que há pessoas que amam mesmo os seus animais. Comecei a trabalhar com estas pessoas e a ajudá-los, e eram pessoas que faziam parte da direcção da ANIMA. Foi a partir daí que decidi começar a ajudá-los e a trabalhar com eles. Descobri que é uma coisa com muito significado e agora tenho a oportunidade de liderar estes assuntos. A ANIMA não foi uma coisa que apareceu de repente.

Mas porque decidiu ter funções de gestão na associação e não ter uma posição apenas como voluntário?

Na altura, quando me convidaram, precisavam de ter mais opiniões por parte da sociedade. A ANIMA costumava ser uma associação com muitos estrangeiros, expatriados e portugueses, mas não havia muitos chineses, particularmente locais, e queriam que nós fizéssemos esse trabalho de chegar mais à sociedade. Agora temos mais pessoas a participar. Também temos mais ligações a outros grupos da sociedade. Pelo menos mais locais percebem o que é a ANIMA. Mas as minhas primeiras impressões foram essas, queríamos que a associação fosse mais local.

Esse objectivo já foi atingido?

O nosso trabalho é muito conhecido, mas a colaboração que temos com outras associações de defesa dos animais não funciona muito bem. Ainda estamos a trabalhar de forma individual. Não digo que isso seja bom ou mau, mas se queremos ser uma das mais importantes associações de Macau devemos cooperar com as restantes.

Mas há associações que são pró-Governo ou que têm uma posição diferente em relação à protecção dos direitos dos animais.

Estamos todos a trabalhar na protecção dos direitos dos animais, mas a forma como abordamos os problemas é diferente. Por exemplo, nós nunca colocamos os animais em jaulas, mas há associações, devido à falta de recursos, que adoptam outros métodos. Todas as associações estão a colocar todos os seus esforços em prol da defesa dos direitos dos animais, mas quando levamos a cabo uma campanha ou quando discutimos com o Governo algum assunto, estas acções não são suficientemente fortes. Se tivéssemos uma espécie de aliança com outras associações teríamos uma posição mais forte para falar com o Governo.

Com o fecho do Canídromo a ANIMA assumiu um papel de destaque. Considera que está mais preparada para discutir com o Governo face a outras associações?

Refere-se a privilégios?

Não, refiro-me ao facto de o Governo poder ouvir melhor a ANIMA em relação a outras associações devido ao trabalho já realizado.

Se olharmos do ponto de vista do apoio financeiro essa interpretação é correcta. As outras associações não recebem apoio financeiro do Governo. Mas em termos de políticas e discussão de leis, não vejo que a ANIMA seja tratada de forma diferente.

A Fundação Macau alterou os critérios de concessão de subsídios. Até que ponto isso pode afectar a ANIMA?

Temos vindo a ser patrocinados pela Fundação Macau nos últimos anos. Têm apoiado muito as nossas acções e acho que compreendem a nossa situação. Acredito que quando nos aproximarmos do fim do ano as respostas vão aparecer. Mantenho-me optimista em relação ao apoio do Governo.

A ANIMA está sempre a lutar pelo financiamento. Como está a situação financeira neste momento?

Albano Martins é o nosso presidente honorário e continua a dar-nos apoio em muitas áreas. Neste momento ele está mais focado nos patrocínios. Nos últimos meses temos reunido com representantes de casinos e estamos a ver como podemos obter patrocínios. Temos visitado também muitas pessoas. Mas falando do financiamento para este ano, recebemos o dinheiro da Fundação Macau e alguns patrocínios individuais, mas continua a não ser suficiente. Ainda faltam três meses para o final do ano e estamos a confirmar os donativos junto de algumas pessoas que nos prometeram apoio. Albano Martins acredita que conseguimos sobreviver, mas, de novo, ter patrocínios no futuro vai tornar-se cada vez mais difícil. Por isso temos de nos preparar.

Como?

A primeira forma é obtermos mais patrocínios, mas isso nem sempre é sinónimo de dinheiro. Pode também ser ajuda de pequenas entidades. Vamos tentar obter patrocínios de residentes e temos de arranjar uma forma de reduzir as despesas. Neste momento temos colegas a tempo inteiro e em part-time, gastamos dinheiro em vacinas e outro tipo de tratamentos. Também ajudamos outras pessoas que cuidam de animais. Mas estamos mais focados nas grandes tarefas da ANIMA.

Mas voltando ao financiamento, a pandemia dificultou as coisas, porque os casinos também atravessam um mau período.

Na primeira metade do ano normalmente obtemos o dinheiro da Fundação Macau e conseguimos sobreviver com ele. Mas na segunda metade do ano dependemos mais dos recursos dos casinos, e até agora os casinos ainda têm de confirmar quanto é que nos podem dar. Mas vamos acompanhar essa questão.

Quanto dinheiro necessitam até Dezembro?

Cerca de 1.5 milhões de patacas. A Fundação Macau já nos apoiou este ano. Procuramos ter a ajuda dos casinos e chegar a mais pessoas que nos possam ajudar. É importante que as pessoas saibam a situação em que estamos.

Se não obtiverem o dinheiro, quais são as alternativas?

Sem dinheiro não conseguimos fazer nada. Como alimentamos os animais, e fazemos outras coisas? Podemos sempre tentar chegar às pessoas para que nos emprestem dinheiro, ou junto dos bancos, mas não é uma solução definitiva.

Em relação à concessão definitiva do terreno onde estão situados, em Coloane, acredita numa resolução em breve?

Existe a questão dos esgotos que têm de estar ligados ao edifício da ANIMA. Temos um projecto para resolver esse problema, e por isso é que o assunto da concessão ainda não está concluído. Espero que esse trabalho fique feito este ano, mas ainda não sabemos se o Governo não vai alterar a sua posição. Só depois de concluído o projecto dos esgotos é que falaremos com o Governo para termos a concessão definitiva do terreno.

Como presidente qual é a sua estratégia principal para os próximos anos?

Não vão haver grandes mudanças. Vamos continuar a trabalhar como temos feito e penso que até agora conseguimos mostrar que a ANIMA faz um bom trabalho. No entanto, também precisamos de resolver algumas coisas. Uma delas é algo urgente, porque temos 800 animais nas nossas instalações. Estamos a 200 por cento da nossa capacidade (risos). Temos um grande número de animais e há coisas que não conseguimos fazer tão bem, como acções educativas ou discutir com o Executivo questões relacionadas com a lei de protecção dos animais. Quero reduzir o número de animais que temos nas nossas instalações. Não falo em abatê-los, mas podemos ter mais adopções ou dá-los temporariamente a famílias de acolhimento. Dessa forma poderíamos libertar parte das nossas instalações e ter menos despesas. As acções de educação são muito importantes e também queremos passar mais tempo nas escolas a falar com os alunos. Também queremos tornar a ANIMA mais local e ser mais cooperante com outras associações. Mas voltando ao financiamento, não nos devemos focar nas grandes entidades ou indivíduos.

Steve Wynn, por exemplo, é um dos parceiros da ANIMA, Edmund Ho, ex-Chefe do Executivo também. A ANIMA pretende manter esses nomes, mas trabalhar mais com associações locais? 

Sim. Essas duas personalidades têm-nos apoiado muito no passado. Albano Martins mantém contacto com Steve Wynn sobre aquilo que se passa na ANIMA, o que está a mudar, mas também sobre o financiamento no futuro. Também mantemos contacto com Edmund Ho para o informar sobre o que se passa e também pedimos ajuda de várias formas. Essa ajuda faz as coisas funcionarem, mas temos de ter uma boa relação com diferentes entidades e temos de continuar a manter esta postura.

A ANIMA tem como objectivo o fim das corridas de cavalos. Que acções estão a ser planeadas?

Actualmente temos três grandes preocupações: a campanha para o fim das corridas de galgos em Portugal, o fim das corridas de cavalos e o encerramento do Matadouro. Ainda não lançámos nenhuma campanha sobre estes dois assuntos, estamos a fazer um levantamento da situação. Penso que neste momento não posso falar muito sobre isso porque estamos apenas no começo, mas esperamos avançar com algo em breve.

Em relação à lei de protecção dos animais, quais os problemas que se mantém e que deveriam ser resolvidos?

Antes da lei ser implementada a ANIMA sempre deu sugestões e apoiou esta lei. Mas quando o diploma foi implementado os comentários da ANIMA não foram tidos em conta e actualmente dizemos ao Governo que a lei não é suficiente. Tem muitas questões que não são práticas e faltam muitos detalhes. Por exemplo, temos poucos casos de abusos de animais, e a lei até determina pena de prisão para quem pratica esses actos. Mas como é que podemos acusá-las. Há também problemas com as lojas de animais, pois a lei não é clara. Como é que as lojas põem os animais em jaulas? Quem é que pode comprar um cão? Se comprar um cão e abandoná-lo, amanhã posso comprar outro sem problema. A lei funciona mais do ponto de vista da sociedade e menos do ponto de vista do bem-estar animal.

Como assim?

Se eu abandonar um animal na rua, estou a cometer uma ilegalidade, mas se o deixar no Instituto para os Assuntos Municipais já não. Temos de olhar para os animais e a sua relação com as pessoas. No futuro teremos a oportunidade de falar com o Governo sobre isto, mas se nos juntarmos a outras associações será melhor.

Acredita numa boa relação com o Governo de Ho Iat Seng?

Não sei dizer (risos). Neste momento estamos a trazer mais pessoas para a direcção, personalidades ou pessoas com posições de liderança na sociedade. Queremos pluralidade e assim teremos uma melhor ligação com o Governo. Temos de rever a lista dos membros da direcção. Até agora a nossa lista é muito boa comparando com outras associações, mas de tempos a tempos temos de fazer uma actualização.

7 Out 2020

D2 Jazz Festival arranca este fim-de-semana com quatro bandas locais 

O D2 Jazz Festival arranca esta sexta-feira, uma iniciativa da discoteca da Doca dos Pescadores com produção e programação dos None Of Your Business. Bandas como os The Bridge, Yaya Quintet, Mars Lee Trio feat. Hon Chong Chan e The Hot Dog Express tocam num local onde habitam, por norma, os sons da música electrónica

 

[dropcap]E[/dropcap]sta sexta-feira e sábado, dias 9 e 10, vão ouvir-se sons de jazz num local bastante improvável para tal acontecer: a discoteca D2. Numa altura de pandemia em que os turistas e clientes escasseiam, os proprietários do espaço nocturno pretendem apostar em noites alternativas, tendo assim surgido o D2 Jazz Festival. A produção e programação está a cargo dos NOYB – None Of Your Business.

O festival promete proporcionar “um fim de semana de concertos marcados pelo jazz feito em Macau, com interpretações que vão dos clássicos do género às composições mais contemporâneas”, sempre com o objectivo de “celebrar o género musical nas suas diversas expressões”, lê-se num comunicado.

Ao HM, Manuel Correia da Silva, ligado aos NOYB, contou que esta é a oportunidade de levar o jazz a outros palcos do território. “É um desafio interessante ter a oportunidade de o espaço do D2 se abrir a este tipo de diversificação de oferta cultural e de entretenimento. Isso permite também que se aumente a oferta de espaços em que o jazz se apresenta à cidade.”

Macau é um território há muito familiarizado com este género musical, mas esta é a primeira vez em que este se apresenta ao seu público numa sala com outras dimensões. “O jazz tem estado presente em Macau há muitos anos, mas limitado a espaços muito específicos, e este é mais um espaço que se torna amigo do jazz, de alguma maneira. Para nós é a continuação de uma parceria, mas com um conteúdo diferente que é também inovador”, defendeu Manuel Correia da Silva.

O responsável da NOYB assegura que o D2 Jazz Festival acaba por ser “um bom resultado da crise gerada pela covid”, uma vez que existe a “necessidade de conseguir diversificar a oferta, uma vez que estão muito limitados, e há um tipo de clientes habituais que neste momento não estão em Macau”. Do outro lado, estão os músicos e bandas ávidos por tocar em público.

“Neste momento nós e muitas outras associações temos de nos virar para as bandas locais e conseguir o máximo de oportunidades. Isso tem trazido uma dinâmica interessante à cidade”, disse Manuel Correia da Silva.

The Bridge e companhia

O D2 Jazz Festival abre portas esta sexta-feira com os The Bridge, uma banda bastante conhecida no território criada em 1989 pelos músicos Phil Reaves e José Chan. Para este festival, o grupo faz-se acompanhar da voz de Yaya, que também actua com o Yaya Quintet.

A cantora Yaya tem mais de 10 anos de experiência de palco e fez parte da banda local Black Sheep durante sete anos. Além de interpretar clássicos do Jazz, Yaya compõe ainda os seus originais tendo sido seleccionada para integrar o projecto  “iBand Macau” – uma compilação de temas de bandas independentes, lançada desde 2009. Para o D2 Jazz Festival Yaya faz-se acompanhar do seu quinteto de músicos de diferentes géneros garantindo dar uma nova roupagem aos clássicos do jazz que vai interpretar. Depois das sonoridades jazz o público poderá dançar ao som do DJ Herbie Bangkok a.k.a. A Long.

