Filipa Araújo PolíticaJuventude Dinâmica não acredita em investigação de CCAC sobre Jinan [dropcap style≠’circle’]A[/dropcap] reacção é clara: a investigação do Comissariado Contra a Corrupção (CCAC) aos cem milhões de yuan atribuídos pela Fundação Macau (FM) à Universidade de Jinan não convence a Juventude Dinâmica. “A nossa Associação já leu a conclusão do CCAC e percebe-se que parte do seu conteúdo é de uma carta também publicada pela FM. Desde o período da data de denúncia até à data a que o CCAC nos respondeu passou muito pouco tempo. Acho que o CCAC não fez uma investigação a fundo sobre este caso”, acusa Lei Kuok Keong, secretário da Associação. O responsável da Juventude Dinâmica vai ainda mais longe e acusa o CCAC de “estar a ajudar a FM”. “O que nos parece é que o CCAC está a desculpar a própria FM, explicando à população o que aconteceu. Não parecer ser uma investigação”, frisou. “A doação que foi feita é dos cofres públicos, o público não pôde decidir sobre nada, nem sequer soube detalhes da decisão, portanto, ambos – o Governo e a FM – têm de ser mais transparentes”, argumentou. Lei Kuok Keong diz ainda que, na conclusão do CCAC, a questão do conflito e transferência de interesses não é explorado. “Isto nem sequer faz sentido quando a própria FM admitiu que tem espaço para melhorar no processo de doação de fundos. Partimos ainda do princípio que, como o CCAC indica que não houve violação da lei relativamente aos impedimentos do Chefe do Executivo, então todos os cidadãos podem fazê-lo também”, continua. Para a Associação “é óbvio” que o sistema de subsídios da FM “não funciona bem”. “Porque é que o CCAC não disse nada sobre isto, afirmando que não existem problemas relativamente à doação. Acho que o CCAC faltou na sinceridade da investigação, não está a trabalhar bem no seu papel de fiscalização e por isto o público não vai acreditar mais no CCAC”, rematou. Nos conformes Também ontem, a FM reagiu ao relatório do CCAC, afirmando que concorda com o mesmo e que a própria instituição “tem funcionado no estrito cumprimento dos [seus] Estatutos, estabelecendo regras rigorosas para a concessão de apoios financeiros”. Ainda assim, no mesmo comunicado, a Fundação indica que tem “vindo a adoptar diversas medidas no sentido de melhorar os seus serviços no âmbito de concessão de apoios financeiros”, tais como, os critérios de apreciação, divulgação da informações, novos formulários no pedido e um maior reforço na verificação sobre a idoneidade dos requerentes. “Fazer dos cidadãos beneficiários finais dos subsídios é um objectivo em que a FM tem insistido”, pode ainda ler-se no comunicado. Para Lei Kuok Keong não há dúvidas: a “maneira mais rigorosa na atribuição dos subsídios é existir uma maior participação do público”. “Há muita coisa debaixo da mesa, só quando a FM avançar com medida para a participação do público é que existirá rigor e verdade”, remata.
Filipa Araújo Eventos“Mês de Portugal” | Iniciativa com muita adesão veio para ficar A iniciativa “Junho – Mês de Portugal” conquistou Macau. É o que dizem organizadores, que falam em mais pessoas, união entre associações e vontade de continuar [dropcap style≠’circle’]T[/dropcap]erminou ontem a iniciativa “Junho – Mês de Portugal” que, na visão dos organizadores, superou as expectativas e acaba em “balanço francamente positivo”. Foram 30 dias com exposições, ciclos de cinema, música, teatro e tantas coisa mais para marcar o Dia de Camões, de Portugal e da Comunidades Portuguesas. Este ano, entre 1 e 30 de Junho, juntaram-se o Consulado de Portugal, a Casa de Portugal em Macau, o Instituto Português do Oriente (IPOR), a Fundação Oriente, o Clube Militar e a Livraria Portuguesa. Para João Laurentino Neves, presidente do IPOR, esta iniciativa foi um óbvio exemplo de bom trabalho entre as associações. “Um trabalho que já existia bilateralmente em alguns caos, mas que agora veio para ficar. O programa veio provar que, quando as instituições se coordenam entre si, é possível construir um programa não só vasto, mas abrangente em termos das áreas da expressão cultural e artística e sobretudo um programa de qualidade”, explicou ao HM, frisando o importante trabalho que Vítor Sereno, Cônsul-Geral, desempenhou na divulgação da iniciativa. O resultado final não podia ser mais positivo, diz. “O programa não só proporcionou à comunidade de Macau um conjunto de excelentes eventos, mas promoveu-se igualmente, de forma muito positiva, aquilo que é a produção cultural e aquilo que é produção artística portuguesa”, frisou, sublinhando que, desse ponto de vista, o balanço só pode ser positivo. De olhos postos Prova do sucesso é o aumento no número de pessoas que aderiram às várias actividades. “As assistências que estiveram em qualquer um dos eventos que compunham este programa, mesmo aqueles em que tradicionalmente é mais difícil mobilizar a pessoas, cresceram quando comparando com iniciativas anteriores”, afirmou, frisando que não só portugueses compunham este auditório. A concordar está Amélia António, presidente da Casa de Portugal em Macau, que justifica uma maior adesão na calendarização das actividades. “No conjunto, as iniciativas foram extremamente positivas. Houve de facto uma maior presença das pessoas. Penso que o facto das coisas não acontecerem em dias seguidos facilita que haja uma maior adesão. Temos essa experiência, quando os eventos acontecem muito próximos uns dos outros não dá para as pessoas gerirem o seu tempo. Ser num mês inteiro, com intervalos, permite uma maior adesão”, apontou. É para continuar Desengane-se quem tinha dúvidas. A iniciativa é para continuar. “O Cônsul-Geral sempre disse que esta actividade é para ficar, mas claro depende sempre da vontade das instituições. Julgo que existe essa boa e grande vontade. Julgo que se pretende que este seja um programa para que Portugal marque de facto no calendário o mês de Junho como especial. Em que se juntam vários esforços, colaborações das instituições, empresas, parceiros, do próprio Governo da RAEM neste programa”, aponta. Para a presidente da Casa de Portugal este é o resultado de um trabalho feito ao longo dos últimos anos. “Claro que queremos continuar. Isto é uma coisa [para] a qual já se vinha a caminhar. Não é uma coisa que aconteceu este ano. Já vínhamos a trabalhar para isto, não era explícito que seria um mês, mas sempre quisemos juntar as peças de cada associação e instituição para fazer uma coisa mais representativa. Já tínhamos tentado, agora assumiu um nome e uma meta. Acho que é de defender a continuação”, rematou.
Filipa Araújo PolíticaLei dos Animais votada na especialidade na próxima semana [dropcap style≠’circle’]A[/dropcap] proposta de Lei de Protecção dos Animais será votada na especialidade na próxima segunda-feira, em plenário da Assembleia Legislativa (AL), depois de trazer muita controvérsia. Será necessário introduzir melhorias no futuro, indicam os deputados, que emitiram esta semana o parecer sobre a proposta de lei. Depois de 28 reuniões de discussão na especialidade pela 1.ª Comissão Permanente da AL, presidida pela deputada Kwan Tsui Hang, o grupo de trabalho entregou o parecer ao hemiciclo. A lei parece não agradar a todos os intervenientes. Ao todo foram ouvidas 80 opiniões, ao longo de dois anos, que não foram suficientes para se chegar a um acordo, como refere o grupo de trabalho no parecer final. “É de referir que se trata da primeira lei da RAEM sobre a protecção dos animais e que o âmbito de protecção consagrado na proposta de lei é bastante abrangente. Mesmo que a Comissão, com base no respeito pelas diferentes opiniões, tenha tido um amplo diálogo com o Governo, tenha apreciado cuidadosamente a proposta de lei e equilibrado, o mais possível, os diversos interesses, as opiniões da sociedade são bastante diversificadas, algumas contrárias ou até totalmente opostas, ao que acresce a definição de uma lei que tem de ter por base a situação real de Macau e as condições de aplicação da lei por parte do Governo, sendo portanto impossível satisfazer todas as exigências”, pode ler-se no documento. Por isso mesmo, defende a Comissão, é necessário introduzir melhorias após a entrada em vigor, com base na experiência obtida na sua aplicação. A Comissão não indica quanto tempo depois da aprovação deverão ser feitas alterações.
Filipa Araújo SociedadeIACM garante solução para parque infantil degradado [dropcap style=’circle’]D[/dropcap]epois do HM ter noticiado o estado de degradação e pouco limpo do parque de lazer ao lado do Sakura Court, no complexo Ocean Garden, que coloca em risco a segurança de centenas de crianças que o frequentam, o Instituto para os Assuntos Cívicos e Municipais (IACM) garante que já está “a acompanhar o caso”. O instituto, em resposta ao HM, assumiu que “por lapso” e “má comunicação” percebeu que os parques referidos na carta correspondiam apenas à administração do condomínio do complexo, apesar das fotografias enviadas em anexo. Trata-se do único parque público dos Ocean Garden. A estrutura com o mesmo fim mais próxima fica a cerca de 20 minutos a pé. Reparado o erro, o Governo diz-se pronto para solucionar a questão.
Filipa Araújo Manchete PolíticaCTM | Renovação automática do contrato poderá vir a acontecer O contrato de concessão do Serviço Público de Telecomunicações entre o Governo e a CTM continua a dar que falar. Raimundo do Rosário esclarece que existem vários tipos de activos em causa, sem descartar a possibilidade de renovação automática do contrato até ao final do ano [dropcap style≠’circle’]N[/dropcap]uma nova reunião com a Comissão de Acompanhamento para os Assuntos da Administração Pública, o Governo reforçou a fragilidade de uma possível não renovação do contrato de concessão do serviço público de telecomunicações com a Companhia de Telecomunicações de Macau (CTM). O contrato, assinado em 2009, será alvo de uma revisão intercalar até ao final deste ano. Aqui poderá decidir-se se o contrato é renovado automaticamente ou não. “[No contrato] está previsto que a meio, ou seja, este ano de 2016, possa ser feita uma revisão. Mas a revisão só terá lugar se houver uma infracção grave de alguma lei, ou se houver imperiosas razões de interesse público”, esclareceu Raimundo do Rosário, Secretário para os Transportes e Obras Públicas, no final da reunião de ontem, frisando que, se nenhum dos casos se detectar, o contrato será renovado automaticamente até ao final do presente ano. Questionado sobre a decisão do Governo, Raimundo do Rosário apenas referiu que não houve, por parte da CTM, qualquer incumprimento da lei e que o interesse público terá de estar sempre relacionado com “imperiosas razões”. “Renovação? É possível que vá acontecer”, acrescentou ainda o Secretário. No entanto, avançou, o próximo passo é um encontro entre o Governo e a operadora de telecomunicações. Activamente ligados Como defendido pela Comissão na primeira reunião, a questão dos activos continua por resolver. A Comissão acredita que este é “um contrato injusto” para com as outras operadores a actuar no mercado. “Este é um contrato injusto, tem cláusulas injustas (…) alguns membros [da comissão] indicaram nunca ter visto um contrato assim”, explicou Chan Meng Kam, presidente da Comissão. Raimundo do Rosário quis esclarecer que em causa estão três tipos de activos: os de concessão, os comuns e os de investimento feitos pela própria CTM. “Parte dos activos são da RAEM e parte são da concessionária”, apontou o Secretário. Os activos de concessão serão inspeccionados pelo Governo e um representante da CTM, com vista a verificar o bom estado de funcionamento. Os activos comuns “são os activos afectos à prestação de serviços concorrenciais e à prestação dos serviços públicos de telecomunicações em regime de exclusivo”, como se pode ler no contrato. Caso as partes acordem nos termos que determinado activo comum deve ser atribuído a uma delas, a parte que àquele renuncia será compensada pelos seus direitos sobre esse activo. Compensação esta que será calculada pelo valor que for mais elevado de entre o valor líquido ou o custo de substituição no momento de atribuição. Por fim, os activos de investimento referem-se aos investimentos realizados pela CTM nos serviços locais e internacionais de circuitos alugados, bem como nos serviços de trânsito. Estes serão considerados da única e exclusiva propriedade da CTM e não integram os activos da concessão. Soluções à vista Questionado sobre a vontade da Comissão, Chan Meng Kam não confirma que o grupo de trabalho considera a não renovação o passo a seguir. “Não queremos que seja injusto (…) já viram os preços em Macau (…) a concessão não pode pertencer a uma só (…)”, argumentou, indicando ainda que para a Comissão existem fortes razões de interesse público neste caso. Chan Meng Kam acrescentou ainda que durante o encontro a Comissão teve como principais alertas e conselhos ao Governo a promoção da concorrência do mercado justa, pedindo mais esforços ao Executivo para rever a cláusulas deste “contrato injusto” e que o mesmo entre em conversações com a CTM. Pontos que o Governo garantiu fazer.
