Sofia Margarida Mota EventosPedro Moutinho, fadista | “Existe liberdade quando canto” [dropcapstyle=’circle’] P [/dropcap] edro Moutinho, irmão de Camané e de Hélder Moutinho, dá hoje o concerto que encerra o Festival de Artes de Macau deste ano. Amante do Rock, é a cantar o fado que se sente livre. Ao HM, o intérprete falou da nova geração de fadistas e da sua opção por uma vertente mais tradicional Como é que o gosto do seu pai pelo fado influenciou a sua carreira? O meu pai era muito ligado ao fado. O avô dele, o José Júlio, já cantava no bairro da Madragoa. Como o meu pai gostava de cantar e de música, em miúdo ia muito às casas de fado com ele. Íamos todos os fins-de-semana. A primeira vez que cantei foi com oito anos. Na altura, havia poetas que escreviam letras para crianças, para não ser uma canção tão pesada. Lembro-me de ter chegado a ouvir miúdos a cantarem letras que incluíam “Ela deixou-me” e este tipo de coisas. Os meus pais não me deixavam cantar isso. Essa minha infância a acompanhar o meu pai acabou por ser uma escola. Acabei por ouvir, desde miúdo, os melhores intérpretes de fado tanto ao vivo como em disco. Como é que depois optou por ter o fado como carreira, numa altura em que este género não era tão popular como é agora? O fado esteve sempre presente. Sempre ouvi outros tipos de música, mas este era aquele bichinho. Quando dei por mim já pedia ao meu pai para me levar às casas onde eu gostava mais dos músicos. O fado estava sempre presente. Era aquela coisa de que gostava e que gosto. O que sente quando canta? Existe liberdade quando canto. Não consigo explicar. O fado é uma coisa muito relacionada com o sentir. Depois há a união com o público. Há o sentir que estou a ser ouvido e que as pessoas estão comigo. Acaba por ser uma coisa que pertence àquele momento. Cantar poemas e canções que gosto, é muito bom. Como é que escolhe as letras que canta? Sou muito esquisito. O poema às vezes pode ser lindíssimo, mas se tem lá uma palavra que não gosto, já não o canto. Depois a escolha é feita por identificação, em que há qualquer coisa de mim que está naquele poema. Tenho também tido muita sorte com as pessoas que escrevem para mim, que são os melhores, e isso é fantástico. Considera-se parte desta nova geração do fado? Uma parte sim, uma parte não. Venho mais de trás. A minha geração ainda é mais dos anos de 1990. O fado começou a ganhar mais popularidade, na minha opinião, depois da morte da Amália Rodrigues. A partir daí começaram a aparecer muito mais jovens a cantar, alguns que vieram de fora deste género e outros que já cantavam. A Amália foi a primeira no que respeita à internacionalização do fado, depois foi a Mísia. Elas abriram a porta para eu estar aqui hoje. Só mais tarde é que apareceu a Mariza, a Ana Moura ou a Carminho. Eu faço parte ali de uma geração intermédia. De qualquer forma começou numa altura em que o fado não era tão popular. Foi difícil o início de carreira? Nada é fácil. O fácil é uma ilusão. Sempre tive que trabalhar muito para conseguir as coisas e continuo a ter de o fazer. No início comecei pelo percurso da casas de fado. Comecei a cantar profissionalmente lá para os lados de Cascais. Havia uma casa que era o Forte de D. Rodrigo que abriu nos anos 70 e fechou nos final dos anos 90. Tinha por volta de 16/17 anos, e o gerente do forte vivia ao lado da casa dos meus pais e começou-me a convidar para ir lá fazer os fins-de semana já a ganhar um cachet por noite. Depois da tropa vim para Lisboa. Um dia fui até ao Bairro Alto, pedi para cantar no Luso e, de repente, pediram-me o número de telefone e começaram-me a chamar. Na altura, era o mais novinho. Os meus colegas eram tudo pessoas dos 50 anos para cima tirando uma colega minha. Havia muito poucos jovens a cantar. A seguir, na viragem do século, começaram aparecer os nomes desta nova geração. Havia uma coisa que achava piada: na altura, a crítica jornalística referia muito que se andava à procura da nova Amália. Mas qual nova Amália? Foi também quando o meu irmão Camané fez um concerto fantástico no Centro Cultural e houve mesmo um crítico que referiu que parecia que a tal nova Amália era um homem. Vem tocar acompanhado pela orquestra de Macau. Como é que está a ser esta experiência de ser acompanhado por instrumentos orientais? Está a ser das melhores experiências da minha vida. Os arranjos estão fantásticos. Estava com alguma expectativa positiva. Mandámos as músicas, a Orquestra de Macau tratou de tudo. Chegámos para o ensaio, tocámos duas vezes cada tema e pronto. Estava tudo óptimo. São instrumentos diferentes, mas estamos a falar de música. O fado, e o meu que é mais tradicional, é um tipo de canção melodiosa e estes instrumentos são também instrumentos muito melodiosos. Fica tudo muito bonito quando se juntam. Com esta experiência com orquestra de Macau estou cheio de vontade de voltar a cantar com eles. O fado tem guitarra, viola e baixo e tem uma melodia simples e bonita. Quando chega uma orquestra com aquele encher dos instrumentos todos, fica incrível. E o maestro é fantástico. Além do fado, que música ouve? Nasci nos anos 70 por isso apanhei os 80 e os 90. Sempre ouvi rock. Led Zeppelin Metallica, Pixies, consumia tudo. Por influência dos meus irmãos, também ouvia muita música brasileira: Chico, Caetano, Betânia, Elis, João Gilberto. Gosto de jazz. Gosto também de Frank Sinatra e de Tony Bennett. Não aprecio muito música electrónica. Sou capaz de ir para o Lux e estar uma noite a divertir-me, mas não é o tipo de som que ouço em casa. Às vezes passam-se semanas que não ouço fados também. Já esteve em Macau. Como é que sente o público cá? O público português é sempre diferente. O que reparei no público de Macau, na última vez que cá estive, foi o facto de estar sempre com muita atenção, mas mais tímidos. Também se nota que é um público que gosta muito do espectáculo, principalmente no final em que assinamos os discos. Há uma situação engraçada de um senhor chinês de Hong Kong, que é meu fã, e que veio ver o concerto. No final estava a assinar os discos e ele aparece com os meus discos todos inclusivamente o primeiro e o segundo que nem eu tenho e que já não há nas lojas. Nem gosto do meu primeiro disco. O primeiro trabalho é para cometer erros. Há pessoas que têm logo sorte e corre bem mas não foi o meu caso. Se calhar é um problema meu. Tenho dificuldade em me ouvir. Já está a trabalhar num novo disco? Vou começar a gravar um trabalho novo este ano. Vou seguir a minha linha tradicional com algumas coisas novas. Estou a abrir um bocadinho o leque a compositores fora do fado. Estou à espera de receber músicas. Esta é aquela fase mais deprimente. Um disco é sempre um processo muito ansioso em que há muitas incertezas. Sou muito picuinhas e preocupo-me muito quando se calhar não me devia preocupar tanto. Levo isto muito a sério e se calhar às vezes podia ser um bocadinho mais leve. Até estar tudo feito não consigo relaxar.
Diana do Mar EventosFestival “Connections” | Ioga, música e dança ao ar livre a 12 de Maio [dropcap style=’circle’] O [/dropcap] reservatório de Ká-Hó, em Coloane, vai acolher, no próximo dia 12 de Maio, o “Connections”. Apresentado como o primeiro festival ao ar livre a juntar ioga, música e dança em Macau, o evento promete um arranque “épico” A ideia surgiu de uma conversa espontânea entre amigas. “Estávamos a falar sobre a necessidade de haver eventos ao ar livre, fora do contexto urbano, que é uma tendência dos últimos anos, mas algo invulgar em Macau”, começa por explicar Rita Gonçalves, uma das mentoras da iniciativa. Das palavras passaram aos actos e, com ajuda de parceiros, nasceu o “Connections”, um festival ao ar livre que vai combinar uma série de actividades, como ioga, música e dança. Os interessados devem reservar o dia 12 de Maio na agenda, uma vez que o evento promete ser “épico” e conquistar um lugar regular no calendário de Macau. “Este tipo de eventos e festivais ao ar livre tem-se desenvolvido cada vez mais”, aponta, dando o exemplo do “Boom” ou do “Andanças” em Portugal e, na Ásia, do “Wonderfruit” (Tailândia) ou do “Bali Spirit” (Indonésia). “Estes eventos são muito giros e especiais, de contacto com a natureza e também com o nosso interior, em que se quebram barreiras, como os papéis sociais, e todas essas coisas que nos restringem no dia-a-dia”, enfatiza Rita Gonçalves ao HM. “Todo o contexto criado permite, depois dos primeiros dez minutos da vergonha, que as pessoas se soltem”, constituindo “uma grande fonte de alegria e liberdade”, complementa a presidente da Associação Yoga Loft. O “Connections”, a ter lugar no reservatório de Ká-Hó, vai realizar-se a 12 de Maio. O festival, que decorre das 11h às 22h, vai ter música o dia inteiro, estando previsto um concerto ao vivo da banda “Concrete Lotus” e a actuação de DJs. A ideia da organização é proporcionar “um ambiente descontraído, com som ambiente”. Neste cenário, “vai também haver ioga – um mais fácil e calmo e outro mais mexido e puxado”, explica Rita Gonçalves. “Há muito tempo que amigos alunos me pedem para eu fazer aulas com música. Só que, para mim, o ioga é um trabalho mais sério”, mas com “um ambiente festivo e ao ar livre vai ser engraçado explorar o contexto da música”, sublinha a também instrutora. O programa do festival inclui ainda dança, com ‘workshops’ orientados por pessoas de Macau e do estrangeiro. “Vai ser uma dança muito exploratória, em que a ideia é brincar com um tema lançado pelo facilitador”. Em paralelo, há também actividades para crianças, como jogos, pinturas de rosto ou espectáculos de marionetas. Dado que o “Connections” vai decorrer durante todo o dia, o serviço de ‘catering’ da “Blissful Carrot” disponibilizará refeições no local, devendo o menu ser divulgado em breve. Na preparação do “Connections” encontram-se envolvidas entre 50 a 60 pessoas, estando a organização à procura de mais voluntários para o evento. O ingresso custa 120 patacas para ajudar nos gastos, sendo que quem reservar com antecedência paga menos 20 patacas. Aliás, a organização recomenda-o para evitar que muita gente acabe por se concentrar à entrada. “É pedido um donativo porque vamos ter custos associados ao processo logístico, nomeadamente da montagem das sombras”, indica Rita Gonçalves. As crianças têm entrada gratuita. Festa amiga do ambiente A pensar no ambiente, a organização do “Connections” também pretende que haja o menor lixo possível. “Aconselhamos as pessoas a trazerem copos ou cantis para as suas próprias bebidas, por exemplo, e a reservarem a refeição de modo a que ‘Blissful Carrot’ saiba de antemão os pedidos para que também não haja desperdícios alimentares”, realça. “Este é um evento que quero que as pessoas venham porque se sentem naturalmente atraídas pela experiência, portanto, a informação há de ir parar a elas. Vou deixar decorrer de uma forma orgânica. Embora pareça um pouco arrogante, a ideia é que as pessoas ouçam falar pelos interesses que já têm”, sublinha Rita Gonçalves que, até ao momento, lançou apenas o evento no Facebook. Embora o festival ainda não tenha estreado, Rita Gonçalves não esconde o desejo de ver o “Connections” conquistar um lugar anual no calendário cultural de Macau.