No sábado, dia 10, é a vez de se ouvirem as sonoridades de Mars Lee Trio feat. Hon Chong Chan. Mars Lee é guitarrista e fundador da Associação de Promoção de Jazz de Macau.

Hon Chong Chan formou-se na The Collective School of Music de Nova York e na Beijing Contemporary Music Academy, tendo estudado guitarra e jazz com alguns dos grandes mestres enquanto adquiria experiência em apresentações internacionais. O músico tocou em Pequim, Guangzhou, Zhuhai e Nova Iorque.

Mais perto de casa, apresentou-se no Festival Internacional de Música de Macau, na Semana de Jazz de Macau, no Festival de Jazz de Guangzhou e no Festival de Jazz de Shenzhen. Para este concerto, o Hon Chong Chan vai apresentar não só alguns dos temas mais conhecidos do jazz como originais estreados no Festival Internacional de Música de Macau.

Os Hot Dog Express actuam também no sábado e deverão apresentar o jazz numa na sua versão electrónica contemporânea. A banda local é composta por músicos provenientes de Macau, Austrália, Canadá e Filipinas e traz a palco o resultado das suas diferentes origens e influências. O festival encerra com um DJ Set de Herbie Bangkok a.k.a. A Long. Os bilhetes custam 180 patacas e dão direito a duas bebidas.

6 Out 2020

Justiça | TSI dá razão ao Governo em caso de perda de residência 

[dropcap]O[/dropcap] Tribunal de Segunda Instância (TSI) deu razão ao Governo num caso de perda de residência. Tudo começou em Março de 2008, quando a requerente recebeu a residência temporária na qualidade de cônjuge, que foi depois renovada em Março de 2014. Aquando do segundo pedido de renovação, verificou-se que o cônjuge da requerente não tinha cumprido plenamente as obrigações tributárias, além de ter ficado sem trabalho. O então secretário para a Economia e Finanças, Lionel Leong, proferiu um despacho, em Dezembro de 2016, que rejeitou o pedido de renovação. Como consequência desse acto, a Direcção dos Serviços de Identificação (DSI) cancelou o bilhete de identidade de residente não permanente da requerente. Esta apresentou recurso hierárquico junto da secretária para a Administração e Justiça, à data Sónia Chan, mas esta manteve a decisão da DSI.

A requerente apresentou então recurso junto do TSI, mas o tribunal entendeu que “o residente temporário na RAEM não passa a residente permanente pelo mero decurso do tempo, sendo necessário um acto administrativo expresso que verifique as condições de que depende o estatuto de residente permanente, designadamente, a residência habitual em Macau durante sete anos consecutivos”. No entanto, “o cônjuge de A [requerente], ao não cumprir plenamente o dever fiscal e ao não corrigir o respectivo erro depois de ser notificado, deixou de ter fundamento para requerer a renovação da autorização de residência temporária (extinção da relação laboral), e não cumpriu o dever de comunicação”.

Além disso, “com o indeferimento do pedido de renovação, caducaram a autorização de residência temporária da recorrente e o seu estatuto de residente não permanente (com efeito retroactivo até 27 de Março de 2014), pelo que a estadia da recorrente posterior à referida data não pode ser contabilizada nos sete anos consecutivos de residência habitual em Macau”.

6 Out 2020

Auto-silos | Ng Kuok Cheong exige calendário para normas sobre qualidade do ar 

[dropcap]O[/dropcap] deputado Ng Kuok Cheong interpelou o Governo sobre a qualidade do ar nos parques de estacionamento públicos, questionando quando estará terminado um estudo já prometido pela Direcção dos Serviços de Protecção Ambiental (DSPA) sobre a criação de indicadores e normas a implementar nestes locais. Ng Kuok Cheong deseja saber se o estudo já está concluído e como serão definidos os indicadores da qualidade do ar nos parques de estacionamento.

O deputado pede também que sejam definidas instruções a serem adoptadas pelas empresas gestoras destes parques, questionando se os indicadores serão também aplicados nos parques de estacionamento privados.

“Vai a DSPA cooperar com o Instituto da Habitação e outros departamentos relevantes, bem como com o sector imobiliário, para que haja uma aplicação gradual destas normas nos parques de estacionamento privados?”, questionou na sua interpelação.

Numa anterior resposta ao deputado Ng Kuok Cheong, Lam Hin San, director dos Serviços para os Assuntos de Tráfego (DSAT), indicou que serão emitidas “exigências concretas” às entidades de gestão e exploração dos parques de estacionamento públicos relativamente ao controlo da qualidade do ar, mediante instruções que vão ser elaboradas pela DSPA.

6 Out 2020

Parque Oceanis | Empresa perde último recurso para o Governo

[dropcap]O[/dropcap] Tribunal de Última Instância (TUI) deu razão ao Governo em oito processos relacionados com a anulação da concessão de terrenos. Um dos processos diz respeito ao terreno situado à entrada da Taipa concessionado à sociedade Chong Va – Entretenimento Lda e que tinha como objectivo a construção do parque “Oceanis”.

O prazo de aproveitamento do espaço terminou a 11 de Março de 2001, mas só em 2018 o então Chefe do Executivo, Chui Sai On, proferiu o despacho que dá conta da declaração de caducidade da concessão “por falta de realização, imputável à concessionária, do seu aproveitamento nas condições contratualmente definidas”, esclarece o acórdão do TUI.

Os juízes decidiram também, a favor do Governo, em mais cinco processos relacionados com terrenos situados na zona do Fecho da Baía da Praia Grande, concessionados à Sociedade de Investimento Imobiliário Tim Keng Van, Sociedade de Investimento Imobiliário Man Keng Van, Sociedade de Investimento Imobiliário Chui Keng Van e Sociedade de Investimento Imobiliário Pun Keng Van e Sociedade de Investimento Imobiliário Fok Keng Van.

Foram ainda considerados improcedentes os recursos apresentados pela Companhia de Investimento Predial Hoi Sun Limitada e Sociedade Fomento Predial Predific, Limitada relativos a dois terrenos situados na Taipa.

29 Set 2020

AL | Possível saída de Au Kam San e Ng Kuok Cheong não surpreende analistas 

Au Kam San disse que é quase certo o facto de não se candidatar a um lugar de deputado nas próximas eleições legislativas, enquanto que Ng Kuok Cheong poderá ser candidato, mas não como cabeça de lista. Analistas ouvidos pelo HM revelam não estar surpreendidos com esta tomada de posição. Larry So prevê duas listas candidatas, mas teme um maior enfraquecimento do movimento pró-democracia

 

[dropcap]V[/dropcap]ários analistas dizem não estar surpreendidos com a possibilidade de os deputados Au Kam San e Ng Kuok Cheong poderem não concorrer aos lugares de deputados pela via directa, algo que pode pôr um ponto final a décadas de trabalho político por parte das duas figuras históricas do campo pró-democracia.

A informação da saída foi avançada pelo canal chinês da TDM e depois confirmada ao HM pelos próprios. Ng Kuok Cheong ainda pondera concorrer caso a saúde o permita, mas não como cabeça de lista. Au Kam San admitiu mesmo sair da corrida eleitoral.

Para o analista político Larry So, há muito que Au Kam San e Ng Kuok Cheong mostram sinais de cansaço. “Ng Kuok Cheong tem demonstrado algum cansaço, e [os dois deputados] já não têm uma postura tão agressiva como antes. Têm exibido um comportamento que transmite a mensagem de que estão cansados de estar nessa posição e que querem sair, ou, pelo menos, fazer uma pausa. Não estou surpreendido com o facto de não serem candidatos nas próximas eleições, já esperava isso.”

Larry So frisou que até esperava mais a saída de Ng Kuok Cheong ao invés de Au Kam San. “Parece que este está mais determinado em não ser candidato”, apontou. O analista político prevê que o campo pró-democracia poderá apresentar duas listas, uma delas ainda sob influência de Ng Kuok Cheong, para garantir votos.

“Espero que Sulu Sou não seja a única voz do campo pró-democracia [no hemiciclo]. Mas o pior cenário será esse, a existência de um único deputado desse campo. Mas pode haver uma lista criada sob a sua influência. Ele pode dar uma espécie de assistência a um candidato mais jovem e, talvez, o cabeça de lista seja eleito, mas o segundo dificilmente será. Desta forma ele poderá reformar-se sem sentimentos de culpa.”

Larry So alerta, contudo, para a falta de experiência política dos novos rostos, o que poderá ter influência no número de votos. “As caras que surgirem agora serão novas, mas também inexperientes. Penso que nas próximas eleições teremos apenas duas listas a concorrer porque o número de pessoas que votam em Ng Kuok Cheong e Au Kam San podem não se sentir próximas dos jovens que acompanham a lista de Sulu Sou. Não estou a dizer que Sulu Sou não é um bom candidato, mas a separação que ocorreu [entre os deputados e a ANM] não foi uma coisa boa.” Desta forma, para Larry So, o campo pró-democracia só poderá reforçar-se com duas listas na corrida.

Jason Chao, activista ligado à ANM que chegou a concorrer às eleições ao lado de Au Kam San, também diz “não estar surpreendido” com a informação. “Ng Kuok Cheong já tinha dito que poderia apoiar um candidato colocando-se na sua lista. Mas em relação a Au Kam San foi um pouco mais surpreendente. Como alguém que trabalhou com ele há alguns anos digo que temos de analisar de forma cuidadosa as suas palavras. Au Kam San pode não ser candidato, mas não sabemos o que ele quer dizer com isso, porque pode vir a apoiar outro candidato, ou fazer campanha por alguém. Ambos [os deputados] continuam a ter alguma influência.”

O HM questionou Luís Leong, ligado à União para o Desenvolvimento da Democracia de Macau [associação criada pelos dois deputados] se poderá ser cabeça de lista nas próximas eleições, mas este disse apenas que “ainda está a considerar” essa possibilidade.

“Penso que será melhor anunciar os nomes depois de uma discussão interna. Neste momento estamos focados em questões sociais importantes, como a pandemia e a vacina, o planeamento urbanístico e a preservação de Coloane”, disse ao HM.

Um ano de preparação

Scott Chiang, ex-presidente da ANM, também confessou que a possível saída de Ng Kuok Cheong e Au Kam San não é uma novidade. “Esta notícia dificilmente surpreende ainda que eles não tenham confirmado o rumor que existe desde as últimas eleições, de que essa seria a última vez que iriam liderar listas candidatas. Além disso, há muito que se comenta que Ng Kuok Cheong pode concorrer em segundo lugar ao lado de outro candidato.”

“Agora que essa possibilidade se confirma, têm um ano para introduzir e vender junto do público um ‘jovem’ (palavras de Ng) que ainda precisa de ser mais conhecido. Esse objectivo não será mais fácil de atingir do que se eles concorrem para uma nova reeleição”, frisou Scott Chiang.

Apesar dos conflitos internos, Scott Chiang continua a ter uma palavra de apreço pelo trabalho que os dois têm feito no panorama político de Macau, embora o destaque vá para Ng Kuok Cheong. “Teve, sem dúvida, um grande contributo para a introdução da política parlamentar democrática moderna que temos hoje. Poderemos dizer que ele é uma espécie de Elsie Tu [política de Hong Kong] de Macau, no sentido em que estabeleceu um exemplo para os democratas, desde a narrativa ao processo de trabalho.”

Camões Tam, analista político, prefere não analisar o trabalho dos dois deputados e a sua importância, assumindo que o movimento pró-democracia poderá renovar-se. “Sobre o desenvolvimento da democracia em Macau, temos figuras como Sulu Sou ou Kam Sut Leng [presidente da ANM] e muitos outros jovens estão a crescer. Penso que não temos de nos preocupar com isso. Au Kam San e Ng Kuok Cheong estão velhos e esta é a altura para eles saírem, talvez seja a fase mais adequada.”

Influência de Hong Kong

A possível saída de Au Kam San e Ng Kuok Cheong faz-se numa altura difícil para a política de Macau e de Hong Kong, devido aos protestos e à implementação da lei da segurança nacional na região vizinha. Além disso, as duas filhas de Au Kam San estão acusadas do crime de reunião ilegal depois de terem estado presentes na praça do Leal Senado no dia 4 de Junho, dia em que se assinala o aniversário do massacre de Tiananmen.

Larry So não tem dúvidas de que este cenário poderá ter contribuído para a decisão de Au Kam San e Ng Kuok Cheong. “Há algum medo por causa da lei da segurança nacional e com tudo o que está a acontecer em Hong Kong. Isso desencoraja a chamada geração jovem de participar em causas de maior justiça social. O movimento pró-democracia poderá ficar afectado”, defendeu.