Filipa Araújo Manchete SociedadeOcean Garden | Parque infantil em péssimas condições põe segurança em risco Equipamentos em mau estado, tudo cheio de lixo e muitas vezes utilizado como casa de banho para cães. É assim o estado em que se encontra o parque de lazer dos Ocean Garden. O IACM nega responsabilidades e atira o assunto para a administração do condomínio. Mães unidas querem um espaço onde os filhos possam brincar [dropcap style≠’circle’]É[/dropcap] o parque da polémica. Apesar de Macau disponibilizar “parques de lazer com excelentes equipamentos” este é o seu calcanhar de Aquiles. Fica no complexo Ocean Garden, na Taipa, ao lado do Sakura Court, perto da Rotunda dos Jogos da Ásia Oriental. No site do Instituto para os Assuntos Cívicos e Municipais (IACM) é identificado ainda como zona de lazer da Avenida do Oceano, sendo um espaço sob a responsabilidade do instituto. Mas parece que a realidade não é tão clara, é que chamado à atenção pelo estado de degradação do espaço, o Governo nega responsabilidades. A ideia de denunciar o caso ao IACM partiu de Andreia Martins, mãe de uma criança de dois anos. “Eu sei que as crianças correm e brincam e estão sujeitas a isto [magoarem-se], mas duas crianças magoaram-se neste parque, uma partiu a cabeça e outra um dente”, começa por contar ao HM. Depois de comentar o estado do parque, seja pela degradação visível e aspecto de abandono, como pelo lixo que salta à vista de quem por ali passa, Andreia decidiu escreveu uma carta expositiva ao IACM, colectando ao mesmo tempo várias assinaturas. Na carta, enviada a 6 de Maio do presente ano, Andreia Martins, e as assinantes, indicavam que “as condições actuais destas instalações […] devem ser requalificadas em prol da segurança e bem-estar dos seus utilizadores”. O documento dedica vários parágrafos ao assunto e menciona ainda dois outros parques que são da responsabilidade de administração de condomínios do complexo. “Em relação à sua carta, em que refere os estragos em instalações recreativas da zona de lazer e o mau estado higiénico dos Jardins do Oceano, proponho a V.Exa. que, por esta zona não se encontrar sob a gestão do IACM, procure contactar directamente o promotor do respectivo empreendimento ou a empresa de administração de condomínio para lhe referir essas situações”, assina Cecilia So Mui, chefe dos Serviços de Zonas Verdes e Jardins do IACM. É, apontam as assinantes, uma não resposta, porque o IACM não menciona o parque em causa, que é da sua responsabilidade. “Ignora ou parece querer ignorar”, defende Andreia Martins. “Parece que se esqueceram que aquele parque é deles [IACM]. Acho que o Governo não está a ser competente, e mal viram que o parque era do Ocean Garden não quiseram saber. Isto é uma tremenda falta de profissionalismo”, aponta Joana Couto, mãe de uma criança com menos de um ano. “É preciso perceber que isto não é nada inventado por nós. O parque é da responsabilidade do IACM e isso está no próprio site do instituto. Esta resposta parece só referir-se aos outros parques (…) parece-me que não quiseram responder. Deviam ter explicado o que se passa. Até podiam dizer que estão a fazer um estudo, como fazem tantos, também podiam dizer que estavam a estudar uma solução. Mas nem isso. Não tiveram a simpatia de nos dizer. Portanto isto é claramente ignorar e varrer para baixo do tapete”, argumenta ainda Diana Massada, uma das assinantes. Pontos negros Os problemas são vários e as mães tornam isso claro. “Em primeiro lugar, existe um problema de segurança. O escorrega é perigoso, pois a sua estrutura é antiga e instável. Em segundo, é um escorrega que não pode ser utilizado por crianças de todas as idades. É uma estrutura demasiado alta, sem escadas, que obriga as crianças a trepar as barras de ferro para poderem utilizar o escorrega”, começa por apontar o documento a que o HM teve acesso. A questão da segurança é ainda apontada pelas assinantes pois, apontam, as instalações destinada para exercício físico para adultos são partilhadas no mesmo espaço do parque, sem qualquer separação física. “Esta situação causa incómodo tanto aos utentes destas instalações, como às crianças e quem as supervisiona, pois as crianças acabam por circular naquela zona, como se instalações infantis se tratassem. Já houve casos de crianças que se magoaram, atingidas por alguém que praticava exercício físico, causando um transtorno geral”, apontam ainda. Ao lado do perigo Outra falha apontada por Joana Couto é a falta de protecção entre o parque e a marginal. “Aquela zona de relvado está aberta para a marginal, de forma directa. Portanto crianças a brincar, meninos que jogam à bola naquela zona, é super perigoso. Perigosíssimo. Facilmente olhamos para o lado e a criança já está na estrada”, contou, indicando que já lhe aconteceu. “Não sei de acidentes que tenham acontecido, mas eu já vi, por mais do que uma vez, bolas a irem parar à estrada e os miúdos a irem a correr na tentativa de apanhar a bola. Se não fossemos atrás deles podia ter acontecido o pior”, apontou. Saúde em causa Mas não é apenas o estado de degradação que preocupa as mães, a higiene está também em causa. “Jovens residentes ou estudantes da Escola Secundária Pui Vai têm o hábito de frequentar o espaço, sujando as instalações e largando lixo no chão, incluindo beatas de cigarro, infringindo uma série de regras e leis da RAEM”, defende Andreia Martins. Também para Diana Massada a situação de falta de limpeza é insustentável, colocando em causa a saúde das crianças e acompanhantes. Pior que isso é o descuido dos utilizadores que passeiam animais de estimação e deixam que os mesmos “façam as suas necessidades” no parque de lazer para os residentes. Sem fiscalização não há como impedir que isto aconteça e ninguém “quer os filhos a brincar num espaço sujo, que é utilizado para parque de cães”, acrescenta ainda Andreia Martins. Seguindo as instruções, uma proprietária de um apartamento no complexo e também assinante da carta entrou em contacto com a empresa responsável pelo condomínio. “Foi feita uma abordagem oral, mais um alerta desta situação, mas a administração ignorou por completo”, esclarece Andreia Martins. A luta não termina. As assinantes vão continuar chamar o Governo às suas responsabilidades. “Se o IACM diz que não tem responsabilidade sobre este parque, se alguma criança se magoar a sério quem é que se responsabiliza?”, atira ainda para o ar Diana Massada. O grupo vai agora responder ao IACM partilhando o link do Web site do instituto que indica que aquele parque é da sua responsabilidade. Andreia Martins diz ainda que vão averiguar de quem é a responsabilidade criminal em caso de acidente com os equipamentos dos parques que pertencem à administração do condomínio. Vão ainda enviar uma carta através do advogado à administração do condomínio e um documento expositivo ao gabinete da Sónia Chan, Secretária para Administração e Justiça, tutela a que pertence o IACM. Tudo “em prol da segurança das crianças”. Ao HM, até ao fecho desta edição, o IACM não apresentou qualquer esclarecimento. Andreia Martins explica ainda que num território “com tantos bons parques” não faz sentido este ficar esquecido. Entre este compasso de espera, aguarda-se que as crianças possam voltar a brincar.
Filipa Araújo PolíticaNovo Macau | Scott Chiang não descarta mudanças Não quer comentar as ideias apresentadas por Au Kam San e Ng Kuok Cheong, mas levanta o véu e diz que podem acontecer novas mudança na Associação Novo Macau. Scott Chiang não fala sobre as eleições à AL, mas tudo está em aberto [dropcap style≠’circle’]S[/dropcap]cott Chiang, presidente da Associação Novo Macau, diz que podem estar para acontecer mudanças no grupo pró-democrata. Questionado sobre uma possível candidatura às eleições à Assembleia Legislativa (AL), Scott Chiang volta a não querer falar sobre o assunto, deixando tudo em aberto incluindo a possibilidade de caras novas no próprio grupo. “Tudo é possível, há sempre pessoa novas, há sempre caras novas. Já tivemos o Sou Ka Hou, também já tivemos o Jason [Chao]. O que o espero é que o futuro traga mudanças, das boas, mas ainda não sabemos o que pode acontecer” Questionado sobre a possibilidade de eleger um novo membro da associação, o presidente foca-se no único que agora os representa, o deputado Ng Kuok Cheong. “Perdemos um [Au Kam San] mas temos Ng Kuok Cheong. Se ele concorrer outra vez, primeiro garantimos o seu lugar, depois queremos que se faça mais”, explicou. Tempo curto Relativamente às ideias apresentadas por Ng Kuok Cheong e Au Kam San no âmbito do Plano de Desenvolvimento Quinquenal, o qual, acusam, foge à questão da implementação do sufrágio universal para a eleição do Chefe do Executivo, apresentada na passada sexta-feira, em conferência à imprensa, o presidente pró-democrata não quis comentar. “Não tive tempo para estudar e ver a proposta apresentada, nem as ideias, pelos deputados Au Kam San e Ng Kuok Cheong. Portanto não me parece justo fazer uma apreciação agora”, explicou, frisando que não está a recusar fazê-lo. “Para já não o vou fazer”, apontou. As ideias apresentadas vão muito ao encontro de iniciativas defendidas também pela associação na área da habitação, transportes e avaliação do próprio Governo. Scott Chiang continua a aguardar desenvolvimentos do caso avançado pela Polícia de Segurança Pública (PSP) em que o pró-democrata é suspeito de desobediência na manifestação de 15 de Maio, que pedia a demissão de Chui Sai On, Chefe do Executivo, após tornadas públicas as doações da Fundação Macau à Universidade de Jian.
Filipa Araújo MancheteUM | Yao Jingming novo director do departamento de português Yao Jingming vai substituir Fernanda Gil Costa na direcção do departamento de português da Universidade de Macau. Toma posse em Setembro e não comenta as causas da mudança. Alunos justificam mudança para “ensino mais oriental” [dropcap style≠’circle’]A[/dropcap] direcção do Departamento de Português da Universidade de Macau (UM) terá, já no próximo Setembro, uma nova cara: Yao Jingming. “Sim, posso confirmar isso. Mas só tomo posse a 1 de Setembro”, confirmou o actual coordenador de mestrados de Tradução. Sem prestar qualquer esclarecimento adicional, Yao Jingming irá substituir a actual directora, Fernanda Gil Costa, que até ao fecho desta edição não foi possível contactar. Numa tentativa de justificar a mudança o HM falou com alguns alunos do departamento de português que não estranham a mudança, até porque os alunos preferem um “ensino mais oriental”. Um aluno finalista, que preferiu manter o anonimato, explicou que o “ensino ocidental do departamento da UM promove um estudo autónomo, aplicando uma disciplina muito livre”. Sendo que “os estudantes locais, em geral, não são muito trabalhadores” e se não forem “obrigados a estudar nunca serão bons profissionais”. As diferenças, conta, entre alunos oriundos do interior da China e os locais são evidentes. “Os alunos que vêm do interior da China, habituados ao ensino oriental, são muito diferentes de nós e normalmente aprendem melhor do que os locais”, explicou, indicando que o ensino ocidental não impõe ao aluno a responsabilidade de ser bom aluno. “Mas claro que também há bons alunos locais”, explica, frisando que a Universidade de Línguas Estrangeiras de Pequim é muito “mais exigente” que a UM, mesmo na área de Língua Portuguesa. “Se comparamos a UM, de um modo geral, às universidades da China, percebemos que o ensino é pior. Se quisermos trabalhar na área de português, depois de nos graduarmos, precisamos de saber muito, é muito importante aprender bem os conhecimentos básicos, gramática, o léxico, tudo. E nisso Pequim é melhor por ter o ensino ocidental”, acrescenta. Missão cumprida Para um actual aluno Fernanda Gil Costa cumpriu as suas funções de forma muito correcta. “A mudança de cargo já anda a correr os corredores da UM. Embora não tenha sido aluno da professora Fernanda Costa, acho que sempre assumiu as suas responsabilidades de forma muito correcta, gentil e soube unir as pessoas”, aponta. No entanto “o programa do departamento de português e o seu método pedagógico tende a ser mais académico”, algo que para o aluno não está direccionado para os alunos chineses e locais, e se estivesse, frisa, talvez os resultados do ensino fossem um pouco melhores. Felipe, actual estudante do departamento, acredita que “um director chinês vai certamente trazer mudanças positivas para o departamento”. “Ele deve conhecer melhor o que os alunos querem e trabalhar num modelo pedagógico mais apropriado”, explicou, ao HM. “Na verdade, não quero comparar o modelo ocidental e oriental de aprendizagem de línguas, pois ambos devem possuir as suas próprias vantagens e desvantagens. O que é mais importante é saber o que os alunos querem e ajustar o programa. Estive alguns meses em Portugal a fazer intercâmbio e lá há muitos bons professores portugueses e gostei muito das aulas. Se calhar os professores aqui devem prestar mais atenção ao ensino. As teorias de ensino de português aqui desenvolvidas não são muito adequadas aos alunos de Macau e devem ser ajustadas conforme o resultado de práticas. Em suma, acho que o departamento vai ser melhor”, remata. Maior comunicação O aluno finalista não esconde que existem problemas no programa de português. “Uma das características do nosso departamento é que não existe comunicação entre os professores, levando a que existam repetições nos conteúdos do ensino de cada professor. Acho que o método chinês para a fase inicial de aprendizagem é claramente mais útil porque exige que os alunos aprendam muito bem a base da língua”, argumenta. O aluno chega mesmo a dizer que, de forma geral, o departamento de português não consegue adaptar-se aos alunos. “Os professores da UM, são maioritariamente professores estrangeiros, tratam-nos como alunos que falam uma língua materna estrangeira, levando a que os alunos não se consigam adaptar às diferenças do ensino ocidental e oriental. Acho que os professores do departamento não possuem muita experiência de ensinar português aos estudantes estrangeiros”, argumenta. Uma combinação entre os dois tipos de ensino é a solução apresentada pelo ex aluno. “Acho que tanto o ensino ocidental como o oriental têm as suas vantagens. É melhor combinar os pontos positivos de cada um para alcançar um resultado melhor. Na primeira etapa, é melhor utilizar a maneira oriental para obrigar os estudantes a aprender, mas nas etapas seguintes o ensino ocidental orienta os estudantes a abordar a língua e a aprofundar o interesse deles à língua, até que os alunos possam realmente amar a língua . Nós temos recursos para fazer isso, porque temos professores chineses e portugueses”, frisou. Para o aluno a escolha de Yao Jingming foi bastante acertada, apesar de nunca ter sido seu professor. “Para mim, não me importo se é um professor chinês ou uma professora estrangeira que vai assumir o cargo do director do departamento. O mais importante é o director perceber bem a necessidade dos alunos, e ter experiência suficiente para ensinar os alunos de língua materna chinesa. Nunca fui ensinado pelo professor Yao, mas acho que o departamento deve fazer uma reforma, acho que o professor Yao conhece melhor os estudantes chineses e talvez venha trazer um impacto positivo”, remata. Com Angela Ka