Andreia Sofia Silva EventosCarlos Damas faz digressão na China com um pé em Macau [dropcap style =’circle’] É [/dropcap] uma digressão feita de estreias: não só será a primeira vez do violinista português Carlos Damas na China, como será também a primeira vez que os chineses poderão conhecer melhor o trabalho do compositor António Fragoso, falecido há 100 anos. A digressão de Damas na China decorre entre os dias 13 e 23 de Abril, estando previstos concertos nas cidades de Dalian, Jilin, Dongguan e Pequim, entre outras. Em declarações ao HM, o músico, que viveu em Macau entre 1995 e 2000, falou do que o público chinês poderá esperar dos concertos desta tournée. “Toquei pela primeira vez na China no ano de 1997, tive o privilégio de ser o único ocidental a actuar como solista no Festival de Artes da República Popular da China. Lembro-me que na altura o público parecia não saber como reagir ou agir perante uma performance musical, passaram-se bastantes anos e espero vir a ter nesta tournée um público mais participativo e vibrante.” Sem concertos agendados, para já, em Macau, o violinista espera vir ao território no próximo ano. “Curiosamente recebi há cerca de um mês um contacto do Instituto Cultural de Macau, que me pediu para enviar uma proposta para o Festival internacional de Música de Macau de 2019, espero realmente poder voltar a tocar em Macau em 2019”, adiantou ao HM. A homenagem a Fragoso António Fragoso entrou na vida de Carlos Damas apenas em 2010. “Os descendentes do compositor ofereceram-me as partituras das obras para violino. Adorei a música e um ano depois estava a gravar essas obras para uma editora Holandesa. Essa gravação foi muito apreciada pela crítica internacional.” A homenagem que será feita na China aconteceu um pouco por acaso. “Os concertos que vou realizar não foram programados para serem dedicados a António Fragoso. Como vem sendo meu hábito, faço questão de incluir uma obra portuguesa em todos os concertos que realizo, como este ano se comemoram 100 sobre a morte de António Fragoso, em tom de homenagem, decidi incluir no programa a sua sonata para violino que por sinal foi a última obra que escreveu.” Para Carlos Damas, o compositor “foi um prodígio”, apesar de ter morrido com apenas 21 anos. “Segundo fontes que consultei, Fragoso nunca foi tocado na China continental (toquei em Macau obras suas em 2012). Estou curioso por sentir a reacção do público nos vários concertos que irei dar, na realidade a linguagem de Fragoso é distinta do habitual. O restante programa dos concertos é preenchido com obras de L. V. Beethoven e J. Turina”, contou. A digressão de Carlos Damas no continente acontece numa altura em que o país começa a despertar para a música clássica. “Nos últimos anos a China assistiu a um boom na música clássica. Foram criadas muitas instituições de ensino, abriram muitas novas orquestras, e têm hoje em dia muitas excelentes salas de concerto, salas de primeira linha. Na minha tournée a sala mais pequena onde tocarei tem 1500 lugares, a maior 3000”, rematou o músico.
Hoje Macau EventosRappers Jay-Z e Kendrick Lamar lideram corrida aos Grammy [dropcap style≠‘circle’]O[/dropcap]s ‘rappers’ norte-americanos Jay-Z e Kendrick Lamar lideram a corrida aos prémios Grammy, atribuídos pela indústria musical dos Estados Unidos e que foram ontem entregues em Nova Iorque. Jay-Z está nomeado em oito categorias da 60.ª edição dos Grammy e Kendrick Lamar em sete, incluindo Álbum do Ano e Gravação do Ano. “4:44”, de Jay-Z, e “Damn.”, de Kendrick Lamar, competem pelo prémio de Álbum do Ano com “Awaken, my love”, de Childish Gambino (alter ego do actor Donald Glover), “Melodrama”, de Lorde, e “24K Magic”, de Bruno Mars. O álbum “4:44”, de Jay-Z, inclui partes (‘samples’) do tema “Todo o mundo e ninguém” do grupo português Quarteto 1111, editado em 1970, no tema “Marcy Me”. O prémio de Gravação do Ano é disputado, além de “The story of O.J.”, de Jay-Z, e “Humble.”, de Kendrick Lamar, por “Redbone”, de Childish Gambino, “Despacito”, de Luis Fonsi e Daddy Yankee com Justin Bieber, e “24K Magic”, de Bruno Mars. Jay-Z e Kendrick Lamar estão ainda nomeados, entre outras, nas categorias de Melhor Performance Rap – com os temas “4:44” e “Humble.”, respetivamente, que inclui ainda Cardi B (“Bodak Yellow”) e Migos com Lil Uzi Vert (“Bad and Boujee”) – e Melhor Álbum de Rap – com “4:44” e “Damn.”, competindo com Migos (“Culture”), Laila’s Wisdom (“Rapsody”) e Tyler, The Creator (Flower Boy). Da longa lista de 84 categorias, que abrangem diferentes géneros musicais, do jazz à música clássica, do gospel aos audiolivros, sobressaem as nomeações de dois músicos que já morreram – Chris Cornell e Leonard Cohen -, ambos indicados para o Grammy de Melhor Atuação Rock. A cerimónia foi conduzida pelo apresentador James Corden, e teve actuações de diversos artistas e bandas, entre os quais Elton John, em dueto com Miley Cyrus, U2, Sting, Kendrick Lamar, Jon Batiste e Gary Clark Jr., que homenagearam as ‘lendas do rock’ Chuck Berry e Fats Domino, que morreram no ano passado, Childish Gambino, Sam Smith, Bruno Mars e Cardi B. #metoo na música Apesar de a indústria da música ainda não ter sido atingida pelas denúncias de abusos sexuais que têm vindo a público ao longo dos últimos meses nos Estados Unidos, a cerimónia dos Grammy não ficará de fora dos últimos acontecimentos. Os patrões da indústria fonográfica apelaram a artistas e outros trabalhadores para que usem uma rosa branca hoje à noite, em solidariedade com o movimento “Time’s Up” (“Acabou o Tempo” em tradução livre para português), criado para apoiar a luta contra o assédio sexual, por mais de 300 actrizes, argumentistas, directoras e outras personalidades ligadas ao cinema.
João Luz EventosThe Pains of Being Pure at Heart e Ride ao vivo em Hong Kong [dropcap style≠’circle’]O[/dropcap]s fãs de rock shoegaze que vivem em Macau e Hong Kong têm razões para estarem felizes com os concertos agendados para os próximos tempos. No dia 24 de Janeiro, os The Pains of Being Pure at Heart actuam na Music Zone KITEC, estando a primeira parte a cargo dos NYPD. Os bilhetes encontram-se à venda e custam 490 HKD. No dia 26 de Fevereiro é a vez dos clássicos Ride actuarem no Macpherson Stadium, em Mong Kok. A banda de culto britânica teve no seu primeiro registo, “Nowhere”, um dos discos mais importantes da cena shoegaze, de onde se retiram hinos intemporais como “Dreams Burn Down”, “Paralysed”, “Kaleidoscope” e “Decay”. A música dos Ride é fortemente marcada por atmosferas de pop rock etéreo, pelas vocalizações suaves e pelos pedais de distorção das guitarras que, do nada, incendiam uma música que poderia revestir roupagens comerciais. Ainda bem que assim é. Depois de sucessivos divórcios e reunificações, os Ride gravaram um disco de estúdio no ano passado intitulado “Weather Diaries”. O álbum é o quinto da carreira da banda e marca o regresso dos britânicos ao estúdio após um hiato de 21 anos. Os Ride, nascidos em Oxford, despontaram para os grandes palcos depois de Jim Reid, dos The Jesus and Mary Chain, os ter visto ao vivo. Em 1990 lançaram o primeiro disco, o acima mencionado “Nowhere”, que viria a lançar a década que se avizinhava. Andy Bell, um dos vocalistas e guitarristas da banda de Oxford chegou a integrar os Oasis durante um dos hiatos dos Ride. As dores Mas antes dos históricos de Oxford desafinem as suas guitarras, Hong Kong recebe uma banda que lhes foi beber bastante em termos de influência: Os The Pains of Being Pure at Heart. Com uma carreira que já ultrapassou uma década, a banda de Nova Iorque tem uma discografia com quatro registos de originais, sendo que em Setembro último lançaram “The Echo of Pleasure”, que deve marcar a actuação dos norte-americanos na Music Zone KITEC. O primeiro registo dos nova-iorquinos, um disco homónimo, valeu a aclamação crítica e alguma popularidade que motivou uma tour mundial, um sonho tornado realidade para uma banda recente. A sonoridades dos The Pains of Being Pure at Heart é frequentemente comparada a My Bloody Valentine The Field Mice, The Jesus and Mary Chain e, lá está, aos Ride. A banda faz parte de uma onda de grupos que foram repescar as sonoridades dos finais dos anos 80 e inícios de 90, onde o pop rock melodioso se aliava ao rasgar de guitarras carregadas de feedback, para gáudio de quem gosta destas sonoridades e estava farto de uma década de música electrónica. O panorama dos concertos no território vizinho arranca este ano com muitos motivos para sorrisos entre quem gosta de rock alternativo. https://www.youtube.com/watch?v=paQRaeIP35I
João Luz EventosThe Chameleons estreiam-se em Hong Kong no MusicZone@Emax [dropcap style≠‘circle’]M[/dropcap]ais de 37 anos depois da fundação, os seminais The Chameleons tocam pela primeira vez para o público de Hong Kong. O concerto é hoje no MusicZone@Emax em Kowloon, com as portas abertas às 19h30. A primeira parte estará a cargo dos Sinister Left e dos Ambience Intelligent. A histórica banda de Middleton, nos arredores de Manchester, é um dos marcos do post-punk do início dos anos 1980. Com uma carreira discográfica curta, com apenas quatro álbuns de originais, os The Chameleons foram uma banda à margem das revoluções musicais nascidas em Manchester. Longe de terem alcançado a notoriedade dos Joy Division, The Smiths e The Fall, o grupo liderado pelo Mark Burgess manteve um culto underground que se foi cimentando com o tempo realçando a relevância em termos líricos e musicais dos seus discos. Com um pé no rock psicadélicos, graças aos efeitos de guitarra e às letras escritas sob a influência de cogumelos alucinogénios, nascidas do génio do vocalista e baixista, Mak Burgess, os The Chameleons criaram um som que os separou das correntes que lhes foram contemporâneas. Algo que faz com que a sua música se mantenha actual, motivando tours que, inclusive, passaram por Portugal várias vezes. Os The Chameleons têm o núcleo da sua discografia na década de 1980, onde lançaram três discos até 1986, hibernando de seguida para um hiato que duraria quase 15 anos. O disco final dos 80’s, intitulado “Strange Times” é um monumento musical de inestimável valor, carregado de hinos como “Mad Jack”, “Caution”, “Tears” e “Seriocity”, numa escolha muito difícil de fazer. Primeiro acto Antes do prato principal subir ao palco, o público que se deslocar a Kowloon será aquecido pelos Sinister Left e os Ambient Intelligence. Os Sinister Left são uma banda local que combina ritmos hipnóticos e pesados com guitarras. O seu disco mais recente “Soot” recebeu alguma atenção por parte da crítica e imprensa da especialidade. O South China Morning Post escreveu que o álbum tem “um groove hipnótico e ameaçador, músicas complexas que fazem do disco um dos mais dinâmicos a sair da cena de Hong Kong nos últimos anos”. Os Ambient Intelligence são um duo de música electrónica criado no final de 2016 e constituído por Alan Ip e Yanlo Chow. A banda é fortemente influenciada pelos sons de sintetizadores dos movimentos musicais do início dos anos 80, ou seja, apropriado para o início de uma noite que se prevê memorável. O som dos Ambiente Intelligence é experimental e as suas actuações são normalmente marcadas pelo improviso em palco onde tentam demonstrar a química entre humanos, máquinas e o meio ambiente. Bons aperitivos antes da entrada em cena do acto principal, a estreia dos The Chameleons na zona do Delta do Rio das Pérolas.
