Angola | Médicos chineses rompem barreira da língua e levam acupuntura aos doentes

As barreiras linguísticas não impedem que médicos chineses atendam as centenas de pacientes que acorrem diariamente ao Hospital Geral de Luanda (HGL) em busca de cuidados de saúde, oferecendo a acupuntura entre as especialidades desta unidade hospitalar. A saúde é uma das vertentes do investimento chinês em Angola, que já ultrapassou os 20 mil milhões de dólares

 

[dropcap]H[/dropcap]á quatro meses em Angola, no âmbito das relações bilaterais entre os dois países, os médicos chineses manifestam-se felizes por trabalhar no país africano e enaltecem as “relações saudáveis” que mantêm com os pacientes e com os “simpáticos” colegas angolanos e cubanos.

Dez médicos chineses, um intérprete e um cozinheiro compõem a equipa asiática que, desde Junho passado, trabalham no HGL, constituindo a quinta equipa médica que é enviada para Angola, desde 2009, no quadro da cooperação no sector.

Os médicos chineses contaram à Lusa as dificuldades diárias para comunicar em português, um processo no qual contam com a solidariedade de colegas e dos respectivos pacientes, socorrendo-se também de ‘software’ para traduções imediatas.

Huang Nan, pediatra, faz parte do grupo dos dez médicos chineses que trabalham no Hospital Geral de Luanda, edificado em 2006 pelos seus compatriotas, e destaca com satisfação a “ginástica” diária e necessária para falar com os doentes. “Trabalho com angolanos e cubanos, eles são simpáticos e eu gosto. Ensinam-nos como abordar os pacientes em português e temos boas relações, esforçamo-nos todos os dias”, disse o médico à agência Lusa, referindo que o diagnóstico é feito quando os doentes falam “pausadamente”. “Sim, quando eles falam devagar ou pausadamente conseguimos nos entender e aí fazemos o diagnóstico”, adiantou Huang Nan, de 34 anos.

Segundo o pediatra asiático, o ambiente laboral transforma-se dia após dia num círculo familiar, com a partilha de experiências profissionais, mas também momentos de convívio nas refeições com os colegas angolanos e cubanos, sobretudo no tempo livre.

Agulhas milenares

Zhang Xin, cirurgião geral, descreve o trabalho no HGL como “intenso”, particularmente no banco de urgência onde são atendidos mais de 200 pacientes/dia, “muitos em estado grave e com necessidade de cirurgia urgente”, uma afluência que difere do seu país.

Feliz por estar em Angola e a aprender com outros colegas a língua portuguesa, o cirurgião de 32 anos assegurou que “muitos doentes” já entendem as suas orientações, “mas, quando está difícil”, sublinha, recorrer aos colegas “é indispensável”.

Com uma capacidade para mais de 300 camas e para um atendimento diário de mais de 800 pacientes, o hospital dispõe das especialidades de pediatria, maternidade, neurologia, cardiologia, ortopedia, oftalmologia, cuidados intensivos, ortotraumatologia, bem como laboratórios e equipamentos avançados.

Oferece igualmente especialidades da medicina tradicional chineses como acupuntura, massagens e terapia auricular, entre outras.

Pelo menos 25 pacientes com problemas lombares, cervicais, de artrite, ou mesmo paralisia facial acorrem diariamente ao hospital para o tratamento com acupuntura e dizem-se “satisfeitos com os resultados” da terapia milenar chinesa. “Estou a sentir já melhorias. O tratamento vai bem, eles fazem as questões, respondemos prontamente e depois começam com a consulta e está a correr bem”, disse à Lusa a angolana Inês da Costa, 40 anos, que há dois meses recorre à acupuntura para tratar das dores lombares.

Satisfeito por trabalhar em Angola está também o acupunturista chinês, Zhou Zugang, que enumerou vantagens da técnica da aplicação de agulhas em pontos específicos do corpo, apontando a satisfação dos doentes. “Aqui eu faço o tratamento com acupuntura e muitos pacientes gostam desse tratamento”, garantiu, realçando que a barreira do português tem sido ultrapassada diariamente.

Há oito anos com dores lombares, a angolana Edna Silva disse à Lusa que, em dois meses de tratamento com o recurso a acupuntura no HGL, tem registado melhorias significativas. “De princípio não estava a ver melhorias, mas agora já há evolução. Os médicos chineses percebem a nossa comunicação, eles têm um dispositivo no seu telefone que traduz automaticamente algumas palavras difíceis”, realçou.

Saúde acordada

“Trabalhar para a melhoria da saúde dos angolanos” é o lema do cardiologista Nie Wenzhen que, admitindo dificuldades para se expressar em português, não foge, no entanto, à “pressão diária de doentes”, particularmente no banco de urgência.

Para o médico chinês de 32 anos, que se diz feliz por trabalhar em Angola, os colegas angolanos e cubanos são fundamentais para se sentir em casa, porque, observou, “Deus ama o mundo e a medicina ama a humanidade”.

A presença destes médicos chineses em Angola faz parte de acordos intergovernamentais, nomeadamente através de um protocolo que é renovado a cada dois anos. Este mecanismo de cooperação voltou a ser reafirmado oficialmente em Setembro, assinado pelo secretário de Estado para a Cooperação Internacional e Comunidades Angolanas, Domingos Vieira Lopes, e pelo embaixador da China em Angola, Gong Tao.

O protocolo estabeleceu que os encargos salariais e de viagens internacionais de ida e volta dos médicos são da responsabilidade do Governo chinês.

No final da cerimónia de assinatura do protocolo, o embaixador chinês revelou que, até ao momento, cerca de 200 mil cidadãos angolanos foram atendidos por médicos chineses. Gong Tao informou ainda que, nos últimos 10 anos, já passaram por Angola cinco equipas de médicos chineses, totalizando 70 especialistas.

O Hospital Geral de Luanda, edificado em 2006 e que teve de ser reconstruído seis anos depois por problemas estruturais, foi reinaugurado em Junho de 2015, após três meses de testes aos equipamentos chineses e de formação para os técnicos.

Milhões do oriente

“Nos últimos anos a China é um dos países principais que investiu em Angola e segundo estatísticas incompletas, até agora, o volume do investimento chinês no mercado angolano já ultrapassou 20 mil milhões de dólares norte americanos”, afirmou Gong Tao, em Setembro, num evento sobre as relações entre os dois países.

O embaixador deu conta também que a dívida de Angola para com o seu país saiu dos 23,3 mil milhões de dólares, em 2017, para 22,8 mil milhões em 2018.

Aludindo ao relatório do Centro de Estudos e Investigação Científica (CEIC) da Universidade Católica de Angola, pedido pela embaixada, referiu que a dívida regista “reduções numéricas” e o seu pagamento “decorre na normalidade”.

“A dívida está a diminuir com os números, por exemplo, em 2017 era de 23,3 mil milhões de dólares, e em 2018 já baixou para 22,8 mil milhões, e, entretanto, é uma tendência para redução”, frisou.

A China é o maior parceiro comercial de Angola. O país asiático continua a ser o principal destino do petróleo angolano, absorvendo 61,56 por cento das exportações no segundo trimestre de 2019, seguido da Índia com 11,05 por cento e depois a Espanha com 3,80 por cento.

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