Filipa Araújo MancheteEspecial 24 de Junho | Jorge Fão: “As pessoas perderam o espírito de luta” Diz-se 99% chinês, sem ligações a um feriado que já foi o da cidade. Jorge Fão recorda uma comunidade de garra, mas actualmente apagada. O português perdeu importância e o chinês é essencial a qualquer macaense que queira vingar Assinalava-se hoje o Dia de Macau, 24 de Junho, perdido com a transição da soberania para a China. Acha que deveria ter sido um feriado a manter-se? Como macaense naturalmente que gostaria que fosse, ou seja, devia ter sido continuado. Não devia ter acabado. Mas aquilo que eu gostaria, nem sempre acontece. Mas, sou sincero, compreendo porque é que [retiraram o feriado], é que o Dia de Macau, o 24 de Junho, não é só por que é o dia da cidade, tem uma ligação com a igreja. Tem uma conotação religiosa. Feriados religiosos foram retirados alguns, e temos outros, por exemplo o Dia do Buda. Este dia não existia no passado, mas os chineses acharam que seria mais justo termos este dia e retirar outros, por exemplo o Dia de Macau. Talvez tenha sido este motivo, esta conotação religiosa, que fez com que este feriado fosse retirado. Focando-nos na comunidade. Como é que um macaense olha de fora para a sua comunidade? Como vê os seus problemas, como é visto pelas outras comunidades? Problemas, sou sincero, acho que não temos. Não vejo problemas na comunidade macaense. O que posso dizer é que a comunidade macaense do passado pode ter sentido algumas dificuldades e a do futuro talvez também sinta. Ou seja, dou um exemplo, a comunidade macaense do passado para se singrar na vida não tinha que estudar muito, mas uma coisa tinha que saber obrigatoriamente: a língua. Veja o meu caso, a minha cara é totalmente chinês, o meu sangue é 99% chinês, sangue português só tenho 1 ou 2 %. Apesar de só ter um passaporte, o português. No meu tempo, a nossa comunidade educava-nos pelo português. Quando os meus pais casaram – e eles eram filhos de chineses – educaram os filhos com costumes ocidentais. Também os meus tios faziam isso com os meus primos. Naquele tempo quem não falasse português, praticamente não tinha hipótese de estar empregado, ou conseguir o que se chamava de bom emprego, que fosse bem pago. Muitas vezes nem o era, até porque estou a falar dos anos 50, 60. Portanto, no passado tínhamos que estudar o português, obrigatoriamente, isto se queríamos ter uma posição social. Agora, o presente e o futuro mudou, é o contrario. Agora, para se ser um bom macaense não basta saber a língua portuguesa, como é obrigatório conhecer a língua escrita, lida, chinesa. Coisa que eu não sei. Percebe-se a desvantagem da comunidade do meu tempo. Tempos antes da transição perceberam que os tempos iam mudar, nomeadamente na questão da língua? Na função pública tudo era em português mas, de facto, quando se falou do handover [transição da soberania] começou a iniciar-se, digamos, a “macaização dos quadros”, ou seja, a meter os locais para os quadros. Porque até aí ninguém falava nisto. E a comunidade macaense futura. Tem em mãos uma mudança na língua prioritária? Agora os nossos filhos, e na geração seguinte, é obrigatório que saibam a língua chinesa. Mas isto é também uma tendência do mundo, não é só a nossa comunidade, os portugueses também. Vejo que em Portugal se estuda cada vez mais chinês, assim como em outros países, Estados Unidos da América, por exemplo. Lá está, a China, neste momento, já é uma das potencias económicas mundiais. Países que são ricos e que podem a distribuir dinheiro o mundo percebe que tem que aprender a sua língua. Há algum facto diferencial nesta comunidade? Algo que vos torne uma comunidade especial, diferente de todas as outras? Não, nada. Não acho que tenhamos algo de diferente. Por exemplo, a questão do patuá: no meu tempo era proibido falar patuá. Era visto como inferior, uma língua que não era o português. Lembro-me perfeitamente de em minha casa não se poder falar chinês. O meu pai chamava-me logo à atenção. Os meus pais não falavam patuá, tinha umas tias que falavam, mas só entre elas, para a rua nem sequer falavam. É que patuá era uma mestiçagem, nem sequer é fácil de entender. O patuá que se fala hoje é um patuá trabalhado. Houve uma evolução. Naqueles nossos tempos era só falado com pessoas de idade. Eu não falo, por exemplo, não me lembro. A verdade é que se nos dedicamos à aprender e a falar patuá, vamos começar a falar mal português, por causa dos verbos, pois não existem tempos verbais. A língua importante era o português e era preciso saber falar bem, o patuá não era bom português. Mas actualmente é algo que vos diferencia. Sim, mas agora as coisas mudaram. O mundo mudou, a mentalidade das pessoas mudou. Agora é aceitável falar patuá com qualquer pessoa, ninguém te vai chatear com isso. Antigamente nem pensar. A mentalidade colonialista era assim. Mas destacou-se na comunidade macaense da altura… Sim, sou muito rebelde, sempre foi assim. (risos) A partir dos 30 comecei a lutar por tudo e por nada. Ao 20 e poucos anos fiz o meu primeiro recurso a uma decisão dos meus chefes, até ao Conselho Ultramarino, na altura não existia Tribunal de Última Instância. O último recurso era em Portugal e era este, o Conselho Ultramarino. O bicho da rebeldia já veio de muito cedo. Quando acho que é injusto, tenho de lutar para ser justo. Mas a comunidade na altura não era assim… Pois não. (risos) Eram todos muito politicamente correctos, até o meu pai, os meus tios, todos. Fui várias vezes chamado a atenção, por causa das manifestações de rua, e outras coisas. Por quê? Medo. A comunidade tinha medo, as pessoas tinham medo de tudo. Agora há menos. Hoje é tudo só politicamente correcto para tirar partido de alguma situação. Basta ver, no passado conseguíamos guerrilhar contra o regime, hoje em dia, a minha comunidade não dá para lutar. Para quê? Temos um continente aqui em cima, um bilhão e tal, com aquela mentalidade… Que vos trata bem? Sim, nós [macaenses] somos bem tratados [pela China]. Nós não fomos mal tratados. Não vejo fortes razões para criticar, lutar contra o que quer que seja. Mas nem tudo está bem… Certo, mas o pensamento mudou e tornou-se mais individual. No passado quando falávamos em comunidade estávamos a falar da função pública, 90% da comunidade estava lá. Agora? Não. Os meus filhos não estão, por exemplo, os meus sobrinhos, quer dizer, ninguém quer estar na função pública. Portanto já não se fala da comunidade. Quando se fala em problemas na administração e na função pública já não se refere à comunidade, porque a comunidade macaense já lá não está. As pessoas perderam o espírito de luta. Mas lutou-se, no seu tempo. Imagina que não tinha lutado? Macau é a única província ultramarina que tem direito a uma pensão paga pelo Governo português. Mais nenhuma tem. Porque nós lutámos. Angola, Moçambique, Timor onde estive, nenhum deles tem. Falei com locais e eles disseram ‘quando os portugueses saíram daqui levaram tudo’. Nós não. Nós lutámos. Como estava a par da situação política do país, percebi que se a nossa comunidade macaense não fizesse nada, hoje se calhar nem sequer estávamos aqui a conversa. Talvez estivéssemos em Portugal, a mendigar. Vai festejar o feriado, mesmo que não o seja. Ou lembra-se de o festejar? Não, nem sequer me lembro de o festejar. Já confessei, não sou nada ligado à religião, e como é o dia do padroeiro, S. João Baptista, eu nunca estive ligado a isso. Embora, tenha sido baptizado e a primeira comunhão, também estudava no Colégio Dom Bosco. Mas, não, não vou festejar. Honestamente, este dia não me traz grande significado.
Filipa Araújo MancheteTiananmen | Escolas evitam falar sobre massacre. Alunos aprendem por si O negro dia 4 de Junho de 1989 continua a ser assunto incómodo. As escolas evitam falar e os livros nem sequer mencionam a data. No entanto, há professores que fazem questão de transmitir aos seus alunos tudo sobre o massacre. Tornar matéria obrigatória é questão difícil de responder [dropcap style≠’circle’]“N[/dropcap]ão, os meus professores nunca me falaram sobre o 4 de Junho, nem os manuais escolares mencionavam o que aconteceu. Soube pelo youtube e pelas redes sociais”, começa por contar, ao HM, Lin Ka, estudante a residir em Macau. Nasceu em Xangai, mas logo cedo veio para Macau, lamenta que nas escolas de Macau pouco ou nada se fale do massacre estudantil na Praça de Tiananmen. “Um ou outro professor disse qualquer coisa, mas foi muito pouco. Se queria saber tinha de pesquisar na internet”, argumenta. Na escola de Sio Fong, um jovem licenciado, os manuais adoptados eram de Hong Kong e mencionavam o acontecimento. “Mas era muito pouco, era uma coisa de nada”, apressa-se em esclarecer. No entanto foi um padre que trouxe a Sio Fong alguns conhecimentos. “Tínhamos um professor padre, que era muito novo, nascido e criado em Hong Kong, e foi ele que nos explicou tudo o que tinha acontecido. Depois disso cada um de nós podia ir estudar e pesquisar”, conta. Ser autodidacta Ser-se autodidacta para saber o que aconteceu é também ideia defendida por Teresa Vong, docente na Universidade de Macau. A professora recorda que dantes mais alunos conheciam a história, mas que agora nota que eles não sabem. “Para saber é preciso ir pesquisar e isso acontece mais a pessoas que não são chinesas”, explica ao HM. Na realidade são as próprias escolas que escolhem dar, ou não, esta parte da história da China. “Segundo os regulamentos de Macau em relação à educação, as escolas privadas e públicas possuem autonomia no seu ensino. O Governo não define os manuais das escolas, e as escolas podem optar por manuais publicados por qualquer regiões conforme as suas características e necessidades”, explica-nos a Direcção dos Serviços de Educação e Juventude (DSEJ). O Executivo indica que de acordo com o plano de “Exigências das competências académicas básicas da educação regular do regime escolar local”, actualmente a ser executado no ensino infantil e primários, e a começar a ser executado no ensino secundário a partir de 2017, “a perturbação politica que ocorreu em 1989 pertence a categoria de história das Exigências”. No ensino primário é exigido aos alunos, explica a DSEJ, saberem “as consequências das figuras importantes e dos assuntos históricos em tempos diferentes da China” e terem “consciência do desenvolvimento, mudanças e desafios enfrentados pela nação”. Durante o ensino secundário, os alunos devem saber “exploração e prática da politica democrática na China”, e todos os momentos pelos quais a China passou depois de 1949. É exigido aos alunos que tenham a “consciência da construção da política democrática do país” e compreendam os “meios para participar nos assuntos administrativos”. Das dez escolas de Macau contactadas pelo HM, apenas três quiseram comentar o assunto. A Escola da Associação para Filhos e Irmãos dos Agricultores admite que os manuais adoptados são do interior da China e não é mencionado o massacre. Contudo um professor faz questão de explicar aos alunos o que foi, quando e porquê. “O nosso professor de história ensina aos alunos o que foi o dia 4 de Junho”, explica a direcção da escola. A Escola Nossa Senhora de Fátima, o Colégio Yuet Wah, o Colégio de Santa Rosa de Lima – Secção Chinesa e o Colégio do Sagrado Coração de Jesus assumiram o assunto como inconveniente e portanto não se mostraram disponíveis para responder. Caminho árduo Questionada sobre tornar esta matéria obrigatória no ensino em Macau, Teresa Vong diz “ser muito difícil”, apontando várias razões. “Nem Hong Kong tem esta matéria como obrigatória, muito menos a China”, frisa. Ser um acontecimento “recente na história da China” é também ponto referido pela docente. “Os alunos não percebem nada sobre o 4 de Junho. Mas é difícil dizer se este assunto deveria ser obrigatório. Por acaso falei sobre isso com um professor de história e no seu ponto de vista, é preciso definir o [massacre] como acontecimento histórico. A China nunca o confirmou. Foi a explicação que o professor me deu”, remata, sublinhando a necessidade de investigação. Enquanto aqui se tenta apagar a história, ou pelo menos, não falar dela f, do outro lado do mundo, na Universidade de Harvard decorre um curso totalmente dedicado ao Massacre de Tiananmen. As inscrições estão abertas. Com Angela Ka
Filipa Araújo Manchete SociedadeExame Unificado | Alunos nervosos e preocupados com o futuro, dizem docentes A ideia era tirar a pressão aos alunos, mas parece que não está a resultar. O Governo tornou público os exemplos do Exame Unificado e as aulas de apoio já começaram. Alunos estão nervosos e há docentes a defender que este não é o melhor método [dropcap style=’circle’]“[/dropcap]A Europa continua a estar ‘lá fora’, o que preserva o nosso ‘dentro’”. Na sua opinião, o que é que esta afirmação revela relativamente à cultura portuguesa? Esta é uma das perguntas exemplo do Exame Unificado (Línguas e Matemática), correspondente à disciplina de Português. Estão publicados os modelos de exames de Chinês, Português, Inglês e Matemática do Exame Unificado, e parece que a ideia que levou o Governo a criar este tipo de exame – diminuir a pressão aos alunos – não está a resultar. “Os alunos estão mais preocupados. Ficam mais pressionados, com medo de reprovarem”, começa por explicar Stephen Wong, Director do Centro de Educação Unnamed. Isto acontece porque antes deste método de avaliação ser implementado os alunos que terminassem o secundário tinham quatro oportunidades para fazer os exames, algo que deixa de acontecer agora porque só podem fazer o Exame Unificado uma vez. “Se os alunos reprovassem havia mais três exames que poderiam fazer, agora só têm um. Isto quer dizer que se o aluno chumbar não terá nenhuma outra oportunidade de estudar em Macau”, explica. Não terá, pelo menos nas quatro universidades abrangidas pelo este Exame Unificado, sendo elas a Universidade de Macau (UM), o Instituto Politécnico de Macau (IPM), Instituto de Formação Turística (IFT) e Universidade de Ciência e Tecnologia de Macau (MUST). Também Lawrence Wong, reitor da Waseda Professional Education, aponta a mesma reacção. “A maioria dos alunos estão mais stressados com este exame, mais do que antes. No passado os alunos poderiam fazer os exames de forma separada e caso reprovassem no primeiro exames ainda tinham mais três universidades para tentar. Agora? Com este exame se chumbarem não podem entrar em nenhuma das faculdades”, argumentou. Tomás Keong, aluno, explicou, ao HM, que mesmo existindo outras universidades em Macau estas “quatro são as melhores” e por isso é natural que os alunos queiram entrar numa destas. “Se chumbar não vai conseguir, claro que há muito mais pressão”, apontou. Confrontado com a argumentação do Governo, Tomás Keong diz “não fazer sentido”. Mais do que a questão da pressão está em causa a não abrangência a todos os alunos de Macau. “Em princípio não estou de acordo com este exame unificado, é que, por exemplo, o Governo disse que este exame servia para tirar pressão, mas quer dizer, só tira a pressão dos alunos que queiram ir para estas quatro universidades, os outros não contam”, acusa Teresa Vong, docente na UM. Pobre promoção O exame entrará em vigor já no ano lectivo de 2017/2018, mas os trabalhos já começaram em 2012. Alegou na altura o Governo, através da Direcção para Serviços de Educação e Juventude (DSEJ), que o Exame Unificado pretendia “aliviar a pressão dos estudantes, resultante dos exames de admissão, realizados em diferentes instituições do ensino superior”. O Governo queria também “responder às exigências, existentes ao longo do tempo, do sector educativo, dos estudantes e dos seus pais”. Por isso, em 2012, foi criado, pelas quatro universidades em causa, um grupo de coordenação. A este grupo de trabalho competia a organização deste Exame Unificado, com a cooperação do Gabinete de Apoio ao Ensino Superior (GAES). Depois de várias reuniões “para obter consenso” das actividades a desenvolver na promoção do exame parece que os resultados ficaram aquém do previsto. “Não acho que o Governo tenha feito uma boa preparação e isso nota-se na reacção dos alunos, que estão cheios de dúvidas quanto a este exame”, explica Stephen Wong. Também para Ma Xiaofong, estudante finalista do ensino secundário, os trabalho de divulgação não foram os melhores. “As indicações [para o exame] não são suficientes, só existe um modelo de exemplo”, continuou. Ma Xiaofong ainda não sabe se vai fazer o exame ou não, diz que ainda tem tempo para pensar, mas não discordava do regime anterior, achava-o “até melhor” do que a aplicação do exame unificado. “Para mim estava tudo bem como estava, não precisávamos desta mudança. Há menos espaço para os alunos, mas também tem um lado positivo”, explicou. Obrigatoriedade de parte Apesar do exame incluir quatro disciplinas os alunos não são obrigados a fazer todas. Os estudantes, de acordo com as exigências de cada universidade e da sua área especializada, podem escolher candidatar-se apenas a algumas disciplinas que têm interesse para o próprio candidato. “Assim, não é obrigatório que se candidatem a todas as quatro disciplinas. As restantes provas das outras disciplinas, podem ser organizadas, livremente, pelas instituições do ensino superior”, esclarece o Governo. Claro é que num curso de Língua e Literatura Chinesa a prova a realizar é de Chinês, assim como é exigida a prova de Matemática para um curso na área de Ciências e Engenharia. [quote_box_right]“Os alunos estão mais preocupados. Ficam mais pressionados, com medo de reprovarem” Stephen Wong, Director do Centro de Educação Unnamed[/quote_box_right] Relativamente à obrigatoriedade do exame, o Governo esclarece que este não é obrigatório para o término do ensino secundário. “Não é obrigatório que os estudantes do ensino secundário façam o Exame. Aliás, o resultado dos estudantes neste Exame não está nada relacionado com a conclusão do ensino secundário e, também, não prejudica, a sua participação nos exames de admissão realizados por outras instituições, que estão fora do âmbito do Exame Unificado de acesso, nem o prosseguimento dos seus estudos no exterior”, esclarece o Governo em nota à imprensa. A DSEJ explica ainda que “se os estudantes pretenderem candidatar-se às quatro instituições, podem, também, solicitar o acesso sob a recomendação da escola secundária, sem necessidade de realizar o exame. Podem, ainda, aproveitar a classificação obtida nos exames internacionais para pedir dispensa parcial ou total das provas das disciplinas no âmbito do exame unificado”. Ser em todo A questão da internacionalização é uma falha apontada por Teresa Vong. Para a professora, na hipótese de existir este exame então deve ter em conta os alunos que querem estudar fora. Algo