João Luz Entrevista MancheteConcerto | The Legendary Tigerman traz “How to Become Nothing” a Macau e Shenzhen Três anos depois da passagem por Macau, The Legendary Tigerman regressa como um dos nomes principais do cartaz deste ano do festival This is My City, no sábado às 22h no espaço What’s Up Pop Up, na Calçada do Amparo. O português vai tocar ao vivo a banda sonora do filme, de Pedro Maia, “How to Become Nothing” [dropcap]O[/dropcap] que é que o público de Macau pode esperar deste espectáculo que sai um pouco fora do conceito habitual de concerto? “How to Become Nothing” é um projecto que foi feito a três cabeças, com a Rita Lino, o Pedro Maia e comigo, e não tem nada a ver musicalmente com o disco “Misfit”. No fundo, é um cine-concerto, um live-cinema. O Pedro Maia faz alguma edição e montagem ao vivo. Obviamente, há uma história no filme que é comum a todas as exibições mas, como num concerto, há alguns espaços para improviso e há alterações que fazemos pontualmente em alguns momentos da montagem do filme. O Pedro faz essa parte ao vivo e eu faço a banda sonoro. É uma espécie de um cine-concerto um bocadinho mais livre e experimental. Não tem, portanto, só a ver com o meu universo como Tigerman, antes pelo contrário, até está um bocadinho distante e é um pouco mais experimental. É um trabalho assente na junção de imagem em movimento e música. “How to Become Nothing” é um título um bocado niilista, baseado na ideia do homem que se perde no deserto e de onde sai outro. O que está por detrás deste conceito? No fundo, a ideia inicial era desenvolver um projecto que tivesse a ver com música e imagem em movimento em Super 8 neste caso, porque era o Pedro Maia, e que tivesse a ver também com fotografia. Para mim era importante que fosse algo que se passaria no deserto, teria de ser uma road trip, era assim que eu queria escrever o disco novo. Antes de começar a compor o disco queria que fosse criado este universo visual e que fosse feita esta viagem e este personagem que dá pelo nome de Misfit. É o personagem principal do filme ao qual eu dou corpo. Desenvolvemos esta ideia a partir de um livro que chega a ser um bocado cómico, que é o “How to Disappear Completely and Never Be Found”, do Doug Richmond. O livro é quase um guia para quem quer desaparecer do mundo quando tem problemas, sei lá, com o IRS, ou para quem quer fugir para algum lado. Partimos dessa ideia muito simples e pragmática da road trip para colocar isto numa esfera que tem mais a ver com a poesia e a filosofia. Foi um road-movie escrito por mim diariamente, todas as manhãs levantava-me às 6 da manhã e escrevia o diário desse dia. O argumento poderia ter alguma parte de verdade dos dias anteriores, ou poderia ser totalmente ficção, ou uma mistura de ambos, e depois partíamos para o dia de rodagem que tinha sido pré-definido. Sabíamos que esta viagem ia acontecer entre Los Angeles e Death Valley, foi um projecto muito aberto em que sabíamos que havia a busca deste homem, um busca um pouco onírica e muito pouco real de alguém que procura tornar-se em nada. O filme também tem a ver com todo o acesso que nós hoje em dia temos à informação e a toda essa existência digital está muito para além da nossa vida. Daí também termos filmado tudo em analógico. São muitas questões. No fundo, é um filme em formato de cine-concerto, que é uma forma mais livre e experimental, e que acaba por ser mais interessante. É um filme que tem muitas camadas, é algo que só poderia ser feito com uma equipa muito curta e com muita intimidade e entreajuda na própria rodagem. Na realidade, o filme foi rodado em 14 dias e tem muita coisa a ver com o trabalho pessoal dos três, e foi algo que também foi tido em conta e levado para dentro do filme. Como é traduzir essa experiência um pouco existencialista para palco? O filme é um bocado mais livre e experimental, os cortes não são sempre no mesmo sítio, da mesma forma que a história não é sempre exactamente a mesma, há sempre uma variável adicionada. Há uma versão do filme um pouco mais fechada, que foi à Mostra Internacional de Cinema de São Paulo e que esteve no Indie Lisboa, que vai passar em Portugal e em várias salas de cinema um pouco por todo o lado. Esta parte ao vivo é como se fosse um concerto, há espaço para a minha parte de improvisação, mas há um guião que tenho de seguir porque eu faço a banda sonora do filme ao vivo. No final da travessia do deserto o Paulo foi para o mítico estúdio do Rancho De La Luna gravar o disco “Misfit”. Como foi a gravação e como define este disco? É um disco totalmente de viragem em relação a tudo que está para trás na minha carreira. Por um lado, porque é o primeiro disco que eu gravo neste formato, ou seja, que não gravo enquanto one-man band. Gravei com o João Cabrita no saxofone e com o Paulo Segadães na bateria. O disco foi composto já a pensar que seria, pelo menos, um trio. Na realidade é, também, o momento em que me apetece descolar totalmente do formato de one-man band, mantendo alguns dos pressupostos que acho que são importantes a nível de arranjos e próprio espaço que a música pode ter. O facto deste trio ter surgido um bocado por acaso, e de se ter vindo a criar quase como se fosse uma banda, acabou por influenciar muito o modo como compus para este disco. Foi gravado no Rancho De La Luna, mas acabei por optar por misturar em Paris com o Johnny Hostile, que misturou as Savages. Ele tem uma abordagem muito contemporânea e inovadora, a forma como ele mistura discos de rock interessou-me porque não queria um disco que soasse ao século passado. Portanto, estou muito feliz com essas opções todas que parecem díspares, mas há aqui um equilíbrio muito grande entre gravar num estúdio praticamente todo analógico no meio do deserto e depois ir misturar em Paris de uma forma mais virada para a música electrónica do que propriamente ao rock. Acho que acabou por funcionar muito bem. Como se sentiu com a necessidade de censurar parte do filme para o público de Shenzhen? Foi algo que estava pressuposto desde o início. Ou optávamos por não passar o filme, ou por censurar o filme e ir a negro, ou por fazer esta opção de desfocar as imagens. Não sei se vai funcionar, ou não, se vamos conseguir fazer isto assim. Houve um momento em que tinha de decidir se queria mostrar o filme e, de alguma forma, marcar uma posição qualquer desfocando as imagens, ou não mostrar. Acho que é importante passar por este tipo de situações porque elas existem. Se elas não existissem em 2017 seria sinal de que a liberdade é uma coisa um bocado mais comum e em alguns países ainda não é assim. Acho que é importante para nós podermos levantar estas questões passando por elas. A mim custa-me imenso que o filme vá passar assim mas, definitivamente, prefiro fazê-lo, que se fale sobre isto e que se questione o facto de se estar a fazer isto.
Hoje Macau China / ÁsiaPequim | Português distinguido como DJ do ano [dropcap style≠’circle’]M[/dropcap]iguel Santos foi para Pequim estudar chinês na Universidade de Língua e Cultura, mas foi nos clubes nocturnos da capital chinesa que descobriu a sua vocação, tendo decidido já enveredar pela carreira de DJ. “Estou a tentar concentrar-me mais na música”, conta à agência Lusa DJ Nigls, como é conhecido na noite de Pequim. “Se calhar, terminarei o curso depois”, diz. O interesse de Nigls, 24 anos, pela música electrónica surgiu “através de amigos” e por influência do irmão. Há sete anos, estreou-se como DJ, mas foi só em 2012 que começou a tocar “a sério”, em estabelecimentos nocturnos de Wudaokou, a zona universitária de Pequim. Hoje, toca quase todos os fins-de-semana no Lantern, um dos mais emblemáticos clubes ‘underground’ da capital chinesa, situado junto ao Estádio dos Trabalhadores, ícone da arquitetura socialista, erguido em 1959 para celebrar o 10.º aniversário da China comunista. “A indústria da música electrónica na China não está ainda ao nível da Europa”, considera o DJ português, ressalvando que “está a crescer” e deverá lá chegar “dentro de cinco anos”. A chamada “vida nocturna” é uma indústria nova na China, mas que tem vivido um ‘boom’ nos últimos anos, com ‘nightclubs’ e bares a brotar rapidamente nas grandes cidades do país. “As pessoas têm necessidade de ter experiências novas e contacto com coisas diferentes”, afirma Nigls. Para o português, um dos “grandes obstáculos” ao desenvolvimento da música electrónica na China é a ausência da cultura do ‘dance floor’. No país asiático, a maioria das discotecas reserva pouca área para as pistas de dança, optando por preencher o espaço com mesas. “O público chinês aprecia a música e quer também dançar, mas um pouco pela sua cultura precisam sempre de ver uma pessoa a dançar e a sentir a música para se libertarem e não se sentirem envergonhados”, nota. Das raízes Nascido em Macau, Miguel Santos mudou-se para Portugal aos dez anos, mas decidiu voltar para a Região Especial Administrativa chinesa aos 16, para terminar o ensino secundário. Concluído o liceu, rumou a Pequim para estudar chinês na Universidade de Língua e Cultura, considerada uma “míni-ONU”, com cerca de 9.000 alunos estrangeiros. “Queria crescer como pessoa e ver o mundo de outra maneira”, diz. Nigls toca sobretudo Techno e House. O seu ‘set’ mais longo foi em Qingdao, cidade costeira do norte da China, onde tocou 12 horas seguidas. O truque para evitar o cansaço é sentir a energia do público, afirma. “Se estiveres a tocar e as pessoas entrarem na tua viagem e sentirem a tua música, tu sentes também a energia que te estão a transmitir e acabas por esquecer o cansaço”, explica. Nigls define a música electrónica como um “outro lado da música”, em que “qualquer ferramenta” pode ser usada para criar um som. “Há certos sons que se calhar nunca ouviste ou nunca pensaste que podiam ser enquadrados na música, mas o processo de produção de música electrónica passa bastante por isso: a experimentação com os equipamentos, para criar sons interessantes e trabalhares o produto final”, diz. O português foi considerado DJ do ano de Pequim pela revista City Weekend Beijing, uma publicação em língua inglesa voltada para a comunidade de expatriados na capital chinesa. Para Miguel Santos, um bom DJ deve ter “uma visão do dance floor” e conseguir “estudar as pessoas e a atmosfera do clube”. “É alguém que sabe conectar as pessoas na sua viagem musical e criar a sua história numa noite”, resume.