Jason Chao não tem dúvidas de que Ng Kuok Cheong “teve uma grande contribuição para o movimento democrático de Macau”, mas não deixa de apontar algumas “fraquezas” relativamente ao seu trabalho como deputado.

“Ele não conseguiu apresentar propostas muito concretas e nesse aspecto é muito diferente do Sulu Sou, que tem muitos ajudantes a fazerem investigação e a preparar as suas propostas. É essa a grande falha de Ng Kuok Cheong.”

Sobre Au Kam San, é público o desentendimento entre os dois desde que participaram em conjunto numa lista às eleições legislativas para o hemiciclo. “O projecto não correu bem e tivemos muitos conflitos internos. Claro que aprecio o facto de me ter dado uma oportunidade de participar nas eleições, mas Au Kam San sempre foi mais seguidor de Ng Kuok Cheong.”

Para o jurista António Katchi, a saída de Au Kam San e Ng Kuok Cheong não acontece por “medo”, mas sim para “dar lugar a uma nova geração”. “Não são pessoas de se agarrar ao poder e a cargos – isso viu-se perfeitamente pela forma serena com que, no interior da ANM, apoiaram a eleição de Jason Chao como seu presidente, tinha ele 22 anos. Ainda assim, não sei se a vergonhosa e ilegal acção da PSP contra as filhas de Au Kam San na noite de 4 de Junho não terá contribuído para a decisão de Au Kam San. É difícil não colocar esta hipótese”, frisou.

Para António Katchi, Au Kam San “tem sido, nos últimos anos, o candidato preferido do movimento pró-democrático nos bairros operários da zona norte”, o que traz riscos para as próximas eleições.

“Uma parte desses votos pode deslocar-se para a abstenção, para uma lista pró-governamental, ou para uma lista de oposição sem votos suficientes para eleger um deputado. O campo democrático tem agora um ano para tentar evitar isso”, frisou. Cabe ao movimento saber definir caminhos e analisar os adversários, aponta Katchi.

29 Set 2020

Líderes de associações contestam conclusões de novo livro de Roy Eric Xavier

“The Macanese Chronicles: A History of Luso-Asians in a Global Economy” é o título do mais recente livro de Roy Eric Xavier, académico da Universidade de Berkeley. Roy Eric Xavier defende que as associações macaenses não estão a desenvolver devidamente o seu papel de ligação entre a diáspora e as oportunidades económicas da Grande Baía e da China, mas Miguel de Senna Fernandes e Jorge Valente contestam: não só o interesse da diáspora é pouco como as associações não têm meios para fazerem esse trabalho

 

[dropcap]O[/dropcap] mais recente livro de Roy Eric Xavier, macaense e académico da Universidade de Berkeley, Califórnia, traça o retrato das comunidades luso-asiáticas ao longo dos séculos e o seu papel na construção da primeira economia a ligar a Europa à Ásia. Publicado pelo jornal Ponto Final e pela Far East Currents Publishing, e distribuído pela Amazon, a obra “The Macanese Chronicles: A History of Luso-Asians in a Global Economy” traça também o retrato da comunidade macaense desde os seus primórdios, sobretudo o seu papel económico.

Mas Roy Eric Xavier não deixa de lançar algumas críticas sobre a actuação das associações de matriz macaense quanto ao fraco aproveitamento das oportunidades económicas lançadas pela China nos dias de hoje, nomeadamente no que diz respeito ao projecto da Grande Baía Guangdong-Hong Kong-Macau. “Os líderes macaenses em Macau têm tido dificuldades em definir o seu próprio legado histórico enquanto tentam definir o papel da comunidade na agenda geopolítica da China”, lê-se nas conclusões do livro.

O autor fala de falhas na comunicação entre associações e membros da comunidade macaense na diáspora que “procuram informação sobre oportunidades regionais de comércio e de negócios”. Há uma “apatia” e uma “falta de ligação com as empresas”, aponta Roy Eric Xavier.

“A falta de capacidade dos líderes macaenses de incluir empresários e profissionais de turismo” em actividades como os Encontros da Comunidade Macaense pode ter efeitos negativos, aponta o livro. “A indiferença em relação a novos negócios em Macau pode minar a relação dos macaenses com a China em geral”, lê-se.

Ao HM, o autor defendeu que “as oportunidades que os líderes macaenses obtiveram da China desde a transição não foram utilizadas plenamente”. E dá exemplos. “O fundo recebido nos últimos 20 anos pelo Conselho das Comunidades Macaenses (CCM) foi dado para encorajar as trocas culturais, de turismo e empresariais com a diáspora macaense, mas o CCM não conseguiu atrair as gerações mais jovens.”

Roy Eric Xavier alerta ainda para o decréscimo crescente da participação dos mais jovens nos Encontros, “na maioria devido ao facto de o CCM não envolver os macaenses jovens que querem trazer novas oportunidades de negócio para Macau”. “O CCM evita questões durante os Encontros sobre visitas a zonas tecnológicas em Shenzhen. Isto poderia ser apenas uma de muitas oportunidades para desenvolver parcerias, e para ajudar a diversificar a economia de Macau através do turismo cultural. Mas estas oportunidades não foram aproveitadas”, acrescentou.

Objectivos distintos

Roy Eric Xavier disse também ao HM que reuniu e comunicou com os líderes do CCM várias vezes, mas que teve sempre não como resposta às suas sugestões. “Disseram-me sempre que o seu interesse não passa pelo envolvimento nos negócios. Além disso, comunicaram com os líderes das casas de Macau na diáspora para não darem crédito à minha investigação ou a outras tentativas de envolvimento. Mas eu não vou desistir”, confessou.

Para o autor, “é importante que a China reconheça os macaenses a nível internacional, especialmente os que residem nos EUA, Europa e Austrália, e que estão dispostos a ultrapassar as actuais tensões entre a China e os EUA ao trabalhar com a China, desenvolvendo parcerias empresariais e culturais”. “O CCM e outros líderes macaenses em Macau que desperdiçam esta oportunidade não representam toda a comunidade”, frisou Roy Eric Xavier.

Em relação ao projecto da Grande Baía, “alguns líderes macaenses em Macau simplesmente não vêem como o turismo cultural pode trazer novos visitantes às oportunidades de negócio”. “Muitos macaenses da diáspora estão envolvidos nas áreas da tecnologia e indústrias que o projecto da Grande Baía espera atingir. Não tem havido o encorajamento ou convites por parte do CCM ou de outras associações de macaenses para se envolverem”, aponta.

Contactado pelo HM, Miguel de Senna Fernandes, presidente da Associação Promotora da Instrução dos Macaenses (APIM), disse que as associações locais não têm recursos financeiros e humanos para levar para a frente a tarefa que Roy Eric Xavier propõe.

“Ele tem uma perspectiva que não é a nossa, a de aproveitar a comunidade para os negócios”, frisou. “Os Encontros não são para fazer negócios, mas se nascerem daí, tudo bem. As pessoas com quem contactamos não têm nada a ver com o mundo dos negócios, para começar. Sabemos as nossas limitações e as nossas associações não estão vocacionadas para isso”, disse Miguel de Senna Fernandes.

O presidente da APIM destaca também o facto de serem escassos os pedidos de informações por parte da diáspora macaense para o investimento. “A comunidade macaense que está na diáspora luta pela sobrevivência nos locais onde se encontram e trabalham, e a maioria deles não pensa na Grande Baía. Se é uma pena, claro que sim. Não recebemos pedidos de informações, que eu saiba. Ninguém da diáspora manifestou interesse em desenvolver algum projecto económico aqui.”

Acrescentar e não mudar

Miguel de Senna Fernandes não tem dúvidas de que, com mais recursos, até se poderia pensar em criar uma plataforma exclusivamente destinada aos negócios, à semelhança de uma câmara de comércio. Mas, para já, é impossível.

Quanto a uma possibilidade de mudança na forma de actuação, o presidente da APIM diz que “não vamos mudar, mas podemos acrescentar”. “Há sempre horizontes para mais, desde que haja condições. Mas fora deste âmbito não é fácil ter esse tipo de ambição porque não temos meios. Caso contrário a própria comunidade portuguesa teria outra dinâmica. Mas com uma câmara de comércio não seria apenas para a comunidade, teríamos inevitavelmente de incluir membros que não têm nada a ver com a comunidade macaense. E assim seria apenas mais uma organização.”

Jorge Valente, presidente da Associação de Jovens Macaenses, fala também de escassos pedidos de informação por parte da diáspora, uma média de dois por ano, um número que considera muito baixo.

“As oportunidades da Grande Baía estão a ser mal aproveitadas não apenas pelos macaenses, mas por Macau inteiro. Até agora não houve o devido aproveitamento, mas com esta crise da covid-19 penso que as pessoas estão seriamente a querer aproveitar essas oportunidades”, declarou ao HM.

Quanto ao papel dos Encontros da comunidade macaense, “sempre foi uma decisão dos líderes de que não serviria apenas para reviver o passado ou como um espaço de convívio, mas para que tivesse também uma componente comercial de forma duradoura”. “Foi uma pena que isso não tenha acontecido, mas é algo que não podemos forçar e que os participantes também têm de desenvolver”, acrescentou.

Os programas dos Encontros da comunidade macaense passaram a incluir algumas visitas ao Interior da China e a Hengqin nos últimos anos, com a economia à espreita, mas a verdade é que é difícil contabilizar os resultados práticos.

“Quando vamos a Hengqin e quando visitamos empresas na China ou em Macau isso faz parte da componente empresarial, mas não dizemos que esta pessoa vai assinar um contrato com aquela empresa, por exemplo. Para isso acontecer teria de estar tudo bem negociado, os Encontros servem mais como um primeiro passo para esse contacto.”

Jorge Valente não concorda que as associações mudem a sua matriz em função da vertente económica. “As pessoas têm é de saber os objectivos de cada associação e contactarem a associação certa para fazer as perguntas certas. Há perguntas que nos fazem e transmitimos essas questões a outras associações que têm a informação mais completa, ou dizemos para se deslocarem ao IPIM”, por exemplo. O HM tentou chegar à fala com Leonel Alves, presidente do CCM, mas até ao fecho desta edição não foi possível estabelecer contacto.

Comunidades esquecidas

Este livro nasceu de alguns artigos já publicados no blogue Far East Currents, mas é sobretudo um retrato “das migrações [dos macaenses] e o desenvolvimento da sua cultura até ao presente”. “Queria destacar a grande comunidade macaense de Hong Kong, onde nasci. A segunda parte do livro conta-nos várias histórias de individualidades e eventos que, em conjunto, mostram a deterioração gradual das relações dos macaenses da segunda geração com o Governo colonial britânico. Esta é uma história que não está devidamente explorada e escrevi o livro também para encorajar mais investigações e bolsas para esta área”, defendeu ao HM.

Mas o livro é também o retrato do desenvolvimento de várias comunidades luso-asiáticas em locais como Goa e Malaca. Comunidades essas que têm sido destinadas ao esquecimento, defende Roy Eric Xavier.

“Os Governos e instituições de todo o mundo deveriam reconhecer e celebrar as contribuições destas comunidades para a cultura de cada país. Há muitas influências que não são reconhecidas, incluindo a língua, arte e diferentes gastronomias. O facto de muitas destas comunidades terem mantido estas tradições desde o século XVI sugere a longevidade e a força destas culturas, bem como as contribuições que os portugueses trouxeram a diferentes culturas no mundo”, rematou.

29 Set 2020

António Félix Pontes, ex-presidente do Instituto de Formação Financeira: “Fiquei com alguma mágoa”

António Félix Pontes esperava cumprir mais um mandato como presidente do Instituto de Formação Financeira, mas o director da Autoridade Monetária e Cambial de Macau invocou “razões não plausíveis” para a não continuação do economista, que continua agora no sector privado. Félix Pontes teme que o Governo tenha de injectar mais apoios na economia e deita por terra as ideias para a criação de um “sistema financeiro com características próprias”

 

[dropcap]E[/dropcap]stá de saída do Instituto de Formação Financeira (IFF) e da Administração Pública. Porquê agora?

Os dois melhores anos do IFF, em termos de ‘performance’, foram precisamente os do meu último mandato (2018-2019). Por conseguinte, tinha a expectativa de ter mais um mandato, pois, em termos de uma gestão racional dos recursos humanos sem estereótipos, premeia-se quem tem bons resultados. No entanto, não foi essa a opinião do actual presidente da AMCM, invocando razões não plausíveis.

Como assim?

Descortinei que o que ele queria era uma pessoa que não fosse tão independente como eu, pelo que lhe disse que, não havendo comunhão de opiniões, deixaria o IFF aquando da eleição dos novos corpos sociais e que continuaria apenas a prestar assessoria à AMCM até ao termo do meu contrato. Portanto, a minha saída fez-se sem dramas. Fiquei com alguma mágoa, principalmente porque tinha em mente algumas iniciativas relevantes que não pude concretizar [ao nível da formação].

