Revelador vinho

A lenda da “Dama Serpente Branca”, do tempo da dinastia Song (960-1279), refere que duas serpentes vindas do espaço se transformaram em belas damas no dia da celebração do Qingming. Na cidade de Hangzhou vivia Xu Xian e certo dia ao viajar de barco no Lago Oeste viu numa das margens duas jovens senhoras a querem atravessá-lo.

Mandou o barqueiro ir buscá-las, dando-lhes boleia para a outra margem e como era ainda jovem solteiro, logo ficou enamorado pela beleza de Bai Suzhen. Pouco tempo depois estavam já casados e logo recebeu um aviso de Fa Hai, monge com poderes sobrenaturais, para se afastar da esposa e da dama de companhia, pois eram espíritos de serpente. Não acreditando, recebeu o repto do monge para no dia seguinte, 5 da quinta Lua oferecer à esposa Xiong huang jiu (雄黄酒), vinho com que era costume comemorar em família a Festividade dos Barcos-dragão. Assim, veria com os próprios olhos quem era ela. Mesmo sem acreditar em tal, acedeu e no dia seguinte bebeu-o com a esposa.

Esta, após um copo de vinho sentiu-se indisposta e pediu ao marido para se retirar, solicitando que ele não a acompanhasse aos aposentos. Preocupado, Xu Xian foi ao quarto e vê-a transformada em serpente. Transtornado com a revelação, atirou-se da janela e morreu. Quando Bai Suzhen voltou a si, chorou a morte do marido, mas lembrando-se de uma erva para ressuscitar os mortos, conseguiu com ela fazer renascer Xu Xian. O vinho conhecido por Xiong huang jiu é feito a partir de uma pequena quantidade de pó de cor rubi do mineral realgar, composto de sulfureto de arsénio (As4S4) de grande toxicidade e cujo contacto pode causar irritabilidade na pele e nos olhos. Servia para desintoxicar e limpar o veneno, sendo usado nas crianças apenas no exterior e nunca para beber.

REGATAS DOS BARCOS-DRAGÃO

Na Festividade do Duplo 5 (Duan Wujie), celebrada no dia 5 da quinta Lua, realizam-se duas importantes actividades, a de se prevenir ocorrências funestas e comemorar Qu Yuan, que nesse dia em 278 a.n.E. se suicidou atirando-se ao Rio Miluo. Após infrutíferas buscas para o encontrar, as pessoas deitaram arroz glutinoso nas águas, assim como vinho de realgar (Xiong huang jiu) para evitar ser que o corpo fosse comido pelos peixes. Desde então, realizam-se as regatas dos Barcos-dragão.

Neste mês é fácil ficar-se doente pois o ar é abafado, quente e húmido, estando os insectos mais activos e as suas picadas trazem febres, proliferando infecções contraídas pela boca e nariz. Para as prevenir, as pessoas bebiam vinho medicinal amarelo e nele colocavam a planta seca de açoro (Acorus calamus, conhecida na China por Chang Pu) para fazer o vinho Chang Pujiu (菖蒲酒). Com esta planta medicinal da família das Acoraceae, os tártaros desinfectavam a água para beber e como o rizoma do cálamo contém um óleo com propriedades de vigorar a circulação do sangue, aumentar o apetite, facilitar a digestão, eliminar os gases do tubo digestivo e aliviar bronquites crónicas, era o vinho usado para o tratamento de 36 problemas causado pelo vento (maleitas relacionados com o fígado) e depois de o consumir ficava-se a ouvir bem e os olhos a ver claramente. Ao ser misturado com a água do banho torna-se um relaxante muscular para aliviar as dores reumáticas e acalmar a urticária.

Além de cana de calamus e artemisia para evitar infortúnios e desviar o mal, usa-se também beber vinho Xiong Huang a fim de desintoxicar e neutralizar o veneno, além de se esfregar e borrifar tudo com realgar e pegando-lhe fogo, fazer fumigação. Esse costume foi caindo em desuso e desapareceu.