que não acontece neste momento. “Os alunos que querem ir estudar na China ou em Taiwan têm que fazer outro exame. Não tenho isto bem confirmado, mas por aquilo que sei o resultado deste exame unificado de Macau não é reconhecido por Taiwan ou China. Portanto os exames dos que queiram estudar fora têm de ser outros. Isto não faz sentido, se o Governo quer unificar então tem de ser tudo”, explicou a docente. “Este é uma tentativa para resolver uma questão local, não tem abrangência internacional”, rematou. Ideia refutada por Lawrence Wong que acredita que este é um método que vem organizar e obrigar os alunos a tomarem decisões mais cedo. “Acho que este exame unificado poderá servir para que as escolas secundárias possam definir padrões muito claros. Por exemplo, se os estudantes querem entrar em universidades de Taiwan, fazem os exames de Taiwan, se querem ficar cá, fazem este. Isto vem criar um mapa muito claro das tendências dos alunos, quantos vão para aqui ou para outra opção. Por último, os estudantes podem agora melhor preparar-se para os exames que querem”, explica. Apoio pronto Por hábito, a esmagadora maioria dos centros de estudo em Macau têm um curso especifico para os exames de ingresso ao ensino superior. É o caso do Centro de Educação Unnamed que sempre teve o curso de preparação para a Universidade de Macau. “Antes oferecíamos o curso para os exames de acesso à UM, mas quando tornámos público o nosso novo curso para o exame unificado recebemos muitas mensagens dos alunos a perguntar o que era, como é que seria o conteúdo do exame, entre outras coisas. Sinal de que a promoção do Governo falhou ou não foi suficiente”, explica o director. Também Lawrence Wong conta ao HM, que já está a decorrer o curso de preparação para este exame, mesmo só estando agendado para Abril do próximo ano. [quote_box_left]“Se o aluno chumbar não terá nenhuma outra oportunidade de estudar em Macau”[/quote_box_left] Em análise aos exemplos fornecidos pela DSEJ, Stephen Wong faz notar alguma diferenças, como é o caso das exigência de Matemática. “Depois de compararmos este modelo de exame ao anterior exame de acesso da UM percebemos algumas diferenças, por exemplo as perguntas de Inglês são mais fáceis, é pelo menos, menos exigente, mas o de Matemática é mais difícil. Acho que este vai ser um desafio para os alunos”, explicou. Lawrence Wong classifica os exames de muito semelhantes. “Tendo como base os exames da UM, que é para onde a esmagadora maioria dos estudantes quer ir, este exame é muito idêntico”. Para o reitor estes novos exames foram elaborados com base nos da UM e por isso esta pode ser uma vantagem para os estudantes. No entanto, Stephen Wong é claro. “É preciso uma maior promoção e preparação dos alunos”, para que os mesmos fiquem mais calmos e confiantes no exame que os espera. “Sugiro que o Governo avance com formações e mais instruções para nós, docentes, para podermos ajudar os estudantes que se sentem perdidos”, remata. (com Angela Ká)
Filipa Araújo PolíticaNotários privados | Curso para todos, vaga só para os melhores Todos podem fazer o curso, mas só os melhores ocuparão as vagas que o Governo irá abrir, um número ainda desconhecido. Governo e Comissão contam com grande adesão ao curso, mesmo de pessoas que não queiram exercer [dropcap style=’circle’]O[/dropcap] Governo continua sem divulgar o número de vagas que vai abrir para o curso de formação de notários privados, nem quando o mesmo se vai realizar. Mas, sabe-se agora, que qualquer advogado interessado pode candidatar-se ao mesmo, desde que respeite os requisitos propostos na revisão ao Estatuto dos Notários. “Acho que muitos advogados querem fazer o curso, mesmo que não queriam exercer a profissão”, explicou Kwan Tsui Hang, presidente da 1ª Comissão Permanente da Assembleia Legislativa, responsável pela análise da proposta de revisão. Este curso, explicou ainda a deputada, terá uma validade de três anos, com possibilidade de extensão por mais um ano, sob proposta da Direcção dos Serviços para os Assuntos de Justiça. Caso os notários privados não exerçam a profissão nesse período a validade do curso irá expirar, pois os conhecimentos adquiridos, explica Kwan Tsui Hang, poderão estar desactualizados. Alta frequência A Comissão acredita que haverá muitos interessados para o curso, mas que o Governo irá ainda estudar o mercado para perceber quantas vagas ir disponibilizar, contudo, a comissão acredita que cerca de 140 advogados possam estar interessados. “Não podemos dizer um número, mas a fazer as contas é possível que sejam mais de 100, talvez 140”, explicou. Contrariamente ao último curso realizado, Kwan Tsui Hang explica que este novo curso terá mais aulas do que o anterior. “O Governo propôs um aumento de aulas de 50 para 75”, rematou. Relativamente aos notários privados que não tomaram posse e não estão no território, também contemplados pela proposta, o Governo admitiu à Comissão que não espera que eles retornem. Ao todo, são 15 os já notários privados que terão, depois de aprovado o novo Estatuto de Notários, de deslocar-se até Macau, mostrando a sua vontade em tomar posse. Algo que terá que ser feito nos primeiros três meses depois da aprovação da revisão.
Filipa Araújo MancheteFestival de Carne | Defensores de animais acreditam em mudanças culturais Controvérsia e choque. São algumas das características atribuídas ao Festival de Carne de Cão na China. Mas os tempos são outros. Cada vez mais chineses apoiam o fim deste massacre. Defensores locais falam em mudança dos tempos [dropcap style≠’circle’]C[/dropcap]omeça hoje e dura 10 dias. Chama-se Festival de Carne de Cão, acontece na cidade de Yulin, na província de Guangxi, e mata 10 mil cães em cinco dias. Polémico é uma das suas características. Em 2014, depois de muitos protestos em edições anteriores, a organização chegou mesmo a antecipar o festival, em uma semana, para que os protestos não invadissem as ruas. Nesse mesmo ano, um comunicado do Governo de Yulin explicava que não existia um festival organizado pelas autoridades. “Uma parte da população de Yulin tem o hábito do consumo de carne de cão e lichias no início do solstício de Verão, e por isso, tornou-se um costume popular nesta cidade”, pode ler-se no documento. O Governo frisava a sua independência na organização indicando que não existia um festival oficial. “Este tipo de actividades nunca foram realizadas pelo Governo ou por associações sociais. As nossas autoridades já lançaram projectos de regulação de carne, promovendo a matança civilizada (…) proibindo a matança pública (…) aumentando a fiscalização do roubo de cães (…)”, indicou na altura o Governo. Depois de milhares de assinaturas recolhidas por diversas petições internas e além fronteiras o Governo indicou que tinha “em conta essas manifestações” e iria esforçar-se “na supervisão” do então chamado costume popular. Conta a história Na sua origem, o Festival de Carne de Cão está relacionado com duas expressões idiomáticas chinesas: “no solstício de Inverno nasce o peixe, no solstício de Verão nasce o cão”, e “comer cão em solstício do Verão, desvia o vento do oeste”, sendo que vento do oeste é sinónimo de azar e doença. Ao comer carne de cão no solstício de Verão, os chineses acreditavam que o seu corpo e sistema imunitário iriam ganhar defesas para qualquer doença possível. Reza ainda a história que segundo a Medicina Tradicional Chinesa se aconselha a população a comer carne de cão naqueles que são considerados os últimos dias de Inverno, pois o Verão está à porta. É ainda defendido que quem come carne de cão – alimento quente – está a equilibrar o yin e o yang [conceitos de taoísmo]. Nos últimos anos o festival tem atraído a atenção do mundo, e, do outro lado da moeda, mais turistas e apreciadores para a cidade. A agência noticiosa Xinhua indica, num artigo, que a atenção atraída pelos defensores dos animais tornou-se uma oportunidade de negócio para os próprios comerciantes locais. É que as atenções aumentaram o número de visitantes e de vendas dos próprios cães ainda vivos, para os salvar. A agência escreve ainda que o mercado dos cães disparou. Um dos casos mais conhecidos, em 2015, foi o de Yang Xiaoyun, uma mulher que para salvar 100 cães de serem comidos pagou mil dólares. Um jornal local indicava que a mulher, de 65 anos, levou os cães para sua casa, em Tianjin. Novos ventos Mas a mudança parece estar a acontecer. Um estudo pedido pela Sociedade de Prevenção aos Maus Tratos dos Animais (SPCA – sigla inglesa), de Pequim, indica que 64%, dos dois mil inquiridos, estão a favor do cancelamento do festival, sendo que 60% considera que este “costume popular” afecta “gravemente” a reputação internacional da China. A empresa contratada pelo estudo, inquiriu dois mil cidadãos, entre os 16 e 50 anos, de mil cidades chinesas e 500 aldeias. As entrevistas foram feitas pela internet, por telefone e na rua. Dos dados tornados agora públicos, cerca de 52% votaram a favor da proibição total do comércio de carne de cão. Do total dos entrevistados 70% indicou nunca ter comido carne de cão. O movimento de discórdia para com este comércio também se fez notar durante as sessões plenárias anuais da China deste ano, em que mais de 80 milhões de pessoas, através do voto online, concordaram com a proposta de Zheng Xiaohe, membro da Assembleia Popular Nacional da República Popular da China, relativamente à “sugestão de legislação para a proibição da entrada de carnes de cão e gato no mercado”. Zheng Zhishan, que assumiu o cargo no International Fund for Animal Welfare, em entrevista com a agência chinesa, referiu que, contrastando com a ideia de países estrangeiros, a maioria dos chineses “adoram animais e protegem-nos”, sendo que a grande parte desconhece sequer esse nicho de mercado de “roubo-transportação-matança-venda de cães e gatos”. O representante citou ainda um estudo feito em 2013, que indicava que 95% dos inquiridos “adoram animais” e “recusam-se ao consumo de animais de estimação”, considerando que “os animais devem ser protegidos”. Gao Guang, vice-secretário geral da Associação de Carne da China, chegou mesmo a afirmar que na “China não existe a indústria do cultivo do ‘cão comestível’”. “O consumo de carne de cão é caso raro na China”, afirmou à agência. O veterinário Liu Lang, também presidente da Associação das Clínicas dos Animais Pequenos de Pequim, afastou a possibilidade o cultivo de cães e gatos para consumo, sendo que, diz, é “algo que tem custos elevados, seja na alimentação ou vacinação”. “O período de cultivo também é muito longo”, apontou. Dados das autoridades chinesas mostram que o preço da carne de cão, entre 2011 e 2014, variou entre os sete yuan e os 23 yuan por quilo. “(…) mostrando que só com roubo dos animais de estimação é que se pode ganhar dinheiro”, pois o segundo os cálculos de Xia Shaofei, Director do Departamento da Clínica da Universidade de Agricultura da China, para este tipo de carne ser rentável deveria custar mais de 100 yuan por quilo. Questionado sobre os últimos dados, Albano Martins, presidente da ANIMA – Sociedade Protectora dos Animais, diz que a tendência é cada vez mais a da proibição. “Basta ver que ainda há muito pouco tempo, grupos de activistas pelos direitos dos animais pararam, com a ajuda da polícia, milhares de gatos que iam ser consumidos. A polícia prendeu os transportadores, eles foram presos. Isto significa que na própria China as autoridades já não acham piada nenhuma a este tipo de manifestação”, argumenta, frisando que este tipo de festival “já não tem sentido numa China que se está a modernizar”. Cada vez mais “a comunidade chinesa não aceita isto” e “é violenta para quem viola os direitos dos animais”. Albano Martins recorda uma manifestação que reuniu um milhão de pessoas na China contra este tipo de “costume”. A matança de animais domésticos, ou de estimação, “violenta os fundamentos humanísticos” e não existem razões culturais ou de necessidade, como por exemplo a fome, que justifiquem tal acto. “Não é cultural, nem para alimentação. Claro que durante a nossa história houve sempre pessoas que comeram animais, mas neste momento não tem razão de ser”, rematou. Hipocrisia gratuita Fátima Galvão, representante da MASDAW – Associação Protectora de Animais, mostra-se totalmente contra, mas aponta o dedo a todos aqueles que criticam este festival. “É evidente que para mim conseguir-se acabar com o festival é uma vitória. É lamentável que ainda não se tenha conseguido. No entanto, ao mesmo tempo, existe uma grande hipocrisia entre as pessoas. É que isto é uma questão cultural, enquanto todo o resto do mundo se põe à apontar o dedo à China, deviam era pensar o que aconteceu aos animais que comem, como é que eles são criados e abatidos”, acusa. É o bom comportamento que dá permissão à critica e por isso, Fátima Galvão afirma ser necessário consciencializar a população mundial do mal que se está a fazer aos animais de uma forma geral. Mudando isso, tudo muda, diz. Em reacção, Albano Martins assume que esta é uma discussão muito acesa, mas não tem dúvidas de uma coisa, “as sociedades vão caminhando cada vez mais contra o abate de animais que estão próximos do ser humano e que com ele conseguem estabelecer uma comunicação”. Com Angela Ka
Filipa Araújo PolíticaCaso Jinan | Criticada investigação feita a Scott Chiang Especialistas consideram que a investigação que as autoridades policiais estão a fazer ao presidente da Associação Novo Macau é negativa para a imagem internacional da RAEM, revela alguma intimidação e põe em causa o segundo sistema [dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] protesto organizado pela Associação Novo Macau (ANM) contra a doação de 100 milhões de renmimbi à Universidade de Jinan obrigou o seu presidente, Scott Chiang, a ir à Polícia de Segurança Pública (PSP) prestar declarações, estando a ser investigado por alegada desobediência. Ao HM, especialistas consideram que esta reacção das autoridades policiais só revela a existência de um cerco mais apertado ao activismo local. “Esta não é a maneira mais correcta para lidar com este caso, especialmente se tivermos em conta a imagem internacional de Macau em termos políticos. Em Macau e Hong Kong temos liberdade de expressão e também a liberdade de manifestação, as quais estão defendidas no conceito de “Um país, dois sistemas” e na Lei Básica”, disse Larry So, ex-docente do Instituto Politécnico de Macau (IPM). “Não diria que passou a ser proibido participar numa manifestação, mas parece que o Governo cria muitas dificuldades e entraves que desencorajam as pessoas a participar nestas iniciativas. Vejo que o Governo está a criar cada vez mais restrições e a espremer as pessoas (no sentido de lhes retirar mais informações)”, adiantou Larry So. Pela transparência O deputado Ng Kuok Cheong, que já não pertence à ANM mas que luta por uma maior clarificação do caso Jinan, referiu ao HM que o Executivo “tem de parar com este tipo de procedimentos”. Sobre a doação feita à universidade chinesa, Ng Kuok Cheong continua à espera. “O Governo não é claro com uma questão que tem a ver com o interesse público. É necessária mais informação sobre este caso mas o Comissariado contra a Corrupção (CCAC) já me confirmou que neste momento não pode divulgar quaisquer dados”, acrescentou o deputado à Assembleia Legislativa (AL). O académico Eric Sautedé recorda uma “participação massiva da polícia, maior do que o habitual” num protesto que juntou três mil pessoas nas ruas. “Podemos ver que nos últimos anos, e sobretudo desde o protesto contra o Regime de Garantias, que as autoridades dão mais atenção a este grupo. Não diria que há intimidação de forma directa mas há uma maior atenção dada para alguns grupos sociais.” “Há uma grande pressão política à volta do caso da Universidade de Jinan”, destacou o politólogo e ex-docente da Universidade de São José. “Deveria haver maior independência, mas caberá aos tribunais decidirem. Quanto à existência de maior intimidação, (os membros da ANM) estão a ser mais pressionados e não é apenas uma percepção, é a realidade”, referiu o académico. A investigação de que Scott Chiang está a ser alvo prende-se com uma alegada desobediência durante o protesto de 15 de Junho, tendo sido posteriormente contactado pela PSP para se dirigir à esquadra prestar declarações, juntamente com outros membros da associação pró-democrata. À agência Lusa a PSP confirmou que o presidente da ANM é “acusado de agravação de desobediência à polícia”. Já foi entregue um relatório ao Ministério Público (MP), que ordenou “mais averiguações”. No dia 15 de Junho a PSP bloqueou o acesso a uma rua mas o grupo, segundo a polícia, “não obedecendo à decisão do Tribunal de Última Instância, nem às instruções indicadas por esta polícia, recusou utilizar os passeios que os agentes no local indicaram, obstando deliberadamente o trânsito (…) e provocando momentos de disputa com os condutores”. De frisar que o mesmo protesto pedia a demissão de Chui Sai On do lugar de Chefe do Executivo.
