Proteger os voluntários

No passado dia 8, Macau levou a cabo a sexta ronda de testes gerais. Registou-se uma agressão por parte de um estrangeiro a um voluntário.

A comunicação social assinalou que o estrangeiro não respeitou a ordem da fila, o que levou à intervenção do voluntário e acabou por dar origem a uma discussão, na sequência da qual o voluntário foi agredido. Posteriormente, a Polícia declarou que o agressor vai ser acusado de conduta criminosa, mais especificamente de – “danos à integridade física”. Este caso não tem muito que saber, mas existem algumas questões que devem ser ponderadas.

O surto epidémico em Macau começou em Junho, há cerca de um mês. Desde então realizaram-se várias rondas de testes gerais. Sempre que se realiza uma destas rondas de testes, os residentes passam entre meia hora a uma hora nas filas, o que os deixa ansiosos.

Os voluntários que prestam assistência nos postos de testagem trabalham mais de dez horas por dia e têm períodos de descanso muito reduzidos. usam equipamento de protecção, que lhes dificulta as idas à casa de banho.

Além disso, quase que não conseguem beber água. Por isso, os voluntários ficam facilmente confusos. A irritabilidade dos residentes, a confusão dos voluntários e a onda epidémica que se está a viver criam condições para mal-entendidos. Para a próxima semana serão realizadas mais três rondas de testes gerais. A situação que cria ansiedade e confusão vai continuar. Devemos tomar medidas para evitar que incidentes deste género voltem a acontecer.

Os envolvidos no caso afirmaram que o vão levar até às últimas consequências, e a Polícia vai acusar os agressores de “danos à integridade física “. Estas medidas têm pouco significado prático. Basta pensar, se em Macau, um indivíduo agredir ligeiramente outro, este pode ficar ligeiramente ferido. O agressor será acusado de “danos à integridade física”.

Portanto, este método apenas significa que o agressor será alvo de procedimento criminal, circunstância a que todos ficam sujeitos na mesma situação. Este método não cria uma legislação especial para proteger os voluntários; ou seja, este método não leva em consideração que os voluntários estão ao serviço do bem-estar social, e que atacar voluntários é atacar o bem-estar de todos.

No exemplo acima apontado, se a pessoa agredida ficar magoada e tiver de ficar em casa durante três dias, pode levantar um processo ao agressor, para ser compensada pelas despesas médicas e pela perda de salário referente aos dias que faltou. Estes são os prejuízos que sofreu na sequência do ataque. A situação dos voluntários é muito especial. O actual sistema de saúde de Macau implica que os residentes têm de pagar parte dos tratamentos e dos exames a que são sujeitos; ou seja, um voluntário agredido enquanto presta serviço a bem da comunidade terá de pagar parte do seu tratamento.

Os voluntários não são pagos. Neste contexto epidémico, têm ajudado o Governo a levar a cabo várias rondas de testes gerais e têm-se exposto a um trabalho de alto risco, colocando-se ao serviço da população e procurando trabalhar em prol do bem-estar comum. O voluntariado é um serviço nobre que tem de ser respeitado. Uma vez que não há remuneração, para além de se cobrir as suas despesas hospitalares, que compensação pode um voluntário obter depois de ser atacado?

A relação entre os voluntários e o Governo não é uma relação empregador-empregado. Nas relações laborais, os empregadores são regulados por lei e devem adquirir um seguro de trabalho para os seus empregados. Os trabalhadores que sofrem lesões no trabalho podem ser compensados pelo seguro. A compensação mais comum é, naturalmente, a cobertura das despesas hospitalares e dos salários referentes aos dias de baixa, o que não se aplica no caso dos voluntários.

De acordo com o actual sistema de saúde de Macau, e na ausência de seguro, o voluntário tem de pagar os seus próprios tratamentos. Embora, em caso de agressão, possa processar o agressor, não pode ser compensado pelos eventuais prejuízos.

Por que devemos considerar a questão da compensação para os voluntários? Porque os voluntários servem a população sem qualquer remuneração, trabalham a bem da sociedade e do bem-estar de todos. Se não existir um bom sistema e uma legislação sólida para proteger a segurança dos voluntários, que garanta que terão tratamento adequado e compensação na eventualidade de um incidente, as pessoas vão constatar que “não existe recompensa para o trabalho pelo bem comum e que, se forem atacados, têm de pagar o seu próprio tratamento.”

Este cenário só as vai assustar. Quem é que vai querer voluntariar-se de futuro, e continuar a trabalhar em prol da sociedade e do bem-estar comum? Se não houver voluntários, quem é que vai prestar assistência nos postos de testagem? Se ninguém responder ao apelo do Governo, toda a sociedade de Macau vai ser penalizada. Gostavam de ver isto a acontecer?

