Entrevista ManchetePaul Chan Wai Chi explica saída da Associação Novo Macau: “Em 2017 já pensava sair” Sofia Margarida Mota e Victor Ng - 18 Jul 20181 Out 2018 Depois de meio século dedicados à Associação Novo Macau, chegou a altura de Paul Chan Wai Chi abraçar outros desafios. Para já, o ex-deputado vai dar primazia à fé que professa, o catolicismo. Em entrevista de balanço de actividade política, Paul Chan Wai Chi analisa a história do movimento pró-democrata em Macau, recorda os momentos mais complicados e analisa o significado da eleição de Sulu Sou [dropcap]D[/dropcap]eixa a Novo Macau depois de 25 anos ligado à associação. Que balanço faz? Entrei na Novo Macau na altura em que Ng Kuok Cheong se candidatava às eleições (legislativas) e eu auxiliava a sua candidatura. Depois de Ng Kuok Choeng ser eleito, a Novo Macau empenhou-se em apoiar os seus trabalhos. Com o desenvolvimento social, a Novo Macau tornou-se progressivamente numa associação. Na altura em que me tornei presidente, a natureza política foi intensificada na sequência da necessidade social e do desenvolvimento da associação. Em 2009, ano em que fui eleito como deputado, salientei a importância de conseguir captar jovens para a Novo Macau para suceder nos trabalhos e desenvolver a associação. Por isso, em 2013 avançámos com uma lista (às eleições legislativas) constituída pelos membros jovens, mas falhou, o que foi lamentável. Depois das eleições houve mudanças nos corpos dirigentes da associação. Foi um período difícil. Até ao ano das eleições de 2017, que era decisivo para a Novo Macau, já pensava em sair da associação para fazer outro trabalho, tendo em conta que sou católico e que deveria ter feito melhor alguns serviços para a igreja. Entretanto, como Ng Kuok Cheong decidiu constituir uma outra lista independente da Novo Macau, senti a necessidade de avançar e acabei por ser o segundo candidato da lista (da Novo Macau) para apoiar Sulu Sulu e a Novo Macau para poder desenvolver-se. Nos passados 25 anos, consegui ajudar associação no seu crescimento e desenvolvimento. A minha missão está completa e agora é oportuno iniciar o meu trabalho na outra área. Como já acabaram as eleições, agora é a altura para me dedicar totalmente a Deus, por isso, decidi investir mais tempo na igreja. Vai ter saudades da Novo Macau? Quais são as memórias mais fortes vai ter da associação? Considero que nós, enquanto pessoas que tentam impulsionar o avanço social, andamos todos no mesmo caminho. Mas há pessoas que andam a um ritmo diferente das outras. No entanto, basta termos o mesmo objectivo, somos iguais, mantemos comunicação e ajudamos os outros. Quanto à memória mais forte, tinha no passado um ideal que não chegou a ser realizado. Era transformar a Associação Novo Macau num grupo político. Em Macau não há partido político. Mas defendo que a política em Macau deve avançar, passo a passo, nessa direcção e não deve ser baseada na cultura das associações. Quando era presidente (da Novo Macau) e deputado na AL queria atingir esse objectivo. Mas, se calhar por causa do ritmo do desenvolvimento de Macau, não aconteceu o que esperava. Em Hong Kong há, por exemplo, o partido cívico e o partido democrático. Em Macau não há. Isso é uma questão de tempo. Acredito que com o desenvolvimento de Macau e a consciência da população a amadurecer progressivamente, vai haver cada vez mais pessoas atentas à política e com vontade de participar nas actividades políticas. Esse são os elementos para surgir uma associação com natureza política. Pode-nos contar um bocadinho da história do movimento pro-democrata em Macau? Com base no meu conhecimento, o início está ligado à Associação de Amizade liderada por Alexandre Ho. Depois da revolução dos cravos em 1974 em Portugal, Macau passou a ter eleições nas assembleias, sendo assim os chineses, especialmente os que não estavam nas associações, tinham mais canais para participar na política. Alexandre