Vivemos tempos de pandemia. Que consequências económicas destaca?

A redução a pique das receitas do jogo vai implicar que o Produto Interno Bruto (PIB) tenha uma queda astronómica. No final do segundo trimestre deste ano a queda no PIB era de 67.8 por cento, valor este que irá depender do número de turistas oriundos da China a partir do mês de Outubro, o que, no entanto, não evitará uma diminuição recorde nesse indicador económico. No que respeita aos turistas, no ano de 2019, registámos quase 25 milhões de Janeiro a Agosto e, no ano corrente, no mesmo período entraram em Macau cerca de 3,6 milhões, ou seja, menos 87 por cento. Como consequência dessa evolução negativa, a taxa de ocupação nos hotéis teve uma redução dramática, tornando a situação no sector hoteleiro de Macau muito grave.

Pelo meio, muitas empresas abriram falência.

Centenas de pequenas e médias empresas (PME) encerraram este ano e a taxa de desemprego em Macau que, antes da pandemia, era na ordem de 1.7 a 1.9 por cento, no final do segundo trimestre de 2020 foi de 2,5 por cento e a tendência de aumento irá manter-se. Como reflexo disto, o montante referente ao subsídio de desemprego, proporcionado pelo Fundo de Segurança Social, triplicou em relação ao ano transacto e não vai ficar por aqui.

Qual o impacto no sector bancário e financeiro?

Haverá uma deterioração no crédito malparado devido ao encerramento já mencionado das PME, ou devido ao facto de estas terem visto as suas receitas sofrerem uma grande redução. Acresce-se a realidade de milhares de indivíduos que estão desempregados ou que passaram a ter muito menos rendimentos. Antes que a bolha de crédito rebente, dever-se-ia equacionar o estabelecimento de moratórias para esses casos.

E no período pós-pandemia, que análise faz?

Creio que será necessário o Governo injectar mais recursos financeiros na economia local. Mas devemos fazer muito mais para reduzir essa dependência [do jogo] e é aqui que entra a proclamada diversificação económica. Desde há várias décadas que é uma das palavras-chave das linhas de acção governativa e, com raras excepções, não são mais do que um ‘copy-paste’ do que é proposto em anos anteriores. Se queremos tornar real a diversificação económica em Macau, tem de se definir a estratégia e os objectivos a prosseguir, bem como o respectivo calendário de execução.

Que tipo de medidas concretas devem ser adoptadas? 

Poder-se-ia proceder ao lançamento em Macau do turismo de saúde de qualidade mundial. Temos tido uma média de mais de 30 milhões de visitantes por ano, a maioria proveniente da China. Sem grande esforço poder-se-ia atrair parte deles para efectuarem exames médicos em Macau (ou em Hengqin), em hospitais que oferecessem um serviço médico de excelência. Dever-se-ia definir uma estratégia e um roteiro, por exemplo, até 2025, para uma iniciativa que incluísse uma visão para a inovação e tecnologia, com a criação (eventualmente em Hengqin) de um parque tecnológico do tipo ‘Cyberport’, de Hong Kong e em que, nesse plano, se contemple a hipótese de, dentro de alguns anos, os casinos estarem a operar em ‘Blockchain’.

Também se fala muito da relação comercial com os países de língua portuguesa para diversificar a economia. Que passos devem ser dados?

Aqui dou especial ênfase aos países africanos de língua portuguesa e a Timor-Leste, pois o comércio entre Macau e esses países é praticamente inexistente. Há um elevado risco de crédito dos restantes países de língua portuguesa e os exportadores locais têm receio legítimo de encetarem qualquer actividade comercial com os países em causa. Desta forma, há que proporcionar garantia para os riscos políticos que advêm desse relacionamento comercial. A forma mais eficaz, como fez a China e Hong Kong, é o seguro de crédito a ser disponibilizado por uma seguradora local de capitais públicos, com a concessão de garantia governamental para esses riscos políticos e até os meramente comerciais. Essa garantia teria de merecer a aprovação da Assembleia Legislativa, o que creio que não seria difícil de obter, atendendo que são muitos os deputados a criticar o valor muito residual que representam as exportações de Macau para os ditos países no total das exportações locais.

Ainda foi a tempo de observar as mudanças no regime offshore, que deixa de vigorar já em Janeiro. É um avanço para o sistema financeiro?

Macau deveria ter um centro offshore com outras bases, e temos condições para isso. Houve uma grande evolução do sistema financeiro, com as novas tecnologias, e a nossa tributação é muito mais baixa do que em Hong Kong e Singapura, que têm centros offshore.

Mesmo que o mundo offshore tenha hoje uma má imagem. 

Há centros de grande envergadura com supervisões mais eficientes, tal como as Bermudas, por exemplo. Mas há centros offshore que deveriam ser banidos quando são usados para actos de corrupção e lavagem de dinheiro. Quando estiveram cá os bancos portugueses, os clientes eram portugueses. Eles punham cá o dinheiro para não terem de pagar tantos impostos em Portugal. Aí havia evasão fiscal, mas não quer dizer que houvesse branqueamento de capitais.

Que análise faz ao caso FinCEN e aos milhões transaccionados a partir do BNU e do Banco da China?

Os bancos em causa participaram, como era o seu dever, a suspeita que determinadas transacções indiciavam ao Gabinete de Informação Financeira, que posteriormente fez o seu tratamento. O controlo interno desses bancos funcionou em pleno. Isto surge como uma arma de arremesso dos americanos, em plena guerra comercial entre os EUA e China. Macau pertence à China e criaram essa suspeita de que, em Macau, havia uma série de situações irregulares que os bancos cometeram. Não, os bancos não cometeram nenhuma irregularidade. Penso que, neste caso, houve alguma conotação política.

Muito se tem falado sobre a verdadeira eficácia do Fórum Macau. O que tem a dizer sobre esta matéria?

A China tem feito um desenvolvimento notável do comércio e investimento com os países de língua portuguesa, com linhas de crédito com Angola, Cabo Verde e Moçambique. As empresas e os produtos chineses são cada vez mais vendidos nos países de língua portuguesa. Em Macau, pelo contrário, nada foi feito. São sempre feitos serviços mínimos, as visitas de delegações e a assinatura de protocolos de cooperação têm poucos resultados. O Fórum, em relação à China, é positivo, mas em relação a Macau é negativo em termos de resultados.

Fala-se muito na criação de um “sistema financeiro de Macau com características próprias”. O que tem a dizer sobre esta matéria? 

Não tenho conhecimento da existência de um plano para o sistema financeiro, e se existe deve estar nos gabinetes. As notas sobre esse sistema financeiro, constantes nas diversas linhas de acção governativa, não constituem qualquer plano director, mas sim conjuntos de ideias avulsas, muitas vezes sem correspondência com a realidade local. A pedido da AMCM até preparei em 2018 um plano director para a formação de talentos para o tal sistema financeiro, o qual não mereceu qualquer ‘feedback’, pelo que o IFF foi lançando uma série de acções de formação. Do que apreendi, esse sistema financeiro teria como pilares os bancos e as seguradoras tradicionais, a locação financeira, os ‘trusts’, a gestão de patrimónios privados por entidades especializadas, uma bolsa de diamantes e ouro, e outra bolsa, esta de valores, bem como a emissão de títulos verdes (‘green bonds’), e a tecnologia FinTech. Ora nada disto contribui para que se diga que o sistema financeiro de Macau tem características próprias, pois tudo isso já existe em qualquer centro financeiro de renome. Além disso, embora se tenha feito uma alteração à legislação sobre a locação financeira, não há condições em Macau para se desenvolver.

Porquê? 

Esse instrumento serve para o financiamento de projectos de grande envergadura e, em Macau, quando estes têm iniciativa governamental são financiados por dinheiros públicos. Quando têm origem no sector privado, com os casinos, há uma nítida preferência por empréstimos bancários sindicados. A narrativa dos países africanos de língua portuguesa e Timor-Leste utilizarem o sistema de locação financeira de Macau para comprarem equipamentos à China não me merece credibilidade, pois, além de outros factores, tal implicaria que as empresas chinesas aceitassem a jurisdição de Macau para dirimir os litígios, o que creio não vá acontecer.

E relativamente aos “trusts” e gestão de patrimónios privados? 

Os ‘trusts’ são de difícil implementação em Macau pois são de base anglo-saxónicas, com a Common Law como sistema jurídico. Será difícil, mesmo que a nível jurídico se opere algum milagre. Quanto à gestão de patrimónios privados, será que se pretende atrair fundos de milionários da China? Se assim for, há que tomar cuidados acrescidos em relação à origem desses fundos, pois o risco de branqueamento de capitais aumentará exponencialmente. Também se questiona a necessidade de existirem ‘entidades especializadas’, pois os bancos e seguradoras do ramo vida autorizadas a operar em Macau já prestam esse serviço com excelente qualidade. Tendo em atenção o rígido controlo das autoridades chinesas em relação às transferências transfronteiriças de fundos por parte dos seus cidadãos, acho que se está a seguir um caminho em que há muita poeira no ar.

Há também a ideia de criar uma bolsa de valores em Macau. 

Coloco muitas dúvidas sobre a sua viabilidade. A maioria das empresas de Macau são PME, grande parte delas nem segue padrões contabilísticos internacionais ou são auditivas. Por isso, não podem ser listadas em nenhuma bolsa de valores que se preze. Por outro lado, os casinos, bancos e seguradoras, já estão listadas nas bolsas de Hong Kong, Xangai e Shenzhen. Será que se pretende uma bolsa da segunda ou terceira divisão para aceitar as empresas que forem rejeitadas, por exemplo, na bolsa de valores de Shenzhen? Se for isso, então é pior, pois iria afectar a imagem de Macau, com o seu grau de risco reputacional, como centro financeiro, a registar uma grande deterioração.

27 Set 2020

Fotografia | Quarta edição da revista Zine Photo dedicada aos lugares de Macau 

A última edição da revista Zine Photo, um projecto fotográfico de João Miguel Barros, foca-se totalmente em Macau. Sempre a preto e branco, é uma revista “mais focada nos lugares, ainda que não esquecendo as pessoas”. O território poderá voltar a ser objecto de uma nova edição a sair no próximo ano, diz o criador do projecto

 

[dropcap]O[/dropcap] quarto número da revista de fotografia Zine Photo, projecto de João Miguel Barros, sai no mês que vem e é inteiramente dedicada a uma Macau a preto e branco e aos seus lugares peculiares. Este é o número que se chama apenas “Macao” e que se aponta menos para as pessoas.

“Independentemente do lado estético da fotografia, há o seu conteúdo. E é aí que esta Zine Photo pode ser diferente das anteriores, que eram mais emocionais, que tinham a possibilidade de suscitar uma adesão mais rápida devido ao lado essencialmente humano que transmitem. A Zine Photo #04 é mais agreste, mais focado em lugares, ainda que não esquecendo as pessoas. As pessoas comuns, e não as glamorosas das páginas cor de rosa, que são aquelas que têm um potencial de riqueza nas histórias que podem contar”, contou João Miguel Barros ao HM.

A nova edição da Zine Photo é sobre uma Macau “que não é o mundo da perfeição, porque a realidade não se ajusta apenas com leis, regulamentos e disciplina”. Há, também, “um lado diferente, que é exótico para quem aqui chega pela primeira vez mas para quem, como eu, já aqui vive há algumas décadas, fere por vezes o olhar. E, para o bem ou para o mal, a minha ‘elaboração mental’ força-me a tentar conseguir imagens fortes daquilo que tenho perante mim”, conta o fotógrafo e curador.

João Miguel Barros reconhece que a utilização do preto e branco “dramatiza”, mas essa constitui “uma forma de arte e de estar na fotografia”. “Foi uma estética que adoptei. Mas para ser coerente e rigoroso tenho de me esforçar por olhar com os meus olhos e não com os olhos dos outros. E nem sempre é fácil esse exercício tal a força dos media, das redes sociais e da globalização, que teimam em impor o ‘belo’, o bonitinho”, frisou.

A quarta edição da Zine Photo é “uma aproximação a um trabalho maior sobre Macau que, neste momento, já tem umas dezenas de imagens seleccionadas”. João Miguel Barros teme que este “não seja um trabalho consensual”, citando Ansel Adams: “There are always two people in every picture: the photographer and the viewer.” Isto porque “não há unanimidades na avaliação de uma imagem, por muito impactante que seja”.

Para realizar esta edição, João Miguel Barros inspirou-se em dois projectos recentes nos quais esteve envolvido, um deles como curador, como é o caso da exposição YiiMa, com trabalhos de Guilherme Ung Vai Meng e Chan Hin Io, e que esteve patente no Museu Berardo, em Lisboa, com trabalhos “que mostram Macau de uma forma única e inigualável”. A exposição do fotógrafo austríaco Andreas Bitesnich, “Deeper Shades”, que incide sobre cidades, foi outro dos impulsos que ajudou a dar corpo ao projecto.

