O Retrato Impossível de Yinyuan Longqi

Yiran Xingrong (1601-68), o monge de Hangzhou que foi para Nagasaki e que foi conhecido no Japão como Itsunen Shoyu, terá sido o responsável pelo convite feito ao mestre do mosteiro Huangbo em Fujian Yinyuan Longqi para vir para o Japão em 1654, no tempo da transição Ming-Qing. Num tríptico, Yiran representou os três mestres da Escola do Budismo chan: Linji, Deshan e Damo (Bodhidharma) os dois primeiros a três quartos, voltados para Damo, de frente e no meio (rolos verticais, tinta e cor sobre papel, 124,4 x 39,6 cm, no Museu de Arte da Universidade de Michigan) do modo como tradicionalmente eram representados os monges budistas desde a dinastia Song, cohecido como dingxiang, neologismo budista que foi a tradução fonética da palavra indiana usnisa, o alto na cabeça do Buda significando a sua iluminação, que se diz invisível ao olhar de seres vivos.

Sobre o retrato de Deshan, à esquerda, outro monge mestre de caligrafia Muan Xingtao (1611-84) conhecido no Japão como Mokuan Shoto, escreveu:

«Um único ponto no grande vazio,

uma única gota num grande barranco,

Ele queimou o sutra

quando lhe surgiu a iluminação.

Com o seu bastão, aponta tanto para os sábios

como para a gente comum,

Neste mundo de Carma, acção e consequência,

ele é um verdadeiro buda.»

Quando Yinyuan se tornou o venerado mestre do mosteiro Obaku no Japão, também retratos seus foram feitos do mesmo modo. Num deles, feito por um autor desconhecido (rolo vertical, tinta e cor sobre seda, 119,4 x 57,8 cm, no Metmuseum) ele apresenta-se de corpo inteiro; o cabelo e a barba brancos não ocultam um suave sorriso, a sobrepeliz vermelha sobre o ombro esquerdo segura por um anel colocado em cima do lugar exacto do coração e, calçado com sapatos da mesma cor, os pés repousam sobre um escabelo. Na sua mão esquerda um enxota-moscas, na direita um longo bastão irrompe no meio de um poema.

Muan Xingtao é também o autor desse poema:

«Segurando o bastão ele aponta

directamente para a Humanidade,

E no entanto, como ele era

originalmente sem forma,

este retrato não é verdadeiro,

A sua forma não pode ser

percebida como forma,

A sua benevolência é apenas

a sua natural benevolência.

Se, de repente, conseguires

entender esta lei,

Então o teu espírito poderá

vaguear para além do Mundo.»

Muan Xingtao foi reconhecido, com Yinyuan e Jifei Ruyi (no Japão chamado Sokhui Noitsu, 1616-71) como um dos “Três pincéis do mosteiro Obaku”. O último, na pintura Luohan lendo ao luar (no Metmuseum) com um pincel largo desenhou a lenta figura de um monge de costas sentado no chão, segurando um rolo que aparenta ler. Porém, nada dele nem da lua se percebe. E escreveu, com o fulgor ligeiro de uma dança:

«A lua e o papel são da mesma cor.

A pupila do olho e a tinta

são as duas negras.

O sentido maravilhoso

alojado no círculo,

Está para além da compreensão.»

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