Os direitos dos úteros: a endometriose, o aborto e a vida

No mundo de produção e consumo, o bem-estar humano é de extrema importância para a boa continuação do sistema. A endometriose é daqueles problemas que se atravessam na visão de pessoas como máquinas, que devem estar prontas para contribuir para o enriquecimento comum. O aborto também é um direito que garante mais produtividade e crescimento económico, dir-vos-á o império do meio. E porque argumentos destes funcionam para dar um pouco de espaço no direito aos úteros existirem, o governo francês tem dado máxima importância à endometriose e à sua investigação. Recentemente, também, consagrou o aborto na sua constituição.

Ainda assim, o caminho para a paridade de género ainda é longo em qualquer ponto do planeta. O passado 8 de Março relembra-nos disso: “Queremos direitos, não queremos flores”. O caminho tanto parece infindável como circular. Esses direitos que parecem pouco estabilizados nas suas conquistas, são susceptíveis aos tremores políticos que se fazem sentir. Os úteros só estão protegidos enquanto se continuarem a reunir esforços para proteger a sua existência plena de direitos e oportunidades. Caminhos que reforçam a investigação em endometriose porque consideram o bem-estar um valor fundamental para se consagrar os direitos humanos, e não os direitos de produção capitalista. Passos ainda maiores são os que contemplam o direito ao aborto como um direito à escolha com dignidade.

O útero é a incubadora da vida humana, mas recebe pouca atenção humanista. Essa que integra a experiência dos que carregam os úteros nas suas vísceras. O fanatismo religioso que tem ditado as regras do aborto nos Estados Unidos chegou a um ponto assustadoramente caricato. Os embriões, na sua personalidade jurídica, são crianças por nascer. Os embriões sem casa, os que se encontram congelados para tratamentos de fertilização in vitro lá continuarão, à espera de que milagrosamente se transformem em crianças. Nenhum médico se arriscará a fazer o procedimento de implementação porque a perda do embrião pode ser punível por lei. Esse embrião não tem casa fisiológica, porque o útero, e quem o carrega, é completamente invisibilizado. Uma objectificação aflitiva que faz lembrar a “História de uma Serva” de Margaret Atwood.

Os direitos dos úteros são tão importantes quanto precisam de ser integradores da vida que os rodeia. No meio do genocídio que tem acontecido na faixa da Gaza há dificuldade em menstruar, parir e garantir a vida dos filhos com dignidade. A vida de quem carrega úteros, seja uma mulher, um homem trans ou uma pessoa não binária, tem de ser honrada. O útero pode não definir uma mulher na sua panóplia de existências sociais, mas não é esse objecto exterior, sem história e vontades que querem fazer acreditar. O útero é o princípio da vida só dentro de uma outra vida que o carrega.

Subscrever
Notifique-me de
guest
0 Comentários
Inline Feedbacks
Ver todos os comentários