Outra a caminho

O lançamento do projecto Zine Photo previa quatro edições este ano, mas a iniciativa não se fica por aqui. “O trabalho mais fácil sobre Macau está quase feito, apenas precisa de ir sendo actualizado. O trabalho mais difícil é aquele que me motiva a continuar e a não dar por terminado este projecto sobre Macau, que deverá merecer a publicação de uma outra Zine sobre a cidade e as suas gentes daqui a um ano, ou talvez na altura da edição do Festival Literário de Macau de 2022”, confessou João Miguel Barros.

O fotógrafo, que é também advogado, assume que “o trabalho mais difícil é entrar na intimidade das pessoas, daquelas que vivem na penumbra, que sofrem e que não são tocadas pelas luzes do deslumbramento que a cidade provoca e promove, com os seus casinos e luxos vários”.

A Zine Photo é, também, um reflexo desse outro lado. “A vida em Macau rola muito para além dessa máquina de vender ilusões. E é a esse ‘outro lado’ que me seduz e atrai, ao qual eu quero tentar chegar. Só então poderei dar como terminado o meu projecto sobre esta cidade que me acolheu há mais de trinta anos”, rematou.

Esta edição chega “em tempos de pandemia e muitas incertezas”, sempre “com trabalhos próprios, como se fossem fascículos de um trabalho maior”. João Miguel Barros confessa que sempre tem resistido a fotografar Macau “numa perspectiva mais sistemática e tendo como objectivo a publicação”.

Uma posição que mudou nos últimos anos. “Decidi avançar com essa ideia, quebrando o bloqueio que sempre tive de não conseguir olhar de forma descomprometida, curiosa, mas também crítica, para o que me rodeia.”

Para o fotógrafo, “as rotinas castram a imaginação”, pois “passar todos os dias pelos mesmos lugares banaliza o olhar”. É daí, defende, que surge a influência das “imagens bonitas que servem para promover o turismo que nos enchem a imaginação e os sonhos”. “A pergunta que surge é de imediato: mas Macau é isto?”, questiona. A nova edição da Zine Photo diz-nos que não.

24 Set 2020

Marika Cukrowski, curadora do World Press Photo: “É importante ter uma presença em Macau”

A exposição das fotografias vencedoras do World Press Photo, promovida pela Casa de Portugal de Macau, é hoje inaugurada na Casa Garden, às 18h30, onde pode ser vista até ao dia 18 de Outubro. Ao HM, Marika Cukrowski, curadora de um dos maiores concursos de fotografia do mundo, falou de uma edição cheia de imagens de esperança e força. As manifestações que decorreram em vários lugares do mundo, incluindo Hong Kong, são um tema central

 

[dropcap]U[/dropcap]m jovem toca no peito, à noite, enquanto grita qualquer coisa, que soa como uma mensagem de esperança. A mensagem é poesia recitada no meio de uma manifestação no Sudão, a 19 de Junho de 2019. Enquanto recita poemas, o jovem é iluminado por telemóveis empunhados por outros jovens.

Esta imagem, captada pelo fotógrafo japonês Yasuyoshi Chiba, da agência France-Press, venceu a edição deste ano do World Press Photo e pode ser vista até ao dia 18 de Outubro na Casa Garden, numa iniciativa que conta mais uma vez com o apoio da Casa de Portugal. O regresso da mostra a Macau deixa Marika Cukrowski, uma das curadoras do World Press Photo, muito satisfeita.

“Estamos muito empolgados com o facto de esta exposição acontecer como habitualmente, mesmo com todas as alterações que decorreram este ano. Podemos não estar presentes na inauguração, mas assegurámos a sua continuação. É importante para nós ter esta presença [em Macau] para diversificar ao máximo o concurso e Macau é sempre um lugar interessante para estarmos, por ser um local onde várias culturas existem”, contou ao HM.

Esta é uma edição muito marcada por protestos em vários pontos do mundo, incluindo Hong Kong. São protestos que se calaram subitamente devido à pandemia da covid-19, mas cujas mensagens e ideias continuam a existir.

“Temos várias histórias e imagens simbólicas de manifestações em vários lugares no mundo. Temos a Foto do Ano, tirada no Sudão, temos os protestos de Hong Kong, uma imagem sobre os protestos no Chile. Mesmo a História do Ano é sobre os protestos na Argélia [Kho, the genesis of a revolt, de Romain Laurendeau]. Não se trata apenas de um lugar, mas é uma espécie de onda que chegou em 2019.”
Marika Cukrowski considera que a Foto do Ano é, sem dúvida, uma das imagens mais impressionantes do concurso. “Esta é uma imagem que sobressai em relação às outras, porque não é gráfica e está cheia de esperança. É muito representativa do tema deste ano. Desde 2018 que temos tido essencialmente temas ligados a manifestações e jovens que protestam sem recorrer a qualquer tipo de violência.”

Batalhas de Hong Kong

Os protestos de Hong Kong que decorreram em força no ano passado são um dos temas dominantes da edição deste ano do World Press Photo. Exemplo disso é o trabalho vencedor na categoria storytelling “Interactive of the Year”, intitulado “Battleground PolyU”. Com produção de DJ Clark e China Daily, trata-se de um trabalho digital de storytelling sobre os intensos protestos que decorreram nas instalações do Instituto Politécnico de Hong Kong.

“Foi sem dúvida um grande acontecimento que decorreu durante muito tempo. Há muitas imagens diferentes, tiradas durante um longo período de tempo, e todas elas são muito poderosas e simbólicas”, disse a curadora do concurso.

O trabalho de Nicolas Asfouri, intitulado “Hong Kong Unrest”, nomeado para a categoria “Story of the Year” é outro exemplo da forte presença das manifestações de 2019 no concurso. “Ele cresceu na Dinamarca e viajou para Hong Kong para cobrir os protestos, embora já tivesse feito a cobertura das manifestações durante o movimento dos guarda-chuvas. Disse estar surpreendido por estar tudo muito bem organizado e por haver muitos jovens desta vez”, contou Marika Cukrowski.

Para a responsável, a fotografia mais importante desta série de 10 imagens é o retrato de várias estudantes, com os seus uniformes escolares, de mãos dadas. “Normalmente associamos esta imagem a estudantes a caminharem nos corredores das escolas, mas aqui estão nas ruas, de mãos dadas, com as máscaras colocadas. É uma imagem muito poderosa e representativa das pessoas que se mantiveram de pé, a lutar pela sua liberdade.”

Ambiente e neonazismo

Além dos protestos, as questões ambientais voltam a marcar presença na edição deste ano, não só numa categoria em nome próprio, mas também na categoria de questões contemporâneas. “Temos imagens sobre os fogos na Austrália e também sobre os incêndios na Califórnia, ou sobre lagos que estão a secar em vários pontos do mundo. Este é sem dúvida um tema que está presente em várias categorias e assim vai continuar.”
Marika Cukrowski destaca também o trabalho do fotógrafo Mark Peterson, e que é o retrato de vários membros do grupo neonazi Shield Wall Network a celebrar o aniversário de Adolf Hitler num barco, no estado de Arkansas, EUA. Esta imagem ficou em terceiro lugar na categoria de questões contemporâneas.

“É uma imagem de confronto. Nem sempre é óbvio que os neonazis existem, mas a verdade é que nos EUA estes grupos estão a crescer. Esta foto é importante porque revela isso mesmo, bem como o facto de as pessoas não terem mais receio de pertencer a grupos neonazis. Esta é uma questão contemporânea preocupante. Parece ser uma minoria, mas a verdade é que está a crescer”, frisou.

Em primeiro lugar na categoria de questões contemporâneas, mas com uma única imagem, ficou o trabalho de Nikita Teryoshin, intitulado “Nothing Personal – The Back Office of the War”, tirada em Abu Dhabi por ocasião do International Defence Exhibition and Conference (IDEX).

“Esta imagem documenta o negócio da venda de armas e é algo muito poderoso. Este ano os protestos estão muito presentes no concurso, mas nos últimos anos a guerra foi um tema dominante. Então é interessante perceber de onde vêm estas armas e esse é um assunto que esta imagem explora, há muito dinheiro envolvido. Ele [Nikita Teryoshin] foi lá fotografar as pessoas sem revelar os seus rostos”, concluiu a curadora.

23 Set 2020

FAOM sem consenso sobre possível apresentação na AL de projecto de lei sindical 

[dropcap]O[/dropcap]s deputados ligados à Federação das Associações dos Operários de Macau (FAOM) ainda não chegaram a consenso quanto à possibilidade de apresentarem um novo projecto de lei sindical na Assembleia Legislativa (AL). Na conferência de imprensa de ontem, que serviu para fazer um balanço da última sessão legislativa, foram apresentadas posições diferentes sobre o assunto.

Para Lam Lon Wai, eleito pela via indirecta, cabe ao Governo apresentar a proposta, ouvindo as posições do Conselho Permanente de Concertação Social (CPCS) e da população. “A lei sindical só tem vantagens para a sociedade e estamos optimistas em relação à legislação”, disse. Ella Lei lembrou que o Governo prometeu avançar para a lei sindical, defendendo uma discussão com a sociedade sobre a elaboração do diploma, a fim de incluir os direitos sindicais e o direito de participação dos trabalhadores.

Já Lei Chan U, frisou que a lei sindical já foi chumbada no hemiciclo mais de dez vezes, mas que o consenso em torno desta questão ainda está a ser construído junto da sociedade. O deputado lembrou que o último relatório do CPCS sobre este assunto revela que há uma maior proporção de pessoas a pedir a lei sindical o quanto antes. Lei Chan U sublinhou que este diploma é necessário, além de já ter sido prometido pelo actual Chefe do Executivo, Ho Iat Seng.

Dúvidas e pandemia

Relativamente ao trabalho desenvolvido na qualidade de deputados, Lei Chan U lembrou que a FAOM recebeu, em contexto de pandemia, muitos pedidos de ajuda da parte de trabalhadores do sector da restauração, construção civil, logística e jogo. O deputado disse que na próxima sessão legislativa é importante melhorar a questão dos salários em atraso e implementar uma maior regulação das licenças sem vencimento, bem como reforçar o combate ao trabalho ilegal.

Além das preocupações relacionadas com a pandemia, a FAOM lidou também com queixas sobre habitação e trânsito. Os deputados, como Ella Lei, expressaram o desejo de que o Governo possa melhorar o planeamento urbanístico e a utilização dos terrenos.

Ella Lei frisou que é necessário estabelecer um calendário na área da habitação pública, a pensar nos candidatos em lista de espera e pede a construção de mais apartamentos T2 ou T3 para os candidatos com famílias maiores, além de dizer ser necessário criar mais políticas de habitação para a chamada classe sanduíche.

O deputado Leong Sun Iok afirmou esperar que o Executivo apresente o projecto completo do metro ligeiro com mais detalhes sobre o orçamento e o segmento da Ilha de Hengqin. Além disso, o tribuno defendeu que o Governo deve recorrer aos terrenos não aproveitados para criar mais parques de estacionamento provisórios. Ainda na área do planeamento urbano, Lam Lon Wai pede o aproveitamento de 40 terrenos que ainda estão por recuperar, como é o caso do terreno à entrada da Taipa destinado ao parque temático Oceanis ou onde está a velha fábrica de panchões Iec Long. O deputado deseja ainda que sejam criadas mais zonas verdes nos novos aterros ou em zonas costeiras na península e ilhas.

23 Set 2020

Comunidades | Elogios a programa de apoios de Portugal, apesar do cepticismo

Concurso para financiar movimentos associativos é uma boa iniciativa, os apoios são bem-vindos, mas as associações de Macau lidam com falta de informação e um histórico de inactividade de Portugal no que diz respeito a apoios vindos de Lisboa

 

[dropcap]U[/dropcap]ma iniciativa que merece muitos elogios, mas olhada com algum cepticismo devido a muitos anos de inactividade. É desta forma que as associações locais ouvidas pelo HM encaram o concurso promovido pelo Estado Português para financiar os movimentos associativos das comunidades portuguesas.

A abertura de candidaturas para que as associações que servem as comunidades portuguesas decorre entre 1 de Outubro de 31 de Dezembro de 2020 e este ano, ao contrário do anterior, a iniciativa foi promovida pelo Consulado nas redes sociais.

A promoção não passou despercebida às associações locais, que elogiam a iniciativa, apesar de já terem aprendido a viver sem apoios vindos de Portugal. É este o cenário traçado por Amélia António, presidente da Casa de Portugal, e Miguel de Senna Fernandes, presidente da Associação dos Macaenses.

“Considero que pode ser um apoio muito importante, até porque há associações que não conseguem outros apoios. Até para nós [Casa de Portugal] haver esta possibilidade é importante porque os apoios podem sempre tapar buracos no orçamento”, considerou Amélia António.

