Censos 2021 | Mais residentes têm curso superior, mas mercado não absorve graduados 

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Numa década, o número de residentes com curso superior mais que duplicou. A maior parte opta por licenciaturas em ciências empresariais, línguas e turismo. Entre 2011 e 2021, quase metade dos diplomas foram obtidos nas universidades locais. Analistas ouvidos pelo HM assumem que o mercado laboral não consegue absorver todos os licenciados

 

Em dez anos, a fatia da população com curso superior quase duplicou, segundo os resultados dos Censos 2021, que traçam o retrato de um período marcado não apenas pelo investimento público no ensino superior, aponta o relatório. “A tendência para a formação contínua foi impulsionada pelo aumento da procura de quadros qualificados, que se deve ao desenvolvimento económico”, lê-se.

Da população com mais de 15 anos, num total de 583.089 pessoas, 175.956, ou seja, 30,2 por cento, tinha curso superior, quando esse valor era em 2011 de apenas 18,1 por cento, o que constitui um aumento de 99,9 por cento.

Relativamente aos locais, deu-se um aumento de 97,9 por cento do número de residentes com formação superior, sendo que as maiores proporções se registam nas pessoas com idades compreendidas entre 25 e 29 anos e dos 30 aos 34 anos, com percentagens de 72,2 e 61 por cento.

A grande escolha dos residentes recai na licenciatura, que representa 69,8 por cento, enquanto que apenas 14,7 dos residentes tem mestrado e 1,6 por cento doutoramento. Relativamente às áreas de ensino, os cursos de “ciências empresariais e administração” são os mais procurados, com uma fatia de 30,5 por cento, enquanto os cursos de “humanidades e línguas” representam nove por cento. Seguem-se os cursos de “turismo, hotelaria e serviços de catering”, com 8,4 por cento.

Apesar de muitos locais optarem por estudar no estrangeiro, a verdade é que a procura por cursos em Macau aumentou, com 44,2 por cento dos diplomas a serem obtidos no território. Segue-se o Interior da China com 29,5 por cento, Taiwan com 10,5 por cento e Hong Kong com 2,8 por cento. Portugal representa apenas 1,3 por cento dos destinos para frequentar o ensino superior.

Ainda no sector educativo, os Censos mostram que “com a elevação do nível de escolaridade da população, 29 por cento dos trabalhadores detinham cargos de ‘directores e dirigentes administrativos’, ‘especialistas das profissões intelectuais e científicas’ e ‘técnicos e profissionais de nível intermédio’”, um aumento de 6,2 por cento face a 2011.

Estes trabalhadores mais qualificados eram, no total, 10.5432, sendo que 73,8 por cento tinha estudado no ensino superior.

E encontrar emprego?

Para Agnes Lam, académica e ex-deputada, estes dados são “um bom sinal” e reflectem “o investimento que tem sido feito pelo Governo no que diz respeito à escolaridade gratuita e concessão de bolsas”. No entanto, acredita que, com o actual cenário de crise económica, “o mercado não consegue absorver todas as pessoas”.

“Deveria haver um mecanismo para ajudar licenciados a iniciarem os seus próprios negócios em determinadas áreas, e não apenas a abrirem cafés. Há pequenos negócios que podem ser criados, mas serão precisos mais dez anos para vermos algum desenvolvimento [a este nível]. Deveríamos apostar também na educação profissional. Não podemos ter os mesmos empregos que tínhamos nos anos 90 e as pessoas também têm de encarar essa realidade”, admitiu.

Rui Martins, vice-reitor da Universidade de Macau (UM), interpreta os dados demográficos do ensino como o reflexo do investimento público e privado no ensino superior. “A nível de licenciatura creio que grande parte dos alunos são de Macau, mas ao nível de mestrado e doutoramento este panorama inverte-se um bocado”, disse.

Antes da pandemia, 30 por cento dos graduados da UM encontravam emprego assim que terminavam o curso, mas o cenário mudou um pouco. “Estamos numa situação de crise devido à pandemia e isso afecta grandemente a economia dos casinos. Estes têm, à sua volta, uma série de empresas e indústrias que permitem a criação de muitos empregos. Até 2019/2020, costumava dizer que bastava a um aluno de Macau entrar na UM para ter emprego. Mas a economia está a abrandar e os licenciados começam a ter mais dificuldades em encontrar emprego.”

No entanto, Rui Martins acredita que, levantadas as restrições pandémicas e com mais visitantes, a situação laboral “entrará no ritmo normal que tínhamos”.

Por sua vez, Carlos Noronha, docente da UM, destaca o “grande encorajamento para que os residentes trabalhem em Hengqin”, embora haja ainda poucas vagas no contexto dos projectos de cooperação existentes.

“Temos de esperar mais um tempo porque a economia está a ser muito afectada pelas restrições. Como se pode atrair os jovens a trabalhar em Hengqin? Por exemplo, na Grande Baía, existe um sistema jurídico diferente e estas coisas têm de ser resolvidas.”

Carlos Noronha entende, contudo, que existe “receio de ir trabalhar para outros locais”, pois em Macau “os jovens são muito protegidos e talvez queiram manter-se por perto ou mesmo “procurar emprego em Hong Kong”.