Portanto, esperamos que o Governo considere cobrir as despesas hospitalares e da compra de medicamentos dos voluntários; prestar-lhes toda a assistência possível no decurso do seu trabalho em prol do bem-estar social. O voluntário deve ser valorizado pelo Governo e deve ser respeitado pela sociedade. O Governo deve também considerar a criação de um conjunto de sistemas e de leis sólidas para proteger os voluntários no decurso do seu trabalho em prol do bem-estar social. Esperamos que o voluntário que foi agredido recupere rapidamente, possa voltar a servir-nos a todos, e que possa receber respeito, amor e cuidado por parte da população.

 

Consultor Jurídico da Associação para a Promoção do Jazz em Macau
Professor Associado da Escola Superior de Ciências de Gestão/ Instituto Politécnico de Macau
Blog: http://blog.xuite.net/legalpublications/hkblog
Email: legalpublicationsreaders@yahoo.com.hk

12 Jul 2022

Canídromo | Voluntários podem participar todos os dias da semana

[dropcap style=’circle’]A[/dropcap]Sociedade Protectora dos Animais de Macau (ANIMA) emitiu um comunicado onde informa que, desde ontem, os voluntários podem tratar dos galgos todos os dias da semana, ao longo de dois turnos, entre as 9h00 e as 12h00 e entre as 14h e as 17h. Quem já participou e quiser repetir a experiência pode aparecer nas instalações do Canídromo e assinar a lista de presença, enquanto que aqueles que participam pela primeira vez devem inscrever-se através do email info@animamacau.org.

21 Ago 2018

População une-se em solidariedade no tratamento dos galgos

A passagem do Hato já tinha mostrado algo que a crise dos galgos voltou a realçar. Quando é necessário, a população de Macau une-se e actua. A prova viva é a onda de solidariedade que juntou centenas de voluntários aos funcionários do IACM no tratamento dos galgos que no passado recente correram na pista do Canídromo

[dropcap style≠‘circle’]O[/dropcap] dia começa às nove da manhã. Funcionários do Instituto para os Assunto Cívicos e Municipais (IACM) e voluntários entram nas instalações que há pouco tempo eram o palco das corridas de galgos, para tratar dos 533 animais que ainda ali se encontram.
Uns dirigem-se às vassouras, baldes e mangueiras. Os voluntários, que recebem o cartão de identificação, reúnem-se para serem divididos em grupos. À espera estão mais de 500 galgos. Entre as missões por cumprir conta-se a limpeza das jaulas, passear os cães, dar-lhes refeições mas, acima de tudo distribuir carinhos. “Hoje foi o meu primeiro dia e fui seguindo os passos dos outros”, começou por contar Rita Machado, na semana passada, ao HM.
Cumpridas as formalidades matinais e uma vez inserida num dos grupos, Rita Machado e os colegas de boa vontade foram para o canil nº8.
Existem, neste momento, oito canis naquele espaço, cada um com capacidade para 80 animais.
É aqui que começa verdadeiramente o trabalho. Para que seja dado espaço ao pessoal da limpeza de cada compartimento individual, com cerca de um metro quadrado e onde têm vivido os campeões das pistas de corridas, os voluntários pegam nos animais e levam-nos a passear à volta dos canis. “Vamos recebendo os animais em cada canil e damos uma volta, seja com um, dois ou três ao mesmo tempo”. Enquanto isso os restantes animais aguardam pela sua vez, tentando escapar ao calor. Uns mais encostados à parede de trás da sua jaula onde ainda há alguma sombra, outros, de língua de fora a tentar poupar o corpo a qualquer movimento que nem a temperatura, nem a falta de ventilação ajudam.
Depois de passeados, é hora de beber e de comer e, acima de tudo, de dar afecto. “Creio que hoje passeei dez cães. Depois muda-se a água em cada uma das boxes e a seguir alimentam-se”, explica Rita Machado. “E ainda sobra tempo, no final, para conviver e a dar mimos aos animais”, acrescenta.