Filipa Araújo MancheteNotários privados | Advogados não estão contra limites do Governo Notários privados de Macau não se mostram contra limites impostos pelo Governo para novo Estatuto dos profissionais. Uma profissão que exige muita idoneidade, rigor e que está cada vez mais difícil. Neto Valente não acha elevado o número de sanções na última década [dropcap style≠’circle’]N[/dropcap]a passada semana, 23 advogados entregarem uma carta à 2ª Comissão Permanente da Assembleia Legislativa (AL), manifestando-se contra os limites, definidos pelo Governo, na candidatura para o curso de notário, a abrir ainda em data indefinida. Em causa está, especificamente, a barreira na candidatura a todos os advogados que tenham sido condenados com pena disciplinar acima da censura. Ana Fonseca, advogada e notária, está de acordo com as exigências do Governo. “Compreendo que se seja muito exigente em relação à idoneidade. A mim não me repugna que não se permita a advogados que tenham qualquer pena disciplinar superior a censura que lhes seja vedado o acesso ao notariado”, explica ao HM. É para na visão da profissional “ser notário implica uma idoneidade mais exigente”, algo que sempre esteve em discussão. “Repare, a questão vem já do passado, quando foi criado o notário privado, com a própria acumulação de funções de advogado com notário privado. Ao ser-se advogado é suposto estar a intervir e a defender uma parte, como notário [o profissional age] como uma espécie de magistrado, com isenção e imparcialidade a documentar o negócio que ambas as partes querem”, referiu. Uma decisão do Governo que “até faz sentido”, até porque, diz, com tantos possíveis candidatos é natural que o Governo queira seleccionar aqueles que nunca foram sancionados. “A partido momento que existe um universo de candidatos mais do que suficiente para as necessidades, ou para o número de vagas que possivelmente existirá, faz todo o sentido que eles [o Governo] estejam a limitar, ou a fazer passar à frente aqueles advogados que nunca foram objectos da sanção disciplinar”, refutou. Ideia que não é partilhada pelo advogado Jorge Neto Valente que acredita que “com tantas exigências” a que a função de notário obriga não “haverá muitos interessados”. Cara do Executivo O ser-se idóneo parece ser o argumento mais forte para justificar a escolha do Governo. Diz o advogado Luís Almeida Pinto concordar com a decisão, sendo que é preciso frisar que “independentemente do dispositivo legal que venha a ser aprovado nesta matéria, a relevância social do exercício de tais funções de natureza pública, e a fé e credibilidade de que devem revestir todos os actos dos Notários Privados, exige que os Advogados em exercício de tais funções tenham um registo disciplinar muito próximo do impoluto, sob pena de se poderem estabelecer suspeições e incertezas sobre os actos por si praticados, em absoluto prejuízo da autenticidade e fé pública que os actos notariais têm que merecer. Um notário representará sempre o Governo, aponta, e isso é crucial para o desenvolvimento da sua profissão. “O exercício da função de notário privado, em Macau, terá sempre que ser aferida pelas exigências e regras de competência e credibilidade das funções dos Notários Públicos. Jamais nos poderemos esquecer que o advogado que é notário privado representa o Estado, a RAEM, e que, em nome desta, assegura o controlo da legalidade e que a vontade das partes está de acordo com a lei aplicável ao acto, dando garantia de autenticidade aos actos em que intervém, como depositário e afirmador da fé pública, a qual é uma prerrogativa exclusiva do Estado, da RAEM”, apontou. Nessa medida, todas as exigências de controlo e fiscalização terão que ser admitidas relativamente a esses profissionais, mas “tão somente quanto aos actos e exercício das suas funções de notário”. “O advogado que confunda o exercício da sua profissão liberal com a de notário, ou que incumpra regras fundamentais do exercício de autoridade pública delegada, pondo em causa a fé pública dos seus actos notariais, deverá ser sancionado e impedido de exercer tais funções de natureza pública. Tanto pelo órgão público tutelar, como pela Associação de Advogados de Macau (AAM), porque o advogado terá incorrido também, nesse caso, em incumprimento de regras deontológicas da profissão”, reforça. Números em destaque Jorge Neto Valente explica ainda ao HM que a “AAM limitou-se a concordar com o Governo”. “Não sei quem são [os advogados que assinaram e entregaram a carta] mas desconfio que seja para proteger alguém em especial”. Para o advogado a argumentação, por parte dos assinantes da carta, de que a associação a que preside atribui multas com muita frequência, não é verdadeira. “Há muita gente que pensa que punimos pouco. Eu até acho que há penas que não são muito penalizadoras. Não acho que nos últimos dez anos tenham sido muitas”, explicou. Entre 2006 a 2016, houve 17 casos de sanções disciplinares, envolvendo nove advogados e um estagiário. Registaram-se ainda sete suspensões de exercício de actividade envolvendo cinco advogados e um estagiário a quem não foi atribuída idoneidade para a prática da profissão. “Se há sanções é porque os advogados fizeram asneiras”, reforça ainda Neto Valente. Um ponto de partida Para o advogado João Encarnação é preciso ver a questão de uma forma mais ampla. “Os requisitos para admissão ao curso de notário e à sua função têm de ser definidos em algum ponto, se é na pena de advertência, multa, censura ou suspensão, em alguma delas terá de ser. Obviamente que os advogados e notários praticam uma função essencial à sociedade, nomeadamente os notários têm determinadas responsabilidades que lhes exige um grau de idoneidade muito elevado. Tem de exigir confiança por parte do Governo, portanto é preciso estabelecer que pessoas que tenham um currículo disciplinar que não se coaduna com a profissão, não possam exercer essa função”, começa por apontar. João Encarnação assume que não tem um “padrão” para definir esse ponto, porque a argumentação pode atribuir razões a várias possibilidades. “Teremos sempre razões para achar que [os limites ao curso] devem ser a partir da advertência, multa ou mesmo só para quem tenha sido suspenso. Eu diria que a multa é um meio termo, a advertência seria muito pouco, porque toda a gente se pode enganar e às vezes a advertência surge por um descuido ou um engano praticado pelo advogado. A suspensão só existe por actos bastantes graves. E no meio está a multa. No meio está a virtude e é capaz de não ser mal pensado”, argumentou, admitindo que não tem uma opinião inflexível. O mesmo diz Pedro Leal, também advogado, que defende que “a generalização que é feita, qualquer pena acima da censura pode não ter a ver com a qualidade técnica do profissional”, algo que dependeria de cada caso. “Analisar caso a caso, para perceber qual a causa da censura, iria implicar um esforço muito grande, mas deveria ser feito, porque há casos em que este tipo de sanção poderá não estar ligado à qualidade.” No mesmo saco João Encarnação faz notar a amplitude da aprovação da proposta. É que estas alterações vão fazer-se sentir em todos os profissionais, ao contrário do que a população poderá pensar. “Isto é um requisito que se vai aplicar a todos os advogados. Também se aplicará a todos os que já estão em funções, embora só a penas que tenham sido aplicadas já depois da entrada da proposta em vigor. Mas, qualquer que seja a determinação do Governo aplicar-se-á a todos os notários, sendo que a mim também, por isso, posso afirmar que não me repugna que o limite seja a partir da multa, mas poderia ser a partir da suspensão. É uma questão de ver quais são os argumentos do Governo”, rematou.
Filipa Araújo SociedadeSaúde | Maior inspecção depois de cancelado serviços sem licença Depois de alguns médicos advertirem para o risco da saúde pública nas cirurgias estéticas, devido à falta de lei, os SS dizem que vão reforçar as inspecções. A decisão acontece depois de ter sido detectada a prestação de um serviço de botox sem licença. O caso segue para investigação [dropcap style≠’circle’]O[/dropcap]s Serviços de Saúde, em cooperação com o Instituto para os Assuntos Cívicos e Municipais (IACM) vão reforçar as inspecções aos estabelecimentos de beleza depois de terem detectado ilegalidades na prestação de serviços de mesoterapia num espaço de beleza. “Perante esta situação os SS e o IACM irão reforçar a inspecção aos estabelecimentos de beleza de forma a prevenir a prestação ilegal de serviços médicos prejudicando os interesses públicos”, indicaram as autoridades em comunicado à imprensa. No documento pode ainda ler-se que, depois de uma inspecção, os SS detectaram que o espaço em causa está a prestar serviços de mesoterapia – através de um sistema denominado por Vital Injector – sem licença. As autoridades indicaram que neste momento estão à aguardar a emissão de ofício, passado pelo IACM, para notificar o espaço de beleza e avançar com uma investigação. O Vital , explicam, é um aparelho computorizado que através do uso de micro-agulhas aplica na pele soluções injectáveis (nomeadamente toxina botulínica – vulgo botox – ácido hialurónico ou outros componentes) com o intuito de hidratar e atenuar rugas. Antes da intervenção é utilizado um creme [Lidocaína] anestésico que pode provocar efeitos secundários, entre os quais reacções alérgicas. “Acresce que a utilização do Vital Injector provoca nas áreas onde é utilizado inúmeras perfurações onde são aplicados os injectáveis além de provocar furos ensanguentados. A aplicação inadequada destes procedimentos pode causar infecções, ou cicatrizes permanentes em casos graves”, acrescentam os SS. Mesmo não sendo considerados medicamentos, estes produtos e a operação invasiva são considerados procedimentos médicos que devem ser “obrigatoriamente executados por médicos inscritos em estabelecimentos de prestação de serviços de cuidados de saúde”. “(…) caso os estabelecimentos de beleza proporcionem medicamentos (incluindo estupefacientes) aos seus pacientes podem violar as disposições referentes ao exercício das profissões e das actividades farmacêuticas”, apontam, frisando que “a prestação de serviços médicos por alguém que não está habilitado ou não possua licença de médico é considerada crime”. Alerta de riscos O caso acontece depois do HM ter publicado um artigo que defendia que os residentes de Macau correm risco de vida quando recorrem a este tipo de serviços, pois não existe legislação. “Em Macau qualquer curioso vai a um Centro de beleza e faz a cirurgia. Os procedimentos que têm de ser feitos pelos especialistas, por exemplo o botox, é feito por qualquer curioso, em qualquer lado. Portanto qualquer acto médico em Macau é feito sem responsabilidade nenhuma porque ninguém assina papéis”, advertiu o médico Rui Furtado, reforçando que a saúde pública está em risco.