FESTIVIDADE DO OUTONO

No dia 15 da oitava Lua celebra-se por toda a China a Festividade do Meio do Outono. Está ligada à Lua, quando ela parece ser maior e se oferecem e comem os bolos lunares por estes terem a forma de Lua Cheia, sendo por isso conhecida pela Festa do Bolo Lunar e em Macau, por Bolo Bate-Pau. Para os chineses, é a segunda mais importante depois da do Ano Novo, quando se faziam as últimas colheitas e o trabalho no campo estava a terminar. Com dias iguais às noites e temperaturas amenas, instala-se uma sensação de prazer e bem-estar no ambiente quotidiano, reinando a alegria e felicidade. As casas, dos ricos e das mais humildes pessoas, iluminam-se com festas animadas e nos banquetes familiares come-se fruta, bolo lunar e caranguejo, usando-se vinho amarelo onde se deitava um pouco de gengibre para balançar, sendo leve para conviver e oferecer sacrifícios à Lua.

FESTIVIDADE DO DUPLO 9

Por ano há dois dias importantes reservados pelos chineses para visitar e homenagear os Antepassados: o Qingming celebrado antigamente apenas pelos Imperadores, oficiais e a corte à volta do dia 5 de Abril do calendário solar e o dia 9 da nona Lua, a Festividade do Aprovisionamento do Princípio Masculino, celebração do Duplo 9, ou duplo yang, também conhecida por Chong Yang Jie (Chông Iéong Chit).

A primeira referência conhecida a Chong Yang fora feita por Qu Yuan, no poema intitulado ‘Longínqua Viagem’: “Parando em Chong Yang e entrando no Palácio dos Deuses”. Há quem afirme, o Duplo Yang, como é traduzido Chong Yang, não se referia à festividade, mas ter o significado de Céu.

Altura de o povo oferecer sacrifícios aos Antepassados, levando-lhes galinhas, vinho, assim como acendendo duas velas e três paus de incenso, põem fogo aos sacos cheios de papel-moeda dourado em lingotes para a comunicação com os seus mortos seja facilitada.

Segundo o ritual chinês, não é recomendável visitar templos ou oferecer sacrifícios aos deuses, apenas é sugerido um passeio pelas montanhas, a fim de estar próximo dos Antepassados.

O costume era nesse dia as pessoas oferecerem um grande banquete a todos os parentes e amigos e os letrados juntarem-se nos locais mais ermos a contemplar a Natureza e ajudados com vinho, divagar em poesia.

A flor usada é o crisântemo, não fosse a nona Lua do ano conhecida pela Lua do Crisântemo. A flor de crisântemo (菊花, jü hua em mandarim e kók fá em cantonense) está relacionado com o Outono, pois aparece nesta estação, quando as outras flores já murcharam, e dura até às primeiras geadas. Simboliza a longevidade e representa a jovialidade e amizade em comportamento apropriado e ético.

Tao Yuanming escreveu sobre os crisântemos e no poema “Bebendo vinho”, (traduzido por Manuel Afonso Costa e editado por Livros do Meio), na sétima parte refere, <Crisântemos de Outono de cores fascinantes / eu vos colho carregadas de orvalho / e mergulho no vinho / para esquecer as mágoas / e os pensamentos do mundo…”

Com tempo bom e uma paisagem repleta destas flores, bebia-se vinho de Crisântemo. Na dinastia Song dentro do palácio eram aos milhares e com ela se fazia a comida e o vinho, usada ainda na Medicina Tradicional Chinesa. Como o corpo está seco e quente, o crisântemo é perfeito para balançar e no chá se mistura essa flor.

A Festividade do Aprovisionamento do Princípio Masculino tem como finalidade alcançar riqueza e descendência masculina e celebra-se com a esperança de se ter uma longa vida.

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