Ho foi pioneiro na promoção da participação popular na política e fez a milagre de conseguir eleger três pessoas na AL. Em seguida, na sequência da mudança do sistema político de Portugal, a AL desenvolveu-se no sentido democrático e foi aumentado o número de deputados directos. Em 1991 ou em 1992, não tenho a certeza, houve eleições suplementares para dois lugares de deputados directos. Primeiro foi Alexandre Ho que agregou alguns candidatos. Os jovens antes de 4 de Junho de 1989 começaram a tomar atenção ao futuro da China e às mudanças em Macau. Na altura, os jovens realizavam actividades alusivas ao 4 de Maio para discutir os assuntos. Até 4 de Junho, houve algumas mudanças no panorama político, e os mais jovens eram da opinião de que se precisava de continuar a valorizar o desenvolvimento da democracia. A participação na política era o meio, por excelência, para actuar na sociedade. Por isso, Ng Kuok Cheong decidiu candidatar-se às eleições suplementares mas não teve sucesso. Até às eleições legislativas em 1992, Ng Kuok Cheong criou a Novo Macau com outras pessoas e conseguiu um lugar na AL. Depois, Au Kam San entrou na Câmara Municipal do Leal Senado. Com o esforço e dedicação dos mais novos a Novo Macau cresceu. FOTO: Sofia Mota A associação cresce como um esforço colectivo… Posso dizer que com várias pessoas a participar houve mudança saudável na sociedade. Au Kam San entrou na AL em 2001. Nesta altura, a Novo Macau tornou-se uma das associações fomentadores da democracia, enquanto que no panorama associativo também houve reajustamentos ao progresso social. As outras associações também se transformaram, algumas passaram a ter mais membros jovens e fizeram muitos trabalhos para as classes sociais mais carecidas. O desenvolvimento da democracia em Macau para mim está a ser cada mais florescente. As eleições legislativas são eventos políticos que produzem vários novos talentos. Tenho uma posição optimista em relação ao futuro da democracia. No entanto, com a mudança social, tanto as oportunidades como os desafios são igualmente enormes para as pessoas, sobretudo se conseguirem enfrentar a onda e atingir o topo da onda. Isso é um grande desafio. No passado tivemos três deputados da Novo Macau na AL, um resultado brilhante. No entanto, tínhamos de avançar e arranjar alguém para suceder nos trabalhos, por isso fomentei a realização de actividades para formar talentos nos assuntos políticos e sociais. Sulu Sou disse que conheceu a Novo Macau através dessas actividades. Acho que esse tipo de acções podem atrair os jovens, dando-lhes oportunidades. Se se acreditar nos jovens e no sistema da associação, vai ser produzido um efeito de desenvolvimento mútuo. Isso é um desafio que as associações vão enfrentar no que diz respeito ao seu crescimento. Entre os anos 2013 e 2017, a Novo Macau enfrentava estes desafios mas sinto que agora já ultrapassámos essas dificuldades. Quanto ao futuro desenvolvimento da democracia em Macau, tendo em conta que não há eleições para os membros aos órgãos municipais, espero que o Governo tome uma atitude aberta para que os conselhos consultivos e os órgãos municipais tenham alto grau de representatividade. Tal é relevante para o desenvolvimento de Macau. Se as associações conseguem insistir no seu lema e os políticos tiverem como orientação máxima as suas intenções iniciais, o futuro será optimista. Quando saíram da associação históricos como Au Kam San e Ng Kuok Cheong, você ficou. Como foi este momento de ruptura para a associação? Au Kam San saiu primeiro da Novo Macau. Nas eleições legislativas em 2017, Ng Kuok Cheong ainda era membro da associação. Apesar de lhe perguntar se ia ficar e empenhar-se com os mais jovens da associação, acabou por se candidatar na outra lista. Isso é lamentável e de certeza que teve um impacto na Novo Macau. Quer seja no caso da saída de Au Kam San ou no caso da decisão de Ng Kuok Cheong de não se candidatar