Uma questão de prioridades

Para ajudar na causa a também arquitecta teve que fazer uma mudança de agenda e de rotina. Se antes começava às nove da manhã no atelier, agora começa ao meio dia e termina mais tarde, pela noite dentro. Não há problema, garante, até porque “se vivemos em comunidade temos que nos preocupar com o próximo e por isso faz todo o sentido partilhar o nosso tempo e reajustar as nossas agendas para responder ao apelo das associações e do Governo”.
Para Rita Machado, ser voluntária neste projecto foi a forma que encontrou para manifestar o seu “apoio e solidariedade”.
Já Yoko não precisou de ajustar agendas. Reformada, de naturalidade japonesa, optou por encher o seu tempo, enquanto necessário, com a dedicação total a esta causa. Passa agora os dias no Canídromo por ser uma questão “que diz respeito a todos”.
A rotina é idêntica à de Rita Machado, mas repete-se ao longo do dia, no período da manhã e da tarde. Além das actividades que marcam o dia destas pessoas, Yoko destaca também a oportunidade de estar não só com os animais, mas com os colegas. “O ambiente é muito bom, estamos todos pela mesma razão e contentes por poder contribuir, enquanto for necessário, para o bem-estar destes animais.”

Domingo fora do sofá

Apenas com os fins-de semana livres, não é por passar os dias rodeada de animais que a veterinária Paula Reais deixa de prestar a sua colaboração voluntária àqueles que ainda estão no Canídromo. O convite veio de Fátima Galvão, responsável pela associação de protecção dos animais Masdaw e Paula Reais não conseguiu recusar. Por isso, “alterei um pouco a monotonia dos meus rotineiros domingos. Desta vez, experimentei um pouco de exercício fugindo da expectável preguiça domingueira, mas em nada comparado com o exercício que estes verdadeiros corredores fizeram durante anos”.
Afinal estas acções podem, apesar de pontuais e simples, ajudar na vida destes animais, considera.
No domingo, dia 22 lá estava na porta do Canídromo, às três da tarde, à chuva. “Perdi a conta ao número de animais que nessa tarde passeei”, refere sem esconder contentamento.
Apesar de estar inserida numa acção de emergência para garantir os cuidados de tantos animais, a veterinária ressalva a boa organização e dinâmica. “Devo ressaltar que nesta dança de galgos e pessoas, me pareceu que estava tudo relativamente organizado, quer pelo pessoal de limpeza que se ocupava de limpar a urina e as fezes, quer pelos trabalhadores que preparavam os animais para o passeio e os disponham nas respectivas jaulas logo”.
Paula Reais ficou no canil número 1 onde alimentou os animais e teve contacto directo com as “condições em que vivem”. De uma forma muito espontânea surgiram os gestos de carinho, “que em todo o momento foram mútuos, porque são animais muito dóceis”, aponta.
Para a veterinária este é uma acto civil e cabe a todos dar contributo. “Sinto que é um singelo contributo enquanto cidadã deste território que se vê abraços com esta questão. Na minha opinião, não será exclusivamente política, mas antes uma obrigação conjunta das autoridades responsáveis assim como da sociedade civil”.

Afectos protegidos

A calma e necessidade de afecto destes cães contrasta com os esforços excessivos das corridas e das más condições em que têm habitado, que resultaram em feridas e problemas de pele visíveis em muitos deles.
Agora, em processo de cura das feridas denunciadas pelo corpo de muitos, e depois de lançados vários apelos no início da semana passada, foram em média 65 por dia, aqueles que se disponibilizaram a ir tratar dos galgos do Canídromo. A estes juntam-se os voluntários que responderam a pedidos da ANIMA e de outras associações de protecção animal do território. “São números impressionantes e comoventes”, aponta Fátima Galvão, responsável pela Masdaw.
Mais uma vez, ajudar não separa, e as nacionalidades e residências podem deixar de fazer sentido tratando-se de uma causa maior. “Há voluntários que vêm de Hong Kong especificamente para ajudar no Canídromo. Há malaios, húngaros, tailandeses, filipinos e mesmo japoneses. Todas as comunidades em uníssono emprestando força e acima muita ternura à causa de proteger os galgos e assegurar o seu bem-estar. Deveria ser sempre assim”, remata.
No passado dia 21, o IACM activou um plano de emergência para cuidar dos 533 galgos que ficaram no Canídromo, depois da Companhia de Corridas de Galgos – Yat Yuen não ter apresentado um plano viável para os animais que estavam na sua posse. A Yat Yuen, entretanto, reclamou os cães e apresentou, com a Sociedade Protectora dos Animais¬- – ANIMA – um plano que envolve a criação de um centro internacional de ajuda a estes animais. Tudo indica que a partir de 1 de Agosto, a ANIMA assume a responsabilidade de gestão deste centro. Quanto aos funcionários, para já serão os antigos trabalhadores do Canídromo, supervisionados pelos responsáveis da ANIMA. A Yat Yuen pediu mais 60 dias ao Governo, para que os galgos fiquem naquelas instalações. O tempo necessário para concluir a adaptação do edifício do Pac On, de modo a que possa receber este mais de meio milhar de cães.

30 Jul 2018