Factos menstruais

[dropcap]U[/dropcap]ma associação no Reino Unido estabeleceu que esta seria a semana da consciência ambienta-menstrual onde tentam incorporar vários temas que por aqui já vos trouxe ao longo do tempo: tabu, pobreza, inclusão e representação menstrual, e os seus efeitos no ambiente. A proposta é de que a menstruação, para além de sangue a sair por entre as pernas, seja uma questão de justiça social. Nós, humanos, perpetuamos práticas menstruais que não nos trazem muita saúde, nem física, emocional ou ambiental.

As práticas desenvolvidas para ajudar a gerir a menstruação têm resultado em poluição. Os produtos como pensos e tampões descartáveis acabam no mar e em aterros sanitários. Não há praia com lixo que não tenha algum componente menstrual, e, dada a percentagem atroz de plástico na sua composição, estes objetos nunca vão desaparecer por completo. Um facto aleatório para o vosso conhecimento geral.

Neste ano de 2020, em que sentimos tudo a mudar, a menstruação continua a ser uma preocupação de topo. O que devia ser tremendamente normal – os úteros sangram mensalmente -, continua a ser uma grande fonte de escárnio e nojo. Vi algures uma tira de BD que ilustrava a dificuldade em normalizar o sangue menstrual. Imaginem um tipo sentado no sofá a ver uma batalha sangrenta na televisão, está todo contente! Em outro momento, aparece um penso ensanguentado no ecrã, e com ele vem a expressão de horror do espectador. Padrões duplos, é o que é. Para umas situações o sangue é fixe, para outras é absolutamente intolerável.

De quem é a culpa desta discriminação menstrual hedionda? Nossa, minha, tua, de todos. A educação menstrual está mais a cargo das empresas de comercialização de produtos do que de conversas familiares sem vieses comerciais. Empresas que retratam a menstruação como um líquido azul. Porque ainda hoje, ninguém diz que está com o período. Ensinou-me a minha mãe. Insinua-se que se está menstruada, com um código de morse, com olhares de “a ver se me faço entender”. Desconversa-se a menstruação porque o aceitamos como a norma, e há quem sinta a necessidade de se desculpar por sequer mencioná-la na comunicação social.

Não se fala da menstruação como quem fala de queques, por exemplo. Se assim fosse estaríamos mais à vontade em trocar receitas (e factos!), ou discutir as melhores estratégias que nos trazem conforto durante dias de inchaço e dor, até aos produtos que usamos e queremos recomendar. Sabiam que a água ensanguentada, das lavagens dos pensos e cuecas menstruais reutilizáveis, resulta numa água tão incrivelmente rica que podem regar as vossas plantas com ela? Outro facto menstrual que provavelmente não sabiam, e este, muito benéfico para o ambiente.

Até acho que, a incapacidade de falar de menstruações como quem fala de um bolo de arroz, e o uso massivo de produtos descartáveis, fizeram com que as pessoas menstruantes se desconectassem da sua menstruação. O que ela é e para onde vai? O plástico e a menstruação começaram a ter uma relação mais íntima, precisamente porque as pessoas queriam formas discretas de lidar com ela. Mas agora que vemos os pensos descartáveis (que podem ter 90% de plástico! Outro facto) a serem encontrados pelas praias do mundo, as pessoas mais ambientalmente conscientes ficaram com vontade de utilizar outros produtos: pensos reutilizáveis e copos menstruais. Com esta transformação vem outra transformação desejável: uma relação mais próxima com a menstruação, olhar o sangue de frente e aguentar todas as pressões que nos sinalizaram que podia ser nojento. Não vale a pena viver na pouca aceitação (social e individual) porque a menstruação é um facto inevitável da vida.

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