A importância não se prende apenas com a questão financeira, é também política, principalmente quando a associação depende do financiamento de instituições ligadas ao Governo da RAEM. “É muito desagradável estar num sítio onde se está completamente dependente das ajudas locais e do país onde se está, e ao mesmo tempo que não sem tem ajuda nenhuma do país de origem”, vincou. “Cria situações delicadas, principalmente quando se pede ajuda. Às vezes ouvem-se coisas de que não se gosta”, acrescentou.

Falta de informação

Por sua vez, Miguel de Senna Fernandes apontou o facto de haver pouca informação sobre este concurso junto das associações locais, o que faz com que persistam ainda muitas dúvidas. “A intenção é boa, e é sempre de louvar quando o Ministério dos Negócios Estrangeiros toma uma iniciativa a pensar na diáspora, mas era bom que nos dessem mais informação sobre o programa. Só espero que não seja apenas uma manifestação de boas intenções” disse o presidente da ADM.

Já sobre o facto de as associações locais terem aprendido a viver sem contar com apoios de Portugal e deste apoio ser tardio, Miguel de Senna Fernandes mostra-se resignado. “É uma boa iniciativa. Mas nós já parámos de nos queixar há muito tempo [por não haver apoios de Portugal] porque sabemos como as coisas são”, admitiu. “Eles têm tantos problemas internos que não têm tempo para a diáspora. É esta a ideia que tenho. E não me engano muito se considerar que outras associações congéneres pensam o mesmo sobre o Governo de Portugal”, atirou.

Neste momento, os representantes das duas associações admitem que a informação que possuem ainda é escassa e ainda não se debruçaram sobre este dossier, até porque têm outros problemas e a entrega das candidaturas só começa a partir do mês de Outubro. No entanto, ambos mostraram a intenção de se candidatarem.

Segunda vez

Criado pelo Governo de Portugal, em 2017, o primeiro concurso para atribuir apoios às associações sem fins lucrativos e ligadas às comunidades portuguesas foi lançado no ano passado, também entre 1 de Outubro de 31 de Dezembro.

Segundo a informação publicada no portal das Comunidades Portuguesas foram distribuídos cerca de 560 mil euros a 95 projectos, alguns dos quais pertencentes às mesmas associações, como foi o caso da Associação Portuguesa Cultural e Social de Pontault-Combault e a Cap Magellan, situadas em França.
Na lista de candidaturas apoiadas e rejeitadas não há qualquer associação com ligações a Macau.

22 Set 2020

Educação | Fusão da DSEJ e da DSES concluída este ano 

[dropcap]L[/dropcap]ou Pak Sang, director dos Serviços de Educação e Juventude (DSEJ), garantiu, em resposta a uma interpelação escrita do deputado Ho Ion Sang, que o processo de fusão da DSEJ com a Direcção dos Serviços de Ensino Superior (DSES) deverá estar concluído ainda este ano. “O regulamento administrativo já se encontra na fase final de preparação e, de acordo com o plano, a fusão destes dois serviços será concluída e implementada este ano para reorganizar, combinar e integrar as suas funções, bem como para melhorar a coordenação e a eficácia das políticas de educação.”

A mesma resposta dá conta de que a revisão da lei que regula o ensino técnico-profissional também deverá estar concluída em breve. “A discussão e o relatório dos trabalhos de revisão do actual regime de ensino técnico-profissional foram concluídos recentemente. O texto encontra-se, de momento, na fase de elaboração do projecto de regulamento administrativo, prevendo-se a sua publicação em 2021”, aponta Lou Pak Sang.

O director da DSEJ adiantou alguns dados relativos ao ensino técnico-profissional no ano lectivo anterior. No ensino superior, dos 108 cursos de licenciatura que funcionaram no ano lectivo de 2019/2020, mais de 60 por cento, cerca de 70 cursos, concentraram-se no ensino com orientação profissional, ligados a várias áreas especializadas como a terapia da fala e da linguagem, enfermagem ou tradução, entre outras. No ensino secundário, nove escolas oficiais e particulares realizaram 35 cursos técnico-profissionais, além de que mais de 130 empresas ou entidades proporcionaram aos alunos os estágios profissionais.

22 Set 2020

Andrew Leung, académico e consultor: “Os EUA sentem que a China está a comer o seu almoço”

Andrew Leung, académico, consultor e cronista de Hong Kong, é um dos oradores numa palestra online, organizada pela Universidade Autónoma de Lisboa, que tem hoje início e onde se vai abordar o crescimento dos países euro-asiáticos, o multilateralismo e o papel que a iniciativa “Uma Faixa, Uma Rota” tem nesse contexto. Andrew Leung, diz que o cenário de tensões e de multilateralismo não vai mudar com a eleição de um novo Presidente nos EUA, e defende que será difícil cimentar a liderança chinesa a nível global

 

[dropcap]A[/dropcap] sua palestra aborda o posicionamento da China nos dias de hoje por oposição ao dos EUA. Mas afirma também que vivemos num mundo multilateral.

Temos hoje uma nova ordem mundial dividida por poderes crescentes onde se inclui a China, claro, que é o país que mais compete com os EUA. Mas temos também a Rússia, Índia e outros poderes no Médio Oriente, como o Irão. O mundo está a mudar porque tem sido dominado pelo Ocidente, mas hoje temos o crescimento de poderes continentais mais tradicionais, como os países que referi. Temos então um crescimento da Eurásia e o conflito entre a China e os EUA é apenas uma parte de todo o cenário. Esta mudança de poderes é influenciada por esse conflito, mas não só. Há também outros competidores, sobretudo na Eurásia.

A Europa está a perder peso no palco mundial?

Estamos a assistir ao crescimento da Ásia contra a Europa, que está a tornar-se mais fracturante, particularmente com o Brexit, e também em termos demográficos, pois a população está envelhecida. Mesmo a Europa, como um todo, tem hoje uma economia maior do que a norte-americana, mas não é um país, é um conjunto de nações com muitos interesses. Temos todas estas dinâmicas multilaterais. O mundo era dominado pela hegemonia americana. A China não consegue retirar a liderança aos EUA, não tem capacidade para o fazer e não o quer fazer, pois o país não está interessado em intrometer-se nas questões de outros países. Mas à medida que a China se torna maior e mais influente isso reflecte-se na economia americana. O medo dos EUA é que, com o fortalecimento da China, a influência norte-americana a nível económico ou militar na Ásia-Pacífico seja ameaçada ou sofra mesmo uma erosão. Há vários factores em jogo e a guerra comercial entre a China e os EUA é apenas um deles.

Não enfrentamos uma Guerra Fria, mas é uma guerra com várias frentes. Qual o caminho para a paz global?

Antes da II Guerra Mundial não havia a bomba atómica. Mas hoje os EUA, EUA e Índia são potências nucleares, e também temos a questão dos mísseis, que estão cada vez mais sofisticados. A China está a apostar numa posição simétrica: não tem de ser igual ao seu adversário, mas tem poder. No tempo da Administração Nixon, na Guerra Fria, os EUA tinham como inimigo a URSS. A China era um país extremamente pobre e era considerado pela Administração Nixon como um parceiro para os interesses americanos contra os soviéticos. Foi um período de lua de mel, porque servia a ambos os países.

Mas isso mudou.

Depois surgiu a Organização Mundial do Comércio (OMC), a economia chinesa estava a desenvolver-se, produzia sapatos e t-shirts, o tipo de coisas que já não se produziam nos EUA. Os EUA queriam ajudar a China a entrar para a OMC, porque muitas fábricas americanas poderiam mudar-se para a China e o país poderia também liberalizar-se. Essa era a esperança. Contudo, todos estes anos depois, a China já não está a produzir sapatos e compete com os EUA em campos como a rede 5G, por exemplo. Os EUA sentem que a China está a comer o seu almoço, além de que se assiste a uma mudança de dinâmicas no Mar do Sul da China. A China agora está a aproximar-se ao Ocidente através do projecto “Uma Faixa, Uma Rota”, para que o comércio de gás e combustível possa ser feito por terra através do Médio Oriente para a Europa. Daí o interesse em desenvolver as economias na Eurásia. Já a Rússia quer manter a sua influência e tem interesses comuns com a China.

As presidenciais americanas estão marcadas para Novembro. Poderemos ver alguma mudança neste cenário de multilateralismo com um novo presidente americano?

Não creio. A ordem mundial continua, com o crescimento de países em desenvolvimento e a mudança de poder do Ocidente para o Oriente, e também com o foco na China enquanto potência emergente e a ameaça ao domínio americano. Se olharmos para os democratas, há um consenso de que a China é uma ameaça existencial para os EUA em termos económicos, militares, tecnológicos, de direitos humanos e ideológicos. Um recente inquérito da Pew Research Center revela que cerca de 60 por cento dos americanos têm uma visão negativa da China. Isto porque olham para a mudança que está a acontecer no mundo e, claro, não gostam da política chinesa e da violação dos direitos humanos. Também não gostam do desafio que a ascensão chinesa representa para a influência americana. Muitos não compreendem a China e pensam que o país vai substituir os EUA na liderança mundial, mas a China não é capaz de fazer isso.

Porquê?

Nem todos os países vão aceitar a liderança chinesa. A China está a aumentar a sua influência para defender os seus próprios interesses, e por isso é que a tendência [de um mundo multilateral] se irá manter. Este conflito entre a China e os EUA não é apenas comercial, militar ou ideológico, baseia-se também numa percepção. Porque é que tantos países seguiram, ao longo de todos estes anos, a liderança norte-americana? Por causa dos valores. Não apenas as instituições democráticas, mas a capacidade de o país assumir a liderança mundial.

Os candidatos às presidenciais norte-americanas têm perfis diferentes, e isso pode mudar a relação do país com a China.

Não acredito que muitas pessoas na China se preocupem se Trump ganhar um segundo mandato. Biden é mais equilibrado, mas a percepção de que a China é um desafio não vai mudar.

Na sua palestra aborda também a relação que a iniciativa “Uma Faixa, Uma Rota” tem nesta questão do multilateralismo.

Este projecto comporta uma faixa económica entre a China e a Ásia Central, a caminho da Europa, que liga a China ao Ocidente. Há também uma rota marítima que vai até ao Mar Mediterrâneo e Mar Vermelho. A China tem vindo a falar também da Rota da Seda digital que, na verdade, liga todo o mundo. Esse é o plano da China em prol de uma maior globalização e multilateralismo. Mas claro que no final todas as ligações vão dar à China. Segundo um estudo recente da Goldman Sachs, mesmo que a economia chinesa esteja a abrandar, é ainda possível que esta se transforme na maior do mundo em 2032. Mas não é possível o PIB chinês ultrapassar o PIB americano. O PIB não é sinónimo de poder a nível mundial. Temos Macau, com um PIB muito maior do que o de Hong Kong, mas com muito menos poder. O poder de um país depende também da dimensão da sua economia e da sua conectividade. Esse dia vai chegar para a China mas, por outro lado, a trajectória da nação está a tornar-se mais difícil, porque há uma imagem negativa do país. A China tem hoje mais poder e uma maior capacidade para defender os seus interesses, mas isso gerou um maior conflito.

Hong Kong é uma das peças neste conflito entre a China e os EUA.

Hong Kong sempre foi uma economia aberta e muito dependente do comércio e sistema financeiro internacionais. Mesmo antes da transferência de soberania, já Hong Kong era um membro independente da OMC. Os EUA não reconhecem hoje esse estatuto autónomo, devido às sanções, mas a OMC não depende da autoridade norte-americana. O estatuto mantém-se, mas há o risco de erosão, e isso é muito perigoso para Hong Kong. O sector financeiro é dominado por muitos bancos americanos que beneficiam da existência de uma bolsa de valores. Mas estes bancos não recorrem apenas a Hong Kong, usando o território como base para fazerem negócios em todo o mundo. Acredito que os bancos americanos estão a ser muito cuidadosos para não saírem muito do barco [neste momento].  Mas não são apenas as tensões em Hong Kong que estão em causa no conflito entre a China e os EUA. Há Taiwan, o Mar do Sul da China, Xinjiang. Hong Kong é uma peça neste tabuleiro de xadrez, e está num fogo cruzado. Mas como disse há uma forte presença americana em Hong Kong e a banca dos EUA está a usar Hong Kong e a existência do princípio “um país, dois sistemas” para fazer negócios com o resto do mundo e também para negociar com o mercado chinês.

A lei da segurança nacional veio alterar um pouco as coisas.

Hong Kong continua a estar bem posicionado porque faz parte da China. Mesmo com a imposição da lei de segurança nacional o território continua a ser muito diferente do que se passa do outro lado da fronteira. A China quer que Hong Kong continue a actuar de forma autónoma, sobretudo para as empresas chinesas que usam o território para aceder a mercados internacionais. Acredito que o acordo de livre comércio RCEP (Regional Comprehensive Economic Partnership) pode entrar em vigor mais cedo ou mais tarde, têm sido feitos progressos. Caso entre em vigor no próximo ano Hong Kong estará muito bem posicionado.