“Não há emprego se a porta para a internacionalização continuar fechada. [Seria importante] enviar estudantes universitários para o estrangeiro para absorverem mais conhecimentos e deixá-los regressar a Macau ou para Hengqin para transferir ferramentas e capacidades. Macau vai conhecer um retrocesso se continuar desta forma”, rematou o docente da UM.

Tudo para Coloane

Coloane registou, em dez anos, um aumento de moradores de 753,7 por cento, e uma subida vertiginosa de 900 por cento no número de habitações. Por sua vez, a Ilha Verde teve um aumento de 143,9 por cento, devido à construção “de edifícios novos e empreendimentos habitacionais públicos de grande envergadura”. Entre 2011 e 2021 registou-se uma quebra de 6,8 por cento no número de pessoas a viver na península, enquanto que a proporção a residir na Taipa aumentou 16,4 por cento.

Os mais velhos residem sobretudo em zonas como a Praia Grande e Penha, numa proporção de 18,4 por cento, e avenida Conselheiro Ferreira de Almeida, com 17,1 por cento. Em termos de dimensão do território, Macau tinha em 2021 mais 3,14 quilómetros quadrados, sendo que na baixa da Taipa residem 75.689 pessoas, 11,1 por cento da população total. Na zona da Areia Preta reside 10,4 por cento.

TNR no activo

Entre 2011 e 2021, deu-se um aumento de 8,8 por cento das pessoas em idade de trabalhar “em consequência dos incrementos de imigrantes e de trabalhadores não-residentes”. A população activa feminina cresceu 14,6 por cento, sendo superior à masculina em 3,3 por cento. Em termos gerais, Macau a população activa no ano passado era de 377.071 pessoas. A população empregada global era, em Agosto de 2021, composta por 364.043 pessoas, mais 7,8 por cento em relação há dez anos atrás.

Sectores como o do jogo, inserido nas “actividades culturais e recreativas, lotarias e outros serviços”, comércio por grosso e retalho, hotelaria e restauração tinham 48 por cento da população empregada global, uma quebra de 4,1 por cento em relação a 2011. A área do “trabalho doméstico” tinha, em 2021, mais cinco por cento de pessoas empregadas, num total de 30.242 pessoas, em relação a 2011. No ano passado havia também mais pessoas empregadas nos sectores da educação (5,4 por cento), saúde e acção social (4,3 por cento) e actividades financeiras (3,9 por cento).

Salários em alta

A mediana do rendimento dos trabalhadores de Macau subiu 5.600 patacas em dez anos, situando-se, em Agosto do ano passado, em 15.600 patacas. Os funcionários públicos apresentam a mediana de rendimento mensal mais elevada, com 40.000 patacas, seguindo-se os sectores da “educação”, com uma mediana de 27.000 patacas, e “produção e distribuição de electricidade, gás e água”, com 25.500 patacas.

Idosos em casa

A população idosa mais que duplicou, com um aumento de 107,2 por cento em relação a 2011. Os idosos representavam no ano passado 12,1 por cento da população, mais 4,9 por cento face a 2011, sendo que mais de metade dos dependentes, 63,7 por cento, vivem em casas de família, enquanto que 34,5 por cento estão em lares.

Ainda assim, 95,5 por cento dos idosos com 60 ou mais anos afirma ter capacidade para levar uma vida autónoma.

A solidão na terceira idade é cada vez mais comum, uma vez que, em dez anos, houve um aumento de 80,3 por cento de idosos a morar sozinhos. Francisco Manhão, presidente da Associação dos Aposentados, Reformados e Pensionistas de Macau (APOMAC), considera que, em termos gerais, os mais velhos têm uma boa vida em Macau, sendo importante o regresso da injecção das sete mil patacas anuais nas contas individuais de previdência. Isto porque o Governo “deveria partilhar mais a sua riqueza com os residentes, em particular com os da terceira idade”. Além disso, Francisco Manhão defende a criação “de uma cidade satélite” para albergar os idosos.

Rendas mais caras

Olhando para o contexto da habitação privada arrendada, os Censos mostram que em Agosto do ano passado as zonas do Pac On e Taipa Grande são as que têm a renda média mensal mais elevada, no valor de 16.300 patacas. Pelo contrário, viver nas zonas do Patane e São Paulo era mais barato, com uma renda média mensal de 5.500 patacas. A renda média mensal das casas paga por agregado familiar atingiu, em 2021, o valor de 8.700 patacas.

Português menos falado

Em matéria de domínio de línguas, os Censos revelam que, em dez anos, houve uma ligeira descida de 0,1 por cento das pessoas que falam fluentemente português, representando apenas uma fatia de 2,3 por cento. Entre 2011 e 2021, Macau passou a ter mais pessoas a dominar o inglês, um aumento de 1,3 por cento, representando uma proporção de 3,6 por cento. Tal deve-se “ao crescimento da população imigrante oriunda de outros países ou territórios”. Em termos de domínio geral de línguas, 86,2 por cento da população usava o cantonense como meio de comunicação, enquanto que 45 por cento falava mandarim, menos 3,8 por cento e mais 3,6 por cento, respectivamente.

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