com a Novo Macau, tivemos de fazer o nosso melhor para evitar uma influência negativa. As pessoas têm os seus objectivos. O que podemos fazer é respeitar as suas decisões. O período mais difícil da associação já passou. A eleição de Sulu Sou como deputado em 2017 é a prova de que a cooperação entre os membros da Novo Macau vai conseguir obter apoios dos cidadãos. Apesar de Sulu Sou ficar com função de deputado suspensa por estar envolvido em outro caso, acredito que Macau é uma sociedade regulamentada por leis. Finalmente, o caso está resolvido, Sulu Sou regressou à AL, marcando tal o início de uma nova fase. Apesar da saída de Au Kam San e da decisão de Ng Kuok Cheong, continuou a ficar na Novo Macau. Porquê? Desde que saí da AL em 2013, continuei na Novo Macau. Por um lado, precisava de reflectir sobre o sucesso e as falhas nas eleições, por outro lado, precisava de fazer os trabalhos da nova direcção. Desde a saída de Au Kam San até às eleições em 2017, nunca pensei em sair da Novo Macau. Na altura, a associação necessitava de uma pessoa com experiência para enfrentar as questões com que se deparava. Em 2017 decidi ficar para ultrapassar o último desafio, que é conseguir um lugar na AL em prol do desenvolvimento da Novo Macau. Isso também é importante para a sociedade de Macau, porque acredito que o território precisa de associações diferentes como a nossa. Mas isso depende da decisão dos cidadãos e dos eleitores. Os factos apontam para a evidência de que os cidadãos e os eleitores apoiam as ideias da Novo Macau. Estou satisfeito com isso. Fiquei para enfrentar os desafios da Novo Macau juntamente com os outros membros. Agora que foram ultrapassados chegou a altura de me empenhar nos meus próprios assuntos, nomeadamente, o religioso, sem causar influência à associação. Qual é o papel de Sulu Sou? Considera que representa a salvação da Novo Macau? É injusto, quer para Sulu Sou, quer para a Novo Macau, dizer que ele representa a salvação da associação. Nós, enquanto candidatos da lista Associação do Novo Progresso de Macau, assinámos um documento de compromisso com as ideias da Novo Macau e que vamos aceitar a fiscalização da associação. Qualquer indivíduo que aceite os requisitos pode ser candidato. Ao longo dos anos os trabalhos da Novo Macau não foram feitos só por duas ou três pessoas, mas sim por um grupo maior. Se Sulu Sou não entrasse na Novo Macau, ou se não se candidatasse pela lista da Novo Macau, seria eleito? Isso é incerto. Mas a Novo Macau, como uma associação experiente na participação em eleições durante vários anos, tem capacidade para conseguir um lugar merecido na AL. Poderia ser Sulu Sou, Paul Chan Wai Chi ou Scott Chiang. Qualquer pessoa tem a possibilidade de ser eleito como primeiro candidato na lista. Relativamente à disputa por lugares cimeiros na ordem dos candidatos da lista, a ideia era responsabilizar os jovens. Em Hong Kong já se tem feito isso há anos. Algumas associações em Macau tiveram uma atitude semelhante. Por exemplo, a União Geral das Associações dos Moradores de Macau e a Federação das Associações dos Operários de Macau. As associações e os deputados estão naturalmente ligados. Não é adequado dizer que alguém salva outrem. As associações e os deputados progridem e declinam em conjunto. Fala de Xi Jinping no artigo escreveu para o HM e refere que a China precisa de se renovar. Como é que o país o pode fazer? Em primeiro lugar, o presidente Xi Jinping avançou com a ideia do sonho de rejuvenescimento do povo chinês. É de esperar que a China daqui a alguns anos consiga ser uma sociedade moderadamente próspera. Para mim, este sonho não só influencia profundamente o país, mas também pode produzir efeitos positivos no mundo inteiro. “A renovação e a abertura não podem voltar para atrás”, isso foi dito por Deng Xiaoping. Como é que se garante que se avança pelo caminho certo? Sobre esta questão acho que cada cidadão chinês pode