Zhang Ming, embaixador chinês em Bruxelas: “Portugal tem vindo a demonstrar um grande respeito pela China”

Numa entrevista a órgãos de comunicação social portugueses em Bruxelas, Zhang Ming, chefe da missão da China para a União Europeia, falou da Presidência portuguesa na UE e disse esperar “um empurrão” para o acordo de investimento que deverá estar finalizado ainda este ano. Zhang Ming destacou também a boa relação da China com Portugal

 

A China espera um “empurrão” de presidência portuguesa da União Europeia (UE) para acelerar o processo de ratificação do acordo de investimento entre Pequim e Bruxelas, considerando que irá permitir também mais investimento chinês em Portugal. “Esperamos que Portugal, enquanto assume a presidência rotativa da UE, possa dar um ‘empurrão’ ao processo e, idealmente, esperamos que na primeira metade deste ano possamos assinar estes documentos” preliminares, disse o embaixador Zhang Ming, chefe da missão da China para a UE, em entrevista à agência Lusa e outros meios de comunicação social portugueses em Bruxelas.

Questionado na ocasião sobre o acordo de princípio sobre investimentos alcançado entre Bruxelas e Pequim no final do ano passado, que tem ainda de ser ratificado, o responsável notou que, “depois da assinatura, os documentos serão submetidos aos parlamentos de ambos os blocos para ratificação”. “Num cenário ideal, o acordo estará formalmente finalizado no final deste ano ou início do próximo e aí entrará em vigor”, estimou Zhang Ming.

O representante do bloco chinês para o espaço comunitário precisa que, de momento, os dois lados estão a “tratar do escrutínio legal e da tradução”. “Não está em causa recomeçar as negociações, apenas estamos a tratar e finalizar os detalhes”, adiantou.

Frisando que “a China e Portugal são parceiros bons e próximos”, Zhang Ming disse que, “Portugal, enquanto Estado-membro, vai de certeza beneficiar com este acordo”. “O acordo vai facilitar o acesso de investidores chineses e europeus a estes mercados”, pelo que “haverá mais investimento europeu na China e também mais investimento chinês na UE, incluindo em Portugal”, conclui o responsável.

Uma relação “exemplar”

Zhang Ming elogiou ainda a relação entre a China e Portugal, falando numa ligação “exemplar” e feita de “respeito mútuo”. “Penso que podemos considerar a relação de Portugal e China como exemplar e penso que o segredo é o respeito mútuo”, afirmou. O responsável insistiu que “Portugal tem vindo a demonstrar um grande respeito pela China e a China ainda mais respeito por Portugal”. “Nunca interviemos nos assuntos internos um do outro, o que é importante, e espero que continuemos a promover a nossa cooperação em prol do interesse dos dois países e dos seus cidadãos”, vinca Zhang Ming.

Notando que “Portugal não foi dos primeiros países a estabelecer ligações diplomáticas com a China [e que] talvez tenha sido até dos últimos”, o embaixador observa que, “desde o final dos anos 1970, aquando do estabelecimento dessas ligações, a relação bilateral entre os dois países tem vindo a desenvolver-se de forma suave, rápida e amigável”. “Agora podemos ver uma cooperação bastante próxima entre os dois países”, frisou.

Questionado sobre os constantes avisos da Comissão Europeia e do Parlamento Europeu para os Estados-membros porem fim a programas de autorização de residência ou de nacionalidade perante investimento, como é o caso dos ‘vistos gold’, Zhang Ming escusou-se a comentar, dizendo que esta é “uma matéria interna da UE”. Ainda assim, vincou: “Há alguns investidores de países terceiros a tentar obter autorizações ou autorizações ou vistos de residência [nalguns países da UE] através do investimento e isto não é algo incentivado pelo governo chinês”.

Em outubro passado, o Parlamento Europeu defendeu que os países da UE devem “acabar imediatamente” com os programas de vistos ‘gold’ que dão residência ou cidadania a investidores estrangeiros, criticando que esta é uma “entrada rápida para criminosos”. Depois de severos avisos do executivo comunitários, os eurodeputados tomaram nessa altura posição para exigir o fim dos designados programas de passaportes dourados, existentes em 19 Estados-membros, vincando que “a cidadania da UE não pode ser comercializada como uma mercadoria”, assinala a instituição em comunicado de imprensa.