João Luz EventosConcerto | FIMM traz a Macau jovens estrelas da música mundial [dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] cartaz deste ano do Festival Internacional de Música de Macau está repleto de jovens talentos. Entre eles destaque para o pianista russo Lukas Geniusas, para a cantora norte-americana Jazzmeia Horn e para o artesão do vibrafone El Fog. O HM apresenta-lhe as propostas mais frescas do festival que arranca esta sexta-feira As revoluções musicais foram, quase sempre, protagonizadas por sangue novo que rompe com velhos conceitos. O Festival Internacional de Música de Macau (FIMM) tem no seu cartaz uma panóplia de jovens valores dos mais variados quadrantes musicais. Além do programa “Bravo Macao!” que tem como objectivo ser uma rampa de lançamento para os novatos talentos locais, destaque para o espectáculo de Masayoshi Fujita, o japonês sedeado em Berlim que em palco dá pelo nome de El Fog. Este é um dos destaques mais contemporâneos num cartaz pontuado pela música clássica. O músico experimental sobe ao palco do Antigo Tribunal no dia 13 de Outubro, para uma performance que leva o espectador numa viagem subtil a um mundo íntimo do vibrafone. Com uma gama de influências que vão do jazz à electrónica, El Fog é dono de um som evocativo e onírico para ouvir, preferencialmente, de olhos fechados. Num registo mais clássico, Lukas Geniusas apresenta o seu virtuosismo ao piano no pequeno auditório do Centro Cultural de Macau (CCM) no dia 27 de Outubro. O música russo/lituano irá interpretar um repertório com composições de Chopin, Ravel e Prokofiev. Oriundo de uma família de músicos, Lukas Geniusas começou a estudar piano aos cinco anos, impulsionado pela sua avó, uma professora do Conservatório de Moscovo. Voz de poder Num registo totalmente diferente, o cartaz do FIMM oferece ao público uma prenda de inestimável valor: a voz de veludo de Jazzmeia Horn, cantora norte-americana de jazz. Com apenas um disco na bagagem editado este ano, “A Social Call”, Jazzmeia Horn tem granjeado os elogios da crítica que vêm na cantora uma sucessora de Betty Carter, Sarah Vaughan e Nancy Wilson. A jovem de apenas 26 anos é daqueles fenómenos de tem no palco o seu habitat natural. Dotada de uma voz com grande amplitude, a cantora promete deliciar os melómanos no dia 29 de Outubro num concerto ao vivo na Fortaleza do Monte. Dois dias antes, a norte-americana dará um workshop na Fundação Rui Cunha onde os apreciadores do jazz cantado podem experimentar a prática da improvisação, assim como outras técnicas de interacção entre instrumentos e voz.
João Luz VozesTrompete [dropcap style≠’circle’]S[/dropcap]ou uma onda contínua de embalo cruel, quero encher todos os copos com whisky, os oceanos e sistemas de canalização com single malt e trazer substância caótica às vossas inócuas vidas. Sou olhos cerrados no sublime, capturados pela fantástica nota que destrói o mundo. Uma escala imprecisa de variados agudos e precoces graves, uns soltos, outros despidos, expondo melancolia ao sol, a caminhar para onde o vento escolher em direcção à arritmia de cósmicas tarolas. Sou um vibrato de dourados. Dou o remate entre saliva e vida, deslizo com o veludo do Chet e corto com as facas do Miles, sou trilogia oscilatória, um metal dourado erigido em direcção ao firmamento. Fixo as coisas no definitivo, transformo o momento numa fotografia de nota azul. Levo os exaltados Deans e Jacks a saltarem afirmativos num amplexo que embarca todo o tempo que os relógios são capazes de conter. Sou exaltação de metedrina, combustível para almas que rasgam continentes de costa a costa. Tenho carícias de cetim e vertigem de suor, aceito tudo o que o alcatrão me traz, sou o seu mais benevolente filho e amante. Vivo em sessões a preto e branco em caves do East Side, uma sépia alma, longos e sofridos dedos negros em mim a voar num indómito vento melódico. Sou o ultraje que matou Lee Morgan, demasiado ousado para chegar aos 30, estouvado e escandaloso maquinista do comboio azul. Que me perdoem os saxofones, mas vocês são a minha salada, o acompanhamento, os lençóis onde me espreguiço libidinosamente. Tenho estado calado, antecipação nervosa no bocal, à espera de uma abertura para trazer o abismo ao ritmo do contrabaixo. Sou o melhor que a vida tem para oferecer, autenticidade recheada de ingenuidade, sou uma prenda inesperada num dia triste. Bochechas em lua cheia, amendoins salgados e descida ritmada até à mais aguda nota abafada pela surdina numa noite tunisina. Como fui feliz e torcido naqueles duplos balões de ar, cercado por anticiclones de fumo e corações brutos, meu querido pai Dizzy, minha alada mãe Bird, percursores artísticos da luta por direitos civis dos negros. Miles nosso que estais no céu, santificado seja o vosso bop, tanto no Harlem como em Nova Orleães, venha a nós o beat e livrai-nos de Kenny G. Amen-doim. Salt Peanuts, errante e aos saltos, com ginga na anca, matreiro como uma sorridente hiena e mais ágil que qualquer metal de orquestra. A minha voz é o som que exclama: Sim! Que impele à fuga das triturantes maquinações do tédio, que arranca sorrisos demolidores a anjos sacanas. A minha campânula é a fonte de vida desbragada, a liberdade que esmaga a conformidade, a paisagem adequada à ferocidade dos amantes, um divino chafariz sonoro. Trago alucinações e corpos suados a caves escuras, um sentimento sacramental a tudo o que é transitório, o gosto do ferro na saliva. Sou o completo oposto da docilidade, a estrada que se abre para a viagem infinita sem qualquer vestígio de destino no horizonte. Venham os saxofones e o titubeante contrabaixo suspirar pelo Terror vindouro, pela estridência que vai da agonia ao êxtase num amplo ápice. Que a luz rompa a treva como nos primeiros clarões de Vermeer e na revolta das alvas ondas de Turner. Sou um veículo de dom, o pedaço de metal que faz a extensão do Homem até ao Cosmos, a transcendência numa escala de notas astrofísicas. Projecto delírio fulminante e o nascimento do cool, pedaços de Espanha e África trasladados através do Atlântico. Sou um milhão de olhos raiados de sangue, veias salientes, esgares gelados, a perdição da carne com um trio de pistões que nascem e se põem como o Astro. Transformo marginais em deuses, becos em catedrais, fome em abundância, silêncio em amor. Sou a Anunciação, as sete trompetas do Apocalipse que pintam tudo de preto depois de rompido o sétimo selo. Trago presságios de fim, declaro o óbito da humanidade, a tudo precedo e a tudo sobrevivo. Sou o céu e o inferno.
Sofia Margarida Mota Eventos MancheteEntrevista | Rui Vieira Nery, musicólogo É, desde 2012, o director do Programa Gulbenkian de Língua e Cultura Portuguesas. Rui Vieira Nery tem estado no território no âmbito do 12º. Congresso de Lusitanistas e acredita que a cultura, com o tempo, pode ter o lugar que merece nas prioridades políticas portuguesas [dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] seu interesse pela música não é de estranhar, dado o seu contexto familiar, mas acabou por se formar, inicialmente, em História. Porquê?Pois, sou filho de um grande guitarrista de fado, um dos melhores do seu tempo, o Raul Nery, e, como tal, cresci a ouvir fado em minha casa. A minha mãe era uma melómana apaixonada por música clássica. De uma maneira ou de outra, a música fez sempre parte, desde criança. Ao mesmo tempo, interessei-me sempre por história e, a par da minha aprendizagem como pianista, que foi como comecei, sempre me interessei por pensar a música numa perspectiva histórica. Quando fui fazer o curso de História, acabei por perceber que podia ser historiador sem deixar a música. Foi por isso que escolhi a musicologia histórica e acabei por fazer o doutoramento em Musicologia na Universidade do Texas. Deixei de tocar, deixei de ser intérprete, mas continuei sempre ligado ao universo da música, embora numa perspectiva mais historiográfica. Não tem saudades de tocar? Tenho muitas. Mas era muito exigente comigo e não teria gostado de continuar a tocar se não conseguisse chegar a um nível que considerasse satisfatório e, para o conseguir, teria de me dedicar inteiramente à prática instrumental, que não poderia acumular com o meu trabalho de musicólogo. Tive de fazer uma opção e escolhi aquilo que achei que poderia fazer melhor. Mas custa-me muito e sinto muito a falta de fazer música. Uma das suas obras tem que ver com o encontro de culturas no mundo, “O Vilancico Português do Século XVII: Um fenómeno Intercultural”. Esta multiculturalidade de que hoje em dia tanto se fala já vem de há muito. Sim. Uma coisa que é característica do processo de globalização em que as chamadas Descobertas portuguesas se inserem é o encontro de culturas. Portugal levou consigo uma matriz cultural europeia e depois encontrou, nos vários lugares a que chegou, culturas vivas e ricas. Ao contrário de outros países que estiveram em expansão colonial nesse período, Portugal incorporou muitas das componentes dessas culturas que foi encontrando na sua própria cultura. Costumo dizer que somos uma cultura eminentemente mestiça e que essa é uma das características mais individuais da cultura portuguesa. Essa capacidade de experimentar outras canções, outras danças, outros temperos e outros namoros. Daí nascem muitas manifestações culturais e artísticas que são o resultado desse diálogo intercultural. Isto acontece logo a partir do séc. XVI. O estudo a que se refere é sobre o vilancico religioso desta altura em que temos cantigas em português, espanhol e em crioulo, cantadas na igreja, mas compostas por compositores portugueses de formação, digamos, “clássica”, que incorporam ritmos, melodias e danças populares de África e do Brasil. Temos também um exemplo mais acabado e mais moderno que é o próprio fado. Começa por ser uma dança cantada afro-brasileira, depois é apropriado pelos portugueses e transformado num fenómeno puramente nacional. O fado é “nosso”? Claro que é nosso. As primeiras manifestações que encontramos descritas e que tratam do fado são do Brasil, do início do séc. XIX. As primeiras manifestações da prática documentada em Portugal são já da década de 1820/30 e tudo indica que esta dança cantada, como muitas outras que foram chegando a Portugal ao longo dos séculos XVII e XVIII, foi apropriada pela cultura popular de Lisboa e foi transformada localmente. Costumo dizer que se um brasileiro tivesse chegado a Portugal em 1850 e visse cantar e dançar o fado em Lisboa perguntaria: ‘Mas o que é que eles estão a cantar e a dançar?’ Ou seja, Portugal apropria-se deste fado e fez dele uma manifestação puramente portuguesa. Integra este Congresso de Lusitanistas dedicado à língua portuguesa e à cultura de língua portuguesa e que, cada vez mais, se alarga a várias expressões. Penso que a Associação Internacional de Lusitanistas (AIL) tem tido uma preocupação em alargar o seu âmbito e passar do estudo da linguística e dos estudos literários em português para um estudo das várias culturas de expressão portuguesa. A língua não existe no vácuo, mas sim como um veículo de comunicação e de cultura. A língua é a comunicação do dia-a-dia, mas também é a poesia, a prosa, o cinema, o teatro e, de certa maneira, marca o nosso olhar sobre o mundo. As artes plásticas feitas por uma comunidade que fala português estão marcadas por um olhar que também tem a influência da língua e das suas estruturas. Como tal, faz sentido que não estudemos apenas a comunicação oral e escrita e que se veja, cada vez mais, o português como um veículo de culturas. Uma das coisas mais interessantes no caso do português é, precisamente, a riqueza e a variedade dessas muitas culturas a que serve de base. O português transformou-se num grande mosaico de expressões culturais diferentes, umas vezes concordantes, outras vezes em conflito, mas todas elas enraizadas na mesma língua. A AIL e os seus congressos seguem essa tendência. Estamos no final do encontro. Qual o balanço que faz? É um balanço muito positivo. Em primeiro lugar, pelo próprio facto de termos vindo para Macau. O último congresso foi em Cabo Verde e era muito importante que a AIL fizesse um congresso agora na Ásia, porque isso é a universalidade da própria língua portuguesa e da vitalidade destas comunidades que falam português. Por outro lado, e independentemente do lugar em que o congresso se faz, o nível científico é muito elevado. Estamos perante investigadores de múltiplas nacionalidades com um alto nível de pesquisa, de reflexão científica e de produção intelectual, e estamos aqui, a partir da língua portuguesa, a discutir questões de grande actualidade, podemos mesmo dizer questões de ponta, no debate científico internacional. Pode dar alguns exemplos dessas questões de ponta? A questão da própria diversidade cultural, do diálogo intercultural, da cultura como um veículo de inclusão ou de exclusão social. Tudo isto são questões muito importantes. A questão da ligação entre cultura erudita e cultura popular. São aspectos que estão na agenda dos estudos culturais em todo o mundo, e que nós aqui estivemos a discutir a partir da língua portuguesa e das culturas de expressão portuguesa. Como é que vê o valor da língua portuguesa para a China? É um valor óbvio. A China tem vindo a emergir como um grande parceiro geopolítico, cultural e económico à escala planetária. É muito importante estreitar, cada vez mais, as relações entre a cultura ocidental e a cultura chinesa porque somos parceiros naturais, digamos que numa nova ordem mundial que seja sustentável, justa e equilibrada. A aposta que a China faz no desenvolvimento do estudo da língua portuguesa é muito importante. O Governo Central definiu como prioridade importante o estudo e a promoção do português, e Macau, dentro dessa perspectiva, tem um papel de plataforma fundamental. O território é, naturalmente, um espaço de articulação. Macau tem um conjunto de instituições de ensino superior de grande qualidade e o Instituto Politécnico, em particular, tem feito um trabalho extraordinário. Estamos no bom caminho. A língua e o seu ensino podem ajudar-nos a descobrir as culturas de outras partes e de outras áreas. Para a semana vou estar no Congresso Mundial das Humanidades em Liége, na Bélgica, e é presidido por um investigador chinês. Este fenómeno está cada vez mais a suceder. Já há uma representatividade da investigação chinesa? A investigação chinesa é gigantesca e só por ignorância é que tem havido esta espécie de separação artificial entre o mundo académico europeu e norte-americano, por um lado, e o mundo académico chinês. Só temos a ganhar, de um lado e do outro, com a troca de experiências e de sabedorias. Temos um futuro muito entusiasmante nesta descoberta mútua e penso que o português pode ser um dos veículos nessa comunicação. Temos um espaço de língua comum que junta estas valências e que faz a ponte com esta realidade tão importante como é a realidade chinesa, o que acho muitíssimo positivo. Estamos perante um tempo áureo da língua portuguesa? Estamos a atravessar um período difícil para o planeta. Difícil em termos da paz mundial, em termos da justiça social, da sustentabilidade ecológica. Mas dentro desse quadro, que tem muitos elementos preocupantes, a entrada clara da China nas inter-relações à escala global é um factor muito positivo para a paz e para o desenvolvimento. Neste sentido, há perspectivas muito entusiasmantes de futuro, se todas as partes se souberem relacionar e encontrar caminhos partilhados. Está neste congresso a representar a Fundação Calouste Gulbenkian, um nome maior na cultura em Portugal. Como é que está a cultura portuguesa? Tem aspectos muito positivos, sendo que o principal é a grande quantidade de jovens agentes culturais que foram formados nas últimas duas, três décadas. Parece um lugar-comum, mas temos possivelmente a geração com maior número de profissionais da cultura com formação avançada. Naturalmente, aumenta a massa crítica e aumenta também o topo de gama dessa massa crítica. Temos, como nunca tivemos, um grande número de artistas, de escritores, de músicos, de investigadores nas áreas culturais. Este é o lado positivo. O lado negativo é o facto de a sociedade portuguesa ter dificuldade em encontrar formas de acolher essas novas gerações de profissionais da cultura e de lhes dar oportunidades de aplicarem a formação especializada. Acredito que, pouco a pouco, vamos tendo mais consciência da importância que este sector tem para o desenvolvimento global do país. Não é um luxo, não é um objecto decorativo para o qual se olha depois de se tratarem das coisas “importantes”. É parte das coisas importantes. É um factor de desenvolvimento essencial. Diria que, em termos das políticas públicas para a cultura, ainda há muito que fazer. Precisamos de mais orquestras, de mais teatros, de mais apoios para o cinema, de mais galerias de exposição, de mais oferta cultural à população em geral. É disso que estamos a falar: oferecer o acesso à cultura aos cidadãos, o que é uma obrigação constitucional. Tudo isso existe, penso, numa escala muito pequena em relação àquilo que seria o potencial do país. Hoje em dia fala-se muito da marca Portugal. É reconhecida internacionalmente em grande parte pelo impacto da cultura. Pelo cinema que ganha prémios em todos os festivais, pela música que faz um enorme sucesso em todo o circuito da world music, pelos escritores portugueses já traduzidos em muitas línguas, pelos sapatos que têm um design original e criativo. Já são efeitos da transferência da área artística para a área económica. Estamos a falar de factores de desenvolvimento essenciais para o país e que precisam de maior investimento na esfera cultural para depois terem esse impacto reprodutor. Mas sou um optimista por natureza e acredito que os próprios cidadãos irão ter, cada vez mais, noção desta necessidade de cultura e irão passando isso para as esferas de decisão política.
Victor Ng Perfil PessoasKane Ao Ieong, cantor | Cidadão Kane [dropcap style≠’circle’]S[/dropcap]eguir uma fantasia e concretizá-la é algo que não está ao alcance de todos. Kane Ao Ieong é uma das pessoas que leva exactamente a vida com que sonhou desde que era miúdo. “Quando estudava na escola secundária queria muito ser cantor”, lembra o jovem de 23 anos. Para concretizar a aspiração que tinha desde tenra idade, o artista local começou a participar em vários concursos de canto e a habituar-se a pisar o palco. Mas a paixão pela música era uma evidência bem antes de se atrever a subir a um palco ou a entrar em competições de canto. O pai de Kane Ao Ieong trabalhava junto de um local com karaoke. Portanto, a visão de pessoas a pegar no microfone a lançar-se em versão de canções populares foi algo que sempre esteve presente no quotidiano do jovem. Passou a ser uma ocupação de tempos livres, sempre que podia insistia com a família para o levarem a cantar no karaoke. O hábito rapidamente tornou-se paixão, com uma forte tendência a transformar-se num modo de vida. Para dar forma a este sonho, o jovem decidiu que, para levar as coisas mais a sério, teria de ter aulas de canto, uma condição essencial à evolução que projectava. Através dos concursos de canto em que entrou em Macau, foi conhecendo mais cantores e artistas locais, pessoas com aspirações e sonhos semelhantes. Hoje em dia, Kane Ao Ieong é cantor a tempo inteiro e o seu projecto musical levou-o a assinar contrato com a editora Easy Music. As sonoridades nas quais se gosta de expressar são muito assentes no R&B e nas influências da pop da Coreia do Sul. O jovem de Macau ainda se dedica à representação e à música clássica e, numa perspectiva mais contemporânea, anima festas como MC. À medida que a sua carreira avança, Kane enfrenta “o stress da necessidade de ter de evoluir e chegar a palcos maiores”. O artista considera que Macau é uma terra com grande margem de crescimento no que toca às artes de palco, mas é difícil furar e chegar a mais gente. Até bem recentemente achava que havia poucas oportunidades para os cantores locais encontrarem o seu espaço num panorama musical muito pequeno. Nesse aspecto, Kane é da opinião que “o desenvolvimento do sector da música em Macau é muito limitado, funciona de uma forma muito lenta”. Ainda assim, o jovem cantor está contente porque sente que cada vez mais a população da cidade aprecia as vozes dos artistas locais. Apesar de a abertura ser progressiva, os projectos musicais de Macau começam a ter público. Aula coreana Numa tentativa de acrescentar algo às suas performances, Kane Ao Ieong fez-se à estrada e partiu para a Coreia do Sul para estudar canto e dança. O artista considera que os coreanos estão no caminho certo no que à música pop asiática diz respeito. “Nos últimos tempos o público de Macau, Hong Kong e Taiwan, virou-se para a música coreana”, revela. No entendimento do cantor, este fenómeno de popularidade deve-se ao profissionalismo da produção musical da Coreia do Sul, que exporta artistas e bandas de grande qualidade. “O meu objectivo é cantar cada vez melhor, juntar a dança à minha música e trazer o que há de bom da pop da Coreia do Sul para Macau”, projecta Kane. Os tempos que passou em solo sul coreano fizeram-no enfrentar carências de interpretação que tinha, além de o terem despertado para o papel da dança num contexto pop. A experiência foi tão enriquecedora que o jovem de Macau pondera visitar outro país com a finalidade de ir buscar influências exteriores e evoluir como performer. Um dos frutos da sua passagem pela Coreia do Sul é a colaboração que tem na forja com uma rapper coreana que espera que venha a acrescentar algo novo no contexto do panorama musical de Macau. Kane Ao Ieong vê neste projecto uma oportunidade para colocar cá fora tudo o que aprendeu na formação que teve e dar um novo rumo à música que tem vindo a fazer. Ou seja, dar ritmo às melodias mais lentas e emocionais que têm dominado o seu repertório. O resultado desta coligação musical deve estar concluído ainda este ano e será um novo passo na carreira de Kane Ao Ieong.
