h | Artes, Letras e IdeiasFernão de Magalhães no mar Arábico José Simões Morais - 11 Jan 2021 “Foi grande a repercussão que o descobrimento do caminho marítimo para a Índia obteve nos centros políticos e comerciais da Europa. Tanto na corte pontifícia e junto dos Reis Católicos, como nos principais sectores económicos da Itália e da Flandres, a notícia constituiu uma verdadeira revolução. Muitos agentes estrangeiros vieram estabelecer-se em Lisboa, onde procuravam recolher benefícios da compra e distribuição das especiarias. É evidente que a coroa de D. Manuel I quis de imediato assegurar o monopólio dos produtos orientais, servindo-se das estruturas financeiras e técnicas que reunira ao serviço da empresa. A ciência náutica foi logo colocada ao dispor da política régia, para garantir o êxito de novas viagens à região do Malabar. O que significa que um grupo de nautas experientes, incluindo pilotos, cartógrafos e mareantes, passou a trabalhar na , dispensando uma cobertura naval aos pequenos fidalgos e aos mercadores nacionais e estrangeiros que embarcavam com aquele destino”, refere Veríssimo Serrão. “A Cidade dos Doges [Veneza] viu-se, devido ao aparecimento no Índico das nossas esquadras, gravemente prejudicada em proveito de Lisboa e de Antuérpia – pois logo em 1501 concentrámos no grande porto flamengo avultadas exportações de mercadorias e em 1503 o negociante Tomé Lopes entende-se com alguns argentários e ali instala rendoso centro de distribuição de produtos. Pouco tardam a afluir, tanto à metrópole do Tejo como à do Escalda, os magnates da finância germânica e italiana – os Fugger, os Welser, os Hochstetter, os Imhof, os Frescobaldi, os Gualterotti – na mira de vantajosas transacções”, segundo João Ameal, que refere, tal como o Cairo, Alexandria, Beirute e Alepo, Veneza não se resignava e propôs-lhes uma aliança para combater os portugueses. “Vacila ainda o Sultão Kansuh el Ghuri em desencadear hostilidades contra nós, tão intenso receio lhe inspira o valor já bem atestado dos portugueses; mas busca intrigar e intimidar-nos com o envio a Roma do Prior do Convento de Monte Sinai, Fra Mauro, a prevenir o Papa Júlio II do propósito em que se encontra de exercer violentas represálias sobre a cristandade palestiniana e, também, de iniciar operações de guerra no Mediterrâneo caso o Rei de Portugal insista em manter no Índico as suas armadas, os seus núcleos fortificados, os seus estabelecimentos mercantis. Quando se conhecem em Lisboa estas notícias, apercebe-se o Venturoso do vasto conluio dos adversários para nos expulsar das águas orientais.” A Lisboa chegou em Junho de 1505 Fra Mauro com o recado do Papa a exortar à desistência, mas já a armada partira e como resposta levou, estarem os portugueses decididos a avançar na empresa e substituir o eixo comercial Veneza, Alexandria, Meca, Calicute. Com Francisco de Almeida Através de Afonso de Albuquerque, D. Manuel compreendeu a necessidade de alterar a estratégia no Oriente e aí ter uma organização de governação. Criou o cargo de Governador, como seu representante com autoridade na Índia portuguesa. A prioridade era dar apoio e protecção às embarcações no Mar Arábico e fazer alianças com os soberanos locais para estender a soberania a outras regiões, onde se deviam criar feitorias e erguer fortalezas. Além do Malabar, procurar abrir as rotas com o Ceilão, Malaca e Insulíndia, fonte das especiarias e no Golfo Pérsico tomar Ormuz. A primeira escolha de D. Manuel foi Tristão da Cunha, mas estando em momentânea cegueira substituiu-o por Francisco de Almeida, nomeado governador por um triénio, levando de Lisboa outorgado o título de Vice-Rei quando erguesse fortalezas em Cananor e Coulão. O Rei investiu uma enorme soma de dinheiro para erguer a armada, co-financiada pelos alemães Welser, sendo a finalidade assegurar o domínio português no Índico e aí impor o monopólio do comércio de especiarias, assim como criar estaleiros para a reparação de navios. A sétima armada à Índia, comandada por D. Francisco de Almeida, deixou o Tejo rumo ao Oriente a 25 de Março de 1505. Numa das 22 naus ia com 25 anos Fernão de Magalhães, um entre os 1500 soldados, fora a tripulação e onde seguia a primeira mulher a embarcar de Portugal, Iria Pereira, a acompanhar o marido António Real, mandatado alcaide-mor de Cochim. Na costa oriental de África, a 22 de Julho em Quíloa erguiam a fortaleza e a 15 de Agosto conquistavam e incendiavam Mombaça. Chegaram à ilha de Angediva em Setembro de 1505, fazendo um forte e depois a Cochim, onde se montou a sede da governação no Oriente e se instalou a residência de Governador, Casa da Fazenda, Casa dos Contos e Casa da Matrícula. Ainda nesse ano tomaram Cananor e construíram a fortaleza de Santo Ângelo. Lourenço de Almeida em finais de 1505 estava no Ceilão (Sri Lanka), a origem da canela, estabelecendo em Galé uma aliança com o reino de Kotte. Discutia-se fazer no Ceilão a capital da governação, pois de mais fácil defesa que Cochim, mas tal não foi avante. O primeiro Vice-Rei da Índia D. Francisco de Almeida (1505-09) mandou nos finais de 1506 uma expedição “para solucionar as divergências sobre a posse do trono de Quíloa, existentes entre Hocem e Micante”, segundo João Cosme, que refere ter Fernão de Magalhães nela participado. “Crê-se que regressou à Índia na nau S. Simão que, em 19 de Setembro de 1507, partiu de Sofala em direcção à costa do Malabar.” Desastre de Chaul Em missão de patrulhamento, D. Francisco de Almeida enviou em 1507 o filho Lourenço para Norte, pela costa ocidental da Índia, com a intenção de estrangular Cambaia, zona de grande comércio e cujos mercadores dominavam as rotas no Índico, com ligações do Golfo Pérsico até Malaca. Como a cidade de Cambaia era de impossível ataque, pois recuada da costa e cuja muralha no alto do monte controlava o porto, situado no interior do golfo, então, era preciso nas redondezas encontrar locais para impedir a navegação dos seus barcos. A atenção virou-se para a cidade de Chaul, no Decão e mais tarde, para a ilha de Diu, no Guzerate. Chaul, cujo Rei Nizamaluco era rival do vizinho Adil Khan de Goa, tinha no Rio Roha uma boa enseada onde os barcos portugueses aportaram pela primeira vez em 1505. Dois anos depois, Lourenço aí afundou sete navios do Samorim de Calicute. Para travar as conquistas portuguesas realizadas nas costas ocidentais da Índia, o Sultão do Egipto enviou uma grande armada que, coligada com a do Sultanato de Deli e muçulmanos de Diu, em Janeiro de 1508 apanhou de surpresa no interior do porto de Chaul a frota de Lourenço de Almeida e derrotou-a. Capturando algumas naus, mataram D. Lourenço e mais cem homens, conseguindo outros muito a custo regressar a Cochim. Como retaliação pela morte do filho, D. Francisco de Almeida em finais de 1508 foi aos domínios de Cambaia arrasar o porto de Dabul e Diogo Lopes de Sequeira, saído de Lisboa em Abril de 1508 ao comando da nona armada com a intenção de ir a Malaca, tentou, sem conseguir, construir em Chaul uma fortaleza.