Filipa Araújo Manchete ReportagemFunção Pública | Funcionários falam de ambiente de medo e pressão Um ambiente de medo e pressão. É assim que alguns funcionários públicos relatam o seu dia-a-dia. Chefes inflexíveis que só ouvem “amigos” prejudicam um local que deveria ser bom. Com consequências graves, é a estabilidade da família que os faz ouvir e calar [dropcap style=’circle’]É[/dropcap] inegável. Trabalhar na função pública parece ser bastante bom. “Na nossa cultura é normal querermos ir trabalhar para o Governo. Os nossos pais passam-nos essa ideia, que trabalhar na função pública é mais estável, ganhamos mais dinheiro e não há muitos riscos. Não temos de trabalhar muito”, diz-nos Weng, jovem residente de Macau, que, como tantos outros, anseia o momento da publicação dos resultados da candidatura para a função pública. Tem 23 anos e não quer fazer outra coisa. “Quero trabalhar no Governo”, reforça. Como ela, “quase todos” os seus amigos seguem-lhe os passos. A própria Weng está a fazer aquilo que muitos outros também fizeram. Mas será assim tão bom trabalhar na função pública? Um salário chorudo, horário fixo e leveza na densidade de trabalho serão motivos suficientes para dizer que este é o melhor emprego do mundo? “É horrível! As pessoas não imaginam o que é trabalhar nos departamentos do Governo. Basta ir perguntar às pessoas, é normal que ninguém queira falar, mas as famílias, a sociedade sabe: não é bom trabalhar na função pública”, responde Ku, funcionário público há 10 anos, que prefere ocultar o departamento onde trabalha. Silêncio, por favor Ku começa por explicar que “nem todos os departamentos são maus” mas a realidade mostra que em “quase todos” os sectores registam casos de “abuso de poder”. “O que reina, entre os funcionários, é o medo. Não podemos dizer nada, não nos é dada a hipótese de expormos as nossas ideias, darmos as nossa opiniões. Já para não falar das queixas. Se o fazemos sofremos consequências, já todos ouvimos histórias dessas e muitos de nós já sentiram as consequências na pele”, continua, afirmando que o próprio é um exemplo disso. “O meu trabalho é bastante metódico. Escrevo muitos documentos. O nosso sistema informático é antigo, e não há vontade de actualizar, temos de trabalhar com o que há. Não é raro na escrita as vezes darmos erros, normalmente os softwares dão aviso de erro. O nosso não, portanto torna-se ainda mais comum que os documentos possam ter, por vezes, alguns erros. Aconteceu-me comigo, várias vezes. E com os meus colegas. Éramos constantemente repreendidos por uma coisa que podia ser facilmente resolvida. Resolvi apresentar uma sugestão à direcção para instalar um dicionário no nosso software e resolver o problema”, recorda o funcionário público. A sugestão não foi bem vista pelas chefias que sem tolerância perante o funcionários decidiram atribuir-lhe um castigo, por este ter admitido que errou outras vezes. “Fui castigado, tiraram-me três dias de vencimento alegando que eu tinha errado. Não ouviram a minha sugestão e continuam a acontecer erros. Isso nota-se, por exemplo, nos comunicados à imprensa, ou em qualquer outro documento interno”, aponta, frisando que “fazer o bem quando se têm um chefe que se acha superior e perfeito não adianta”. “É melhor estar calado e deixar a máquina andar sem condutor”, lamenta. Pressões e tragédia Com a equipa do HM estão 10 funcionários públicos. Todos eles com relatos mais ou menos graves. O pior caso é a de uma jovem funcionária pública, contada pela boca de Lao, colega de trabalho da vítima. “É muito vulgar os superiores hierárquicos ralharam de forma indiscriminada. Por tudo e por nada, com ou sem razão. A nossa colega estava grávida e todos os dias era alvo de berros e a fúria do chefe. Todos os dias eram berros e mais berros. Muitas vezes lá ia ela para a casa-de-banho chorar. Um dia depois de uma sessão de berros foi para a casa-de-banho uma vez mais, mas demorou muito. Fomos ver o que se passava, estava desmaiada no chão. Infelizmente perdeu o bebé”, relata. O silêncio invadiu a sala e as caras não pareceram surpresas. “Há muitas histórias como esta”, remata, Cheong, funcionário público com mais de 30 anos de serviço. Leong acrescenta que “seja homem ou mulher, um dia todos cedem e acabam por chorar, de nervos ou de estar farto”. Amigos à parte Leong relata ainda situações em que o chefe se torna “altamente inflexível”. “Nós que trabalhamos no terreno sabemos mais do que eles [chefes] e como vamos dar uma opinião ou uma sugestão se eles são inflexíveis? Não querem ouvir? Só se for amigo da pessoa, ou filho de alguém importante”, aponta. Uma postura de chefe e nunca de líder, os funcionários descrevem um ambiente de pressão laboral. “Todos os dias vamos para o trabalho com medo. Se erramos vamos ouvir berros, é-nos tirado parte do ordenado”, partilha. Questionados sobre uma possível mudança de trabalho, olham-nos com ar de surpresa. “Não há ordenados como na função pública. Como vamos alimentar as nossas famílias?”, responde Lao. O “2 5” Falar para a comunicação social é sempre “um grande problema” e a participação na vida social e política é melhor manter bem longe. Quase todos tinham marcado presença em pelo menos uma manifestação do 1º de Maio. Recordam o ano em que muitos foram de máscaras. “Sabemos que temos consequências se formos para as manifestações”, frisa Leong. Muitas vezes concordam com o que leva as pessoas à rua, mas é melhor ficar a ver, ao longe, para garantir a renovação do contrato de trabalho. Pior que é isso é método “espião”, mais conhecido por “dois (2) cinco (5)”. “Ás vezes em jantares de trabalho e convívios há um espião, o dois cinco, enviado pelos chefes para tentar saber coisas. Nós pensamos que estamos num ambiente de amigos e até podemos desabafar sobre qualquer coisa, ou criticar os chefes e o espião vai contar tudo. Temos sempre de ter cuidado. Depois fazem-nos a vida negra”, conta um dos funcionários que preferiu não ser identificar. Influência chinesa Questionados sobre as possíveis diferenças entre a governação antes e depois da transferência da soberania, aqueles que trabalharam nos dois sistemas não têm dúvidas: “era muito melhor”. “Com os portugueses podíamos debater assuntos, dar opiniões, havia estímulo, agora não, é mais estilo chinês, ordem e respeito ao chefe”, apontou um dos funcionários que conta com mais de 32 anos de serviço. Questionado sobre as acusações António Katchi, ex-funcionário público, jurista e docente de Administração Pública no Instituto Politécnico de Macau (IPM), fundamenta a possível mudança de comportamento. “Depois da transferência do exercício da soberania, Macau continuou a ter um regime político local formalmente semelhante, mas subordinado agora a um regime político nacional estalinista putrefacto, o qual reforçou aqui o poder da sua velha parceira de negócios, a oligarquia local. Tendo em conta este pano de fundo, creio podermos considerar compreensível – o que não significa “aceitável” – a evolução negativa que se registou, quer na faceta liberal do regime político de Macau – que está permanentemente sob ameaça e sofre frequentes facadas -, quer no ambiente interno da função pública”, afirmou ao HM. [quote_box_right]“Ás vezes em jantares de trabalho e convívios há um espião, o dois cinco, enviado pelos chefes para tentar saber coisas”[/quote_box_right]Com a transição o ensino primário e secundário continuou a ser “esmagadoramente dominado por escolas privadas diversas obediências, qual delas a mais conservadora: escolas católicas, escolas protestantes, escolas pró-Pequim, escolas pró-Taipé. Muitos dos alunos saídos dessas escolas foram estudar para universidades da China continental e de Taiwan (e recordemos que Taiwan vivia sob uma ditadura militar fascista até ao início dos anos 90)”. “Ora, é deste caldo político-cultural que saíram muitas das pessoas que, a partir dos anos 90, começaram a ser apressadamente içadas para os altos cargos da Administração Pública, no âmbito do processo conhecido como ‘localização de quadros’. Algumas outras eram mesmo oriundas da China continental e, de entre estas, uma ou outra vinha directamente das fileiras ou do submundo do Partido ‘Comunista’ Chinês. Estes novos dirigentes, normalmente muito jovens e cheios de vontade de impor a sua autoridade a pessoas mais velhas, mais experientes e amiúde mais qualificadas, vieram substituir pessoas oriundas de Portugal, de onde vinham imbuídas, em maior ou menor grau, dos valores que se tornaram dominantes em Portugal após a Revolução de 1974. A tudo isto acresceu uma especial admiração do primeiro Chefe do Executivo, Ho Haw Wah, por vários aspectos – em geral, os mais negativos – do regime político e da Administração Pública de Singapura. Essa sua admiração, pelos vistos partilhada pela então Secretária para a Administração e Justiça, inspirou o Governo a iniciar uma política indiscriminada de “formação” de funcionários públicos, sobretudo de pessoal de direcção e chefia, em Singapura. Foi como se o farol da Administração Pública de Macau tivesse passado de Portugal para Singapura”, argumentou. Para nada As diferenças são então inegáveis, como por exemplo, no apoio à formação. Cheong conta que ele e os seus colegas são obrigados a frequentar formações que em nada lhes são úteis e, sempre, em horários pós laboral. Este é também um dos exemplos que António Katchi partilha. “(…) Nos anos 90, [os] dirigentes encaravam muito positivamente a decisão dos trabalhadores de tirarem um curso de licenciatura e faziam o possível, dentro dos limites da lei e tendo em conta as necessidades dos serviços, para lhes facilitarem essa acumulação do trabalho com os estudos. A maioria dos actuais magistrados, quer judiciais, quer do Ministério Público, e muitos dos titulares de altos cargos na Administração Pública, beneficiaram desse encorajamento e dessas facilidades. Após a transferência do exercício da soberania, os novos governantes e muitos dos dirigentes da Administração Pública passaram a tentar barrar a ascensão educacional e profissional dos trabalhadores da Administração Pública: não só deixaram de os encorajar, como passaram a dificultar-lhes o estudo por diversas formas – impondo-lhes a prestação frequente de trabalho extraordinário, obrigando-os a frequentar cursos de “formação” inúteis ou de fraca utilidade para o serviço, impedindo-os de sair do serviço um pouco mais cedo para poderem comer e chegar às aulas a tempo e horas, proibindo-os de estudar no local de trabalho mesmo quando não têm nada para fazer, entre outros – , chegando mesmo ao ponto de violar direitos consagrados na lei, como as faltas para exame”, relata. Mecanismo a caminho Em reacção, o director dos Serviços de Administração e Função Pública, Kou Peng Kuan garantiu que “criar um bom ambiente de trabalho para os trabalhadores da função pública foi desde sempre uma preocupação do Governo”, daí o Executivo ter apresentado uma proposta para a criação de um mecanismo de tratamentos de queixas dos trabalhadores. “Este mecanismo serve para fomentar o diálogo entre os trabalhadores e os serviços, resolver atempadamente os eventuais desentendimentos e conflitos entre as partes, criando, deste modo harmonia no ambiente de trabalho”, continuou. O director explica ainda que o mecanismo prevê a criação de uma entidade imparcial, uma comissão, que “vai acompanhar o resultado do tratamento dos serviços das questões apresentadas pelos trabalhadores, com o objectivo de garantir a justiça e a imparcialidade no tratamento das queixas, e determinar que o trabalhador não pode ser prejudicado em virtude de ter apresentado queixa”. Compete aos SAFP a formação de recursos humanos para essa averiguação. “O SAFP vai proporcionar formação e orientações aos trabalhadores dos serviços públicos responsáveis pelo tratamento de queixas assegurando um tratamento adequado das queixas, para que, desta forma, seja implementado o mecanismo de queixas e criado um bom e harmonioso ambiente de trabalho”, explicou o director. “Quer dizer, é o próprio serviço que está a ser acusado que trata da queixa, ou que pede a alguém para tratar da queixa? Não, isto está errado. Este mecanismo de queixas tem que ser efectuado por outra entidade, uma de confiança. Que garanta a segurança do trabalhador. É preciso justiça. O que tem acontecido em Macau, nos seus serviços públicos, é que muitas vezes, quando há um problema a ser analisado, os directores já sabem o que vai acontecer, qual a decisão. Dizem que estão a avaliar mas não”, reagiu Cheong, trabalhador. [quote_box_left]“O que reina, entre os funcionários, é o medo”[/quote_box_left] Com ou sem mecanismo, no fim, aponta, os mais prejudicados são os cidadãos. “O medo reina na função pública. Eu admito, se vir alguma coisa a acontecer a um colega de trabalho, nunca serei testemunha dele. Tenho medo de represálias e de perder o emprego. Temos medo, temos medo. Quem sofre mais são os próprios cidadãos. Se nós prestamos mal o serviço, como é que vai chegar à sociedade? Pior! O que acontece é que dados errados e informações incorrectas são atribuídas aos cidadãos por causa de todos estes erros e falhas no sistema”, rematou Cheong. ATFPM recebe 50 queixas por dia José Pereira Coutinho, presidente da Associação dos Trabalhadores da Função Pública de Macau (ATFPM), não se mostrou admirado quando confrontado com os casos. “É o prato de cada dia”, afirmou. A associação que dirige, conta, recebe “uma média de 50 casos por dia”. “Os trabalhadores da função pública sofrem muitas pressões desnecessárias, deixou de existir um diálogo honesto de olhos para olhos entre superiores e inferiores. A maioria dos trabalhadores são considerados como máquinas. Isto resulta pelo facto de que as pessoas escolhidas para cargos de direcção, e chefia, terem sido escolhidos sem preparação. Isto porque são, normalmente, amigos de amigos”, acusa. Em reacções ao mecanismo a ser criado, Pereira Coutinho não tem dúvidas: “é inútil”.
Filipa Araújo PolíticaCondomínios | Regras obrigatórias para prédios com mais de 10 fracções [dropcap style=’circle’]O[/dropcap]s condomínios com mais de 10 fracções autónomas terão de ter um regulamento. A regra é definida pelo Regime jurídico da administração das partes comuns do condomínio, em análise na especialidade. Uma regra, aponta Chan Chak Mo, presidente da 2ª Comissão Permanente, grupo responsável pela apreciação, “muito clara”. No fundo, explica Chan Chak Mo o que se pretende é que os edifícios “criem Assembleia Gerais”. “Sabemos que muitos edifícios não as têm, e também não existem administração [de condomínios], por isso pretende-se, com a proposta, incentivar à criação das assembleias gerais e administrações”. Propõe então o regulamento que todos estes edifícios criem, na sua primeira reunião, um regulamento do condomínio, ou que aprovem o mesmo, caso já exista. Se os condóminos não aprovarem, ou que o mesmo não entre em vigor nos seis meses após a reunião, este regulamento deve voltar a votos. Se ainda assim não for aprovado, é a própria administração que o aprova, conforme explica o presidente da Comissão. Administração esta, que em edifícios com menos de 100 fracções poderá ser composta apenas por uma pessoa. Igual ou superior a esse número as administrações terão de ter um mínimo de três pessoas na sua composição. A análise na especialidade continua para a próxima semana. Tal como já referido, em sessões passadas, Chan Chak Mo não sabe se os trabalhos irão estar terminados ainda nesta sessão legislativa.