Hoje Macau PolíticaRádio Macau – “Acordar” “Acordar” Não parti, mas já não sei voltar. Ando às voltas a esquecer quem sou. Bebo a noite até o Sol chegar. Ele sempre me encontrou. Só o Amor me faz correr. Só o Amor me faz ficar. Só o Amor me faz perder. Só o Amor me faz querer mais. Não sei viver sem ter de viver. O que me dão já não sei gostar. Não se perde o que não se quer ter. Cada vez mais sem esperar. Só o Amor me faz correr. Só o Amor me faz ficar. Só o Amor me faz perder. Só o Amor me faz querer mais. E se for a primeira vez, que os teus dedos tocam a luz da manhã. Dá-me a tua mão. Respira o ar do dia. Talvez nada mais. Rádio Macau XANA, FLAK, ALEX, FILIPE VALENTIM, SAMUEL PALITOS e RICARDO FRUTUOSO
Hoje Macau PolíticaBárbara Eugenia e Tatá Aeroplano – “Dos Pés” “Dos Pés” O vento leva para tão longe Bem distante Aqui tão perto Muito perto Estão seus pés e só Tenho pés, tenho dedos Tenho plantas Tenho planos Minha vida Onde foi Minha memória Não te peço nenhum risco Nenhum giz Só o seu amor Nas ruas passeiam os pés Os pés que pisoteiam o asfalto não são meus Não são meus, nem são seus Os seus andam com os meus Curvas retas e até ladeiras O nosso andar vai junto Porque os meus pés são os seus E os seus estão nos meus Pés. Barbara Eugenia e Tatá Aeroplano
Hoje Macau PolíticaRita Red Shoes – “Mulher” “Mulher” Sou mulher E contra mim o que vier É bem vindo se trouxer Igualdade e desalinho Sou mulher Sem vergonha de vencer Eu aprendo a viver E não mudo o meu caminho Sei dizer o que quero E o prazer ganha força Eu não minto mas desarmo Sei mostrar o que sinto E lutar corpo a corpo Eu não minto e não escondo Que o desejo é maior Que o medo Sou melhor E agarro o que vier Boca a boca Sem esquece O baton e o meu destino Sem gemer vou colher-te E querer dar-te um nome Ao morrer vou chamar-te Meu menino Rita Redshoes
Hoje Macau EventosFestival Eurovisão da Canção | Salvador Sobral faz história O português Salvador Sobral conseguiu a primeira vitória portuguesa no Festival Eurovisão da Canção com recordes de pontuação. O cantor interpretou “Amar pelos dois” e conquistou a Europa com uma postura real e música sentida [dropcap style≠’circle’]“E[/dropcap]u quero que o Salvador Sobral ganhe o festival da Eurovisão. Ele é bom demais”, foram as palavras de Caetano Veloso num vídeo que publicou no Twitter enquanto via, no passado sábado, o Festival Eurovisão da Canção. Salvador Sobral ganhou, e conseguiu a primeira vitória de Portugal no festival europeu. Mais tarde, dizia, que estas palavras foram mais importantes do que galardão. Salvador Sobral cantou em português, “Amar pelos dois”, com letra e música de Luísa Sobral, sua irmã, e obteve 758 pontos na votação combinada dos júris nacionais e do público, na final do festival disputada por 26 países em Kiev, na Ucrânia. Após a vitória, Sobral sublinhou que a “música não é fogo-de-artifício, é sentimento” e que “vivemos num mundo de música descartável”, apelando para uma mudança. “Vivemos num mundo de música descartável, de música ‘fast-food’ sem qualquer conteúdo. Isto pode ser uma vitória da música, das pessoas que fazem música que de facto significa alguma coisa. A música não é fogo-de-artifício, é sentimento. Vamos tentar mudar isto. É altura de trazer a música de volta, que é o que verdadeiramente interessa”, disse nas primeiras declarações após a vitória. Mais tarde, em declarações à RTP, Salvador Sobral sublinhou tratar-se de “uma boa vitória também para a música no geral”, apesar de saber “que estas coisas são muito efémeras, estes concursos, amanhã já ninguém se lembra”. “O importante é continuar a fazer música, mas sinto que é um bom passo que as pessoas tenham gostado desta música, que tem tanto conteúdo, emocional, lírico, melódico, acho que isto pode ajudar de alguma maneira, se calhar até nos anos próximos a Europa a trazer músicas com um bocadinho mais de significado a todos os níveis”, afirmou o cantor. Questionado pelo apresentador José Carlos Malato sobre se esta vitória significa a entrada do cantor na história, Sobral disse não querer pensar nisso, recordando a digressão que tem agendada para os próximos meses, com concertos a partir do próximo sábado em Marco de Canavezes, seguindo-se o Cartaxo (26 de Maio) e Ovar (27 de Maio), antes de prosseguir a 10 de Junho em Ílhavo com datas que continuam até Agosto. Politicamente incorrecto Salvador Sobral, face a uma pergunta sobre o apelo que fez de apoio aos refugiados na conferência de imprensa que se seguiu à primeira meia-final, disse não pretender acrescentar nada ao que já havia afirmado, mas realçou que transmitiu uma mensagem sobre os refugiados por acreditar ser o maior problema com que a Europa se confronta actualmente, sem querer ser político. “Recebemos um e-mail da organização a dizer que não podia continuar a usar aquela camisola [que dizia ‘SOS Refugiados’]”, explicou, por não serem permitidas mensagens políticas ou comerciais: “Pensei que era estranho. E se vestir uma camisola da Adidas, é uma mensagem comercial? Era apenas humanitária. Já disse tudo o que tinha a dizer, não penso que deva apertar o mesmo botão outra vez”. Sobral, que disse nunca ter escrito uma canção com o propósito de passar na rádio, frisou que a sua vida não vai mudar em nada e que vai prosseguir com a digressão prevista para este Verão. “Nunca quis saber dos votos, só quis cantar uma canção bonita como ela é”, declarou. Durante a conferência de imprensa, o supervisor executivo da União Europeia de Radiodifusão, Jon Ola Sand, enalteceu o trabalho da organização local em Kiev e disse que a preparação para 2018, em Portugal, começa “já na segunda-feira”. O inquieto Salvador Sobral publicou “Excuse me”, o seu disco de estreia, há um ano, cruzando referências de uma vida, que provam o seu modo inquieto de viver a música, do jazz de Chet Baker aos clássicos brasileiros de Dorival Caymmi. Tinha 26 anos, era um desconhecido, não mais do que o irmão de Luísa Sobral, e um rosto perdido na memória de edições de concursos de talentos vocais, há muito desaparecidas. O cantor nasceu em Lisboa, em 1989, ouvia música desde criança e, numa entrevista recente ao El País, recordou as viagens em família, as canções partilhadas com os pais, dos Beatles, dos Genesis, de Simon & Garfunkel e John Lennon, sobretudo clássicos dos anos dos anos 1960/70, e as harmonias feitas com a irmã. Dedicou-se a um curso de Psicologia e a um Erasmus em Maiorca. Para ganhar dinheiro, começou a cantar em bares. E foi aí que tudo mudou. Descobriu Chet Baker, através de um guitarrista argentino com quem cantava: “Deslumbrou-me. Parecia uma angústia misturada com esperança, com melancolia, tudo numa só pessoa. Identifiquei-me totalmente com ele e com o seu estilo”, disse na entrevista ao jornal espanhol El País, publicada no passado dia 16 Abril. O curso de Psicologia deu lugar ao de Música, e Maiorca a Barcelona, onde, em 2014, começou a actuar com a banda Noko Woi, com quem participou no festival Sonar. Um ano mais tarde seria uma voz na programação dos festivais Mexefest e, no seguinte, entraria no Cool Jazz. Entre a vitória em Lisboa e a vitória em Kiev, a actuação de Salvador Sobral teve impacto nos meios internacionais de comunicação. Surgiu na TVE a cantar com o concorrente espanhol, foi entrevistado pelo El País, chegou às páginas do El Mundo, do Daily Express, do The Sun. A agência France Presse definiu-o como “o ‘crooner’ português de coração demasiado grande”. “Sou um inquieto musical, preciso de ter muitos projectos em simultâneo. Estou a preparar um disco de boleros em jazz. É uma dor de cabeça ter tantas facetas. Acabarei por ter tantos heterónimos como Fernando Pessoa”, garantiu ao El País. • REVEJA A PARTICIPAÇÃO DE SALVADOR SOBRAL NO FESTIVAL EUROVISÃO DA CANÇÃO
Sofia Margarida Mota Eventos MancheteTeté Alhinho, cantora: “Nós nascemos com a música” A cantora de Cabo Verde Teté Alhinho sobe hoje ao palco do Teatro D. Pedro V para dar a conhecer o seu último disco, “Mornas ao Piano”. Pela primeira vez no território, a convite da Associação de Divulgação da Cultura Cabo-verdiana, fala ao HM da sua relação com a música e com a terra que lhe deu o ritmo e o sentir [dropcap]O[/dropcap] seu site de apresentação começa com “Nasci ao som das ilhas e delas herdei o ritmo e o sentir”. O que é nascer ao som das ilhas, como são o seu ritmo e o seu sentir? O ritmo das ilhas não é o mesmo do continente. Temos mar por todos os lados. Os sons são muito diferentes, até porque só esta presença de mar também o é. O vento também vem com diferentes sons. Vem, ora de um lado, ora do outro. Claro que é uma forma também metafórica para situar o lugar onde nasci e, talvez, porque é que sou como sou. Os ilhéus também têm um ritmo especial de vida, e dão uma forma diferente de ser a Cabo Verde, que tem uma forma de sentir muito peculiar. De sentir a música, por exemplo, porque é um país muito musical. Que particularidade é essa? Porque somo ilhéus, temos sempre uma necessidade de partida, de procurar o mar. Temos esse instinto, o de ir e depois voltar. É o mar que nos leva e é o mar que nos traz. Também somos, penso, mais abertos e receptivos a muita coisa. O mar também nos traz muita gente de diferentes latitudes. Sou da Ilha de S. Vicente, cujo Porto Grande trouxe sempre muitas pessoas de várias nacionalidades. Uns ficam, outros não, e isso cria uma certa abertura de mente que acho que o cabo-verdiano tem. Não é uma mentalidade local, fechada, é aberta ao novo, mas também muito ciente do que é seu. Por outro lado, e falando da musicalidade local, nós nascemos com a música. É a mãe que canta, é a empregada que canta, é a dança que aparece desde o colo da mãe. Eu cresci assim: com uma mãe que gostava de cantar. O meu pai também gostava muito de música e tínhamos uma aparelhagem em casa. No Mindelo sempre houve a presença constante da música. Não tinha por onde fugir. Tivemos também um piano em casa e era a nossa diversão lá em casa. Ao falar de Cabo Verde é quase impossível não nos remetermos para a morna. Vamos ter um concerto de mornas ao piano. O que é para si a morna de Cabo Verde? É a expressão geral e comum de todo o cabo-verdiano. O barlavento tem os seus ritmos e o sotavento tem outros. A morna fez-se sempre mais em S. Vicente e Boa Vista. A morna, penso, foi a forma que encontrámos para traduzir a nossa nostalgia provocada pela distância. O cabo-verdiano sempre emigrou e com isso nasce a saudade: com as partidas, as tristezas, as perdas e o amor, claro. Já dizia o Baltazar Lopes que acelerando a morna chegava-se à coladeira. A coladeira acabou por ser um ritmo que veio tirar um pouco da melancolia associada à morna. É um ritmo que começa já a tratar de outras coisas, como o quotidiano, a crítica social e um pouco de sátira. Costumo dizer que a morna é um sentir comum cabo-verdiano. Como é que aparece o piano associado à morna? Normalmente a morna é associada à guitarra porque se trata de um instrumento barato. Mas a morna também se tocava ao piano em Cabo Verde. Se recuarmos no tempo, encontramos grupos que usavam o piano. Em S. Vicente, em particular na Rua de Lisboa, havia o Café Royal que tinha um piano. Todos os que tocavam piano paravam ali e era um instrumento que se ouvia sempre, até porque Mindelo era muito pequenino. Este disco acabou por ser uma coisa natural. O piano para mim sempre existiu na música de Cabo Verde. Não com a mesma expressão da viola, a que chamamos violão, mas