Felicidade em Hong Kong

As Nações Unidas designaram o dia 20 de Março como “Dia Internacional da Felicidade”. O Relatório Mundial de Felicidade em 2025, publicado pelo ONU é também lançado nesse dia.

Na elaboração do relatório são considerados vários critérios para calcular o nível de felicidade de uma sociedade, como apoio social, PBI per capita, saúde, liberdade, generosidade, integridade, emoções positivas, emoções negativas, doações e capacidade de ajudar desconhecidos.

O relatório actual usou dados recolhidos entre 2022 e 2024. Foi apurado que a Finlândia encabeça a lista dos 147 países e regiões do mundo, pela oitava vez consecutiva, seguida pela Dinamarca, Islândia, Suécia, Holanda, Costa Rica e Noruega. O Reino Unido ocupa o 23.º lugar, os Estados Unidos o 24.º e o Afeganistão surge em último lugar. Na Ásia, Taiwan, China, ocupa o 27.º lugar do nível de felicidade mundial, Singapura o 34.º, o Vietname o 46.º, a Tailândia ocupa o 49.º lugar, o Japão o 55.º, a Coreia do Sul o 58.º, e a China continental o 68.º.

A classificação de Hong Kong caiu pelo quarto ano consecutivo, ocupando agora o 88.º lugar. No primeiro relatório publicado em 2012, Hong Kong estava em 67.º lugar. Desde então, tem-se situado entre 71.º e 78.º. No entanto, desde 2021, a sua posição caiu abaixo do 77.º lugar, o que representa um mínimo histórico.

O relatório reflecte a situação geral e baseia-se nos resultados de dados estatísticos. É difícil explicar muito detalhadamente porque é que as pessoas se sentem felizes ou infelizes. Hoje, vamos tentar explorar as razões para a quebra continuada do nível de felicidade das gentes de Hong Kong a partir de uma nova perspectiva.

Eva Bogut, uma celebridade russa da internet com mais de 230.000 seguidores, trabalha em Hong Kong, onde vive desde a segunda metade de 2023. Quando chegou à cidade, manifestou o seu amor a Hong Kong na sua rede social e declarou que desejava ardentemente tornar-se uma Hongkonger. Mas no passado dia 11 de Março, reverteu estas declarações e decidiu despedir-se e regressar a Moscovo.

Eva declarou ao Telegram que existiam quatro problemas em Hong Kong que a levaram a tomar a decisão de sair da cidade. Primeiro, o custo de vida é muito elevado. Deu como exemplo o preço de vários produtos: duas pizzas vulgares, atingem os 7.000 rublos (cerca 648 dólares de Hong Kong); um pão com melhor textura e que não cheire a plástico custa cerca de 800 rublos (à volta de 74 HKD); um maço de cigarros chega aos 1.300 rublos (cerca de 120 HKD) e a renda de uma casa com 26 metros quadrados atinge os 2.000 USD (cerca de 15.549 HKD). Estes custos são excessivamente altos e demonstram como é caro viver em Hong Kong, que aparece em segundo lugar como a cidade mais dispendiosa do mundo depois de Nova Iorque.

Em segundo lugar, é difícil encontrar um equilíbrio entre o trabalho e a vida pessoal. Eva afirma que as pessoas de Hong Kong são viciadas no trabalho. Geralmente, a hora de almoço não é contabilizada como horário laboral. Só existem 14 feriados públicos por ano e o tempo de descanso é bastante limitado. Embora em Hong Kong o salário médio seja alto, não sobra tempo para fazer o que se gosta e os rendimentos altos perdem o seu propósito.

A situação de Eva assemelha-se à dos entregadores de comida que abordámos no artigo anterior “Limites do Trabalho”. as pessoas escolhem aquela função porque lhes dá uma noção exacta de quando o trabalho começa e de quando acaba. Depois de despirem os uniformes, ficam de novo imediatamente livres. A visão de Eva e dos entregadores de comida reflecte os pensamentos de algumas pessoas de Hong Kong.

Em terceiro lugar, Eva acredita que o sistema de saúde de Hong Kong é mundialmente famoso, com um elevado número de serviços de urgência e de cuidados intensivos, mas fica muito caro tratar certas doenças e os médicos fazem apenas diagnósticos rápidos e geralmente não prescrevem análises e exames detalhados.

Por último, embora as pessoas de Hong Kong sejam muito educadas, são também muito indiferentes, e muitos são introvertidos, imersos no universo do telemóvel. Nesta comunidade muito fechada, todos trabalham imenso e têm relutância em sair e conviver com os amigos, por isso enviar mensagens e usar o telemóvel tornou-se o principal meio de comunicação. Por tudo isto Eva acredita que Hong Kong é uma “terra de zombies”.

Os dados estatísticos do relatório e a partida de Eva, serão a razão que justifica o sentimento de infelicidade das pessoas de Hong Kong? Não sabemos. Se o nível de felicidade dos habitantes de Hong Kong continuar a cair, será um fenómeno a que ninguém quer assistir. A sociedade da cidade deve adoptar políticas pragmáticas para reduzir o custo de vida, melhorar a inclusão cultural e ainda conquistar o apoio de celebridades da internet para promover o desenvolvimento económico e melhorar as condições de vida.

A saída de Eva de Hong Kong representa a perda de uma embaixadora da cidade. À medida que estrangeiros talentosos forem gradualmente saindo, o estatuto de Hong Kong como “metrópole internacional” irá inevitavelmente ser posto em causa. Actualmente, Hong Kong depara-se com o problema do que deve fazer de futuro para reter todas as “Evas”.

No futuro, Hong Kong não precisará de olhar para o relatório. Desde que consiga reter todas as “Evas” e conquistar as suas recomendações, significará que os níveis de felicidade terão aumentado. Nessa altura, Hong Kong saberá que é feliz.

Consultor Jurídico da Associação para a Promoção do Jazz em Macau
Professor Associado da Faculdade de Ciências de Gestão da Universidade Politécnica de Macau

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