contribuir com o seu esforço, devendo ter o mesmo sonho, que pertence à China e ao mundo. Assim poderemos participar em paz na comunidade internacional, minimizando os conflitos. No entanto, na sua prática, é óbvio que se vão enfrentar riscos e desafios. Por isso, acho necessário que sejam feitos esforços em conjunto para atingir o objectivo. Acredito que quando seguimos por um bom caminho, no final vamos chegar ao destino. Mas para isso temos de envidar esforços e não podemos esperar pela vinda de felicidade. Quais são os maiores desafios de Xi Jinping? Existem dificuldades em cada fase. A renovação e a abertura da China trouxeram prosperidade económica, assim como alguns problemas. Como é que se unem as ideias e se juntam as forças para ultrapassar as dificuldades, isso é importante. A China tem agora melhor capacidade de gestão do país, apesar de estar a enfrentar problemas quer seja no plano exterior quer seja no plano interno. A China deve melhorar no âmbito político, social e económico. Seguindo a esta directriz, neste sentido as dificuldades vão ser resolvidas. Se se empenhar pelo interesse próprio, vai no final sofrer da consequência. Acha que as limitações à liberdade que se registam no continente estão cada vez mais presentes em Macau? Lembro-me que CY Leung, quando era membro do Conselho Consultivo da Lei Básica de Hong Kong, disse em Macau que “o futuro é brilhante, o caminho é com curvas”. Isso foi bem dito. No caminho do progresso é óbvio que se vão encontrar obstáculos. Às vezes podem mesmo acontecer recuos. O mais importante é insistir e saber seguir o caminho certo. Em Macau muitas pessoas dizem que as leis estão desactualizadas e depois, na revisão das leis, (o Governo) quer reforçar-se na monitorização e melhorar a segurança na cidade devido ao número elevado de turistas. Para isso, foram instaladas câmaras de videovigilância nas ruas. É verdade que precisamos de legislação para que a sociedade seja regulamentada. Mas isso não quer dizer que seja adequado elaborar uma quantidade excessiva de leis. Nos últimos vinte anos desde 1999 quais são os aspectos que se pode melhorar quanto ao desenvolvimento do sistema político para que no próximo mandato o Governo se possa operar mudança. Mas qual é o momento oportuno, acho que em primeiro lugar a sociedade deve ter conhecimento e fomentá-lo em conjunto. Uma posição construtiva é melhor do que só criticar os outros. Os chineses valorizam o paz. Macau tem uma característica em termos da fusão de culturas. Nós tratamos bem desta questão. Além disso, com o avanço da Grande Baía, precisamos de ideias inovadoras. Não se deve passar sempre a responsabilidade ao Governo. Não pergunte o que o país pode fazer por si, mas pergunte a si próprio o que fez pelo país. Acha que o movimento independentista de Hong Kong influenciou as medidas que o Governo está a implementar em Macau? A ideia da independência de Hong Kong está relacionada com o sentimento de pertença dos jovens. Quer seja em Macau ou em Hong Kong, não há nenhuma condição para a independência. Por isso, a independência de Hong Kong não é uma situação realista. Mas por que razão é que o tema foi tão falado. Isso tem a ver com vários factores. Em prol de Macau, ou de Hong Kong precisamos de fazer o melhor para eliminar estes factores. Na altura da transferência de soberania estava preocupado com a forma como se podiam manter as características de Macau sob o sistema de “Um País, Dois Sistemas”. Para Hong Kong, é igual. Caso consiga manter as características, os residentes em Macau não precisam de se preocupar com as situações que ocorreram em Hong Kong. O Estado deu, de facto, liberdade à gestão (da região). Mas é lamentável que o assunto sobre as eleições universais não tenha sido bem tratado entre Hong Kong e a China. Tal circunstância causou conflitos na sociedade. Para mim, deve-se pensar em como obter equilíbrio na relação entre grupos diferentes de residentes.