sempre existiu. Daí este projecto “Mornas ao Piano”. A sua carreira também passou por um projecto dedicado a crianças com o disco “O Menino das Ilhas”. Como é que apareceu esta vertente? Eu adormecia os meus filhos a cantar. Ao cantar ia compondo alguns temas para crianças e ia guardando essas canções. Quando regresso a Cabo Verde em 1991, não havia nada para crianças. Temos um cancioneiro que é herdado e não é, realmente, nacional. Há algumas canções, mas dirigidas mais para a dança infantil. Pensei que fazia falta um trabalho para os mais novos e eu tinha três filhos pequenos. Foi assim que um dia me levantei e disse: vou gravar um disco para crianças. A partir desse dia, o disco nasceu. É um trabalho de que gosto muito também porque está muito ligado aos meus filhos. Também trabalhou com a sua filha Sara. Neste disco a Sara trabalhou comigo em três temas. Depois continuámos a colaborar. Sempre a vi como uma miúda muito entoada desde pequena e sempre tentei estimulá-la para a música. Fizemos um disco depois que se chama “Gerações” por ter esse sonho, o da filha que seguisse a música e que pudesse fazer aquilo que eu não tinha conseguido. Nascemos em épocas diferentes. Ela podia ter feito, por exemplo, uma carreira para crianças. Mas acabou por ir estudar para as Canárias e escolheu outras prioridades. Que música é que ouve e a inspira? Ouço música quando tenho tempo. Gosto de ouvir de tudo um pouco. Gosto muito de ouvir Bana e da Cesária. Gosto dos artistas mais modernos, mais jovens. Gosto da música instrumental cabo-verdiana. Quando tenho tempo levanto-me e ponho música, alguma que também possa dançar um bocadinho. Gosto especialmente da Cátia Guerreiro e do Jorge Palma. Ofereceram-me uns CDs do Sérgio Godinho que oiço para o descobrir. O Sérgio tem de ser descoberto. Depois também gosto muito da Ella Fitzgerald. Gosto de música. O que é cantar para si? Tem sido diferentes coisas em diferentes momentos. Em pequenina comecei a dançar. Depois o cantar começou a estar associado à minha casa, aos meus irmãos, ao piano que tínhamos, à alegria. Aliás, cantar é sempre uma alegria e canto mais quando me sinto bem. Depois foi o despertar, a partir dos oito anos. Foi um descobrir-me para a música, para o facto de conseguir e saber cantar. Era sempre uma coisa muito boa. Com o 25 de Abril, o cantar foi uma forma de eu também participar no movimento pró-independência. Tinha cerca de 17 anos nessa altura e era o cantar de músicas de protesto e luta. Foi a minha contribuição para o processo de independência e de reivindicação dos direitos do nosso país. Depois fui para Cuba e cantar era já um processo e manifestação cultural daquilo que era Cabo Verde. Passei pelo México e vou para Portugal já com três filhos. Cantar foi então para mim um escape muito grande. Tive três filhos em três anos e meio, o que fez com que tivesse vivido muitos anos seguidos entre casa, fraldas e comida. Sou também licenciada em Educação Física e ia trabalhar, aliás precisava de o fazer. Mas começava a precisar de mim porque, no meio disto tudo, eu tinha desaparecido. Essa necessidade de mim acordou-me. Tinha de fazer alguma coisa e decidi gravar um disco. Vesti-me, nunca me vou esquecer, com uma saia azul, uma blusa branca e uns sapatos azuis da tia Alice, meti-me a caminho e fui aos Olivais ver o Péricles Duarte. Ele aceitou, foi ver as músicas que tinha, falou com o Paulino Vieira, começámos a ensaiar e foi assim que nasceu o “Mares do Sul”, nos estúdios da Valentim de Carvalho. É um disco pelo qual eu tenho um grande apreço porque representa um marco. Foi tornar a ganhar um pouco o meu espaço que estava todo tomado pela família, que era a minha prioridade. Nunca deixei de fazer música a partir desse momento. Agora, a música é essencialmente comunicação. É o resultado de tudo o que vivi. É o poder expressar o que sinto. É a consolidação de todo este crescer. É o partilhar as minhas composições, o meu sentir e aquilo que a própria música representa. A música consegue o que nada mais consegue, consegue ser universal. Acho que cria uma confluência de sentimentos e uma união. Muita gente diz-me que não entende as palavras, mas que sente o que ouve. Acho que a música é capaz de ir muito longe. A música limpa. Acredito que a arte em geral – e a música em particular – é a grande esperança da Humanidade. Por outro lado, é um retorno de tudo o que tenho feito na vida. Não digo que seja tardia, mas é antes o resultado das minhas escolhas e é também o que me resta para preencher o que ainda tenho para viver. Também me provoca encontros com outras pessoas e com outros lugares. A música permite-me ter boas memórias.
Isabel Castro EventosMúsica | Conferência em Lisboa sobre instrumentos chineses A capital portuguesa recebe, a partir de hoje, especialistas em etnomusicologia para dois dias de sessões sobre instrumentos e música chinesa. Pretende-se sensibilizar a academia do país para a importância das sonoridades que nasceram a Oriente [dropcap style≠’circle’]P[/dropcap]elo segundo ano consecutivo, por iniciativa do Centro Científico e Cultural de Macau (CCCM), Lisboa é palco de uma conferência sobre música chinesa e instrumentos chineses. A série de palestras começa hoje e conta com a participação de etnomusicólogos e investigadores de renome internacional. Entre os convidados está o presidente do Instituto Cultural de Macau, Leung Hio Ming, antigo director do conservatório local e músico de formação. Na edição deste ano, há dois instrumentos homenageados: o ‘sheng’ e o ‘guqin’. “São dois ícones da música clássica chinesa, da música imperial, duas espécies que sobrevivem há mais de três mil anos na sua forma original”, contextualiza ao HM Enio de Souza, responsável pelo serviço educativo do Museu do CCCM. “O gujin, de cordas dedilhadas, é Património da Humanidade desde 2010.” A história destes dois instrumentos chineses é um dos temas da conferência, que abrange outras questões, da notação musical da China antiga ao xamanismo e ao taoísmo. Vai ainda falar-se da produção discográfica durante o período da Revolução Cultural e do património cultural intangível na República Popular da China. Macau também é motivo de reflexão, com intervenções sobre as infra-estruturas culturais do território nas décadas de 1980 e 1990, e o ensino e a performance da música chinesa em Macau. Aberta a todos os interessados, a iniciativa tem como principal alvo a academia portuguesa. Procura-se, sobretudo, criar um debate em torno da importância da música chinesa. “Um dos grandes objectivos é sensibilizar a academia portuguesa para a importância de ter como disciplina a música e a organologia chinesa, e também a música asiática”, explica Enio de Souza. Do outro mundo Residente em Macau entre 1983 e 1999, Enio de Souza tem entre as suas principais metas, no trabalho no Museu do CCCM, a sensibilização para a música e os instrumentos chineses. Em 2003, o responsável criou um ateliê de instrumentos musicais chineses para escolas e público em geral. Na altura, contava com “algum domínio” na matéria que adquiriu durante os anos passados em Macau e com um acervo museológico de 42 espécies de instrumentos musicais chineses. Rapidamente se apercebeu do quão invulgar era a iniciativa, num país em que a música chinesa era uma realidade desconhecida. “Comecei a aperceber-me de que não havia estudos sistemáticos sobre organologia chinesa em Portugal. Não há nenhuma cadeira nas universidades que têm departamentos de música ou de etnomusicologia relacionada com música e instrumentos chineses”, observa. Quando começou a investigar o tema, chegou à conclusão de que em Portugal não havia, de facto, “nenhum musicólogo ou etnomusicólogo que alguma vez se tivesse debruçado sobre música e instrumentos musicais chineses”. Foi precisamente para colmatar esta falha que Enio de Souza decidiu avançar com estas conferências de Lisboa, a par do restante trabalho que vai desenvolvendo no CCCM. Hoje em dia, começa a haver algum interesse no âmbito da musicologia histórica e da etnomusicologia viradas para Oriente. “Já há alunos de doutoramento a trabalharem, já há teses de mestrado sobre a Orquestra Chinesa de Macau, outros estudantes universitários que também se começam a debruçar sobre esta matéria”, aponta. Preparar público Depois do “grande sucesso” das palestras do ano passado, a iniciativa deste ano serve ainda para preparar terreno para o que aí vem: em Maio do próximo ano, o Centro Científico e Cultural de Macau recebe a edição 21 da Conferência da European Foundation for Chinese Music Research (CHIME). “Para uma conferência desse nível, com mais de uma centena de participantes internacionais, tem de haver um público minimamente preparado. Vêm musicólogos e etnomusicólogos do mundo inteiro”, avança o responsável. Enquanto o encontro da CHIME não se realiza, debate-se por estes dias em Lisboa a importância e a razão social dos instrumentos musicais chineses, porque é que fizeram determinado tipo de composições, a quem eram destinadas e como surgiram. A conferência de Lisboa é uma organização conjunta do CCCM, do Instituto de Etnomusicologia – Música e Dança da Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa, e do Instituto Confúcio/Universidade de Lisboa, com o apoio científico garantido pela CHIME. A iniciativa conta ainda com o apoio do Museu Nacional da Música e do Instituto de Medicina Tradicional, sendo que tem como patrocinador principal a Fundação Jorge Álvares.
Hoje Macau EventosFelipe Fontenelle apresenta novo álbum em Portugal [dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] músico brasileiro Felipe Fontenelle, radicado em Macau, acaba de lançar um novo trabalho discográfico. Intitulado “M de Memória”, o disco tem como single de lançamento “Deus Também Sorri”, sendo, no seu todo, “um trabalho recheado de surpresas [onde] não faltam detalhes com ecos do seu percurso de vida entre o Brasil, Portugal e Macau”. A música “Deus Também Sorri” será apresentada na próxima quarta-feira em Lisboa, estando já agendados espectáculos noutras cidades do país. O single de estreia do novo trabalho conta com letra de António Ladeira, tendo sido produzido no Rio de Janeiro, Brasil. “Gravado com a velha guarda do Samba e da Bossa Nova, traz-nos um ‘cheiro’ moderno de outros tempos. Essa foi também a inspiração para o videoclip de apresentação de ‘Deus Também Sorri’, realizado por Pedro Varela (Os Filhos do Rock e A Canção de Lisboa)”, aponta um comunicado enviado pelo músico e compositor. O novo trabalho de Felipe Fontenelle, que em Macau tem estado ligado a projectos da Casa de Portugal em Macau, constitui “uma viagem ao passado entre memórias de infância”, onde existem “os vinis dos seus pais no apartamento da Paulista, em São Paulo, e os textos de autores que marcam a literatura portuguesa”. “M de Memória” tem o poeta Fernando Pessoa, “que dá corpo a cinco músicas originais”, tendo ainda participações de nomes como Cristina Branco, Joana Espadinha e António Ladeira (letrista de Stacey Kent). O disco conta com a colaboração de diversos músicos que já tocaram com Chico Buarque ou Cesária Évora. É, portanto, “um disco melodioso e cheio de emoções que nos surpreende com conversas de família e, até, algum dialecto macaense”. Após um percurso musical em Portugal e no Brasil, Felipe Fontenelle gravou, em Macau, em 2015 e 2016, os discos “Tributo a Macau”, “Pessoa” e “Rua 25 de Abril”, este último com a banda Sunny Side Up.
