No fim de um périplo pela América Latina, o Presidente chinês promete continuar a impulsionar o livre comércio e alerta para os desafios da globalização
[dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] isolacionismo patente nos discursos de Donald Trump, Presidente eleito dos Estados Unidos, parece contrastar com a nova dinâmica da diplomacia chinesa, com Pequim a assumir agora a defesa do livre comércio e da globalização.
Na América Latina, uma região conhecida como o “quintal” dos EUA, o Presidente chinês, Xi Jinping, prometeu esta semana “impulsionar a construção de uma área de livre comércio na Ásia Pacífico e uma economia mundial aberta”.
Xi terminou ontem um périplo por Equador, Peru e Chile. Em Lima, participou da cimeira dos líderes da APEC (Fórum de Cooperação Económica Ásia-Pacífico), que teve como um dos principais temas a criação de uma área de livre comércio para a região.
Durante a cimeira, Xi lembrou que a globalização é “uma faca de dois gumes”, questionada por “muitas vozes” e instou a comunidade internacional a abordar seriamente estes “desafios”.
No Equador, que atravessa uma recessão, o líder da China inaugurou a maior barragem hidroeléctrica do país, construída por uma firma chinesa e paga com parte dos quase oito mil milhões de dólares que Pequim emprestou ao país desde 2007.
Os maiores
A China tem acordos de livre comércio com Costa Rica, Chile e Peru e está a negociar novos acordos com o Uruguai e a Colômbia.
Em 2015, o país asiático ultrapassou os EUA como o principal investidor externo na América Latina.
O investimento directo chinês na região subiu no ano passado 67,1%, em termos homólogos, para 21,45 mil milhões de dólares, segundo dados do Ministério do Comércio da China.
A estratégia de Trump para a região inclui romper com o Tratado Norte-Americano de Comércio Livre (NAFTA) e abandonar o Acordo de Associação Transpacífico (TPP), para além de construir um muro na fronteira com o México.
“A China insiste que a globalização é um processo irreversível, para nós e para o mundo”, diz à agência Lusa Cui Shoujun, director do centro de estudos para a América Latina da Universidade Renmin, em Pequim.
“Histórica, geográfica e até politicamente, a América Latina é vista como o quintal dos EUA”, nota. “Mas agora estamos numa era global”, acrescenta.
Face ao anúncio de que Trump vai retirar os EUA do TPP, vários países voltam-se para tratados alternativos, nomeadamente o Acordo Integral Económico Regional (RCEP).
Esta zona de livre comércio incluiria a China, os dez países da Associação de Nações do Sudeste Asiático (ASEAN), Austrália, Coreia do Sul, Índia, Japão e Nova Zelândia.
Esta semana, um porta-voz do ministério chinês dos Negócios Estrangeiros afirmou que Pequim espera que as conversações para a criação do RCEP “possam produzir resultados em breve”.
No ano passado, Xi anunciou que, até 2025, o comércio bilateral entre a China e a América Latina alcançará os 500.000 milhões de dólares, enquanto o investimento chinês na região atingirá os 250.000 milhões.
“A China pode ajudar a América Latina a internacionalizar a sua economia”, defende Cui Shoujun.
“Partilhamos das mesmas aspirações com os países da região, de que enquanto nação em desenvolvimento, não estamos devidamente representados no novo milénio”, acrescenta.
Em entrevista à Lusa, o novo embaixador do Brasil em Pequim, Marcos Caramuru de Paiva, notou que a China “impõe-se naturalmente” e “força todo o mundo a adaptar-se a uma nova realidade”.
“Você precisa incorporar esta realidade e tentar extrair o melhor que puder”, disse, acrescentando: “Não adianta brigar com a realidade como ela é”.