Que análise faz a esse posicionamento no contexto euro-asiático?

Hong Kong, enquanto centro financeiro internacional, tem um papel a desempenhar na iniciativa “Uma Faixa, Uma Rota”, que inclui a zona da Eurásia e também da Ásia-Pacífico. Há muitas oportunidades de investimento para os profissionais de Hong Kong, como os advogados, que alargam o campo de acção na área da arbitragem. Hong Kong pode também ser usado como peça central em termos de implementação da Common Law. Haverá um crescente interesse por parte dos profissionais de Hong Kong e das suas instituições.

Macau é um território bem mais pequeno, mas também tem um papel neste contexto euro-asiático?

Macau pode apostar na área tecnológica, e foi assinado recentemente um acordo com o grupo Alibaba para transformar o território numa cidade inteligente. Isso é encorajado por Pequim, porque nos últimos anos o território tem estado dependente de uma única indústria, o jogo. Agora há uma aposta na diversificação económica e a tecnologia é um exemplo. Mas há uma coisa que Macau tem, ao contrário de Hong Kong, que é o legado português. Com a língua portuguesa há uma aproximação ao Brasil, por exemplo, que é um grande parceiro da China. O Governo de Macau tem vindo a desenvolver uma maior relação com os países de língua portuguesa.

22 Set 2020

Cinemateca Paixão | Conversa com realizadores marcada para sábado

É já este sábado que a Cinemateca Paixão acolhe a palestra “Cineastas de Macau: A sua jornada para o cinema”, que conta com a presença da realizadora Tracy Choi e de Stanley Kwan, de Hong Kong. Jenny Ip, gestora do espaço, acredita que este tipo de iniciativas aproxima mais o público da renovada cinemateca

 

[dropcap]A[/dropcap] Cinemateca Paixão promove, este sábado, uma conversa online entre realizadores de Macau e de Hong Kong. “Cineastas de Macau: A sua jornada para o cinema” acontece entre as 15h e as 16h e conta com a participação de Tracy Choi e de Oliver Fa, realizadores de Macau, que vão trocar experiências como cineastas com Stanley Kwan, realizador de Hong Kong.

Ao HM, Jenny Ip, gestora de operações da In Limitada, a nova concessionária da Cinemateca Paixão, declarou ser “uma honra” poder contar com a presença de Stanley Kwan.

“Vai ser uma sessão de partilha sobre a sua forma de fazer cinema. Esperamos que possam ser partilhadas muitas ideias nesta sessão.”

Para Jenny Ip, a palestra online vai proporcionar maior aproximação [da Cinemateca Paixão] com o público. “Um dos nossos objectivos é, nos próximos dois anos, trazer a Macau mais produtores e realizadores do estrangeiro, para que possam partilhar as suas ideias com os nossos realizadores. Acreditamos que este tipo de experiência pode ajudar ambos os lados, para que possam aprender novas coisas, algo que ajude no processo criativo”, frisou.

Depois das críticas iniciais por parte de alguns realizadores, a nova gestora da Cinemateca Paixão quer aproximar-se mais daqueles que fazem cinema em Macau. “É necessário tempo, mas o mais importante é mantermos o constante contacto com os realizadores. Temos uma comunicação muito estreita com alguns realizadores e produtores”, disse Jenny Ip.

A responsável pela gestão da Cinemateca Paixão adiantou ainda que acompanha de perto muitos dos filmes que estão a ser rodados neste momento, para que possam vir a integrar o programa.

“Sabemos que muitos dos realizadores e produtores estão a meio da fase de produção de filmes e vamos acompanhando o progresso do trabalho. Depois de terminarem as produções, gostaríamos de agendar a exibição dos filmes na Cinemateca.”

Bilhetes vendidos

Neste momento, a Cinemateca Paixão tem apresentado alguns clássicos do cinema, sessões inseridas no festival “A Love Letter to the Cinema”. Jenny Ip conta que a adesão do público tem sido muito boa, com grande parte dos bilhetes já vendidos.

“Estamos muito felizes. Temos tido bom feedback e até adicionámos novas sessões. Até agora temos tido um bom acolhimento por parte do público e sentimos que é uma boa experiência rever os clássicos.”
Para Jenny Ip, o mais importante é fazer com que os amantes do cinema possam rever obras incontornáveis da sétima arte em tempo de pandemia. “Nos próximos meses, esperamos que o público aprecie o nosso programa e faremos o nosso melhor para trazer bons filmes para Macau”, rematou.

21 Set 2020

CCCM | Macau é prioridade do plano para os próximos 10 anos

Foi apresentado, na sexta-feira, o novo plano de desenvolvimento a 10 anos do Centro Cultural e Científico de Macau em Lisboa. O CCCM quer ser um think-tank, além de investigar personalidades do território como Henrique de Senna Fernandes ou Fu Tak Iam, entre outros. Estão também pensados projectos de investigação sobre o panorama cultural, socioeconómico e político de Macau de 1974 até à actualidade, e um Museu Virtual em parceria com a Universidade de Macau

 

[dropcap]O[/dropcap] Centro Cultural e Científico de Macau (CCCM), em Lisboa, vai sofrer uma profunda renovação estrutural nos próximos anos. Carmen Amado Mendes, presidente da instituição, apresentou na última sexta-feira o plano estratégico de desenvolvimento para 10 anos que tem Macau como prioridade. A estratégia pretende também dar mais visibilidade ao CCCM, e romper com a tendência de “falta de dinamismo” e “recursos humanos e investigadores insuficientes”. Acrescentam-se ainda outros problemas, como a “estratégia de comunicação e imagem”, a “fraca divulgação” ou “edifícios degradados e a fachada pouco apelativa”.

O plano está agora em consulta pública até ao dia 15 de Outubro e pretende atrair a atenção de mecenas que queiram contribuir para a iniciativa. Da parte do Governo português, o investimento será de 3,5 milhões de euros, cerca de 850 mil euros ao fim de cinco anos, prevendo-se a concessão de 10 bolsas de doutoramento e a contratação de mais investigadores.

“Estamos aqui a investir uma quantidade considerável dos recursos públicos que o contribuinte português disponibiliza à Fundação para a Ciência e Tecnologia (FCT) para valorizarmos os estudos asiáticos centrados na relação Europa-Ásia e no papel importante que Portugal e Macau têm tido nessa relação”, concluiu o ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, Manuel Heitor.

Para Carmen Amado Mendes, trata-se de um “plano ousado, com importantes implicações para o entendimento teórico e empírico da Ásia em Portugal e que visa implementar um novo ciclo na vida do CCCM, contribuindo para a sua projeção”. A presidente, que assumiu funções em Fevereiro deste ano, frisou que é necessário “dar início a uma nova fase da história do CCCM, evitando que o Centro continue a ser percepcionado como uma instituição estagnada, opaca e fechada sobre si mesma”.

Manuel Heitor destacou que o plano visa “manter a narrativa inicial do CCCM, mas projectá-la no mundo”. “Este centro é único e a ideia deste plano é manter a narrativa inicial, sobretudo assente em três principais actividades. Por um lado, a investigação e informação, por outro lado a museologia tendo como base um arquivo único que foi doado a Portugal através deste centro, e o terceiro pilar, do Centro de Documentação e Arquivo”, assinalou o ministro, que disse querer implementar a estratégia até ao final deste ano.

Estudar templos e pessoas

Macau assume um papel primordial no projecto, pretendendo-se apostar mais na investigação histórica. O CCCM quer “contribuir para um melhor conhecimento científico sobre a presença histórica e cultural portuguesa em Macau, bem como estimular os contactos e o diálogo com as culturas orientais”. É também objectivo “contribuir para a preservação do património existente em Portugal que atesta a presença portuguesa em Macau e na região Ásia-Pacífico, em particular na República Popular da China”, entre outros.

Um dos projectos relacionado com Macau é o estudo de personalidades que marcaram o território em várias áreas, tal como João Maria Ferreira do Amaral, Pedro José Lobo, Kou Ho Neng, Fu Tak Iam, Bernardino de Senna Fernandes, Luís Gonzaga Gomes e Henrique de Senna Fernandes.

O CCCM “deve, necessariamente, dar prioridade a Macau em colaboração com investigadores e instituições do território que têm apresentado propostas interessantes”. A nível histórico permanecem “temas negligenciados”, como “o estudo de círculos intelectuais macaenses, particularmente no período de transição do século XIX para o século XX – por exemplo o estudo do historiador macaense Montalto de Jesus”.

Nos próximos 10 anos, o CCCM quer também “analisar a evolução de Macau de 1999 à actualidade, incluindo a investigação sobre o seu desenvolvimento económico, a integração na Nova Rota da Seda e na Grande Baía”. Pretende-se também desenvolver projectos de investigação sobre “a comunidade macaense após a transição para a China, as transformações urbanas ocorridas no Território, incluindo a evolução dos templos e construções religiosas, os mandatos de Edmund Ho e Chui Sai On, as perspectivas para Ho Iat Seng e a experiência das pandemias SARS e covid-19 em Macau”.

Ser e pensar

Mais do que um polo de investigação sobre a presença portuguesa na Ásia, o CCCM quer transformar-se também num think-tank. Este “deve começar a dar os primeiros passos que lhe permitam no futuro vir a assumir-se como o ‘think tank’ de Macau, da China continental e da Ásia em Portugal, posicionando-se como um dos principais pontos de encontro das várias entidades públicas e privadas que trabalham estas temáticas, incluindo investigadores e elementos da sociedade civil”, lê-se no documento.

O plano refere o facto de este ser um projecto “a longo prazo”, com alguma dificuldade de implementação. Ainda assim, o CCCM pretende candidatar-se ao processo de avaliação dos 20 anos do Fórum Macau, que decorre em 2023. “Portugal é o país favorito depois de Macau e Pequim terem ganho os dois concursos anteriores, de 2013 e 2018”, aponta o Plano.

“Adicionalmente, o ‘think tank’ do CCCM pode prestar serviços de consultoria relacionados com cultura asiática a diversas entidades, públicas e privadas, bem como de agilização de contactos entre várias instituições e empresas e entre investigadores e empreendedores”, lê-se ainda.

Outro projecto relacionado com Macau prende-se com a criação de um Museu Virtual em parceria com a Universidade de Macau (UM), um projecto “extremamente ambicioso” que, segundo a académica Ana Cristina Alves, esteve na gaveta muitos anos.

Entre 2018 e 2019, o museu, que tem um importante acervo sobre Macau, teve mais 21 por cento de visitantes, mas nem isso fez com que tenha deixado de ser “um dos mais desconhecidos locais de Lisboa, sendo que a situação piorou com a pandemia”. Desta forma, o estabelecimento de um Museu Virtual e de outras iniciativas de dinamização pretendem “contrariar a redução nos próximos anos”.

Actualmente, o CCCM promove também cursos de língua chinesa, mas também nesta área pretende ir mais além. “Tendo em conta os programas actualmente existentes sobre esta área, nomeadamente nos Institutos Confúcio, a oferta formativa deve ser reestruturada de forma a suprir falhas e garantir ao CCCM uma posição de destaque. Uma oferta diferenciada poderia incluir, mesmo que pontualmente, cursos de formação contínua de cantonês ou de chinês clássico (caracteres tradicionais), de modo a contribuir para o aumento do número de sinólogos em Portugal com um profundo conhecimento sobre a língua chinesa.”

Na área documental, o CCCM pretende não só integrar a sua biblioteca em redes internacionais como também criar “uma rede de âmbito nacional, associando-se a instituições que também possuam espólios documentais na área dos Estudos Asiáticos e das relações entre a Europa e a Ásia”.

Na cerimónia de apresentação foram também assinados diversos protocolos de cooperação do CCCM com várias instituições, incluindo Fundação para a Ciência e Tecnologia (FCT), Fundação Jorge Álvares, Câmara do Comércio e Indústria Luso-Chinesa, Associação de Jovens Empresários Portugal-China, Agência Ciência Viva, Agência ERASMUS+, Associação Amigos da Nova Rota da Seda, Instituto Politécnico de Leiria, Universidade de Coimbra e Universidade de Lisboa.

Segundo o ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, estes protocolos são “praticamente simbólicos e importantes” e “todos têm valor”, destacando o firmado com a FCT.

“O protocolo que a FCT aqui assinou (…) é um protocolo que tem um impacto financeiro importante de financiar até 10 bolsas de doutoramento por ano para estudantes de todas as universidades portuguesas trabalharem em colaboração com o centro”, declarou, explicando que está previsto que dois investigadores com doutoramento trabalhem a partir do CCCM.

20 Set 2020

Ensino | Católica nega ter plataforma online para alunos de Macau

[dropcap]A[/dropcap] Universidade Católica Portuguesa (UCP) não vai criar, afinal, uma plataforma online especial para os alunos de Macau que não conseguem sair do território. Numa resposta do gabinete da reitoria da UCP ao HM, refere-se que “não há plataforma online para os alunos de Macau, até porque muitos deles encontram-se em Lisboa”. Essa informação veio da Direcção dos Serviços de Ensino Superior em resposta a uma interpelação escrita do deputado Leong Sun Iok.