Filipa Araújo PolíticaTNR | Ella Lei acusa o Governo de se “esquivar” à questão Ella Lei acusa o Governo de estar recrutar TNR sem respeitar os requisitos mínimos. Em reacção Albano Martins diz que Governo tem de respeitar as regras do jogo, para todos os sectores [dropcap style=’circle’]A[/dropcap] deputada Ella Lei acusa o Governo de dar explicações que “servem apenas para desviar a atenção do público e esquivar-se da questão”. Em causa estão os requisitos mínimos a ser cumpridos aquando do pedido de mão-de-obra importada para a construção civil. Numa interpelação oral, Ella Lei diz que em 2005, pela mão do ex-Secretário para a Economia e Finanças, Francis Tam, o Governo definiu um salário mínimo diário de 450 patacas como um requisito a ser cumprido. Montante este que até agora nunca terá sido actualizado, estando por isso “desfasado do actual nível de salários no sector”. Em 2015, os números mostravam que 10,8% dos trabalhadores do sector, um total de cinco mil, recebiam menos do que isso. Sinal de que os serviços do Governo estavam a “autorizar a importação de trabalhadores cujo salário se situava abaixo do critério de aprovação para a sua entrada”. Na altura, o Executivo explicou que os trabalhadores com baixo salário seriam “indivíduos com funções administrativas nos estaleiros de obras, jardineiros, responsáveis de armazéns, auxiliares e assistentes de lojas comerciais”. “Porém, segundo os dados que solicitei ao Gabinete para os Recursos Humanos, em diversas actividades, por exemplo, electromecânica, pintura e alvenaria, o salário mensal mínimo em 2015 era de 8 mil patacas, quase idêntico ao nível registado em 2014. Esses dados demonstram que existem, de facto, actividades e até profissões especializadas com salários inferiores a 11,700 patacas”, frisa a deputada. Justo para todos Confrontado com a questão, Albano Martins, economista, defende que sempre que pede – para a Sociedade Protectora de Animais de Macau (ANIMA) – trabalhadores não locais “uma das exigências é que eles recebam o mesmo salário que os locais”. “Portanto eu não consigo perceber como é que o Gabinete de Recursos Humanos, a mim me concede trabalhadores com o mesmo grau de exigência – e eu acho muito bem – e na construção civil não o faz”, aponta. Esta é, para Albano Martins, a grande questão. Ella Lei levanta ainda a questão da “injustiça” para com os trabalhadores locais por colocar em causa “a política de recusa de substituição dos locais por mão-de-obra mais barata”. Ideia completamente refutada por Albano Martins. “Não há hipótese absolutamente alguma destes trabalhadores [locais] serem colocados de lado para serem importados outros. Não há hipótese nenhuma. Nem há universo de locais suficiente para alimentar a industria da construção. Quando as obras terminarem os TNR’s terão de voltar à China, portanto o número total de TNR’s agora irá diminuir em cerca de 50%”, desvalorizou. O que é preciso é, aponta, exigir ao Governo que cumpra as mesmas regras do jogo para todos os sectores. “A indústria da construção não está em recessão. Percebo que se importem TNR’s mais baratos quando a inflação é elevada e para fazer baixar o custo de vida. Mas neste caso concreto, não faz sentido a importação de trabalhadores a preço mais baixo. Não são estas as regras do jogo”, frisou.
Filipa Araújo MancheteEnsino | Fim do modelo de memorização será gradual, dizem especialistas Duas especialistas em educação defendem que o fim do modelo de memorização nas escolas vai acabar de forma gradual e que a mudança depende não só de professores mas da sociedade, por se tratar de algo cultural [dropcap style=’circle’]O[/dropcap] deputado Zheng Anting pediu o fim do modelo de ensino “duck stuffing”, em que os alunos se limitam a decorar aquilo que vai ser no exame. Os Serviços de Educação e Juventude (DSEJ), em resposta à interpelação do membro do hemiciclo, confirmaram que isso pode vir a acontecer. Duas especialistas contactadas pelo HM consideram que o modelo de ensino baseado na memorização de conteúdos é algo cultural, defendendo que uma mudança irá ocorrer de forma gradual. “Não se mudam as mentalidades nem dos professores, nem dos alunos ou da própria sociedade de um dia para o outro, porque o facto das escolas se basearem nesse método não tem apenas a ver com os professores. Tem também a ver com as expectativas das famílias. Toda a sociedade, aos poucos, há-de mudar”, disse Ana Correia, directora da Faculdade de Psicologia e Educação da Universidade de São José (USJ). A memorização das matérias “é uma questão cultural, os alunos desta região gostam de aprender dessa maneira. É um estilo de aprendizagem que tem muito a ver com a cultura local”, acrescentou ainda. Teresa Vong, docente da Faculdade de Educação da Universidade de Macau (UM), também fala de uma mudança gradual. “Se o Governo quer reduzir esse sistema, tudo vai depender de como os professores estão preparados para isso ou se há métodos de ensino alternativos em uso. Não estou optimista porque há muitos professores que ainda usam a memorização como único método. Ainda há lugar para melhorar”, disse. “O grupo profissional de professores em Macau é muito jovem e isso dá-nos esperança de que ainda estejam em idade de aprender de encontrar alternativas”, lembrou Ana Correia. “Com o apoio de medidas incluídas na presente reforma educativa penso que os professores vão ajustar-se a modelos pedagógicos que põem o ensino mais focado no aprender do que obter produtos que têm um valor a muito curto prazo. Os alunos preparam-se para os exames mas esquecem tudo duas semanas depois, e o que fica é muito pouco”, acrescentou a directora da Faculdade de Psicologia e Educação da USJ. Acima da média Tanto Ana Correia como Teresa Vong referem que a memorização no ensino é uma ferramenta útil para a compreensão e aprendizagem, mas não deve ser a única. Há até quem tenha bons resultados no seguimento da vida académica. “Os alunos de Macau e desta região do mundo quando vão estudar para universidades estrangeiras obtêm geralmente resultados acima da média, comparando com alunos que pertencem a uma cultura não confuncionista. Os alunos que vêem das escolas de Macau para as universidades são muito variados. Há uns que, de facto, apanham bocadinhos das coisas e esses não conseguem depois partir do pormenor para o todo. Esses sim seguem pelo caminho da memorização. Mas há outros alunos, que apesar de se sentirem confortáveis com a memorização, são capazes depois de passar daí para a compreensão e até para uma perspectiva critica”, frisou Ana Correia. Teresa Vong, que realiza visitas às escolas locais, fala de maus exemplos que continuam a ser o único modelo adoptado. “Acredito que possamos promover um ambiente de ensino mais aberto e dar mais apoio aos alunos para que possam ter espaço para essa criatividade. Hoje em dia os estudantes não têm sequer uma voz. Em muitas aulas que observo há apenas uma forma de comunicação: o professor está de pé a falar até ao fim da aula e não há qualquer ligação com os alunos. Há muitos professores que forçam os alunos a memorizar o vocabulário em inglês, por exemplo”, rematou a docente da UM. Na sua interpelação escrita, o deputado Zheng Anting fez várias críticas ao modelo “duck stuffing”, o qual “priva os alunos do seu tempo de descanso e da vida extracurricular, e resulta na sua falta de capacidade para pensar e analisar de forma independente, enfraquecendo a sua competitividade social”, concluiu. No arranque dos exames nacionais a luta continua É uma luta antiga. A Associação de Pais da Escola Portuguesa de Macau (EPM) continua a reunir esforços para que os horários dos exames nacionais sejam alterados em Macau. Com o arranque ontem, os exames nacionais devem ser respeitar as regras do Ministério da Educação e por isso serem realizados à mesma hora. Acontece que com o fuso horário de Macau os alunos de cá realizam as suas provas às 16h30 e às 21h. “Todos os anos temos lutado para que a escola consiga falar com o Ministério da Educação de Portugal para que se conseguia resolver este problema”, começou por explicar, ao HM, Fernando Silva, presidente da Associação. O representante recorda que “há dois anos”, com as provas de aferição, alunos do ensino primário que “tinham de fazer os exames à noite”. Isto, aponta, sem contar com os alunos de Timor, onde se acrescenta mais uma hora do que em Macau. “Levantamos sempre este problema, mais do que uma vez. Nesse ano o Ministério da Educação atendeu o nosso pedido e mudou o horário”, recorda. No entanto, não é suficiente e a luta continua. “Temos tentado, a escola tem tentado expor o problema para ver se conseguimos reduzir um pouco as horas”, conta, assumindo “que tem sido muito difícil”. Não é segredo, até “porque está pedagogicamente provado”, que fazer os exames quando começa o dia é melhor. “Para os alunos do 10ª e 11ª ano até pode ser menos difícil, mas o mesmo não acontece com os alunos mais pequenos”, explica. Mesmo assumindo uma “luta quase inglória”, Fernando Silva garante que os pais vão continuar no caminho para a mudança.
Filipa Araújo Manchete SociedadePedofilia | Casos escondidos e sem protecção num território de lei curta Vivem nas sombras. Nas mais escuras de todas. São famílias a esconder um problema que deveria ser “uma responsabilidade social”: a pedofilia. Uma psicóloga relata-nos casos. “Muitos, muitos casos”. Vergonha, medo e mundo que desaba levam a que se viva este drama em silêncio. Macau diz querer rever o Código Penal. Enquanto isso crianças vêm o seu mundo ser estilhaçado. Para sempre… [dropcap style=’circle’]N[/dropcap]ão quer dizer quantos casos já lhe passaram pelas mãos. Nem estamos ali para isso. Recorda o primeiro e o choque que foi perceber o que tinha à sua frente. Mas agora já não é surpresa por, infelizmente, ser tão comum. Goreti Lima, psicóloga, conta que há “muitos, muitos, mas mesmos muitos casos de pedofilia em Macau”. Este não é um território especial. Aqui, como em qualquer parte do mundo, as crianças sofrem de abusos sexuais. Um drama que se vive em silêncio, que mora em casas com cortinas fechadas, portas trancadas e corações partidos. Perceber o que leva uma família, uma mãe, uma avó, um pai ou alguém que ama uma criança, vítima de pedofilia, a esconder esta tragédia pode ser um desafio difícil de enfrentar. “O que leva os pais a esconder… bem, para já é super-difícil acreditar que isto [a pedofilia] está a acontecer. Então o que normalmente fazem é achar que a criança está a inventar ou que não é bem aquilo que ela diz ou que até está a fazer confusão. Isto porque aquela pessoa [que pratica pedofilia], por norma, até é uma pessoa amiga da família”, começa por explicar. Um acto que é calculado, ao milímetro. “É maquiavélico, tudo é muito bem preparado. A actuação de um pedófilo é muito calculada. Não são casos rápidos. Vão conhecendo a criança, o seu ambiente, vão fazendo a preparação para o acto. Vão preparando a sua presa e isto leva o seu tempo. O grande alvo deste processo, por norma, é a família para minimizar todas as suspeitas. Quando a criança começa a deixar de querer estar onde aquela pessoa está, a família nunca pensa que é por isto, mas sim outra razão qualquer”, relata. Um perfil definido Os casos que trabalhou, e tantos outros que estudou, trazem uma infeliz certeza à psicóloga. A pessoa pedófila age de forma padronizada e respeita um perfil muito próprio, como por exemplo, vontades, desejos ou concretização dos seus ímpetos durante pelo menos seis meses. Reconhecido como uma patologia no mundo da psicologia e psiquiatria, os doentes, “normalmente são pessoas muito bem vistas na sociedade. Têm posições de estatuto, são sempre muito amáveis, muito prestáveis, muito simpáticas e super metódicos. À partida não existe nenhum indício que leve a crer que aquela pessoa possa sequer ter actos pedófilos”, caracteriza, frisando que este perfil despista qualquer desconfiança. Conquistando uma postura de confiança é nesse momento que se desenrola o crime. “Depois de conquistar a criança, de entrar no mundo dela e de lhe fazer entender os laços de carinho e amor que os liga, é aqui que o pedófilo actua”, aponta. Será errado? No outro lado da moeda, temos a criança, que nem sempre percebe que é errado. “O que acontece é que a criança sente-se muito baralhada”, aponta. Algo perfeitamente natural depois de tanto trabalho de conquista. “As crianças têm imensas dúvidas sobre sexualidade ou sobre as mudanças no corpo e eles normalmente fazem essa aproximação. Portanto, quando um dia tocam, mostram ou querem ver, não é uma coisa totalmente despropositada, porque eles já foram expondo a criança ao estímulo, ou seja, nunca é um acto totalmente descontextualizado”, indica. Ainda assim, para a criança, é uma surpresa, porque lhe suscita dúvidas. “Se esta pessoa é minha amiga, está próxima de mim, diz que gosta de mim, será errado? É o pensamento da criança”, relata. No entanto, há sempre uma altura em que a vítima percebe que não está certo, mas sente vergonha por tudo o que aconteceu. “Ao mesmo tempo o pedófilo faz com que a criança sinta culpa no assunto, porque introduz-lhe ideias de que ela [a criança] o quis fazer, e teve prazer nisso”, continua, assinalando que os dados mundiais indicam que há mais pedófilos homens do que mulheres. “Mas há pedófilos homens e mulheres”, assinala. Verdade escondida Depois de, no início do mês passado, terem surgido dois casos de alegada pedofilia, envolvendo um português e um idoso chinês, a sociedade de Macau parece ter ficado chocada. “A verdade é que todos os dias há casos destes que nunca chegam a ser conhecidos”, garante Goreti Lima. Fonte do HM, responsável por uma associação que acolhe crianças, confirma esta realidade. Existem muitos casos e algumas das crianças que o espaço acolhe são vítimas. Os números oficiais em nada compactuam com estes relatos. Indica-nos a Polícia Judiciária (PJ), por email, que desde 2011, as autoridades receberam um total de 11 casos, quatro em 2012 e três no ano passado. Números que não batem certo com a realidade, porque a PJ garante que este ano ainda não recebeu qualquer acusação. Assobiar para o lado Em Macau, as crianças vítimas de pedofilia estão protegidas pelo Código Penal, mais precisamente pelo capítulo que diz respeito aos crimes contra a liberdade e autodeterminação sexuais, mais especificamente nos artigos 166º ao 170º. Diz a lei que “quem praticar acto sexual de relevo com ou em menor de 14 anos, ou o levar a praticá-lo consigo ou com outra pessoa, é punido com pena de prisão de 1 a 8 anos”. Pena que poderá aumentar até aos 10 anos de prisão se o agente tiver cópula ou coito anal com menor de 14 anos. No artigo seguinte é definido que “quem tiver cópula com menor entre 14 e 16 anos, abusando da sua inexperiência, é punido com pena de prisão até 4 anos, sendo que é alvo da mesma pena quem praticar coito anal. Violação sexual a crianças em momento algum é referido na lei. “É uma falha”, frisa a responsável pela associação de crianças. “Na lei não está definido se é ou não é criança, trata a violação de forma igual. Não pode ser assim, não deve ser assim”, argumenta. As penas são também alvo de crítica. Goreti Lima aponta o dedo a um Direito que não protege as crianças. Já Song Pek Kei, deputada por sufrágio directo, caracteriza as penas de “muito leves” para crimes que mereciam “mãos mais pesadas”. “Em Macau não existe uma punição muito exigente, como por exemplo a pena de morte, mas podemos abordar essa questão”, garantiu a deputada, ao HM. Para a legisladora, as notícias “de casos de abusos de crianças” têm sensibilizado a sociedade para este drama. “É preciso pensar nisto, admitirmos que existe este problema na nossa sociedade, ao fazê-lo será mais fácil tratarmos do assunto e evitar que mais casos venham acontecer. O que está a faltar é a consciencialização deste drama”, defende. Para o advogado Miguel de Senna Fernandes, “nos tempos que correm”, apesar de não existir, em Macau, um alto registo de números de casos, há “todo o interesse em rodear o tratamento desta matéria com uma medida penal acentuada”. Para Goreti Lima, este devia ser uma “responsabilidade social”. A sociedade devia sentir que têm a obrigação de tornar estes casos públicos e puni-los. Numa conferência na Florida, Estados Unidos da América, a psicóloga espantou-se com a defesa de introdução do ensino sexual no jardim de infância. “Na altura pensei, que horror, esta gente está doida, estão a acordar quem está a dormir. Porque não estava a ver o outro lado da questão, que é quanto mais informação a criança tiver, mais alerta pode estar e pode dizer ‘isto não está certo’”, explica. Abrir de olhos É, por isso, que a solução passa sempre pela educação. “Tocar numa criança de forma a estimular os órgãos sexuais ou a própria criança é pedofilia”, garante Goreti Lim, indicando que muitas vezes as crianças “não sabem porque é que aquilo está a acontecer mas até gosta”. “São festinhas, é carinho, é mimo, portanto a criança gosta, mas não está preparada para saber se aquilo está certo. Mas não está. É errado”, frisa. “Temos de avisar que não é certo tocar nas suas zonas íntimas, nem que a criança toque em alguém”, remata. Da sua experiência, a especialista não tem qualquer dúvida “todos nós temos à nossa volta casos de pedofilia, muitas vezes de pessoas já adultas que foram vítimas em crianças”. As consequências, aponta, são nefastas. Crianças que se tornam problemas com auto-estimas destruídas, com problemas relacionais, marcas profundas. Adultos que em crianças acreditaram numa pessoa amiga. Que, finalmente, lhes roubaram a possibilidade de acreditar e de sonhar.