China-EUA-UE: Cooperação contra o unilateralismo

Zhang Ming espera uma relação de “cooperação” e não de “confronto” com os Estados Unidos, e apela a que a UE prossiga o caminho para a “autonomia estratégica”. “A China felicita Joe Biden pela sua posse. Esperamos trabalhar em conjunto com a administração americana num espírito que não seja de conflito nem de confronto, mas de respeito mútuo e de cooperação mutuamente benéfica. Que nos foquemos na cooperação em vez do confronto, em gerir as diferenças entre os dois lados e trazer de volta a relação China-EUA a um nível saudável e estável”, referiu. Frisando que, numa altura em que o mundo enfrenta “desafios severos”, o regresso dos EUA ao Acordo de Paris e à Organização Mundial do Comércio (OMC) são “boas notícias”, o embaixador chinês reproduz as palavras do Presidente da China, Xi Jinping, emDavos: “um mundo dividido não pode ajudar a Humanidade a enfrentar desafios”. “O confronto irá levar a Humanidade para um beco sem saída. E, de qualquer forma, é suposto a comunidade internacional trabalhar de maneira junta, solidária, e cooperar estreitamente para um futuro partilhado”, aponta.

Algumas “dificuldades”

Zhang Ming refere assim que, nos últimos anos, tanto a relação entre os EUA e a China como a relação entre os EUA e a UE “passaram por dificuldades”, e frisa as semelhanças entre a situação chinesa e europeia. “Tanto a China como a UE são vítimas do unilateralismo e do protecionismo e acreditamos ambos no multilateralismo e na abertura do sistema internacional de comércio. (…) Somos ambos poderes para a paz internacional”, destaca.

O embaixador sublinha assim que, enquanto “parceiros estratégicos abrangentes”, a relação entre a UE e a China “resistiu ao teste das mudanças, dos desafios do tempo e da situação internacional”, e refere que tem o seu “próprio valor independente”.

“Pessoalmente, tenho total confiança no futuro do desenvolvimento das relações entre a UE e a China. (…) Espero que a UE mantenha o espírito [da autonomia estratégica] e a desenvolva, e que guie a sua relação externa com membros diversos da comunidade internacional, incluindo a China e incluindo os Estados Unidos, para o bem da estabilidade e do progresso do mundo.”

Índia | O poder emergente

Zhang Ming referiu que Pequim “respeita plenamente” o desenvolvimento de relações entre a UE e a Índia e que “fica contente” por ver “progressos” nas relações internacionais. “A União Europeia é um poder importante na comunidade internacional e respeitamos plenamente a sua política externa. Também ficamos contentes de ver mais progresso e desenvolvimentos nas relações da UE e de outros membros da comunidade internacional, incluindo na relação UE-Índia”, sublinhou. O embaixador da China reagiu assim à prioridade identificada pela presidência portuguesa do Conselho da UE de diversificar as relações com os parceiros do Indo-Pacífico, nomeadamente com a Índia, através da organização, a 8 de Maio no Porto, de uma cimeira informal que irá juntar os líderes dos 27 ao Presidente indiano, Narendra Modi. Zhang Ming qualificou a Índia de “poder emergente” e salientou que Pequim também dá “grande importância” à “relação bilateral Índia-China”. “É por isso que advocamos por uma comunidade de futuro partilhado. Todas as pessoas, todos os países, partilham o futuro do mundo”, concluiu.

5G | Tendências “erradas”

Zhang Ming falou ainda da questão da Huawei e dos seus equipamentos 5G, que foi acusada, durante a administração Trump, de espionagem através da instalação de ‘back doors’ [portas traseiras de acesso] nos seus dispositivos, tendo a Comissão Europeia, face às acusações americanas, criado medidas para reforçar a cibersegurança no desenvolvimento das redes 5G, rejeitando sempre estar a fazê-lo contra qualquer fabricante ou país.

O embaixador chinês nota “duas tendências erradas” na questão da rede 5G, sendo a primeira a “destruição intencional de regras” por parte de “certos países”, que qualificam as empresas de “fornecedores de alto risco” em termos de segurança, sem “apresentarem qualquer prova concreta”. A segunda é “ignorar as leis que regem as operações de mercado e desenvolvimentos tecnológicos”, sublinhando que “qualquer ataque politicamente motivado para distorcer as cadeias de valor das redes 5G” é prejudicial para os “fornecedores, operadores e consumidores”.

Frisando assim que a questão do 5G não se prende com a “ascensão e os interesses de um dado país”, mas antes com a “ordem e o princípio dos mercados”, Zhang Ming pede que a UE “oiça atentivamente as vozes dos académicos e dos círculos empresários” – citando um estudo da universidade de Oxford que refere que a Huawei criou 16,4 mil milhões de euros na Europa e 224,300 empregos –, que “respeite as leis do mercado e trate com justiça outros países do mundo”.

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