Em Macau, estão 25 alunos de um total de 68 estudantes que estudam na UCP ao abrigo do Protocolo de Línguas e Outros Cursos, bem como 64 de 81 alunos do Protocolo de Direito. Para dar resposta à necessidade de um novo sistema de ensino devido à pandemia da covid-19, a UCP “reforçou os meios tecnológicos nas salas”, tendo optado por “um regime híbrido de lecionação, com 50 por cento das aulas leccionadas à distância, via Zoom”.

A universidade de ensino superior privado considera que “o principal desafio que se coloca aos alunos que optaram por ficar em Macau é, naturalmente, a muito menor exposição à língua e à cultura portuguesas”. “A isto se acrescenta a diferença horária e o facto de estarem a assistir a aulas presenciais à distância, o que pode inibi-los de participar com igual à-vontade nas sessões presenciais. Os docentes foram já informados de que alguns alunos da RAEM decidiram ficar em casa e já se mostraram disponíveis para os ajudar com as dificuldades acrescidas”, remata a UCP.

17 Set 2020

Viva Macau | CCAC nega corrupção e fraude na concessão de empréstimo

O Comissariado contra a Corrupção conclui que não houve crime de corrupção ou fraude no empréstimo de 212 milhões de patacas pelo Fundo de Desenvolvimento Industrial e Comercialização à falida Viva Macau. Houve, no entanto, negligência por parte do Governo

 

[dropcap]N[/dropcap]ão houve crime de corrupção nem dolo nos actos praticados, mas sim más práticas que o Executivo deve corrigir. É esta a conclusão do relatório do Comissariado contra a Corrupção (CCAC) relativo à investigação sobre o empréstimo de 212 milhões de patacas concedidos pelo Fundo de Desenvolvimento Industrial e Comercialização (FDIC) à falida Viva Macau Airlines.

No que diz respeito aos administradores e sócios da companhia aérea, houve “crime de falência não intencional”, punido pelo Código Penal. No entanto, o processo depende de queixa, que deveria ter sido apresentada três meses depois da declaração de falência da empresa, em 2010, algo que nunca ocorreu.

O CCAC aponta que “foram descobertos factos que provam que os mesmos [sócios e administradores] não cumpriram a lei para que a contabilidade e as transacções comerciais cumprissem as regras”, além de que “não elaboraram as demonstrações financeiras e a contabilidade, mesmo depois da declaração de falência da Viva Macau”.

Apesar destas irregularidades, o CCAC defende que os administradores Kevin Ho e Ngan In Leng tentaram salvar a empresa. “Conclui-se que não existem indícios óbvios que demonstrem que os sócios ou administradores da Viva Macau levaram intencionalmente a sociedade à falência, cometendo actos de má-fé com o intuito de criar assim uma simulação de insuficientes fundos para fazer face ao pagamento da dívida, evitando assim a mesma.”

Os dois empresários chegaram a fazer vários empréstimos à companhia aérea. Quando esta faliu, em 2010, devia um total de 1.1 milhões de patacas.

As falhas do Governo

Do lado do Executivo houve negligência e falta de rigor na concessão de cinco tranches do empréstimo, mas “não se encontram preenchidos os requisitos legais constitutivos de qualquer tipo de crime”. Ainda assim, o CCAC conclui que “nem a Direcção dos Serviços de Economia, o FDIC ou a Autoridade de Aviação Civil de Macau acompanharam a situação financeira da Viva Macau, nem procedido à supervisão da situação de liquidação dos empréstimos”.

Desta forma, o CCAC defende que “os trabalhadores da função pública responsáveis pela apreciação e aprovação, bem como pelo acompanhamento e supervisão dos empréstimos, não cumpriram de forma empenhada as suas funções nem as suas responsabilidades”.

As sugestões

O CCAC defende que o Governo deve avançar para a “regulamentação específica sobre os destinatários da concessão de apoios, a sua forma, critérios, condições de apreciação e aprovação, competência para a sua autorização, deveres dos beneficiários e sistema de supervisão”.

Tudo para evitar que “surjam novamente situações de falta de base legal no processamento de pedidos de apoio pelo FDIC”. Para o CCAC, montantes muito elevados exigem “legislação clara” que regulamente “a apreciação e aprovação de tais pedidos”.

São também sugeridas mudanças de fundo na forma como o FDIC opera. É necessário criar uma lei que “promova e aperfeiçoe o sistema de supervisão na utilização dos apoios”, além de ser necessário resolver as “lacunas em matérias de garantia de empréstimos, regime de liquidação e responsabilidade de supervisão”.

Para o CCAC, é fundamental “criar um mecanismo de alerta e controlo de risco”, algo “indispensável para garantir que os fundos públicos não sejam alvo de abuso em virtude de uma supervisão não rigorosa e de situações de excesso de confiança”. Apesar dos actos dos funcionários públicos terem prescrito, o CCAC defende que os funcionários e chefias devem ser alertados para melhores práticas neste tipo de processos.

Instruções emitidas

Em comunicado, o Chefe do Executivo, Ho Iat Seng, disse que já emitiu instruções para que os serviços públicos estudem “com seriedade os problemas apontados e as sugestões apresentadas” pelo CCAC. Ho Iat Seng deu também instruções a Lei Wai Nong, secretário para a Economia e Finanças, “para rever os procedimentos de apreciação e autorização da concessão de empréstimos pelo FDIC”. O Chefe do Executivo deseja também que “sejam revistas as normas legais aplicáveis ao FDIC, incluindo a revisão e aperfeiçoamento do actual regulamento”.

O Governo promete ainda “rever e aperfeiçoar o regime de responsabilização dos titulares de cargos públicos, exigindo aos trabalhadores da função pública a quem são atribuídas competências de gestão e aplicação dos recursos públicos que cumpram lealmente as suas funções e que assumam as suas responsabilidades”.

O CCAC instaurou o inquérito relativo a este caso a 30 de Julho de 2018, depois de um intenso debate com os deputados que fazem parte da Comissão de Acompanhamento das Finanças Públicas da Assembleia Legislativa.

17 Set 2020

Miguel de Senna Fernandes lança livro de crónicas: “O meu pai esteve sempre presente”

Depois de criar, em 2018, o blogue “Crónicas à Sexta”, Miguel de Senna Fernandes passa algumas dessas crónicas para um livro com o mesmo nome. Tratam-se de “estórias e ironias do comum dos dias, de alegrias e avarias, desde Marias a Zacarias”, como o próprio escreveu. O livro, com chancela da Praia Grande Edições, é lançado a 4 de Outubro no festival literário Rota das Letras. O evento deste ano celebra o conto e em especial a obra do escritor macaense Henrique de Senna Fernandes, pai de Miguel

 

[dropcap]C[/dropcap]omo surgiu a oportunidade de publicar o livro “Crónicas à Sexta”?

O festival Rota das Letras quis fazer um tributo à obra do meu pai. Este ano todo o programa está sujeito ao tema ‘Contos’ e acharam que deviam fazer uma nova edição, em chinês e inglês, da obra do meu pai, “Nam Van: Contos de Macau”. Depois, em conversa, propuseram-me publicar os meus contos que estão no meu blogue. É uma boa oportunidade de lançar algo que gosto de fazer.

Tem o blogue desde 2018. Porque sentiu necessidade de partilhar os seus escritos?

Inicialmente, eram apenas crónicas que me vinham à cabeça e fiz o esforço para as publicar todas as sextas-feiras. Daí o título da obra ser “Crónicas à Sexta”. Claro que muitas vezes não é fácil escrever crónicas e muitas vezes não consigo concentrar-me na escrita como gostaria. Houve muitas interrupções, mas quis manter um compromisso para que todos estes contos e crónicas fossem lançadas às sextas-feiras. Coloquei todas as crónicas à disposição da organização do festival e até pedi que fossem eles a escolher os textos.

É importante o festival Rota das Letras celebrar os escritos do seu pai?

Sim. Foi bom manter viva a ideia do tributo à sua obra. Já estava à espera que isso fosse adiado para outra altura, mas a organização decidiu manter a palavra. Louvo o esforço da organização nesta época da pandemia. Naturalmente, aguardo com alguma expectativa a edição do seu livro em chinês e inglês. É uma excelente ideia para que, pelo menos, a obra possa sair fora das fronteiras e entrar no mundo chinês. Isso é fundamental, já que hoje em dia há uma tendência para se valorizar coisas da terra. Junto da comunidade chinesa há uma crescente consciencialização da produção local, e isto é muito bom.

Dia 4 de Outubro marca o décimo aniversário da morte do seu pai. Considera que é importante dar uma nova roupagem à sua escrita?

Não só às obras do meu pai, mas também em relação às obras de outros autores de Macau. É importante renovar o interesse pelas obras já publicadas, quanto mais não seja para incentivar outros escritores. Porque apesar das grandes transformações sociais, Macau continua a ter um manancial de histórias. É um campo fértil para histórias, romances, crónicas e há muito canto por aí que pode inspirar obras. É sempre bom que as organizações locais, sobretudo nesta área literária, se debrucem também sobre a renovação do interesse das obras já feitas. É mentira quando dizem que Macau não tem literatura. Claro que tem, mas se calhar a literatura em português podia chegar a outro tipo de patamar. Talvez não se tenha conseguido porque o universo de leitores não é vasto em Macau, o que se compreende, mas é sempre bom manter as obras vivas. Apesar das dificuldades reais que existem, não se deve abandonar a defesa da literatura aparentemente ténue em Macau.

O seu pai serviu de inspiração para escrever estas crónicas?

Não necessariamente. Não me baseei nada naquilo que escreveu, mas o pai esteve sempre presente. Nunca utilizei fórmulas ou a inspiração com base nas obras dele, e penso que ele até gostaria que eu fizesse as coisas por mim, tal e qual como ele começou. Há sempre aquela mão que me abençoa e tenho o meu pai sempre presente quando escrevo. Mas inspiro-me em outras coisas. O meu pai dizia sempre isto, que em cada canto e em cada esquina de Macau há uma história e ele mostrou isso.

Podemos esperar crónicas de análise à sociedade de Macau, ou são reflexões pessoais?

Não é uma análise, não faço isso. No fundo tento focar-me muito na condição humana. Quando falamos sobre uma obra muitas vezes temos de versar sobre o estado de espírito da personagem, há essa representação da condição humana. Talvez algumas questões existenciais venham à tona, há uma tentativa de explorar, através das personagens, até que ponto e em que termos nós existimos. Não é uma análise à sociedade, embora haja ali caricaturas, histórias com alguma profundidade. Há uma história, de que gosto muito, sobre cartas de amor de crianças. É uma história que brinca muito com a inocência das pessoas, mas fala-se de coisas sérias, que não respeitam idade. Há uma certa ingenuidade ali e é precisamente isso que fascina.

É essa a sua crónica preferida, ou tem outras?

Gosto de todas, no fundo. Quando escrevo, o primeiro leitor sou eu, sou um grande julgador de mim próprio. Escrevo, deixo de lado uns tempos e depois volto a ler para ver se gosto. São crónicas muito diferentes. No fundo é uma experiência e tenho de explorar várias possibilidades diferentes nesta forma de escrita. Não sei como as crónicas vão ser publicadas, mas eu, pelo menos, vejo uma evolução nas várias formas de abordar o conto. Há uma história sobre o natal e gosto muito desta. Foi a primeira história que fiz, em 2015. Gosto muito de um conto sobre o bolero [Chi-ca-pom, o bolero improvável]. Também gosto do conto sobre as cartas de amor. Tenho outros contos em mente e vários projectos que vou tentar concretizar no próximo ano. Tenho várias coisas escritas que estão ainda em esboço e que se podem transformar em algo.

Esses projectos passam pela publicação de um romance?

O meu sonho é publicar um romance. Tenho o plano de um romance feito há muito tempo, mas falta-me alguma perspectiva histórica, relacionada com o tufão de 1874. Falta-me alguma pesquisa que terei de fazer. Penso que seria um romance fantástico. Mas esse período histórico serve apenas como pano de fundo. Espero ter tempo para acabar isso. Comecei a escrevê-lo, mas tive dificuldades em termos de enquadramento histórico e ficou para depois. Vamos ver se o reformulo depois.

Porquê esse período histórico em específico?

O tufão em si é um fenómeno da natureza que naturalmente cria várias possibilidades de narrativa, várias histórias que podem servir como pano de fundo. Não há uma razão em especial, mas apenas um certo fascínio sobre esse fenómeno da natureza. Espero que os leitores apoiem aqueles que escrevem e usam o seu tempo para produzir obras. Sobretudo que apoiem aqueles que se vão estrear. Para que haja uma reacção ao que se cria.

17 Set 2020