Filipa Araújo MancheteNotários | Governo não sabe quantas vagas vai abrir A Assembleia Legislativa começou ontem a analisar o estatuto dos notários privados. A Secretária para a Administração e Justiça não sabe quantos concursos vão ser abertos. Deputados pedem mais inspectores [dropcap style=´circle´]A[/dropcap]rrancou ontem a análise da proposta de lei relativa ao estatuto dos notários privados em Macau pela 1ª comissão permanente da Assembleia Legislativa (AL). Em discussão esteve a falta de profissionais na área e as directrizes para a reintegração de habilitados, para além da possibilidade de abertura de concurso que abranja a inspecção dos notários. A Secretária para a Administração e Justiça, Sónia Chan, disse aos jornalistas que ainda não sabe quantas vagas vão abrir para que novos notários possam concorrer. Presidida pela deputada Kwan Tsui Hang, a comissão serviu para abordar as questões relativas à falta dos profissionais no território da RAEM bem como a possível reintegração de profissionais, para além da ausência de inspectores suficientes. Actualmente existe apenas um profissional para monitorizar a qualidade profissional do serviço dos notários privados, número evidentemente escasso para os 57 notários. Neste sentido Kwan Tsui Hang adianta a possibilidade da presente proposta de lei poder vir a abranger um concurso para admissão ao curso de formação nesta área. No que respeita à possível reintegração de profissionais já considerados habilitados pelo Regime Transitório que data da fase anterior a 1999, a presidente da 1ª Comissão Permanente adianta que neste momento há 15 pessoas nesta situação que não estão em Macau. Para estes casos, e assim que a proposta de lei for aprovada, será enviada uma notificação informativa em que é dado um prazo de três meses para os interessados informarem a sua intenção de exercer a profissão no território. Mais formação O diploma abrange ainda a abertura de um concurso para admissão ao curso de formação organizado pelo Centro de Formação Jurídica e Judiciária tendo em conta a escassez de notários privados na RAEM. Desde 2002 que não é aberto um curso de admissão para as funções, sendo que dos cinco cursos ministrados até essa data foram qualificados 99 notários privados. Hoje exercem na RAEM 57 profissionais que não garantem a necessidade de estabelecer o equilíbrio entre a procura de serviços notariais e a capacidade de resposta do sector com vista à eficaz satisfação das necessidades da população. Cartório Notarial vai sair do Leal Senado O Primeiro Cartório Notarial Público situado nas instalações da Santa Casa da Misericórdia no Largo do Senado vai mudar de casa. Kwan Tsui Hang revelou a decisão do Governo de mudar o serviço para a zona norte da cidade, não adiantando quaisquer informações acerca do destino do edifício que ocupa actualmente. Ao ser confrontado com a decisão, o provedor da Santa Casa da Misericórdia de Macau, António José de Freitas, em declarações à Rádio Macau, afirma que ainda não recebeu qualquer denúncia do contrato de arrendamento por escrito, salientando a preocupação com a situação: “Entendemos que o Governo deveria ter uma maior responsabilidade em zelar pela imagem daquele edifício.” Afirma ainda que lamenta que a Santa Casa seja a primeira vítima da política de austeridade do governo ao mesmo tempo que refere que a renda de um milhão e duzentas mil patacas que a Santa casa recebe anualmente do aluguer do espaço representa cerca de 1% dos cerca de 100 milhões de patacas que o Governo gasta em arrendamentos de vários espaços públicos de Macau É intenção da Santa Casa continuar a arrendar este espaço sendo que considera que o inquilino “deveria ser um departamento do Governo, ou então um banco ou qualquer coisa que não seja de comes e bebes” de modo a zelar pela imagem e dignidade do edifício em si, remata.
Filipa Araújo Ócios & Negócios PessoasBournemouth, café e padaria | Chan, proprietário: “Apostei num serviço barato” Está aberto há duas semanas e já tem o rótulo de sucesso garantido. Chan é a cara do negócio que pretende facilitar a vida dos residentes. Comidas leves, acompanhadas por sumos frescos, para levar ou comer num simpático balcão [dropocap style=’circle’]A[/dropcap]ssim que entramos somos recebidos com um sorriso. O cheiro a pão inunda-nos e o calor pede um sumo, bem fresco. Chan, o proprietário do mais recente café junto à igreja de São Lourenço, convida-nos a provar o “fresquíssimo sumo de manga”. “Querem um pão? É português e temos vários tipos de pães”, completa. Esta era, de facto, a ideia que fez nascer o café e padaria Bournemouth. “Sou formado na área de hotelaria, e sempre trabalhei em grandes restaurantes. Um dia decidi que queria o meu próprio negócio e como tinha muito contacto com comida mais ‘ocidentalizada’ decidi criar este espaço”, começa por partilhar o proprietário. A ideia era simples: os clientes tinham ao seu dispor uma quantidade variada de sumos frescos e tipos de café, sejam duplos, americanos, Moka ou um café com leite. Para acompanhar tinham pão português. “Esta combinação resulta sempre: sumo com pão”, brinca Chan. O fabrico não é próprio, alerta. “O pão encomendo da Metro Pizza. Eram os fornecedores do meu antigo trabalho e sempre gostei do serviço”, explica. Pão com chouriço, vegetais e salsichas, leitão, mortadela e até bacon são algumas das variedades que se podem encontrar na montra. Ao lado está uma arca que se destaca, por estar vazia. Chan olha e prontamente justifica. “Não tenho mãos a medir, numa semana e meia as mais de 500 garrafas desapareceram e percebi que as pessoas queriam mais do que um sumo e um pão”, conta. É desta necessidade que nasceu um menu mais completo composto por sandes, saladas e pratos rápidos. Bom e barato “Parece que as pessoas queriam sempre mais, e a verdade é que venho para aqui às 7 da manhã mas rapidamente vendo tudo. Estou a tentar encontrar uma forma de ter mais oferta agora, para a procura que tenho”, continua. Quando questionado sobre a aceitação do serviço, Chan explica que a ideia era ser um serviço barato. “Apostei num serviço barato, porque comecei a perceber que com esta história das baixas na economia as pessoas querem gastar menos. Eu sentia isso no restaurante em que trabalhava, e posso dizer que era uma coisa de luxo”, continua. “Eu sei que há sítios em que este serviço é mais caro. Mas não acho que haja necessidade para isso. A ideia é que seja mesmo barato. Que uma sandes um sumo sejam baratos, não precisam de ser caros”, explicou ainda. Para todos Sandes de frango, queijo e fiambre, bife com ovo, tomate, acompanhadas por uma salada César ou de fruta, por menos de 50 patacas? Sim é possível. Agora é possível. Um balcão com poucas cadeiras, porque “a ideia não é que as pessoas fiquem por aqui, mas sim usufruam do serviço take away”, recebe que por ali que ficar. A decoração não podia ser mais simples e bonita. Paredes de ardósia para se poder diversificar, o uso da madeira e brincadeira com a luz dão um ar saudável, divertido e bastante familiar. Uma pequena cozinha mostra todo o processo de confecção das sandes. E até as garrafas são originais. “Apostei no simples”, explica Chan. Abrir um negócio não “é trabalho fácil” em Macau, mas com esforço as coisas vão-se conseguindo. Chan não esconde que não contava com tanta gente nos primeiros dias porque sempre teve em mente trabalhar para um grupo pequeno de pessoas. “Não sabia que isto iria ser assim, talvez tenha que fechar mais cedo para conseguir confeccionar mais para o dia seguinte, mas é importante que as pessoas também comprem o nosso pão”, argumenta. Entusiasmado com o projecto, mas com medo de falhar, Chan nasceu para vencer e isso nota-se na sua dedicação ao trabalho. “Vamos ver, um dia de cada vez”, diz. E não será este o lema mais simples de viver?
Filipa Araújo MancheteEstética | Saúde pública em risco devido à falta de legislação Sempre gerou muita controvérsia na sociedade. A cirurgia estética é um prazer para uns, um erro para outros. Em Macau não há dúvidas: intervenções estéticas colocam em causa a saúde pública. Para evitar riscos é preciso legislar, frisam médicos [dropcap style=’circle’]“Q[/dropcap]uando não acontece nada até o sapateiro pode ser médico”. A afirmação é de Fernando Gomes, médico, reagindo à falta de legislação para a especialidade de medicina estética. Em termos práticos, o exercício da actividade privada de prestação de cuidados de saúde está regulada pelo Decreto de Lei 84/90/M, publicado em Dezembro de 1990, alterado em 1998 e 1999. Acontece que nada diz sobre medicina estética, mas não é por isso que não se deixa de a praticar em Macau. “Não existe qualquer regulamentação sobre o exercício da especialidade, nem sequer da profissão. Qualquer um que tenha licença para o exercício o pode fazer [bastando ter uma licenciatura em medicina ou acreditação para tal], mesmo que não seja a sua especialidade”, começa por explicar Fernando Gomes. Reforçando a opinião está o também médico Rui Furtado que aponta esta “inexistência de lei” como uma “profundo risco para a saúde pública”. Os culpados O que seria suposto estar a acontecer em Macau, e no mundo da saúde, é que sempre que existe um acto médico o profissional deveria ser responsabilizado pelo mesmo acto, desde que praticado em instituições idóneas e responsáveis, e também responsabilizado pelo administrar medicamentos aos pacientes. Como? Com a assinatura da receita. Em Macau só o hospital Conde São Januário é que passa estas receitas, sendo que todas as outras instituições não o fazem. “Como se sabe aqui ninguém passa receitas, tirando o hospital e, claro, aí há responsabilidade médica, na medicina privada não o fazem. O que acontece é que os utentes vão ao médico e no fim recebem uns comprimidos coloridos num saquinhos de plásticos (…) se houver algum problema, se o doente morrer ninguém sabe quem é que deu aquilo aos doentes. Portanto não há responsabilidade nenhuma de quem administrou aquilo ao doente”, exemplifica Rui Furtado, frisando que esta é a prática “normal em Macau”. Apesar de ser um problema geral, a área da estética está claramente em destaque. Pelos piores motivos. “Aqui qualquer curioso vai a um centro de beleza e faz uma cirurgia estética, algo que só deveria ser feita por médicos credenciados, em hospitais”, continua. “Em Macau qualquer curioso vai a um Centro de beleza e faz a cirurgia. Os procedimentos que têm de ser feitos pelos especialistas, por exemplo o botox, é feito por qualquer curioso, em qualquer lado. Portanto qualquer acto médico em Macau é feito sem responsabilidade nenhuma porque ninguém assina papéis”, acusa. Pulso firme A deputada Wong Kit Cheng, numa interpelação escrita, acusou o Governo de nada fazer num assunto bastante sério. “(…) os Serviços de Saúde (SS) afirmaram que já formaram grupos de trabalhos internos para investigar a regulamentação do serviço de medicina estética, incluindo a proficiência dos médicos, equipamentos, avaliação de risco, entre outros, mas até agora não foi anunciado qualquer progresso”, apontou, sublinhando que “os médicos inscritos não tem conhecimento profissional suficiente ou treino sobre medicina estética, pois o decreto-lei presente [Decreto-lei 84/90/M] não consegue garantir a qualidade do serviço relacionado”. A deputada vai ainda mais longe e afirma que a sociedade estão mal preparada porque nem consegue “distinguir entre medicina estética ou actos de cosmética ordinários”. “Com a falta de informações correctas e claras, o direito e beneficio dos consumidores estão a ser afectados”, apontou. Não são comuns, acrescenta ainda a deputada, casos infelizes de cirurgias em que a única pessoa lesada foi o paciente, sem qualquer responsabilização atribuída ao médico. Fernando Gomes, exemplifica, com o mais recente caso na região vizinha, Hong Kong, da morte de uma paciente depois de desencadear uma reacção alérgica após uma cirurgia plástica. “As pessoas aqui em Macau também correm risco de vida. Até o simples botox. Por exemplo, as pessoas fazem botox hoje em dia quase em cada esquina da rua. Claro que há pessoas que podem ter uma reacção negativa, ou seja, se precisarem de ser reanimadas, isto pode não acontecer porque estas clínicas podem não estar preparadas”, continuou. Acreditação precisa-se A solução está na aprovação do Regime Legal da Qualificação e Inscrição para o Exercício da Actividade dos Profissionais de Saúde, aponta Fernando Gomes. “Essa lei é que vem prevenir todos os casos (…) é preciso regulamentar o exercício de cada especialidade. As pessoas acreditam que por ser médico se pode fazer isso tudo, mas não. É preciso aprovar a lei para ver se conseguimos normalizar uma situação que hoje em dia não pode ser aceitável, principalmente no sector privado”, rematou. Ainda assim, mesmo com a possível qualificação é preciso depois controlar o exercício da especialidade dentro das próprias clínicas. “Responsabilidade médica é um assunto que muito se tem debatido mas que nada se tem feito para alterar”, lamenta Rui Furtado. Enquanto a lei continua em análise e discussão, torce-se para que ninguém morra numa maca, só porque a beleza comanda o mundo.