Enfrentar a realidade *

Rómulo Santos

Sabemos que o surto pandémico estará controlado em breve. Mas, para reanimar a economia de Macau, vai ser preciso tempo e líderes muito hábeis. Por exemplo, se uma pessoa sofrer de transtornos intestinais, além de tomar a medicação tem de fazer dieta. Se chegar ao ponto de não comer nada, o problema desaparece. No entanto, se estiver privado de alimento durante muito tempo, sofrerá de prostração e pode sucumbir.

Durante o jogo da Supertaça de Inglaterra, realizado a 30 de Julho, nenhum dos milhares de espectadores usava máscara. A 31 de Julho, as pessoas que assistiram à corrida de Fórmula 1 na Hungria, durante o Grande Prémio 2022, também não as usavam. Tudo parece decorrer com normalidade em Inglaterra e na Hungria, como se a pandemia já tivesse passado e os países tivessem vencido esta batalha.

Em Macau, as receitas dos casinos em Julho de 2022 atingiram os 398 milhões de patacas e o acumulado dos primeiros sete meses deste ano é de 26,6 mil milhões de patacas, enquanto, em Junho, as receitas obtidas através da taxação ao jogo em Las Vegas atingiram os 1.300 milhões de US dólares e, durante 16 meses consecutivos, as receitas mensais decorridas desta taxação ultrapassaram os 1.000 milhões de US dólares. Macau foi bem-sucedido na prevenção e no combate à pandemia, enquanto Las Vegas foi bem-sucedida na recuperação económica durante a pandemia. Las Vegas voltou a superar Macau e tornou-se a cidade que gera mais receitas através das taxas aplicadas ao sector do jogo a nível mundial. Por que é que os resultados destas duas cidades, ambas atingidas pela pandemia, são tão diferentes? A resposta está na forma como os dirigentes das duas cidades lidaram com os impactos da pandemia.

Pois bem, olhemos agora para a situação de Hong Kong e de Macau. Macau tem de manter as fronteiras abertas com a China continental, por isso insistiu em adoptar de forma persistente a política da “meta dinâmica de infecção zero”, para assegurar a prevenção da pandemia. Por outro lado, Hong Kong seguiu em sentido contrário lutando para manter a sua posição de centro financeiro, por isso a sua forma de lidar com a pandemia tende obviamente para a “coexistência com o vírus”. As duas RAEs têm diferentes estatutos geopolíticos, diferentes valores, e, portanto, actuam de forma diferente, por uma questão de funcionalidade.

A origem deste surto em Macau é ainda desconhecida e eu estou mais preocupado com a actuação dos membros do Governo local. Depois de terem passado mais de dois anos sobre o surgimento da COVID 19, as medidas anti-epidémicas introduzidas pelo Governo da RAEM, em face do surto actual, são ainda mais severas do que em 2020.

Falo, por exemplo dos testes PCR a que se têm de submeter os filipinos que vivem em Macau, que apenas têm validade de três dias, o que provocou muitas críticas de várias comunidades. Numa sociedade onde existe “zero interferência política”, apenas podem ser ouvidas as vozes e as opiniões públicas que louvam o Governo da RAE, e não as queixas e os sofrimentos da maioria da população.

Se não conseguirmos enfrentar a realidade não podemos resolver os problemas. A recuperação económica de Las Vegas não assentou na diversificação moderada da economia, mas no desenvolvimento progressivo da sociedade. Com o princípio orientador “um país, dois sistemas”, Macau não deve embarcar no caminho da economia centralizada.

O Chefe do Executivo da RAEM, Ho Iat Seng, estará presente, no dia 9 de Agosto, na reunião plenária da Assembleia Legislativa, onde responderá às perguntas dos deputados. Se o Chefe do Executivo enfrentar a realidade e aproveitar esta oportunidade para explicar em detalhe as várias medidas que estão a ser tomadas para beneficiar a população, pode vir a ter uma boa hipótese de melhorar a popularidade do Governo da RAEM.

*Artigo escrito no dia 4 de Agosto.

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