Hoje Macau PolíticaTurtle Giant – “Golden Summer” “Golden Summer” She’s a cold and silent lover Walks beneath the summer rain Lives between the sad and lonely Breathes the fire to feel no pain Gone away! Happy day Through the fields of Golden Summer Where the fog has gazed the war Had to bury me from crying All that’s left has gone ashore Gone way! Happy day Your heart, together and apart You life is all that shines above Your blues has filled my empty shoes Your God, have you forgot? Turtle Giant FRED RITCHIE, ANTÓNIO CONCEIÇÃO e BETO RITCHIE
Andreia Sofia Silva Perfil PessoasJandira Silva, cantora | A voz carioca do Oriente [dropcap style≠’circle’]Q[/dropcap]uando Jandira Silva pegou num microfone pela primeira vez, o Brasil vivia o fenómeno Daniela Mercury, que acabava de lançar o primeiro álbum. Na escola, numa festa simples organizada com uns amigos, a sua voz acabou por ficar no ouvido para sempre. Muito antes de ser adolescente, já a música invadia todos os dias a casa de Jandira Silva. Esta cantora, nascida no Rio de Janeiro e a viver em Macau há alguns anos, recorda a rádio logo pela manhã, as músicas que mostram um Brasil genuíno, com muito samba, música sertaneja. A Música Popular Brasileira (MPB) e os seus nomes apareceriam muito depois. “Comecei a sair à noite e a ouvir vários estilos, a ter acesso a outras coisas. Hoje temos o iPod e o MP3, mas antes cada um levava as cassetes com as músicas que ouvia. Comecei a ouvir Bossa Nova e MPB quando comecei a sair à noite”, lembrou ao HM. Os nomes que fizeram da MPB o que ela é hoje marcaram-na desde o primeiro momento. “As músicas que me tocavam mais eram aquelas que tinham a Elis Regina cantando. Tinha ali qualquer coisa que eu não sei explicar, o timbre, a forma de cantar, a maneira dela fazer. Na minha infância tocava na rádio Elis Regina, Elba Ramalho. Depois, durante a juventude, era Mariza Monte, Adriana Calcanhoto, por aí”, aponta. Jandira Silva nunca quis ser outra coisa na vida. A paixão surgiu bem cedo. “Em criança eu falava que ia ser cantora, e ninguém me levava muito a sério, achavam que eu estava brincando. A cena da música começou desde que eu me conheço por gente. O meu pai, por sinal, cantava muito bem e tocava alguns instrumentos”, explica. Os constrangimentos Quando Jandira Silva saiu do seu Rio de Janeiro, foi morar seis anos em Portugal. Cantou em locais como o Casino Estoril e outros bares de renome. Em Londres, no Reino Unido, viveu nove anos. A cantora recorda a imensa competição que existe num lugar onde há vários nomes, todos eles com uma enorme qualidade. Já aí Macau teimava em surgir-lhe no horizonte, mas Jandira nunca arriscou. “A quantidade de músicos em Portugal ou Londres é imensa. Tinha aqui um músico em Macau que me chamou para vir umas três vezes, mas nunca vim. Os contratos nunca foram fechados com clareza, e ficaria sempre a perder.” Depois de ter gravado um álbum em 2012, intitulado “Festa de um Sonho Bom”, Jandira Silva deixou um pouco de parte a ideia de gravar um segundo trabalho de originais. Afirma que criou uma nova canção para a sua vida, chamada Isabella, a filha, que lhe roubou tempo. Mas Jandira Silva sente-se, sobretudo, confrontada com os desafios do território. Dá concertos esporádicos e não consegue viver a cem por cento da música. “Agora estou aqui e não há o que fazer. Em Londres foi essa a minha profissão, em Portugal também. Macau tem tantos hotéis como Lisboa, e lá tem o piano, o pianista e a cantora. Aqui não há isso. Em todo o lugar do mundo há bandas a tocar as músicas do momento.” Assume que o público chinês gosta de outro tipo de entretenimento, mais virado para o jogo, mas a cantora fala também da existência de constrangimentos dentro do próprio sector. Lembra um caso que envolveu uma operadora de jogo local, onde lhe disseram que, naquele lugar, não podia cantar em português. “Disseram-me que não se podia cantar em português, e não foi dada nenhuma justificação. Ninguém consegue falar ou comunicar”, recorda. “Se dissesse que Macau é responsável por me afastar da música, estaria mentindo. Mas posso dizer que aqui poderia ser feito muito mais. Está tudo muito disperso e espalhado. Há alguns músicos, mas ninguém está muito unido para fazer um projecto. Eu gostaria [de lançar um novo álbum], mas teria de ter músicos com quem pudesse contar a cem por cento”, explica. A competição, com preços mais baixos em termos de cachet, também não ajuda. “Os cachets que são pagos aos músicos filipinos influenciam muito o mercado. Não falo em detalhes, mas tive propostas em que decidi ficar em casa.” “Neste momento a cena de música em Macau está muito parada”, remata a cantora.
Hoje Macau PolíticaApanhador Só – “Mordido” “Mordido” Essa balela aqui não vai colar não tá tão fácil assim pra convencer esse teu papo de querer crescer a parceria, jogo aberto e tal não cola mais, já deu pra perceber que se alguém sai ganhando aqui é tu aqui tem peito pra identificar que ao contrário do teu lá lá lá negócio aí não é nada mais do que nãnã e meter no nosso O teu esquema sempre foi lograr criar uma imagem boa pra vender na captura do nosso querer tá conseguindo é nos provocar toma cuidado pra não se perder que aqui na espera tão querendo um um só, que sirva pra exemplificar que volte vivo pra poder contar como é que fecha assim lacrado, interditado, aqui o nosso Apanhador Só ALEXANDRE KUMPINSKI, LORENZO FLACH< FOCA, FELIPE ZANCANARO, FERNÃO AGRA, DIEGO POLONI
João Luz EventosElectrónica | DJ Marfox estreia-se em Macau no sábado Marlon Silva é a personificação das origens humildes que chegam ao estrelato. Desde criança que quis ser DJ. Viu o primo mais velho animar festas de bairro, baptizados e casamentos, e cedo começou a cozinhar remixes. Hoje, as suas batidas já ecoaram por todo o mundo, e chegam ao Kampek no sábado [dropcap style≠’circle’]D[/dropcap]a Portela de Sacavém para o mundo. Podia ser um título alternativo para este artigo. DJ Marfox, ou Marlon Silva no cartão do cidadão, é hoje um fenómeno internacional. Tocou no Museu de Arte Moderna de Nova Iorque, em festas em Los Angeles, Tóquio, Xangai, Seul e por toda a Europa. Apareceu na Rolling Stone e um pouco por todas as publicações de música de dança com renome mundial. Há um bom punhado de anos, num vídeo de uma actuação dos Buraka Som Sistema no conhecido Festival de Coachella, na Califórnia, podiam ver-se caras de espanto. As expressões pareciam trazer a interrogação “o que é isto?”. Internacionalizava-se a mistura de kuduro que nascia nas periferias de Lisboa. DJ Marfox já andava por aí antes dessa explosão, a fazer corpos abanarem-se em festas que não chegavam ao centro de Lisboa, apesar de já marcar presença em várias cidades europeias. “A música já era internacional, os putos já a faziam, chegava a Londres, Nice, Paris, mas sempre para as comunidades emigrantes de Cabo-Verde e Angola”, conta o DJ. Até que a Príncipe Discos e a produtora Filho Único chegam à história de Marfox, e levaram as sonoridades de inspiração africana da periferia para o Cais do Sodré, mais propriamente para o Musicbox. Começavam as “Noites Príncipe”, que foram ganhando notoriedade no underground lisboeta. “Deram-nos uma casa no centro da cidade e, com isso, deram-nos consistência”, revela. O artista tem uma relação umbilical com a sua editora, que considera uma família. O suporte da ‘label’ chegou ao ponto de levar artistas ao SEF para tratarem de documentação, assim como tratar de problemas familiares. Também mantinham uma relação estreita com os pais de Marlon, ligando-lhes para reiterar o talento do jovem e que tudo fariam para lhe dar uma carreira como DJ. Rumo ao Oriente Com cinco discos editados na bagagem e participação em quatro compilações, Marfox não perde o pé. O miúdo que cresceu na Quinta da Vitória, na Portela de Sacavém, tem um sentido de responsabilidade que nem sempre se encontra no mundo da música. Chegar aos palcos internacionais “é uma responsabilidade muito grande porque muita gente depositou confiança em mim”, releva o DJ. Quando pensa no sucesso e reconhecimento internacional que conseguiu, Marfox pensa no pai e na mãe, “nos sacrifícios que fizeram” para lhe darem a melhor vida possível. Ao sentido de responsabilidade junta-se a satisfação que tem em tocar e em fazer correr suor nas pistas por onde passa. Um sentimento de compromisso que cresceu há três semanas com o nascimento do seu primeiro rebento. “Os meus pais cumpriram o seu papel, agora falto eu cumprir o meu e melhorar a vida do meu filho”, conta. Este ciclo que lhe dá força, firmeza, que faz com que encare todos os públicos sem medos e com que dê tudo o que tem, mesmo que esteja cansado. Além disso, toca com prazer. Quando à definição do seu som, Marfox caracteriza-o como “uma ponte entre tudo o que é feito de melhor em África e tudo o que é feito de melhor em Lisboa”, em termos de música electrónica. Mistura as batidas africanas do kizomba, kuduro, funaná, tarraxinha aos sons urbanos do techno, house e electrónica. Ainda assim, classifica a sua música como sendo “80 por cento lisboeta”. Acrescenta que “é uma música da nova Lisboa, não Huambo, mas das periferias de Lisboa que abraça a velha Lisboa do centro”. Quanto a Macau, Marfox sente que tem “bom vibe”. Além disso, achou muita piada à forma como se nota nalgumas pessoas, e na própria cidade, a mistura que houve entre portugueses e chineses. Definitivamente, um bom remix.
Hoje Macau PolíticaCassete Pirata – “Pó no pé” “Pó no pé” Pó no pé Céu azul Não troco o pôr do sol Na pele só no Sul O meu creme é o teu sal Vem cá ver Derreter O fel Luz Maré Céu azul Memórias de jasmim Na pele sou do Sul E o mar escondeu-me assim Vem cá ver Derreter Até ao fim Quando a brisa da manhã se for Quando o sol das ondas se apagar Quando a noite não quiser dormir Eu vou contigo Ah vem cá ver Derreter Até ao fim Quando a brisa da manhã se for Quando o sol das ondas se apagar Quando a noite não quiser dormir Eu vou contigo CASSETE PIRATA JOÃO FIRMINO, MARGARIDA CAMPELO, JOANA ESPADINHA, JOÃO PINHEIRO e ANTÓNIO QUINTINO